Discurso no Senado Federal

QUESTÕES RELATIVAS AO SUPRIMENTO DE ENERGIA ELETRICA NA REGIÃO AMAZONICA. RELEVANTE PAPEL DESEMPENHADO PELA ELETRONORTE. PREJUIZO ESTATAL NO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO COMPLEXO ELETRICO DA AMAZONIA. APRESENTANDO A MESA REQUERIMENTO DA CONVOCAÇÃO DO MINISTRO ANTONIO KANDIR, PARA PRESTAR ESCLARECIMENTOS AO PLENARIO DO SENADO A RESPEITO DA PRIVATIZAÇÃO DE ATIVOS DA ELETRONORTE.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA. PRIVATIZAÇÃO.:
  • QUESTÕES RELATIVAS AO SUPRIMENTO DE ENERGIA ELETRICA NA REGIÃO AMAZONICA. RELEVANTE PAPEL DESEMPENHADO PELA ELETRONORTE. PREJUIZO ESTATAL NO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO COMPLEXO ELETRICO DA AMAZONIA. APRESENTANDO A MESA REQUERIMENTO DA CONVOCAÇÃO DO MINISTRO ANTONIO KANDIR, PARA PRESTAR ESCLARECIMENTOS AO PLENARIO DO SENADO A RESPEITO DA PRIVATIZAÇÃO DE ATIVOS DA ELETRONORTE.
Publicação
Publicação no DSF de 05/09/1996 - Página 15483
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA. PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, PROBLEMA, ENERGIA ELETRICA, Amazônia Legal, REFERENCIA, INFERIORIDADE, CONSUMO, DIVERSIDADE, SISTEMA ELETRICO, DIFICULDADE, ACESSO, ISOLAMENTO, DEFICIENCIA, ATENDIMENTO, CONCESSIONARIA, MOTIVO, AUSENCIA, LUCRO, ESPECIFICAÇÃO, SITUAÇÃO, ESTADO DO PARA (PA).
  • ANALISE, HISTORIA, ATUAÇÃO, CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE), REGIÃO, NECESSIDADE, CONCLUSÃO, OBRA PUBLICA, EXPANSÃO, OFERTA, ENERGIA, INTEGRAÇÃO, SISTEMA, INTERIOR, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, CRITICA, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, INFERIORIDADE, AVALIAÇÃO, PATRIMONIO, FALTA, CONHECIMENTO, SITUAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, VALOR, INVESTIMENTO, GOVERNO.
  • CRITICA, POLITICA NACIONAL, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, PRIVILEGIO, EMPRESARIO, EMPRESA MULTINACIONAL, JUSTIFICAÇÃO, INTERESSE, MEIO AMBIENTE, INDUSTRIALIZAÇÃO, REGIÃO.
  • CRITICA, LEGISLAÇÃO, GOVERNO, AUSENCIA, REPASSE, CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE), SUBSIDIOS, ENERGIA ELETRICA, EMPRESA, ALUMINIO, SILICA, PREJUIZO, INVESTIMENTO, EMPRESA ESTATAL, REGIÃO, ESPECIFICAÇÃO, SITUAÇÃO, ENERGIA TERMICA.
  • REIVINDICAÇÃO, EXTENSÃO, ENERGIA ELETRICA, USINA HIDROELETRICA, MUNICIPIO, TUCURUI (PA), ESTADO DO PARA (PA), PROXIMIDADE, CRITICA, EXCLUSÃO, USINA, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, MOTIVO, SUBSIDIOS, EMPRESA.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, CONVOCAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), ESCLARECIMENTOS, PRIVATIZAÇÃO, CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE).

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o tema que trago para reflexão desta Casa tem a dimensão de mais da metade do território nacional e afeta, diretamente, a vida de cerca de 19 milhões de brasileiros: trata-se da questão da energia elétrica na Região Amazônica, benefício que em alguns locais é escasso, em outros inexistente e noutros ainda fornecida de forma abundante e privilegiada, com preços subsidiados.

