Discurso no Senado Federal

DESVIRTUAMENTO, POR PARTE DA IMPRENSA DE SERGIPE, DAS RAZÕES DE S.EXA. PARA RETIRAR DE TRAMITAÇÃO O PROJETO DE LEI QUE CONDICIONAVA A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE A APROVAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • DESVIRTUAMENTO, POR PARTE DA IMPRENSA DE SERGIPE, DAS RAZÕES DE S.EXA. PARA RETIRAR DE TRAMITAÇÃO O PROJETO DE LEI QUE CONDICIONAVA A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE A APROVAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/1996 - Página 15433
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, INEXATIDÃO, IMPRENSA, ESTADO DE SERGIPE (SE), DIVULGAÇÃO, POSIÇÃO, ORADOR, CONDICIONAMENTO, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), AUTORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na semana passada, tivemos, no plenário desta Casa, um debate que considero bastante interessante, e que eu pensava houvesse sido esclarecedor, a respeito da minha posição de retirar o projeto que condicionava a privatização da Companhia Vale do Rio Doce a uma autorização legislativa, a uma autorização do Congresso Nacional.

Na quinta-feira, apresentei um outro projeto estabelecendo o poder do Congresso de, após 60 dias da publicação do edital de privatização, retirar a empresa do programa, e, quando eu fazia um pronunciamento a respeito do assunto, o Senador Lúcio Alcântara fez o registro de que setores da imprensa haviam noticiado o que acontecera no Senado no dia anterior de maneira distorcida. Concordei, então, com o Senador Lúcio Alcântara, mas ao mesmo tempo percebi que alguns outros órgãos de comunicação haviam efetivamente noticiado as coisas como elas realmente aconteceram.

Ora, uma coisa é a desinformação, ou a informação errada baseada na desinformação; outra coisa é a má-fé. Infelizmente, foi o que aconteceu no meu Estado. Já fiz questão algumas vezes de registrar aqui a total concentração dos meios de comunicação, no Estado de Sergipe, nas mãos de políticos: um do PSDB, um do PFL, um do irmão de um político do PSDB, e por aí afora.

A forma como setores da imprensa local deram a notícia foi absolutamente distorcida, tentando passar a imagem de que a minha ação teria prejudicado imensamente os interesses do Estado de Sergipe. Uma das manchetes de um jornal, cujo nome não vou citar para não fazer propaganda, diz: "Dutra facilita venda da Vale do Rio Doce com retirada de projeto". Como se eu não estivesse aqui, desde maio do ano passado, tentando aprovar um projeto que, pelo menos, daria ao Congresso Nacional a oportunidade de opinar, de maneira decisiva, sobre o assunto; e como se os responsáveis pelo atraso da votação do projeto não fossem exatamente setores do mesmo Partido do Governador do Estado e dos seus aliados.

Depois, um outro jornal diz, numa entrevista do Secretário de Planejamento, que a minha decisão teria lesado o Estado de Sergipe em R$90 milhões.

Em primeiro lugar, foram feitas contas erradas, porque, mesmo na proposta que se estava discutindo como apêndice do meu projeto, ou seja, que ele estaria sendo utilizado como escada para fazer a barganha de interesse dos Estados, ainda assim Sergipe não receberia R$90 milhões.

A empresa está sendo avaliada em R$10 bilhões; apenas 51% pertencem à União. Portanto, com a venda, a União arrecadará R$5 bilhões; pela proposta original, 50% seriam repassados para os Estados, ou seja, dois bilhões e meio e, pela mesma proposta original, Sergipe ficaria com 2%, isto é, com R$45 milhões.

Essa quantia, para o Estado de Sergipe, significa cinco meses do que está sendo pago de juros da dívida do Estado.

Tive que cancelar um compromisso de minha agenda de campanha - pois, como membro da Executiva Nacional, iria para Minas Gerais na semana passada - para ir a Sergipe tentar ocupar pelo menos alguns meios de comunicação, que não nos fecham as portas, a fim de esclarecer o assunto e gravar um depoimento no programa eleitoral do nosso Partido.

Fiz questão de dizer que, para o Estado de Sergipe, mais importante do que o Governador recolher os restos do que for arrecadado com a Vale do Rio Doce deveria ser a manutenção, mesmo depois de privatizada, da atividade que a referida companhia desenvolve hoje no Estado de Sergipe, explorando uma mina de potássio, a única do Hemisfério Sul. Anteriormente, ela era explorada por uma antiga subsidiária da Petrobrás, a Petrobrás Mineração, empresa extinta no Governo do Sr. Fernando Collor de Mello, no início de 1990. A partir daí, por cerca de dois anos, a sociedade sergipana, os trabalhadores e diversos setores da política de Sergipe lutaram para que aquele empreendimento não fosse fechado, pois significaria a extinção de cerca de dois mil postos de trabalho, entre empregos diretos e indiretos; significaria prejuízos para o Estado, e o Brasil estaria fechando a única mina de potássio do Hemisfério Sul, cujo material é utilizado na indústria de fertilizantes, que importa todo o potássio necessário, com exceção do que é retirado em Sergipe.

