Pronunciamento de José Fogaça em 21/08/1996
Discurso no Senado Federal
DECISÃO DA BANCADA DO PMDB EM INDICAR S.EXA. COMO RELATOR DAS PROPOSTAS DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO, QUE VISAM PROMOVER ALTERAÇÕES NO INSTITUTO DAS MEDIDAS PROVISORIAS. RESPONSABILIDADE DO CONGRESSO NACIONAL POR SUA OMISSÃO NA APRECIAÇÃO DAS MEDIDAS PROVISORIAS. PROPOSTAS DE S.EXA. PARA A CRIAÇÃO DE UMA COMISSÃO ESPECIAL MISTA E FIXA, COM O FIM DE ANALISAR AS MEDIDAS PROVISORIAS.
- Autor
- José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
LEGISLATIVO.:
- DECISÃO DA BANCADA DO PMDB EM INDICAR S.EXA. COMO RELATOR DAS PROPOSTAS DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO, QUE VISAM PROMOVER ALTERAÇÕES NO INSTITUTO DAS MEDIDAS PROVISORIAS. RESPONSABILIDADE DO CONGRESSO NACIONAL POR SUA OMISSÃO NA APRECIAÇÃO DAS MEDIDAS PROVISORIAS. PROPOSTAS DE S.EXA. PARA A CRIAÇÃO DE UMA COMISSÃO ESPECIAL MISTA E FIXA, COM O FIM DE ANALISAR AS MEDIDAS PROVISORIAS.
- Aparteantes
- José Eduardo Dutra.
- Publicação
- Publicação no DSF de 22/08/1996 - Página 14730
- Assunto
- Outros > LEGISLATIVO.
- Indexação
-
- DESIGNAÇÃO, ORADOR, RELATOR, PROPOSTA, ORIGEM, SENADO, EMENDA CONSTITUCIONAL, ALTERAÇÃO, NORMAS, VIGENCIA, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
- ANALISE, DIVERSIDADE, ASSUNTO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), EFEITO, VIDA, CIDADÃO, NECESSIDADE, APERFEIÇOAMENTO, ESTUDO, ATENÇÃO, INTERDEPENDENCIA, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, JUDICIARIO.
- ANALISE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), AMBITO, PRESIDENCIALISMO, OPOSIÇÃO, PARLAMENTARISMO, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ITALIA, FRANÇA, ERRO, UTILIZAÇÃO, NORMA JURIDICA, SISTEMA DE GOVERNO, BRASIL, COMENTARIO, EXCESSO, EDIÇÃO, REEDIÇÃO, EXECUTIVO, MOTIVO, OMISSÃO, APRECIAÇÃO, LEGISLATIVO.
- SUGESTÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO MISTA ESPECIAL, REGULARIDADE, FUNCIONAMENTO, OBJETIVO, APRECIAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CRITICA, METODOLOGIA, TRAMITAÇÃO, ATUALIDADE.
O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o nosso Avulso da Sessão do dia 21 de agosto traz um relatório importante, minucioso, detalhado, esquematicamente organizado sobre as medidas provisórias em tramitação no Congresso Nacional. E dá uma informação: são 52 medidas provisórias tramitando no Congresso Nacional. Dessas 52 medidas provisórias, possivelmente já tenhamos mais de 200 reedições, ou seja, elas já se multiplicaram por tantas outras porque, a cada 30 dias, uma vez que a sua vigência completa-se, uma nova medida provisória, teoricamente, é editada.
De fato, trata-se de uma questão importante, fundamental, de uma questão que eu diria estar no próprio nervo, no cerne do processo democrático brasileiro. E eu não poderia deixar de falar sobre isso, uma vez que recebi do meu partido este volumoso e alentado conjunto de propostas, resultante do trabalho da Comissão Especial e da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, a respeito das medidas provisórias.
Em reunião da nossa bancada na última semana, tomou-se uma decisão conjunta, majoritária e, mais do que isso, unânime entre os presentes: a designação do meu nome para relatar esse projeto ou esse conjunto de projetos de emendas constitucionais, relativos às medidas provisórias.
