Discurso no Senado Federal

PERSPECTIVAS DA AGROINDUSTRIA DO CAJU NA REGIÃO NORDESTE, DESTACANDO SEU POTENCIAL DE CRESCIMENTO ECONOMICO.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA.:
  • PERSPECTIVAS DA AGROINDUSTRIA DO CAJU NA REGIÃO NORDESTE, DESTACANDO SEU POTENCIAL DE CRESCIMENTO ECONOMICO.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/1996 - Página 14883
Assunto
Outros > AGRICULTURA.
Indexação
  • NECESSIDADE, AUMENTO, PRODUTIVIDADE, AGROINDUSTRIA, CASTANHA DE CAJU, REGIÃO NORDESTE, IMPORTANCIA, PESQUISA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), DESENVOLVIMENTO, ESPECIE.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, MINISTERIO DA AGRICULTURA (MAGR), SUBSTITUIÇÃO, ESPECIE, CULTIVO, CAJU, OBJETIVO, CONCORRENCIA, MERCADO INTERNACIONAL, INCENTIVO, MODERNIZAÇÃO, TECNOLOGIA.
  • DEFESA, POLITICA, IMPORTAÇÃO, MATERIA-PRIMA, CAJU, OBJETIVO, UTILIZAÇÃO, CAPACIDADE, AGROINDUSTRIA, BENEFICIAMENTO, CRIAÇÃO, EMPREGO, MELHORIA, ATUAÇÃO, BRASIL, MERCADO EXTERNO.

       O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, além do caju, com seu sabor e aroma inigualáveis, o cajueiro gera a não menos saborosa e nutritiva castanha, que é, aliás, seu verdadeiro fruto e que responde pelos resultados econômicos mais substanciais da agroindústria do caju.

       Estimulada por uma política de incentivos fiscais desde os anos 60, a agroindústria do caju expandiu-se grandemente no Nordeste brasileiro, tanto em termos de área cultivada, que atingiu cerca de 700 mil hectares em 1994, como em quantidade e capacidade de beneficiamento das unidades industriais. O Ceará, historicamente, lidera o processo, sendo responsável por mais de 40% da produção nacional da castanha de caju - concentrada toda no Nordeste - e mantendo quase 90% da capacidade de beneficiamento instalada. Destacam-se também na produção de castanha e, em menor grau, na sua industrialização, os Estados do Piauí e Rio Grande do Norte.

       A peculiaridade da indústria cajueira é que ela se desenvolve desde o início voltada essencialmente para o mercado consumidor externo. A demanda de países de alta renda per capita pela amêndoa da castanha de caju tem sido estável e até mesmo ascendente nos últimos anos. Por essa razão, além de gerar empregos no campo e na indústria, a exportação da amêndoa da castanha constitui importante fonte de receita cambial, especialmente para o Ceará.

       Apesar da considerável importância de que se reveste essa atividade agroindustrial, constata-se que o seu potencial de crescimento econômico permanece pouco explorado. O aumento da produção de castanha vem ocorrendo em proporções sempre inferiores ao aumento da área cultivada, o que indica um decréscimo de produtividade. Podemos avaliar o quanto pode ser melhorada a produtividade dos nossos cajuais se a compararmos à dos da Índia, maior produtor mundial da amêndoa da castanha de caju. No período de 1988 a 1992, a média da produtividade indiana foi 570 quilogramas por hectare, chegando a cerca de 800 quilogramas por hectare em Kerala, principal Estado produtor. A produtividade do Ceará para o mesmo período ficou em 212 quilogramas por hectare, pouco mais de um terço da média indiana e de um quarto da de Kerala.

       Veja bem, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que a Embrapa desenvolveu um tipo de cajueiro não precoce com alta produtividade. E é, em grande parte, baseada nas experiências desenvolvidas pela Embrapa e nessa espécie que desenvolveu que vários países estão se tornando produtores de castanha de caju com alta produtividade, tais como o Vietnã, o México, a Venezuela. Outros países estão começando a desenvolver essa espécie, o que significa uma ameaça para o Brasil no mercado internacional, porque a nossa produtividade, como já mostrei aqui, anda bastante baixa. Ora, erradicar esse cajueiral, para plantarmos essa nova espécie, demanda bastantes recursos que, evidentemente, os produtores rurais não possuem.