Eu já disse, tanto para a imprensa como no plenário do Senado, que, com a privatização da Vale do Rio Doce, esse projeto estaria ameaçado, já que não é atrativo para a iniciativa privada; não é um empreendimento que tem um retorno muito elevado do ponto de vista financeiro. Inclusive, segundo análises feitas por pessoas do mercado, a Vale é uma empresa enxuta, eficiente, etc., mas, quando viesse a ser privatizada, fatalmente deveria afastar-se de atividades com pouca sinergia e pouca atração - e citam o setor de fertilizantes, como é o caso de Sergipe.

Desse modo, o Governador do Estado e seu Secretário de Planejamento deveriam estar mais preocupados em pelo menos garantir, na hipótese de privatização, a continuidade daquele empreendimento. Não deveriam se utilizar de um artifício para tentar pegar algumas migalhas. E - o que é pior! -, a partir da minha decisão de retirar o projeto, por entender que ele estava servindo de escada a interesses que não eram os originais, passar a dizer que a minha ação teria repercussões negativas para o Estado.

Na sexta-feira, à noite, vi o porquê dessa campanha contra o PT e contra mim. Houve a divulgação de uma pesquisa eleitoral do Ibope, confirmada na segunda-feira por outro órgão de comunicação do meu Estado. A pesquisa mostrou que o candidato a Prefeito de Aracaju, o companheiro Ismael Silva, havia passado do terceiro para o primeiro lugar, deixando em segundo o candidato do PFL.

Isso é a demonstração do crescimento da candidatura do nosso Partido, que, fatalmente, nos levará ao segundo turno. Os próprios números mostram que, caso consigamos atingi-lo, com qualquer que seja o adversário que tivermos de disputar, ganharemos as eleições, porque temos um candidato com o menor índice de rejeição.

Dessa maneira, na sexta-feira, entendi o motivo da campanha que foi feita contra o PT, devido à retirada do meu projeto. Tentaram passar a imagem de que o PT teria prejudicado o Estado de Sergipe a partir dessa ação. Reafirmamos que, caso haja interesse da Bancada do Governador do meu Estado em votar o projeto, que pelo menos dá poderes ao Congresso para retirar não só a Companhia Vale do Rio Doce como outras empresas da linha de privatização, ele poderá ser votado ainda este ano.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Pois não. Ouço, com prazer, o aparte de V. Exª, nobre Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Nobre Senador José Eduardo Dutra, reafirmo o respeito que V. Exª teve de toda a Bancada do PT e de todo o Senado quando da sua decisão de retirar um projeto pelo qual V. Exª tanto batalhou e tem batalhado, que dá poderes ao Congresso Nacional de decidir sobre a privatização da Vale do Rio Doce. É da maior relevância que o Congresso Nacional tenha essa condição. V. Exª explicou muito bem. Disse, inclusive, que quem fosse a favor deveria apoiar o projeto; quem fosse contra teria também a oportunidade de se manifestar nesse sentido. Mas como V. Exª - e isto ficou muito claro - percebeu que ele estava sendo utilizado para motivos outros, e como o Senado se recusava a votá-lo, estava sempre adiando, V. Exª procedeu corretamente: "Diante de tais circunstâncias, requeiro a retirada do projeto". Se os jornais do Estado de Sergipe ou se a imprensa, o rádio e a televisão procuraram dar uma ênfase que não foi exatamente o seu propósito, então é preciso que os seus eleitores, os habitantes de Sergipe, bem como os das outras Unidades da Federação, possam compreender as suas razões. Também a própria Rede Globo, no Jornal Nacional, no dia da decisão de V. Exª, deu ênfase à questão, dizendo que a privatização da Vale agora estaria mais facilitada pelo fato de o Senador José Eduardo Dutra ter retirado o projeto que dava ao Congresso Nacional a atribuição de decidir sobre a privatização da companhia. Penso que a Rede Globo estaria mais correta se tivesse dado uma oportunidade a V. Exª, como fez tantas vezes, para se manifestar, na condição de autor da proposição, inclusive naquele mesmo dia. Mas ainda é tempo e acredito que, do ponto de vista da imparcialidade, da ética e da preocupação jornalística, seria normal. Sugiro à Rede Globo que ouça V. Exª. Penso que a maior parte da opinião pública compreendeu muito bem o seu passo de descortino, de coragem, que ganhou o respeito desta Casa. Mas, nesta Casa V. Exª explica, oferece informação importante sobre o porquê de terem-no criticado sobretudo em Aracaju. É por uma boa razão. Afinal de contas, o candidato do Partido dos Trabalhadores, Ismael - nós, que o conhecemos, já prevíamos -, está-se constituindo em excelente surpresa, em grande revelação, porque está à frente nas pesquisas de opinião. Tenho certeza de que Ismael poderá fazer de Aracaju mais uma cidade onde se introduzam instrumentos exemplares, como o Orçamento Participativo e outras proposições defendidas pelo Partido dos Trabalhadores.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Muito obrigado, Senador Suplicy. Incorporo o aparte de V. Exª em meu pronunciamento. Registro que, a Rede Globo, no dia seguinte, pelo menos anunciou que eu tinha apresentado um outro projeto. E o jornal do qual li a manchete nem isso fez. Trata-se de uma demonstração de que o objetivo era claro: tentar fazer uma "queimação" na sexta-feira, quando saiu o resultado da pesquisa.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/1996 - Página 15433