São quase 500 páginas de estudos dos Srs. Senadores. A Comissão Especial teve como relator o brilhante Senador Josaphat Marinho, um dos mais renomados juristas dentro e fora do Congresso Nacional, um homem que tem um profundo conhecimento do texto da nossa Constituição. Embora S. Exª não tenha sido Constituinte, é um dos maiores constitucionalistas que esta Casa já conheceu.
Este trabalho coordenado teve uma conclusão, ou melhor, um primeiro momento, um primeiro patamar de decisão, que culminou com uma proposta de alteração da Constituição. Esta proposta basicamente visa inverter o ônus, inverter o lado ativo no processo de aprovação ou reprovação das medidas provisórias.
Basicamente, o que decide ou o que propõe a Comissão é que as medidas provisórias, uma vez completados não mais 30 dias, mas 60, deixem de ter vigência, percam a sua eficácia desde a data original e primacial da sua publicação caso não sejam votadas ou apreciadas pelo Congresso Nacional.
Esta é uma questão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que não pode ser objeto de uma reflexão superficial e frágil. Há que se fazer um estudo alentado, acurado, detalhado, criterioso e, sobretudo, responsável perante o País, perante a História, perante a Constituição brasileira, perante o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Esta é uma questão nossa, dos Congressistas com o Presidente da República, mas, por trás disso, estão todas as questões em torno das quais o País vive os seus dramas diários, os seus dramas comuns e mais permanentes.
Há medida provisória sobre assistência social; há medida provisória sobre vencimentos de servidores; há medida provisória sobre mensalidades escolares; há medidas provisórias sobre planos econômicos que mexem com taxas de juros, que mexem com a vida das pessoas; há medidas provisórias sobre a organização de autarquias e fundações; há medidas provisórias tratando do Programa Nacional de Desestatização, ou seja, tratando da questão da privatização das empresas estatais; há medidas provisórias tratando do Plano de Seguridade Social do servidor público civil ativo; há medidas provisórias tratando sobre o Imposto de Produtos Industrializados, afetando diretamente as empresas; há medidas provisórias sobre o PIS - Programa de Integração Social; há medida provisória que altera complementarmente o Plano Real; há medidas provisórias que tratam sobre amortização, juros e outros encargos decorrentes da extinção ou dissolução de entidades da administração pública federal, de como fazer os pagamentos, em que termos, em que condições e em que prazos; há medidas provisórias sobre servidores militares federais; há medida provisórias que dispõe sobre o FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador; há medidas provisórias que tratam da gratificação de desempenho de atividade de fiscalização e que mexem diretamente com os fiscais relativos ao desempenho e proteção do vôo, portanto, afetam a vida daquelas pessoas que viajam. Enfim, quando nós, aqui, Senadores e Deputados, estamos tratando deste tema, não estamos tratando de uma questão puramente formal; não apenas de uma questão restrita a este mundo supraformal, do poder das estruturas políticas, dos órgãos de decisão, mas estamos tratando da vida comum, da vida diária, da vida permanente, daquilo que há de mais meridiano e elementar em cada cidadão, que é o seu salário, os juros que ele paga, a sua vida, enfim, a mensalidade escolar do colégio do seu filho etc.
Portanto, não estamos aqui falando meramente de questões supraformais ou institucionais. Estamos tratando aqui do nervo central da vida do País. Aqui se tomam as decisões de conteúdo e forma, decisões que afetam a vida das pessoas. Este é um trabalho que não pode deixar de ser amplamente democrático e consultivo. Ou seja, não creio que o Senado possa partir para esta decisão sem antes ter uma interlocução válida, correta, adequada, equilibrada e interdependente com o Executivo.
Não creio que haja dependência nem a mais absoluta independência. Dependência não pode haver, pois subordinação e submissão vulnerabilizam a nossa Instituição. Mas, ao mesmo tempo, a independência do ponto de vista político não é a independência do ponto de vista formal, do ponto de vista institucional. Do ponto de vista institucional, temos, sim, uma interdependência com os demais poderes, inclusive com o Executivo.