Nunca é demais lembrar, até para se ter noção exata da importância desse tema, que a denominada Amazônia Legal abrange a região compreendida pelos Estados do Acre, Rondônia, Amazonas, Mato Grosso, Roraima, Pará, Amapá, bem como parte do Estado do Tocantins e parte do Estado do Maranhão.

Por suas características peculiares, como as grandes distâncias, o isolamento decorrente da descontinuidade e concentração da ocupação, o intenso e desordenado processo migratório e a fragilidade de seus ecossistemas, esse vasto território diferencia-se do resto do País.

Do ponto de vista do suprimento de energia elétrica, a Amazônia também é singular. Apresentando 14% da população brasileira, a Região é responsável apenas por 5% do consumo de energia elétrica do País, se excluídos, evidentemente, os consumidores eletrointensivos lá instalados. O seu consumo per capita representa 34% da média nacional, refletindo o baixo padrão de vida da população que lá reside.

Diferentemente das demais regiões brasileiras, a Amazônia apresenta diversos sistemas elétricos isolados, na sua maioria de pequeno porte, com geração de energia elétrica em sua quase totalidade, a partir de derivados de petróleo, como é o caso das usinas termoelétricas ou dieselétricas. A esparsidade e a diversidade existentes na Região Amazônica dificultam ainda mais o atendimento às necessidades energéticas das populações do interior, no caso das fontes tradicionais de produção de energia.

As dificuldades de comunicação e acesso, só possíveis, na maioria das vezes, por vias fluvial e aérea, e as grandes distâncias acentuam o isolamento das localidades atendidas, exigindo esforços redobrados. Em geral, as localidades do interior não apresentam demanda suficiente para justificar, do ponto de vista econômico, os investimentos e os custos operacionais elevados. Além disso, a renda média da população não permite a obtenção, por parte das concessionárias de energia elétrica, de uma remuneração que estas considerem satisfatórias a ponto de permitir a realização de novos investimentos.

Para exemplificar o quadro de atendimento de energia elétrica na Região, menciono a situação do Estado do Pará, que represento nesta Casa, onde mais de 1 milhão e 800 mil pessoas, ou seja, cerca de 32% da nossa população, não são atendidas e, de um total de 142 Municípios existentes, 69 são atendidos precariamente por termelétricas ou não têm energia de espécie alguma. Temos em nosso Estado a maior hidrelétrica inteiramente nacional e 69 Municípios que não recebem energia dessa hidrelétrica.

Por essas particularidades, a presença do Governo na Região tornou-se fundamental para a implantação de infra-estrutura no setor da energia elétrica. Essa presença tornou-se mais efetiva a partir da criação da Eletronorte, em 1973. À estatal foi atribuída a responsabilidade pelos estudos de inventário, viabilidade, projeto, construção e operação de usinas hidrelétricas e termelétricas, além dos respectivos sistemas de transmissão associados, no sentido de garantir o suprimento de energia elétrica às concessionárias estaduais e o fornecimento a consumidores industriais na Amazônia Legal.

Assim, a Eletronorte concluiu as obras de geração e transmissão da Hidrelétrica de Coaracy Nunes, no Estado do Amapá; construiu as Hidrelétricas de Tucuruí, no Estado do Pará; Balbina, no Estado do Amazonas; e Samuel, no Estado de Rondônia, com os respectivos sistemas de transmissão, e iniciou a construção do aproveitamento múltiplo de Manso, no Estado de Mato Grosso. Construiu também o sistema de transmissão em 230 kV para o suprimento a Cuiabá e assumiu os parques geradores térmicos de Manaus, Belém, Porto Velho, Rio Branco, São Luís e Boa Vista. Assumiu, ainda, os serviços de distribuição de Manaus e Boa Vista e deu prosseguimento aos estudos hidrelétricos de inventário e viabilidade dos rios da Bacia Amazônica, tais como os rios Tocantins, Xingu, Trombetas, Madeira e Tapajós.