       Então, faço um apelo para que a União, o Ministério da Agricultura, procure apoiar a substituição desses cajueirais, a fim de elevar a nossa produtividade e assegurar a nossa competição no mercado internacional.

       Entre as causas da queda da produtividade cearense e nordestina temos a elevada idade dos cajueiros, boa parte plantada há mais de 20 anos. Falta, além da renovação permanente e planejada dos cajuais, uma política sistemática de apoio à cajucultura na região, introduzindo inovações tecnológicas, melhores técnicas de plantio e cultivo e a produção de melhores espécies.

       Outro aspecto de extrema importância, no que toca à indústria do caju no Brasil, diz respeito a sua capacidade de beneficiamento. Tendo crescido intensamente nas décadas de 70 e 80, a capacidade instalada das indústrias ultrapassou consideravelmente a disponibilidade da matéria-prima. O resultado é a subutilização das indústrias, situando-se em torno da metade da sua capacidade instalada. Se levarmos em conta que essas indústrias são altamente absorvedoras de mão-de-obra, em uma região onde as oportunidades de trabalho são poucas, são escassas, vamos verificar que há um interesse muito grande em fazer com que essas indústrias possam funcionar e, conseqüentemente, empregar grande quantidade de mão-de-obra, inclusive a feminina.

       O grau elevado de ociosidade do potencial industrial e a sua constância através dos anos indicam que deve ser adotada um política de expansão e melhoria da cajucultura, aumentando a oferta da matéria-prima. Entretanto, como tais ações trarão resultados apenas a médio prazo, a alternativa a ser considerada de pronto é a importação de castanha de caju in natura para beneficiamento em nossas indústrias.

       Talvez cause estranheza essa idéia, levando-se em conta que o cajueiro é planta nativa das terras brasileiras, elemento integrante das nossas paisagens e do nosso imaginário cultural. Aprofundando, entretanto, a análise das condições do comércio internacional, veremos que a importação da castanha de caju se impõe consistentemente como uma sólida alternativa, não só imediata, mas duradoura para a agroindústria do Nordeste do Brasil.

       Tendo sido levado por missionários portugueses ainda no Século XVI para a África e para a Ásia, o cajueiro se adaptou muito bem às condições climáticas ali existentes. O panorama atual mostra nítido predomínio da cajucultura indiana, tanto em termos de área cultivada como de produção. Apesar disso, a Índia é tradicionalmente um país importador da castanha de caju in natura - na verdade, praticamente o único país importador desse produto. Estabelecendo uma política consistente e sistemática de compra no mercado externo, distribuídas por fontes diversificadas na Ásia e na África, a Índia dita os preços da matéria-prima, além de influenciar fortemente os preços da amêndoa da castanha de caju no mercado internacional, como o maior país exportador que é.

       A ociosidade instalada de beneficiamento no Brasil contrasta com a realidade indiana, onde há uma estratégia global de apoio à agroindústria do caju. Como aponta o sólido estudo dos economistas e professores da Universidade Federal do Ceará, Manuel de Almeida e Francisco Soares, publicado recentemente na Revista Econômica do Nordeste, a capacidade subutilizada, implicando maiores custos de produção e erguendo barreiras à modernização e à melhoria da produtividade industrial, pode resultar não apenas na estagnação, mas em uma séria crise no setor.

       A baixa oferta de matéria-prima nacional e sua irregularidade relacionada aos períodos mais agudos de seca já vem causando uma série de prejuízos aos Estados nordestinos, como o fechamento de fábricas, desemprego, redução de renda e de arrecadação fiscal. Verificamos ainda o surgimento de um ambiente em que há pouco incentivo e motivação para a atividade empresarial, em que minguam os investimentos e passa a predominar a conformação com a situação adversa, vislumbrando-se, por tudo isso, a possibilidade de desmantelamento do parque industrial.

       No entanto, a agroindústria do caju continua a apresentar um elevado potencial de crescimento; e o Brasil permanece tendo amplas possibilidades de assumir um papel de maior destaque no cenário do comércio da amêndoa da castanha de caju. Para tanto, a medida de efeito imediato é o estabelecimento de uma postura mais atuante no mercado internacional, passando nossas indústrias de beneficiamento a importar a matéria-prima de modo regular e sistemático, com o necessário apoio creditício e operacional por parte do Governo Federal e dos Estados.