E, para isso, ou seja, para atender ao princípio da interdependência, não é possível restabelecer esse sistema, renová-lo ou reformá-lo sem que se dê voz, pelo menos, ao Poder Executivo, que é parte interessada, que foi eleito pela maioria da população, que tem, portanto, soberania eleitoral e política para tomar decisões, e que foi eleito na vigência da Constituição que aí está. Evidentemente, eleito também para reformar a Constituição. Mas para reformar a Constituição a partir de decisões que sejam integradas, abrangentes, e, mais do que integradas, integradoras dos diversos poderes. Tenho a impressão de que nos cabe ouvir não só a Presidência da República, mas também os representantes do Supremo Tribunal Federal.
Quando a bancada do PMDB me entregou essa tarefa, que considero sobretudo honrosa, mas inequivocamente muito difícil e complexa, disse-me claramente que desejava ver esse assunto resolvido num prazo o mais breve possível, ou seja, há o desejo político da bancada do PMDB de reformar o instituto das medidas provisórias. Essa mesma bancada me cobra um prazo para apresentar o parecer e, portanto, para criar as condições de resolutividade.
Não creio, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que seja possível tentarmos tergiversar ou levar o assunto para um futuro não conhecido ou para uma situação indefinida. Essa é uma posição política tomada pela bancada do PMDB, e a ela devo atender. Evidentemente, atenderei. No entanto, deixei bem claro à bancada do meu partido que o relatório e o parecer que eu produziria seria a resultante desse conjunto equilibrado de interesses interdependentes do Poder Executivo, do Poder Judiciário e do Poder Legislativo.
Embora sejamos atores extremamente interessados, partícipes dessa questão, talvez sejamos os atores que operam mais diretamente a questão da medida provisória, ela não é exclusivamente do nosso âmbito, da nossa órbita. A medida provisória é também da órbita, da esfera do Poder Executivo e do Poder Judiciário.
Desejo manifestar claramente esse desejo de criar as condições de audiência plena dessas partes para que possamos avançar. As medidas provisórias, todos sabem, foram incluídas na Constituição quase como que uma reprodução perfeita e exata do modelo que existe na constituição italiana. No art. 77 da constituição da Itália, artigo que praticamente transplantamos para a Constituição brasileira em 1988, claramente se estabelece o princípio da vigência da medida provisória, caso não haja apreciação e votação dela no prazo determinado. Quer dizer, as medidas provisórias lá são tratadas do mesmo modo como são tratadas hoje no Brasil: se o Congresso não as vota, elas vigoram. Mas isso ocorre em um país cujo regime é parlamentarista. Também é preciso reconhecer esse lado.
Há outro país, a França, que tem um regime de semipresidencialismo ou de semiparlamentarismo, em que isso ocorre. Eu diria que é mais parlamentarista que presidencialista, embora a percepção externa é a de que o presidente da república tem mais poder que o primeiro-ministro. Essa é uma percepção dos países estrangeiros que se relacionam com a França, já que o presidente tem o papel de chanceler. É ele que se incumbe da política externa e, geralmente, aparece mais para o exterior. Muito pouco, para esse fim, se vê a figura, a presença, do primeiro-ministro. De qualquer maneira, é importante registrar que na França também há um sistema de medidas provisórias basicamente igual a este, que é o sistema das chamadas ordonnances.
Consultamos a Constituição da Itália e vimos lá, no art. 77, os chamados provvedimenti provvisori com forza di legge, medidas provisórias com força de lei, e as reproduzimos exatamente como tais em nossa Constituição. No entanto, é importante chamar a atenção para o fato de que tanto a França quanto a Itália são países de regime parlamentarista. Lá o check and balance, quer dizer, o freio e contrapeso do sistema de poder não depende do sistema das medidas provisórias em si, mas do regime de governo. Ele se estabelece, isso sim, pela força política do parlamento que pode, por meio de voto de desconfiança, derrubar todo o gabinete de ministros.
