Discurso no Senado Federal

PRIMEIRO PREMIO DE IMUNOVIROLOGIA BRISTOL-MYERS SQUIBB, CONCEDIDO AO INFECTOLOGISTA CEARENSE ALDO MOREIRA LIMA, DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARA, POR SUA CONTRIBUIÇÃO AO COMBATE DA AIDS. REALIZAÇÃO, EM BRASILIA, DA CONFERENCIA NACIONAL DA SAUDE. OBJETIVOS E ESTRUTURA DA NOB-96 - NORMA OPERACIONAL BASICA-96, INSTRUMENTO ADMINISTRATIVO QUE REGE O FUNCIONAMENTO DO SISTEMA UNICO DE SAUDE.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • PRIMEIRO PREMIO DE IMUNOVIROLOGIA BRISTOL-MYERS SQUIBB, CONCEDIDO AO INFECTOLOGISTA CEARENSE ALDO MOREIRA LIMA, DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARA, POR SUA CONTRIBUIÇÃO AO COMBATE DA AIDS. REALIZAÇÃO, EM BRASILIA, DA CONFERENCIA NACIONAL DA SAUDE. OBJETIVOS E ESTRUTURA DA NOB-96 - NORMA OPERACIONAL BASICA-96, INSTRUMENTO ADMINISTRATIVO QUE REGE O FUNCIONAMENTO DO SISTEMA UNICO DE SAUDE.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/1996 - Página 15427
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, INCLUSÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, O POVO, ESTADO DO CEARA (CE), CONCESSÃO, PREMIO, PESQUISADOR, UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARA (UFC), COMBATE, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS).
  • REALIZAÇÃO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), CONFERENCIA NACIONAL, SAUDE, ORGANIZAÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), PARTICIPAÇÃO, MUNICIPIOS, ESTADOS, PROPOSTA, SISTEMA NACIONAL DE SAUDE.
  • PUBLICAÇÃO, Diário Oficial da União (DOU), NORMAS, MINISTERIO DA SAUDE (MS), FUNCIONAMENTO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), GESTÃO, RECURSOS FINANCEIROS, DEFINIÇÃO, COMPETENCIA, RESPONSABILIDADE, ESTADOS, DISTRITO FEDERAL (DF), GOVERNO FEDERAL, MUNICIPIOS, SERVIÇO DE SAUDE, EPIDEMIOLOGIA, CONTROLE, DOENÇA, VIGILANCIA SANITARIA, ASSISTENCIA MEDICO-HOSPITALAR, OBJETIVO, ELIMINAÇÃO, FRAUDE, DESVIO, VERBA.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou encaminhar à Mesa, pedindo que seja transcrito nos Anais, um artigo publicado no jornal O Povo, do Ceará, de sexta-feira, 30 de agosto, que trata do feito de um pesquisador cearense, Aldo Moreira Lima, da Universidade Federal do Ceará, que fez jus a um prêmio pela descoberta do mecanismo que impede a mucosa intestinal do portador do vírus HIV de reter proteínas e outros nutrientes. Esse prêmio foi concedido por uma indústria farmacêutica e é o primeiro prêmio de imunovirologia. O trabalho do pesquisador terá grande importância para esclarecer mecanismos patológicos relacionados ao vírus da AIDS, particularmente em relação ao intestino delgado.

Aproveito, Sr. Presidente, para registrar a ocorrência da Conferência Nacional de Saúde, que está tendo lugar aqui em Brasília, tendo sido aberta solenemente no domingo à noite, pelo Ministro Adib Jatene, representante do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso.

Esse é um grande evento da saúde nacional, pois nele estão representados os usuários, as entidades profissionais da área da saúde, as diferentes instâncias de Governo - municípios, Estados e União, e é o coroamento de um processo que começou com a realização das Conferências Municipais de Saúde, depois regionais, quer dizer, abrangendo grupos de municípios, Conferências Estaduais e, finalmente, a grande Conferência Nacional de Saúde.

O evento fortalece um aspecto que não podemos deixar de reconhecer como o grande mérito da organização do Sistema Único de Saúde no Brasil, que é a natureza participativa do sistema, que tem a sua expressão maior nessas grandes conferências que são realizadas periodicamente.