Em 1981, iniciou-se a operação do grande sistema de transmissão de cerca de 800 km que interligou as Regiões Norte e Nordeste, permitindo antes mesmo da viabilização da Usina de Tucuruí, no Pará, o atendimento a Belém por energia hidráulica proveniente do Nordeste do País.

Em todas essas obras e serviços foram investidos mais de 14 bilhões de reais, o que ampliou a capacidade de geração da Eletronorte de 40 MW para 5.433 MW, sendo 4.660 MW em 4 usinas hidrelétricas e 773 MW em 12 usinas termelétricas, distribuídas nas cidades de Manaus, São Luís, Porto Velho, Rio Branco, Boa Vista e Macapá.

Embora a atuação do Governo Federal tenha sido significativa, Sr. Presidente, ainda há muito por fazer. A Região se ressente de um conjunto importante de empreendimentos complementares, necessários à expansão da oferta de energia e integração dos sistemas isolados existentes. Ainda há uma grande dívida a ser resgatada com a população amazônica, e é nosso dever cobrar do Governo Federal que assuma suas responsabilidades, luta da qual queremos contar com o apoio de todos os Parlamentares. Queremos a interligação dos sistemas isolados que lá existem.

No interior, o quadro é mais grave. São 363 localidades atendidas por energia gerada pelas concessionárias estaduais. O suprimento é feito na sua quase totalidade por geração diesel-étrica, sendo os parques geradores compostos por unidades com vida útil já ultrapassada e que mesmo assim estão sujeitos aos mais severos regimes de operação. Dentre os fatores que dificultam a operação do parque térmico, estão a alta temperatura local e a impossibilidade de manutenção, não só por falta de unidades de reserva, mas também em virtude das restrições financeiras das concessionárias. A previsão para o ano de 1996 é de que sejam consumidos cerca de 280 milhões de litros de óleo diesel para a geração de energia nas localidades do interior da Amazônia, representando um custo superior a 70 milhões de dólares. Admitindo-se que essa situação persista, num horizonte de 10 anos, o consumo acumulado de óleo diesel previsto chegará próximo dos 4 bilhões de litros, com um custo estimado em 1 bilhão de dólares!

A falta de investimentos, aliada a uma tarifa que não cobre os custos de produção de energia elétrica, tem impedido que novas localidades sejam incorporadas ao atendimento, além de existirem outras em que o serviço não ultrapassa a 4 horas diárias, seja pela falta de unidades geradoras, seja por insuficiência de recursos para a aquisição de óleo diesel.

Os fatores citados, aliados às características do mercado que apresenta um elevado consumo concentrado no horário chamado de ponta, têm conduzido a freqüentes racionamentos de energia e a um custo operacional elevado e crescente, corroendo gradativamente a situação financeira das concessionárias, já bastante precária.

O deficiente suprimento de energia às localidades do interior amazônico vem se constituindo em sério entrave para o desenvolvimento sustentável da região. O modelo de desenvolvimento adotado no País, centrado na industrialização das regiões Sul e Sudeste, criou sérias disparidades regionais, contribuindo para tornar a Amazônia uma região não integrada ao restante do Brasil. Quando o Governo implementa a sua estratégia de ocupação da região Norte age beneficiando preponderantemente os interesses empresariais e multinacionais. São os interesses externos à Região que condicionam o que deve ser feito e como deve ser feito. Mais recentemente, as crescentes preocupações de cunho alegadamente ambiental que vêm canalizando as atenções internacionais para a região amazônica demonstram mais uma vez que os interesses externos querem decidir o nosso futuro.

Sr. Presidente, Srª e Srs. Senadores, de todas as nossas preocupações quanto aos problemas do setor de energia elétrica do Norte do País, a maior é a que aqui agora vamos detalhar.

Até aqui foi apenas uma introdução, quero chamar a atenção para a parte seguinte do meu pronunciamento.