Na Itália, por exemplo, se uma medida provisória editada pelo gabinete, pelo colegiado de ministros vier com o conteúdo do voto de confiança e a maioria do parlamento italiano votar contrariamente, isto é, pela derrubada da medida provisória, cai o governo. Demitem-se os ministros, que vão para casa, e outros ministros passam a compor o Governo. Isso leva a uma conseqüência inevitável: são extremamente raros - já ocorreram, mas são muito raros - os casos em que o poder executivo, ou seja, o governo, que executa as ações de governo, contraria o parlamento na edição de uma medida provisória. É muito raro que isto aconteça, porque quando o parlamento repudia uma medida provisória ele está também repudiando o governo. Então, o governo do regime parlamentarista, que tem enorme relação, uma enorme dependência, um enorme vínculo com o parlamento, tem um cuidado enorme na edição de medidas provisórias e só o faz sob o consentimento prévio e adrede estabelecido entre os diversos partidos políticos que compõem a maioria.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, isso significa dizer algo muito simples, mas da mais absoluta importância: medidas provisórias são próprias de um regime parlamentarista.
Infelizmente, é preciso reconhecer que cometemos um erro na Constituinte. Havia duas comissões na Assembléia Nacional Constituinte tratando dessa questão: a Comissão do Poder Legislativo e a Comissão do Poder Executivo. Esta última encerrou previamente o seu trabalho, optando, na primeira fase, pelo regime parlamentarista. Ora, subordinados à idéia de que a Constituição de 1988 iria prevalecer com base no modelo parlamentarista, a Comissão do Poder Legislativo resolveu aprovar o sistema de medidas provisórias. Com isso, permaneceu o regime parlamentarista com a edição de medidas provisórias. Somente quando chegou a última fase de votação, a votação em plenário, houve uma reação política dos que eram contrários ao regime parlamentarista, que, isoladamente, fizeram uma emenda para retirar o modelo parlamentarista e incluir novamente o regime presidencialista na Constituição. Isso foi feito. No plenário, foi vitoriosa a idéia do presidencialismo.
No entanto, como a emenda, isoladamente, tratou apenas da questão da estrutura de poder e não mexeu em todo o texto que tratava do Poder Legislativo, lá ficou intocável o instituto das medidas provisórias, e acabou prevalecendo o regime presidencialista.
Criamos realmente uma situação esdrúxula, de uma ambigüidade desconhecida, que é, de um lado, um regime presidencial, um regime unívoco de poder, expressado na figura única do Presidente, e, de outro, a adoção de medidas provisórias com força de lei para serem apreciadas pelo Poder Legislativo.
Não quero dizer, Sr. Presidente, que isso tenha sido o que mais tisnou, o que manchou ou o que submeteu a críticas esta Constituição. Mas é verdade que de lá para cá muitas críticas têm sido feitas por renomados juristas em relação a isso.
Hoje vigoram 52 medidas provisórias, mas o seu número chega a cerca de 850, desde que foi promulgada a Constituição de 1988. É possível dizer que cerca da metade disso refere-se a reedições. Eu não quero, de forma nenhuma, fazer crítica a este, àquele ou àquele outro governo. Todos os governos usaram largamente as medidas provisórias, todos. O primeiro a usá-las, no período pós-Constituinte, foi o Governo José Sarney, que estava no final do seu mandato presidencial, num momento de grande transição, era obrigado a usar e as usou. O Governo Collor também as usou largamente. O Governo Itamar Franco, que foi um governo breve, editou, individualmente, mais medidas provisórias do que o Governo Fernando Henrique. Embora tenhamos hoje um grande número de medidas provisórias contabilizadas, individualmente consideradas, elas chegam a 52. Como há reedição todo mês, o número deve chegar a 300, a 400, não sei quantas medidas provisórias. Também não me preocupo muito com essa estatística, porque os problemas relativos às estatísticas, no que tange às medidas provisórias, são bastante consideráveis. Basta dizer que no ano de 94 nós tivemos 406 medidas provisórias, mas só 102 delas foram individualmente consideradas ou propriamente ditas. As 304 restantes foram reedições.