Fala-se muito em controle social, em acompanhamento do desempenho do Estado, do controle sobre os gastos públicos, sobre os desperdícios, sobre as fraudes. O Sistema Único de Saúde-SUS, muitas vezes pouco entendido, representa a tentativa mais avançada que temos no Brasil de, mediante a instalação dos Conselhos Municipais e Estaduais e do Conselho Nacional de Saúde, permitir que setores da população interessados direta ou indiretamente no assunto possam dele participar e ali manifestar suas opiniões, aprovar proposta do Poder Executivo, dos gestores da saúde, modificar essas propostas e até mesmo rejeitá-las, naturalmente dentro das suas atribuições e competências.

Coincidindo com a Conferência Nacional de Saúde, o Ministro da Saúde, Dr. Adib Jatene, editou, e o Diário Oficial de 02 de setembro já publicou, o que se chama Norma Operacional Básica-96, conhecida pela sigla NOB. Trata-se de um instrumento administrativo que rege o funcionamento do Sistema Único de Saúde, abrangendo a parte de gestão, de transferência de recursos, de controle, avaliação e assim por diante.

A última NOB vigorava desde 1991, e a nova NOB-96 resultou não de um gesto imperial do Ministro, um gesto solitário do Ministro ou de sua assessoria, mas de um processo longamente negociado entre os interessados: Estados, municípios e a União, sempre aberto a sugestões e, finalmente, aprovado pelo Conselho Nacional de Saúde, uma instituição que abriga, em seu seio, representantes das mais diversas instituições envolvidas na questão da saúde.

A Norma Operacional Básica de 1996 está estruturada em 17 capítulos, que, por sua vez, poderiam ser agrupados em cinco blocos:

      - o primeiro, com as Diretrizes Gerais, abordando a finalidade; os campos de atenção à saúde; as características do sistema municipal; as relações entre os sistemas municipais; o papel dos gestores estadual e federal; e os propósitos e bases para um novo modelo de atenção à saúde;

      - o segundo, sobre as Funções Gestoras, abordando a direção do SUS; a articulação entre os gestores; o planejamento e a programação pactuada e integrada; e o controle, avaliação e auditoria;

      - o terceiro, sobre o Custeio de Ações e Serviços de Saúde, abordando a assistência ambulatorial e hospitalar; a vigilância sanitária e as ações de epidemiologia e controle de doenças;

      - o quarto, sobre as Condições de Gestão dos Estados e municípios, detalhando as responsabilidades, requisitos e prerrogativas de cada condição de gestão;

      - o quinto, com as Disposições Gerais e Transitórias da Norma Operacional Básica de 1996.

É importante assinalar que a Norma - e aqui vou me referir a algumas características dela - corrigirá algumas distorções que foram detectadas ao longo desses anos de funcionamento do Sistema Único de Saúde, como também modificará, de alguma forma, a maneira de financiamento do Sistema, na medida em que introduz novos elementos que são fundamentais para se chegar ao cálculo de recursos a serem repassados a Estados e municípios. Então, ela tem como objetivos gerais:

      - Promover e consolidar o pleno exercício por parte do poder público municipal, da função de gestor da atenção à saúde de seus habitantes, com a respectiva redefinição das responsabilidades dos Estados, do Distrito Federal e da União.

Está na Constituição e nas leis que instituíram o Sistema Único de Saúde, que são as Leis nºs 8.080 e 8.142, o fortalecimento do município, o município como base de todo o sistema. É isso que a Norma está enfatizando num dos seus objetivos. E ainda:

      - Caracterizar a responsabilidade sanitária de cada gestor, explicitando um novo pacto federativo para a saúde.

Quer dizer, cada gestor - municipal, estadual ou federal - tem que assumir a sua responsabilidade.

      - Reorganizar o modelo assistencial, descentralizando aos municípios a responsabilidade pela gestão e execução direta da atenção básica de saúde.

Tudo que for atenção básica de saúde e que não for procedimento altamente especializado e de referência é competência do município, tem que estar a cargo do município.

      - Aumentar a participação percentual da transferência regular e automática - é assim que se fala na Constituição e na Lei que criou o SUS - dos recursos federais a Estados e municípios, reduzindo a transferência por remuneração por serviços produzidos ou "pagamento por produção".

Essa é a forma usual como os Estados e municípios recebem hoje recursos: de acordo com os serviços que prestam, quer dizer, de acordo com o atendimento que fazem às populações. Contudo, esse chamado "pagamento por produção" tem muitos inconvenientes, que estão sendo modificados e revistos por essa nova Norma Operacional Básica. A avaliação, a determinação do quantitativo de recursos financeiros que cada unidade vai receber não deverá se referir apenas a quanto ela produziu, quantas consultas ofereceu, quantas cirurgias realizou, quantos partos fez a seu cargo, mas levará em conta também outros elementos que estão relacionados diretamente com a atenção básica da saúde, para que esses repasses sejam efetuados.