Em reunião do Conselho Nacional de Desestatização, realizada em 27 de julho, foi definido o prosseguimento da privatização do sistema Eletrobrás com a inclusão dos sistemas elétricos da região Norte no Programa Nacional de Desestatização. Os ativos são constituídos por:

- no Estado do Amazonas, a usina hidrelétrica de Balbina, o sistema de transmissão associado, as usinas termoelétricas e o sistema de distribuição de Manaus;

- no Estado de Roraima, as usinas termoelétricas e o sistema de distribuição de Boa Vista;

- no Estado do Amapá, a usina hidrelétrica de Coaracy Nunes, o sistema de transmissão associado e o Parque Térmico de Santana;

- no Estado de Rondônia, a usina hidrelétrica de Samuel e as usinas hidrelétricas de Porto Velho;

- no Estado do Acre, as unidades termoelétricas de Rio Branco.

Nesse conjunto de obras - e aqui eu chamo a atenção dos Srs. Senadores - de geração, transmissão e distribuição, foram investidos, pelo menos US$4,5 bilhões. Segundo informações divulgadas pela imprensa, a receita estimada decorrente da privatização dos ativos mencionados, além de outras cinco usinas hidrelétricas e cinco termoelétricas das regiões Sul, Sudeste e Nordeste do País, situa-se apenas entre R$2,5 bilhões a R$3 bilhões, ou seja, só para fazer essas obras no Norte do País o Governo gastou US$4,5 bilhões.

Ora, para vender agora essas obras e mais cinco usinas hidrelétricas no Sul do País e cinco termoelétricas, o Governo vai arrecadar apenas de US$2,5 bilhões a US$3 bilhões, o que representa um prejuízo de mais de 100% nos investimentos do Estado.

Na ânsia de privatizar o mais rápido possível a infra-estrutura do País, o Governo está partindo para a entrega de setores fundamentais, como é o caso dos sistemas elétricos da região Norte, ignorando a sua função social de prover comunidades e regiões carentes dos serviços básicos para a melhoria da qualidade de vida da população.

O fato que nos causa maior perplexidade é a justificativa para essa medida, que se baseia na premissa de que os sistemas isolados da Amazônia não interferem de forma significativa na definição do novo modelo institucional para o setor elétrico, atualmente em discussão. Ora, isso confirma o desprezo e o descaso do Governo Federal em relação ao problemas da Amazônia, na medida em que simplesmente a excluiu da formulação de diretrizes para o País como um todo. Mais uma vez, a Região é colocada à margem do processo de definição das políticas nacionais. Não existe ninguém da Amazônia participando dessas discussões.

Ao privatizar o setor elétrico na Amazônia, o Governo deixa claro o desconhecimento dos problemas da Região nessa área. Com custos médios acima daqueles praticados nas demais regiões do País, situados entre U$20 e U$30 por megawatt/hora, os sistemas isolados da Amazônia apresentam um custo médio de produção de energia superior a U$100 por megawatt/hora.

A situação só não é pior em virtude da Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis - CCC, que cobre parcialmente esse dispêndio através da arrecadação compulsória dos consumidores de energia elétrica em todo o País e que representa cerca de R$164 milhões por ano.

Não obstante o mecanismo da CCC, as empresas se deparam com uma situação de considerável dificuldade, onde a tarifa praticada é bastante inferior aos custos do serviço. As tarifas de suprimento vigentes estão por volta de US$30 por megawatt/hora, o que torna a geração de energia extremamente deficitária, no nosso caso. Além dos combustíveis, a geração térmica apresenta custos de operação e manutenção elevados. A desequalização tarifária não propiciou aumentos substanciais na tarifa que possibilitassem a viabilização empresarial das concessionárias que possuem níveis elevados de geração térmica. Por outro lado, como já mencionei anteriormente, a renda per capita da região não permite que a população arque com tarifas equivalentes ao custo efetivo do serviço fornecido, o que evidencia a necessidade de serem buscados mecanismos que permitam viabilizar o suprimento de energia elétrica para a região amazônica.

Sr. Presidente, só nos sistemas isolados da região Norte, que o Governo pretende alienar, a previsão de consumo de combustíveis para o ano de 1996 é de cerca de 495 milhões de óleo diesel e 296 mil toneladas de óleo combustível, resultando num custo de mais R$170 milhões. Estamos falando apenas do combustível. No ano de 1995 esses sistemas acumularam para a Eletronorte um prejuízo de mais de R$ 120 milhões. Diante desse quadro, pergunto: que atuação empresarial, por mais eficiente que seja, é capaz de reverter tal situação de prejuízo?