Ficar contabilizando essa estatística do total das medidas provisórias é um uso instrumentalmente político muito inadequado. Não vou entrar nesse detalhe. Uso esses números apenas para demonstrar que o problema está aí e chamou a atenção da Bancada do PMDB, que tomou uma decisão. Se há algo que chama a atenção nas estatísticas é o fato de que o número de reedições é sempre muito maior do que o número de medidas provisórias editadas. Em outras palavras, isso significa dizer que, como o Congresso não aprecia no prazo de 30 dias, o governo reedita, ou é obrigado a reeditar subseqüentemente, consecutivamente, as medidas provisórias ao longo do tempo.
Se temos, hoje, 300 ou 400 medidas provisórias, não sei; mas 52, individualmente, unitariamente, foram consideradas. Nessas estatísticas, o resto é puramente reedição. E isso traz para nós do Congresso Nacional - Senado e Câmara - uma enorme culpa no cartório, uma enorme responsabilidade, uma grave culpabilidade. Como não apreciamos as medidas provisórias no prazo, temos consentido a sua reedição.
Então, se de um lado é possível dizer que tem havido uso exagerado, extremado de medidas provisórias, seria incorreto e até constrangedoramente contraditório não ver que também há algo chamado absenteísmo; há uma ausência, uma omissão do Congresso na apreciação das medidas provisórias. Então, são os dois lados dessa questão que não podem deixar de ser encarados de frente.
É preciso estabelecer uma regra mais saudável, apta e adequada ao regime presidencialista? Sim, sem dúvida, mas é necessário também impor ao Congresso Nacional um sistema de participação, de atuação, de operatividade. Se o Congresso Nacional não for operativo, atuante, eficaz, fica constrangedoramente controverso, Sr. Presidente, permanecermos gritando, esbravejando contra as medidas provisórias, deixando registrado no dia-a-dia que o Congresso não as vota, porque não as aprecia, não as considera, não as analisa, não as debate, porque se omite.
Então, para que cheguemos a esse processo, a esse debate, cheios de razão e tomados da maior e mais solene convicção, temos que também criar mecanismos que façam o Congresso Nacional ser mais atuante e participativo.
Nesse sentido, há dois anos, apresentei uma proposta à Bancada do PMDB, objetivando a criação de uma Comissão especial de caráter temporário, mas de funcionamento regular e quase permanente, na mesma modelagem da Comissão de Orçamento, que é também uma Comissão temporária; ela não está entre as Comissões Permanentes da Casa. É temporária; só existe até votado o Orçamento. Mas, como tem Orçamento todos os anos, acaba-se criando a necessidade de instituir a Comissão de Orçamento, nomear os seus integrantes e instalar esta Comissão anualmente. Esta mesma sistemática aplicaríamos a uma Comissão especial de apreciação das medidas provisórias.
Proponho que sejam 25 Senadores e 25 Deputados. Alguns querem menos: 17 Senadores e 17 Deputados. Não creio que esse número seja algo tão decisivo. Considero que quanto maior for o número de deputados e senadores, maior será a representatividade, nessa comissão, dos pequenos partidos, dos menores partidos ou dos partidos com menor representação. Uma comissão muito pequena estreita a participação e não permite que os partidos com representação mais limitada possam ter o seu percentual vivo, consistente de presença. Eu preferiria 25, mas há quem propugne um pouco menos. Essa é uma questão a ser, do meu ponto de vista, bastante considerada e discutida.
Essa comissão, integrada por um determinado número de senadores e igual número de deputados, teria a incumbência, como tem a Comissão de Orçamento de apreciar só a Lei Orçamentária, de só apreciar medidas provisórias. Portanto, todas as medidas provisórias teriam um fórum permanente, onde a comissão se reuniria, certamente, toda semana.