      - Fortalecer a gestão do Sistema Único de Saúde, compartilhada entre os Governos municipais, estaduais e federal, através das comissões intergestores tripartites - no caso, seriam gestores da União, gestores dos Estados e gestores dos municípios - e bipartites, que funcionam no âmbito do Estado, onde estão o gestor estadual e os gestores municipais, que se fazem representar. Essas comissões irão desenvolver um permanente processo de negociação e pactuação entre eles.

      - Estabelecer vínculo entre o cidadão e o Sistema Único de Saúde, conferindo visibilidade quanto à autoridade responsável pela sua saúde, promovendo o cadastramento, a descrição da clientela e criando o cartão SUS municipal.

Isso é muito importante, porque vai contribuir para que a sociedade fique esclarecida sobre os níveis de governo, suas competências e responsabilidades. O cidadão vai saber justamente a quem se queixar, quais são os responsáveis pelo atendimento a sua saúde, onde e como vai ser atendido.

Para isso é fundamental que seja criado o cartão SUS municipal. O cidadão deverá ter uma unidade básica no seu bairro, na região onde mora, para a qual deverá se dirigir ou o hospital que deverá procurar, etc.

A criação desse cartão é essencial, porque hoje há uma imprecisão muito grande nesses níveis de competência e atribuições. Muitas vezes, são feitas pesquisas de opinião pública sobre a questão da saúde - sabemos que o setor tem muitos problemas, principalmente na parte de assistência médica, ambulatorial e hospitalar - que mostram um elevado grau de insatisfação com o Governo Federal. A responsabilidade, muitas vezes, não é do Governo Federal. Mas, nesse processo de indefinição, a população acaba responsabilizando o Governo pelas condições precárias do setor, exigindo que ele desenvolva uma série de ações que, na verdade, não são de sua competência.

Então, esse cartão SUS municipal vai estabelecer, de maneira concreta, que a responsabilidade por essa chamada atenção básica de saúde é do município.

Características da NOB-96:

      - Estabelecer a "direção única em cada nível de governo", garantindo ao gestor todos os instrumentos necessários para o exercício das funções sob sua responsabilidade;

Esse caso de Caruaru, por exemplo, é uma amostra da indefinição de nível de competência: o Município diz que não é da sua competência; o Estado diz que a competência é da União; a União diz que já havia delegado essa competência para o Estado. O fato é que havia uma clínica funcionando em péssimas condições técnicas e de suprimento de material e foi preciso que houvesse uma tragédia, onde dezenas de pessoas morreram, para que o problema fosse detectado e encarado como uma manifestação absolutamente indesejável de um sistema que estava funcionando precariamente.

      - Regulamentar as relações entre os sistemas municipais e destes com as instâncias estadual e federal;

Define justamente o que cabe a cada um fazer, executar e como eles devem se articular para oferecer um melhor atendimento, um atendimento mais barato, mais rápido e, ao mesmo tempo, dentro de um processo em que o paciente possa saber exatamente o que esperar de cada um desses níveis.

      - Fortalecer a função gestora das Secretarias Estaduais, com (re)definição de responsabilidades para a coordenação do Sistema Único de Saúde em âmbito estadual;

Acontece que muitos problemas de natureza político-partidária e de disputa de poder também têm contribuído para que o Sistema Único de Saúde ainda não tenha sido implantado integralmente. Muitas vezes, os governos estaduais, os Governadores ou os seus Secretários de Estado da Saúde não transferem essas atribuições, essas responsabilidades, essas competências, para os municípios, porque querem deter esse poder na sua mão, inclusive para realizarem barganhas de natureza política, para serem, realmente, procurados, uma vez que ainda detêm esse poder. Isso termina inviabilizando a implantação do Sistema Único de Saúde, razão por que é necessário que as secretarias estaduais de saúde compreendam a sua nova responsabilidade, que é a responsabilidade de controlar, de avaliar, de planejar, de programar. Tudo isso seria feito em comum acordo, num processo de negociação, com os municípios.