E o futuro? Numa perspectiva do setor elétrico privatizado, não creio que o empresariado investirá no atendimento de mais de 6 milhões de brasileiros que residem na Amazônia e que não dispõem de energia elétrica, a maioria deles residindo na zona rural. O suprimento de energia elétrica a essa população constitui-se em investimento de difícil retorno, caracterizando-se, portanto, como uma obrigação do Governo.

Ademais, não foram definidos aspectos fundamentais relacionados à manutenção do mecanismo da CCC para compensar os pesados encargos da geração termelétrica ou a sua substituição por outro equivalente que garantam o mínimo de equilíbrio à atividade empresarial. Que empresário entrará nesse setor sem regras claramente definidas? O processo de privatização está se dando de forma atabalhoada, sem a necessária discussão e maturação das ações a serem empreendidas. O Congresso Nacional não está presente nessas discussões.

Um outro aspecto da questão energética na Amazônia diz respeito aos subsídios concedidos na década de 70 aos consumidores eletrointensivos.

Aqui chamo a atenção - e é uma pena que seja uma sessão tão esvaziada - para o absurdo que aqui vou relatar. Naquela época, o Governo Federal decidiu viabilizar três projetos minero-metalúrgicos de grande porte: Albrás/Alunorte, em Barcarena, e Carajás, em Parauapebas, ambos no Pará, e a Alcoa, no Maranhão.

Com a justificativa de industrializar a Região, baseando-se principalmente na produção de alumínio, o Governo determinou à Eletronorte a celebração de contratos de fornecimento de energia elétrica oriunda da usina da hidroelétrica de Tucuruí, no Estado do Pará, com tarifas extremamente vantajosas para os investidores dispostos a implantar os seus projetos na Amazônia.

Quase 99% do que está sendo produzido está sendo exportado - é energia condensada e exportada em forma de alumínio.

Os contratos de fornecimento de energia elétrica, atualmente em vigor para a produção de alumínio primário para a Albrás/Alunorte e a Alumar, têm vigência no período 1984-2004 e o contrato com a Camargo Corrêa Metais, para produção de silício, tem vigência no período 1988-2008.

A política governamental de concessão dos referidos subsídios apoiou-se nos mecanismos de compensação financeira intersetorial, vigentes à época, sendo reconhecidos e assegurados à Eletronorte, primeiramente com recursos da RGG, Reserva Global de Garantia, e, posteriormente, substituída pela Rencor - Reserva Nacional de Compensação de Remuneração. As insuficiências de receitas não realizadas através desses mecanismos eram registradas na CRC - Conta de Resultados a Compensar, onde a União contabilizava esse subsídio em favor da Eletronorte.

Ou seja: a Eletronorte dava o subsídio que atinge US$200 milhões por ano a três empresas - duas no Pará e uma no Maranhão. Elas recebem um subsídio equivalente a US$200 milhões por ano e até 1993, o Governo, com uma série de contas, Reserva Global de Garantia, Reserva Nacional de Compensação e Remuneração, fazia as contas e restituia esse subsídio à Eletronorte.

A partir da edição da Lei nº 8.631, de 4/3/93, que marcou o início da revisão institucional do Setor Elétrico, os mecanismos compensatórios anteriores foram extintos, ficando exclusivamente a cargo da Eletronorte a responsabilidade de assumir os subsídios tarifários aos eletrointensivos, da ordem de US$200 milhões anuais. Dessa forma, passou a se concentrar em uma única empresa a responsabilidade de arcar com um volume de subsídios que anteriormente eram, em função de uma estratégia de desenvolvimento nacional, cobertos pelos contribuintes brasileiros.