       Desse modo, haveria uma alteração em todo o quadro presente do comércio internacional da castanha e da amêndoa da castanha de caju. Os países africanos e asiáticos que produzem a castanha passariam a ter uma alternativa de mercado, não mais permanecendo totalmente dependentes das compras indianas. A conseqüência disso seria a elevação do preço internacional da castanha de caju in natura, fato que só aparentemente poderia prejudicar nossas indústrias.

       A verdade é que as características estruturais das indústrias beneficiadoras da Índia e do Brasil são bem distintas, havendo um grau consideravelmente maior de automatização do processo de beneficiamento no parque industrial brasileiro. Sendo bem menor o custo de produção da amêndoa da castanha na Índia, em razão do baixo investimento em equipamentos e da menor remuneração da mão-de-obra, a maior parte desse custo recai sobre a matéria-prima, correspondendo a 77% do preço final indiano. Como no Brasil o preço do produto final para consumo in natura corresponde a 55% do preço do produto final para consumo, conclui-se que o encarecimento da matéria-prima iria afetar de forma bem mais acentuada a produção de nosso concorrente, que detém a maior fatia do mercado. Além disso, utilizando-se de sua capacidade instalada ociosa, as indústrias brasileiras passariam a contar com os benefícios da economia de escala, na medida em que uma série de custos permaneceriam constantes.

       É bom frisarmos que a importação da castanha de caju pela indústria de beneficiamento nordestina, da qual já houve uma experiência bem-sucedida, mas limitada em 1994, terá sempre um caráter complementar em relação à produção interna. As condições para se adquirir a matéria-prima nos Estados nordestinos são e continuarão sendo bem mais favoráveis do que nos países africanos, parceiros preferenciais para o comércio internacional. Por outro lado, a valorização da castanha de caju in natura, ocasionada pela entrada do Brasil como novo país importador, aumentaria a retribuição do produtor primário nacional, estimulando tanto o aumento da área cultivada quanto a melhoria da produtividade.

       Além da produção da amêndoa de castanha, a agroindústria do caju oferece opções de diversificação que podem se tornar bastante relevantes do ponto de vista econômico, na medida da exigência do mercado. É o caso do líquido da castanha de caju, produto que teve ampliado o seu leque de utilizações, podendo recuperar o tradicional lugar de gerador de receita para o setor. Sucos, doces e refrigerantes são outros produtos, cuja demanda pelo mercado interno vem crescendo sensivelmente.

       Por essas razões, Srªs e Srs. Senadores, entendemos que são excelentes as perspectivas para a agroindústria do caju no Brasil, desde que conjuguemos à capacidade de iniciativa no setor o necessário apoio institucional. Esse apoio deve se direcionar, por um lado, para a busca da produtividade no cultivo, através de assistência técnica e da extensão rural. Por outro lado, deve-se buscar a formulação de uma política sistemática de importações, compatibilizada com a produção interna e que estabeleça laços sólidos e regulares de parceria internacional. Em ambas as frentes faz-se necessária a abertura de linhas de crédito, voltadas para o incremento da produção agrícola e industrial.

       Não é por ser essa atividade essencialmente nordestina, e predominantemente cearense, portanto de efeito muito localizado, que deva o Governo Federal e o Ministério da Agricultura ignorar o seu interesse para a população do Nordeste e, particularmente, do Ceará, em grande parte dependente desta atividade agroindustrial.

       Sr. Presidente, com certeza, nosso País muito terá a ganhar com a expansão das atividades econômicas em torno do caju e da castanha, produto genuinamente brasileiro, cujo cultivo e consumo se difundiram pelo mundo. Ganhará com o aumento de empregos, sobretudo no campo, de que tanto carece o povo do nosso Nordeste. Ganhará com o aumento da receita cambial. Ganhará mostrando competitividade agrícola e industrial, provando que temos condições de enfrentar, com brio, o entrelaçamento comercial cada vez maior entre os países.

       Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/1996 - Página 14883