Vejo o meu Líder, Senador Jader Barbalho, protestar contra as comissões mistas, o que me impressiona muito. S. Exª protesta com razão, porque nomeia os representantes das comissões mistas. Eu mesmo sou relator, creio, de quase uma dezena de medidas provisórias. Nas não temos fórum, não temos lugar, não temos um hábitat, não temos uma situação para apresentar nossas propostas e debatê-las. Por quê? Porque essas comissões mistas, como são nomeadas a centenas, já que há centenas de reedições, perderam a sua validade, o seu conteúdo e até a sua motivação e não se reúnem.
O Líder Jader Barbalho tomou uma decisão pessoal, como Líder, inclusive apoiado pela nossa Bancada, de não mais indicar membros de Comissões Mistas para apreciação de medidas provisórias, embora a Mesa - cumprindo o Regimento - esteja dando cobertura, ao designar os membros do meu Partido, o PMDB.
As Comissões Mistas falharam, esvaziaram-se, não têm funcionalidade, não têm eficácia, não têm conseqüência, estão sem resolutividade.
Quero trazer este debate: por que não criarmos essa comissão? Mista, sim; especial, sim, por ser esta semelhante à Comissão de Orçamento; embora com seu caráter de comissão não permanente, tem regularidade, porque será obrigada a ser instituída praticamente todos os anos. Só não será instalada no ano em que não houver mais medidas provisórias sendo editadas por qualquer governo, presente ou futuro. Mas como eu sei - e todos sabemos - que, na prática, medidas provisórias ainda virão em grande número, a existência de uma Comissão dessas assegura participação dos parlamentares e os obriga a se debruçarem sobre a questão, pois terão um local próprio, um fórum adequado para apresentar emendas e debatê-las. Terá um Relator designado e, a cada semana, ali será o ambiente de debate e discussão dessas medidas.
Há quem diga - é uma tese que já ouvi e devo registrar - que esta é uma Comissão muito perigosa, porque terá muito poder, que o seu Presidente será um homem muito poderoso no Congresso Nacional. Mas também são poderosos os Presidentes da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e da Comissão de Economia do Senado Federal. Isso faz parte do jogo da estrutura de poder. Há quem diga que este poder demasiado dado a uma comissão é pouco recomendável.
Não sei, Sr. Presidente, se esta é uma questão tão relevante. Não sei se isso é um fator impediente para se pensar, detida e refletidamente, a respeito da criação desta Comissão Especial para apreciação das medidas provisórias, uma comissão regular, embora não permanente. Ou seja: a cada ano, ela será instituída e instalada, tal como é instituída e instalada, com designação de novos membros, a cada ano, a Comissão de Orçamento.
O Sr. José Eduardo Dutra - Senador José Fogaça, permite-me V. Exª um aparte?
O SR. JOSÉ FOGAÇA - Com muita honra, concedo o aparte ao Senador José Eduardo Dutra.
O Sr. José Eduardo Dutra - Senador José Fogaça, V. Exª está fazendo um pronunciamento que considero bastante importante e que se relaciona, inclusive, com o pronunciamento que fiz ontem. Por isso, pretendo contribuir também para este debate. V. Exª fez um histórico da inclusão das medidas provisórias na nossa Constituição, o que é absolutamente correto. V. Exª tem participado ativamente da elaboração dessa nossa Constituição. A meu ver, existem, no entanto, algumas questões que merecem um aprofundamento maior. A primeira coisa que deve balizar esse debate que se desenvolve no Senado é que, do jeito que está, não pode continuar. Esse é o primeiro consenso que deve haver nesta Casa. Não tenho a ilusão de que seja possível aprovar uma emenda constitucional, nesta Casa ou na Câmara dos Deputados, sem haver um mínimo de concordância do Poder Executivo com relação à matéria. Embora isso não devesse acontecer, a realidade é que a vontade do Executivo se impõe. Aprovar uma emenda constitucional que exige 3/5 dos votos nas duas casas e votação em dois turnos, enfrentando a oposição do Executivo, é sonho. Gostaria ainda de relativizar a culpa do Congresso Nacional. É lógico que, enquanto