      - Redefinir as funções do Ministério da Saúde, como gestor nacional do Sistema Único de Saúde, com maior integração entre os seus órgãos e instituições e descentralização das responsabilidades definidas nesta NOB, como de Estados e municípios;

O Ministério ainda retém atribuições e competências que não são mais dele, não há razão para serem dele. Deve repassar isso para os Estados e para os municípios.

      - Aprimorar e adequar a normatização da gestão da assistência à saúde, coordenada pela SAS/MS;

Transferir a curto prazo, para a grande maioria dos municípios brasileiros, a responsabilidade da gestão plena da atenção básica ambulatorial.

Não significa jogar nos ombros do município essa responsabilidade sem lhe dar os instrumentos técnicos, financeiros e administrativos. Descentralizar os respectivos instrumentos de gestão para o exercício dessa responsabilidade.

      - Transferir aos municípios habilitados, como gestores da atenção básica, os recursos financeiros relativos a esta responsabilidade;

      - Reorganizar a gestão dos procedimentos de média complexidade ambulatorial, abrindo-se a possibilidade de transferência direta e automática aos Estados habilitados nos termos desta NOB, dos recursos correspondentes a esta responsabilidade;

      - Incorporar as ações de Epidemiologia e Controle de Doenças, coordenadas pela Fundação Nacional de Saúde;

Incorporar as ações de Vigilância Sanitária que não estavam dentro do Sistema Único de Saúde. Na verdade, o Sistema Único de Saúde estava muito mais voltado, infelizmente, para a assistência médica ambulatorial, deixando de lado, para que fossem desenvolvidas separadamente, essas atividades de Epidemiologia e Controle de Doenças e de Vigilância Sanitária, que são fundamentais. Sem elas, não teremos segurança nos processos de controle das doenças transmissíveis, nos processos de pesquisa, de levantamentos de dados, para saber qual é o perfil epidemiológico da população brasileira, de que se morre e de que se adoece neste País, para orientar a política de saúde do País. O mesmo ocorre com relação à vigilância sanitária, a vigilância de consumo de alimentos, de medicamentos e assim por diante, o que é fundamental para resguardar a saúde do nosso povo.

Tudo isso, agora, tem sido trazido de maneira definitiva para o âmbito do Sistema Único de Saúde, integrando, portanto, ações de natureza ambulatorial, de natureza médico-hospitalar (ações básicas de saúde, imunização) com ações de Epidemiologia e Controle de Doenças e de Vigilância Sanitária:

      - Promover a reorganização do modelo de atenção.

      - Aprimorar o planejamento e elaborar a Programação Pactuada (entre gestores) e Integrada (entre as instâncias do Governo),

Integrar, repito, embora se torne até monótono, como um ponto essencial dessa norma operacional básica, que é justamente essa integração de ações entre a União, os Estados e os municípios.

      - Aprimorar a organização e operação dos Sistemas de Controle, Avaliação e Auditoria, integrando as ações dos municípios com as dos Estados e a do Ministério da Saúde;

Aquela famosa reclamação de desvio de fraude. Esse controle está sendo aprimorado através de várias ações contidas nessa norma operacional.

      - Aumentar a transferência regular e automática dos recursos federais a Estados e municípios;

      - Definir as responsabilidades, prerrogativas e requisitos das Condições de Gestão criados nesta NOB.

Para concluir, pois o tempo já está se esgotando, quero dizer que a edição dessa Norma Operacional Básica, resultante desse longo processo de pactuação e negociação entre as diferentes instâncias de poder, inclusive instâncias colegiadas, nos Municípios, nos Estados e na União, significa que estamos ingressando numa nova fase do Sistema Único de Saúde. Uma fase em que a integração das ações será muito maior entre os Estados, os municípios e a União; em que abandonamos o sistema de pagamento por produção como a única forma de transferência de recursos, e colocamos, para efeito de determinação dos recursos a serem transferidos para Estados e Municípios, outros elementos, principalmente relacionados às ações básicas de saúde, que não a simples realização de procedimentos que eram remunerados de acordo com a sua natureza: a implantação de um sistema de integração das atividades de vigilância sanitária, epidemiologia e controle de doença dentro do SUS e, finalmente, o desenvolvimento e o fortalecimento de um sistema muito mais eficiente, descentralizado, mas coordenado, de avaliação, controle e auditorias, visando à eliminação dos desvios, das fraudes, tantas vezes trazidas ao debate como uma das fragilidades do Sistema Único de Saúde.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/1996 - Página 15427