Os subsídios, concedidos desde o início da vigência dos contratos até a edição da Lei 8.631/93, foram da ordem de US$441 milhões. De março de 1993 até abril de 1996, foram concedidos subsídios de cerca de US$506 milhões, recursos que a Eletronorte deixou de receber e evidentemente deixou de investir na nossa Região. Os subsídios totais aos eletrointensivos montam, até abril de 1996, cerca de US$947 milhões, sendo de US$627 milhões para a Albrás/Alunorte, US$279 milhões para a Alumar e US$41 milhões para a Camargo Corrêa Metais, que está instalada no Município de Tucuruí.

A título de ilustração, em 1994, a tarifa praticada pela Albrás/Alunorte chegou a corresponder a apenas um terço da tarifa normal dos consumidores industriais brasileiros, em qualquer canto deste País, em tensão de 230KV. Nesse ano, o total de subsídios foi duas vezes e meia o valor do investimento realizado pela Eletronorte para o atendimento das necessidades de energia elétrica na sua área de atuação, que compreende nove Estados da Federação.

Enfatizo, Sr. Presidente, que os subsídios concedidos aos consumidores eletrointensivos, a partir da vigência da Lei nº 8.631/93, ficaram sem cobertura do Governo Federal, prejudicando enormemente os investimentos da Eletronorte em infra-estrutura na região amazônica.

Para corrigir essa distorção, o nobre Senador Sebastião Rocha elaborou o projeto de lei (PLS 254/95), que está tramitando nesta Casa. Lamentavelmente, tramitando muito lentamente. Dentre outras medidas, o projeto de lei autoriza a União a reembolsar à Eletronorte os valores concedidos às empresas eletrointensivas instaladas na Amazônia Legal.

Quero alertar que, até o final da vigência dos contratos com os consumidores eletrointensivos, ainda serão concedidos subsídios da ordem de US$1,4 bilhões, sendo US$815 milhões para a Albrás/Alunorte, US$445 milhões para a multinacional Alumar e US$146 milhões para a Camargo Corrêa Metais. O Governo é pródigo em beneficiar grandes empresas neste País. Se nenhuma medida for tomada, a região mais carente de infra-estrutura do País deixará de contar com estes expressivos e necessários recursos, que melhorariam a qualidade de vida de uma população na qual há uma parcela de cerca de 33% que não conta com os benefícios da energia elétrica - vivemos ainda no tempo do fifó e do candeeiro.

Nisto tudo, um fato chama-nos a atenção. O tema seria para um debate candente nesta Casa, que, infelizmente, está vazia. O motivo pelo qual a usina hidrelétrica de Tucuruí não foi incluída no Programa Nacional de Desestatização, a exemplo das outras usinas incluídas na Região Norte. O Governo colocou todos os sistemas isolados da Amazônia no sistema de privatização, só não colocou a hidrelétrica de Tucuruí. E por que não o fez? Evidentemente, porque a hidrelétrica de Tucuruí tem um compromisso, até 2004, de vender 45% da sua energia por um preço que é 1/3 que qualquer industrial brasileiro paga neste País.

Por isso, a hidrelétrica de Tucuruí não entrou - acredito eu, ninguém me disse isso, mas é uma suposição - na privatização porque está comprometida com o subsídio que se dá à Albrás/Alunorte, à Alcoa e à Camargo Corrêa Metais.

Enquanto o Governo Federal, de um lado, pretende entregar para a iniciativa privada o atendimento energético à região mais carente do País, por outro procura preservar os interesses do empresariado nacional e multinacional. E aí está o crime.

Quero referir-me agora especificamente ao meu Estado, o Pará, onde as regiões Oeste, Baixo Tocantins e Sul, doze anos após a entrada em operação da usina hidrelétrica de Tucuruí, ainda não são beneficiadas com a sua energia. Enquanto a cidade de Belém, a Região Nordeste do Estado e os consumidores industriais ali instalados dispõem de um suprimento elétrico com alto padrão de qualidade e confiabilidade, a população das localidades mais próximas à usina não usufruem desse benefício. Desde a sua criação, a Eletronorte investiu cerca de US$ 7,8 bilhões no Estado.