instituição, o Congresso deve assumir a sua culpa, em primeiro lugar, porque o Congresso não vota as propostas de modificação do atual quadro e, segundo, que o Congresso não vota as próprias medidas provisórias. Mas o Congresso não vota a medida provisória em função de uma ação do Executivo aqui no Congresso. Mantida a atual prática, é mais interessante para o Executivo não votar as medidas provisórias, porque com algumas delas pode até correr o risco de perder. Então, é mais cômodo utilizar a sua maioria para não votar. O caso mais concreto é o da medida provisória, se não me engano, a mais antiga, aquela que modifica a Lei nº 8.031, do Programa de Desestatização. Essa medida provisória está relacionada à questão da privatização e da remodelação do setor elétrico brasileiro. Se ela for votada e, por algum mau humor do Congresso Nacional em relação ao Executivo, vier a ser rejeitada, claramente estará comprometido um programa que, independentemente do mérito, é o programa do Executivo. Então, ele prefere não votar, assim como outras, salário mínimo, por exemplo. Então, eu queria relativizar. Embora formalmente a responsabilidade seja da instituição Congresso Nacional, essa omissão se dá em função da ação das Lideranças do Governo nesta Casa. Em segundo lugar, em relação à operacionalidade, concordo que se tem que encontrar um meio de dar agilidade ao Congresso quanto à questão da medida provisória. Penso que a proposta de V. Exª, de uma Comissão Mista, pode contribuir mas, a meu ver, também não resolve. A grande maioria das Comissões não se reuniu e não emitiu parecer, mas existem algumas que se reuniram, emitiram parecer, projeto de resolução, e também essas não foram votadas. Então, sugiro que - não tenho uma proposta pronta e acabada - façamos uma revisão nessa história de sessão conjunta do Congresso Nacional, porque o Congresso não tem deixado de votar somente medidas provisórias. Esse instituto da sessão conjunta do Congresso Nacional está-se mostrando inoperante. Dei o exemplo ontem de 66 vetos, que são apreciados em sessão conjunta do Congresso Nacional, que o Congresso não votou; temos vetos de 1993. O Congresso Nacional, salvo engano, neste ano não fez nenhuma sessão com quorum, não se reuniu para apreciar nenhum veto; deve ter votado umas três ou quatro medidas provisórias em que havia acordo; houve uma sessão para votar a LDO, com votação simbólica e houve uma sessão para votar o Orçamento do ano passado, também com votação simbólica, porque concretamente não existe nenhum mecanismo para cobrar a presença dos parlamentares nas sessões conjuntas do Congresso Nacional. A Constituição estabelece - e a partir daí, inclusive, possibilitou-se estabelecer o instituto do desconto de salário dos parlamentares - a obrigatoriedade de o Deputado comparecer a um percentual de sessões da Câmara; estabelece uma obrigatoriedade de o Senador comparecer a um percentual de sessões do Senado, sob o risco, inclusive, de cassação de mandato; mas a Constituição não prevê essa obrigatoriedade nas sessões conjuntas do Congresso Nacional. Não sei se não seria o caso de caminharmos no sentido da extinção desse instituto que, na prática, está-se tornando inoperante, e se estabelecer, tanto para vetos como para medidas provisórias ou para o Orçamento, a apreciação com prazos de maneira separada na Câmara e no Senado. Penso que isso contribuiria, dentro dessas sugestões visando à operacionalidade das ações nesta Casa, para dar agilidade. De qualquer forma, eu gostaria de congratular-me com o pronunciamento de V. Exª. Sei que V. Exª está - usando um termo popular - com um "abacaxi nas mãos", em função daquilo que disse inicialmente, pois V. Exª terá que conseguir costurar um parecer que interesse à instituição, mas que não tenha o veto do Executivo. Acredito que V. Exª tem toda capacidade para fazê-lo e desejo-lhe boa sorte, mas, sinceramente, espero que, neste ano, primeiro no Senado e depois na Câmara, haja uma conclusão palatável para todos os setores que estão envolvidos nessa discussão. Muito obrigado.