Eu pensava que eram US$ 6 bilhões, mas tive a informação, por dados da própria Eletronorte, que foram US$ 7,8 bilhões.

No entanto, durante os 12 anos de operação da usina, não foram disponibilizados recursos de monta muito menor para beneficiar as populações que vivem à sua volta.

Sr. Presidente, a oferta de energia elétrica com qualidade e em quantidade adequada, via interligação ao sistema Tucuruí, constitui justa e legítima demanda da sociedade local. O Movimento do III Grito da Terra Brasil, em manifestação de grande repercussão nacional, realizada no final de maio de 1996, na usina hidrelétrica de Tucuruí, entregou aos representantes dos Governos Federal e Estadual, responsáveis pela negociação com os líderes do Movimento, uma pauta de reivindicações sociais que, após exaustivas negociações, resultou na Consolidação de Entendimentos com medidas que incluem a implantação do sistema de transmissão do Oeste do Pará, chamado Tramo Oeste, atendimento à Região do Baixo Tocantins e o atendimento à Região Sul do Estado do Pará.

Quero destacar que os subsídios concedidos aos consumidores eletrointensivos, a que antes me referi, num período de menos de dois anos, são equivalentes aos recursos necessários à execução dessas três obras no Pará, ou seja: cerca de R$ 300 milhões.

A Região Oeste do Pará compreende os municípios de Altamira, Rurópolis, Itaituba, Santarém e mais 12 outros, apresentando os solos mais férteis do Estado, com cerca de 440.000 habitantes. A implantação do sistema de transmissão denominado Tramo Oeste permitirá a eliminação da geração térmica, em função da desativação de usinas termelétricas a óleo diesel. Propicia substancial redução do custo operacional das Centrais Elétricas do Pará - Celpa e economia de divisas com a importação de petróleo da ordem de R$ 21 milhões por ano. Os investimentos totais requeridos são de aproximadamente R$236 milhões, compreendendo o trecho a ser executado pela Eletronorte, de R$176 milhões, e pela Celpa, de R$60 milhões.

O SR. PRESIDENTE (Valmir Campelo) - Peço ao nobre Senador Ademir Andrade que conclua o seu pronunciamento, pois o tempo de V. Exª já se esgotou há dez minutos e temos outros oradores inscritos.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Vou concluir, Sr. Presidente.

Depois de toda essa análise, a parte final do meu pronunciamento apenas explicita as questões da região, do meu Estado.

Estou concluindo, Sr. Presidente, apresentando um requerimento de convocação à Mesa, para que venha ao plenário desta Casa - e não à Comissão, pois considero esta questão de suma importância - o Sr. Ministro do Planejamento, Antônio Kandir. Convocamos S. Exª para nos esclarecer, para debater conosco, para explicitar o porquê desse desejo de vender o sistema elétrico brasileiro da Amazônia à iniciativa privada. E para nos dizer, levando em conta os dados que aqui apresentei, qual é a empresa privada que vai investir para levar energia elétrica a essas seis milhões de pessoas, na nossa região, que ainda não a possuem, considerando as dificuldades do investimento e do retorno.

Ora, o Governo é capaz de dar US$200 milhões de subsídio a duas grandes empresas que produzem alumínio e alumina no meu Estado e no Maranhão, e não é capaz de dar um subsídio de US$100 milhões para atender a 6 milhões de brasileiros, levando energia até eles, levando a possibilidade de industrialização, de emprego, de ocupação da terra e de uma série de outras coisas. A decisão do Governo de vender o que foi construído por ele mesmo e pela Eletronorte é algo que inviabiliza por completo a possibilidade de ampliar o fornecimento de energia na nossa região.

Portanto, concluo o meu pronunciamento entregando à Mesa um requerimento de convocação, e espero que os Senadores desta Casa sejam compreensíveis e o apóiem, para que o Ministro Antônio Kandir possa vir aqui explicar as razões do seu desejo de vender à iniciativa privada todo o sistema elétrico brasileiro da Amazônia.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/09/1996 - Página 15483