O SR. JOSÉ FOGAÇA - Muito obrigado, Senador José Eduardo Dutra. São muito judiciosas, muito ponderadas, muito corretas as observações de V. Exª. Vou até tentar acrescentar algo ao que V. Exª disse. Não creio que venhamos a resolver o problema das medidas provisórias apenas extinguindo a reunião congressual das duas Casas. De qualquer forma, parece-me que essa é uma questão que V. Exª também admite. V. Exª é de um Partido de oposição, faz uma oposição honesta, consistente, nesta Casa e também reconhece que é responsabilidade nossa, é também culpa do Congresso Nacional que o Congresso Nacional não esteja se reunindo; no caso, V. Exª acrescenta um elemento dizendo que não se tem reunido porque o Governo Federal não tem estimulado, não tem pressionado ou não tem exigido.
Ora, em primeiro lugar, vamos reconhecer que, se é do interesse do Governo, ele não tem qualquer razão para ficar estimulando ou motivando os Parlamentares a se posicionarem contra ele, Governo.
O Sr. José Eduardo Dutra - Permita-me somente precisar algo. Na verdade, o que coloquei é que o Governo tem estimulado o Congresso a não se reunir. Não é uma ação do Poder Executivo no sentido do funcionamento do Congresso Nacional. Estou registrando que o Poder Executivo tem feito ação em sentido contrário. E é lógico que a responsabilidade não é daquele Poder enquanto instituição. A responsabilidade é das Lideranças do Governo que são membros do Congresso Nacional.
O SR. JOSÉ FOGAÇA - Eu até entendo, mas preferi traduzir da outra forma, dizendo que o Governo não estimula e não que o Governo intervém contra, pois se aceitarmos a tese de que ele intervém contra qualquer coisa e interfere nessas decisões, estamos também quebrando o princípio da harmonia da interdependência dos Poderes. Então, fico com a tese de que o Governo não tem ajudado na aprovação de medidas provisórias. Não tem ajudado, é verdade, mas não podemos depender de ajuda do Governo para tomar iniciativas congressuais e legiferantes. Temos que ser produtores de legislação, por nossa iniciativa e por nossa operatividade, que acredito ser o que está faltando.
Tenho a impressão de que não haverá, Senador José Eduardo Dutra, de parte dos demais Senadores, tanta inclinação, como a de V. Exª, para remeter medidas provisórias para aquele processo tradicional, normal, convencional e constitucional de iniciativas do Poder Executivo que começam na Câmara e, depois, vêm para esta Casa. V. Exª vai ouvir, de mais de dez Srs. Senadores aqui, o mesmo discurso que se tem repetido insistentemente: que a Câmara demora, que a Câmara atrasa, que a Câmara tergiversa, manipula e, depois, entrega o projeto para o Senado, na undécima hora, para que nós, em 48 horas, tenhamos que aprová-lo, sem refletir, sem debater, pressionados até pela opinião pública, ou pela imprensa, ou pelos setores interessados.
Então, creio que também haverá resistência a esta tese de fazer com que a medida provisória se transforme num projeto de lei, mesmo que em regime de urgência, entre na pauta da Câmara, seja apreciada e venha para o Senado. Isso implicaria uma perda de poder do Senado, porque o Senado hoje é parte igual na decisão das medidas provisórias. É parte igual; não é parte revisora, portanto, mexe também numa questão de estrutura de poder do Senado dentro do Congresso. Creio que esse debate é da maior importância, a contribuição de V. Exª é excepcionalmente positiva. E creio que vamos discutir mais.
Recebo sinais do Sr. Presidente de que devo concluir. De qualquer maneira, encerro agradecendo ao Sr. Presidente pela enorme tolerância que nos deu com a elasticidade de tempo para que pudéssemos debater o assunto.
Apenas registro finalmente, Sr. Presidente e Srs. Senadores, que eu, de minha parte, tenho a mais decidida intenção de apresentar esse parecer no devido tempo, ou seja, em breve, muito antes evidentemente do encerramento desta Sessão Legislativa. Apenas espero que as partes interessadas, tanto nós Congressistas como o Poder Executivo e quiçá o Poder Judiciário, tenham também semelhante boa vontade e intenção de chegar a bom termo.
Obrigado, Sr. Presidente.