Discurso no Senado Federal

SITUAÇÃO DE ABANDONO DA SAUDE PUBLICA NA REGIÃO NORTE DO PAIS. II ENCONTRO DAS COMISSÕES INTERGESTORAS BIPARTITE DA REGIÃO NORTE DO SISTEMA UNICO DA SAUDE - SUS.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • SITUAÇÃO DE ABANDONO DA SAUDE PUBLICA NA REGIÃO NORTE DO PAIS. II ENCONTRO DAS COMISSÕES INTERGESTORAS BIPARTITE DA REGIÃO NORTE DO SISTEMA UNICO DA SAUDE - SUS.
Publicação
Publicação no DSF de 06/09/1996 - Página 15531
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, REIVINDICAÇÃO, SECRETARIA DE SAUDE, ESTADOS, REGIÃO NORTE, DESCENTRALIZAÇÃO, CONTROLE, ENDEMIA, ESPECIFICAÇÃO, MALARIA, INTEGRAÇÃO, UNIDADE DE SAUDE, RACIONALIZAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, UTILIZAÇÃO, TECNOLOGIA, APERFEIÇOAMENTO, RECURSOS HUMANOS, FINANCIAMENTO.
  • ANALISE, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), REGIÃO AMAZONICA, CRITICA, DESCONHECIMENTO, CARACTERISTICA, REGIÃO, PROBLEMA, DISTANCIA, ISOLAMENTO, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO.
  • CRITICA, ORADOR, PRIVATIZAÇÃO, SAUDE, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), PRIORIDADE, HOSPITAL, SETOR PRIVADO, PREJUIZO, SAUDE PUBLICA, QUESTIONAMENTO, AUSENCIA, INVESTIMENTO, ASSISTENCIA MEDICO-HOSPITALAR, SETOR PUBLICO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Edison Lobão, quero registrar o recebimento de dois importantes documentos, produzidos recentemente, sobre a delicada questão da saúde pública nos Estados da Região Norte. Acabo de receber e quero dar conhecimento a esta Casa da "Carta do Sistema Único de Saúde da Amazônia" e do documento intitulado "Descentralização do Controle de Endemias da Região Norte".

Gostaria de começar com a análise do trabalho sobre descentralização do combate às endemias, porque essa é uma questão vital para os Estados nortistas. Antes de mais nada, é preciso considerar que, nesse aspecto, temos uma peculiaridade em relação ao resto do País. A malária é a principal endemia da nossa região; e 98% dos casos registrados no País ocorrem nas Unidades da Federação situadas na Região Amazônica.

Existe hoje uma grande preocupação nos Estados do Norte com os destinos do Programa de Controle de Endemias, do Ministério da Saúde, especialmente tendo em vista o término da vigência do Projeto Banco Mundial/PCMAM, que financiava ações de combate à malária. A essa preocupação deve ser somado o fato de que os Estados e Municípios daquela área necessitam participar, junto com o Governo Federal, da luta contra esse mal.

Reunidos na Cidade de Porto Velho, Rondônia, em 26 de julho do corrente ano, secretários estaduais de saúde de todos os Estados da Região Norte reafirmaram a necessidade de uma série de medidas para otimizar os resultados no combate às endemias, mormente a malária. Essas ações são as seguintes:

a) desencadear de imediato o processo de descentralização do controle de endemias;

b) priorizar a luta contra as endemias de maior incidência na Região;

c) integrar todas as instituições de saúde - sejam elas pertencentes aos Estados, aos Municípios ou à União -, a fim de racionalizar o gasto de esforços e de recursos.

d) considerar as secretarias estaduais de saúde como gestoras efetivas de todas as ações de saúde, o que eliminaria o problema de choque de competências ou de ações conflitantes;

e) repassar aos Estados tecnologia moderna para o combate às endemias;

f) iniciar programas de capacitação e aperfeiçoamento para o pessoal médico ou auxiliar;

g) formar grupos de estudos que dêem início ao processo de integração entre as instituições federais, estaduais e municipais;

h) lutar para que o financiamento das ações de saúde, dentro da Região, fique próximo do parâmetro estipulado pela Organização Mundial de Saúde, que é de US$250 per capita.

Acreditam os especialistas em Saúde Pública da Amazônia que, se forem adotadas todas essas medidas, possa ser revertido rapidamente o penoso panorama da questão sanitária no Norte brasileiro.

Reunidos dois meses antes, também na Capital de Rondônia, Porto Velho, representantes dos Estados do Pará, Amazonas, Acre, Amapá, Rondônia, Roraima e Tocantins, com atuação em organismos federais, estaduais ou municipais, redigiram a chamada "Carta do Sistema Único de Saúde da Amazônia", documento importante para o conhecimento do atual estágio da saúde pública na área. No referido estudo, são debatidas exaustivamente questões peculiares à região - questões de natureza econômica, geográfica, demográfica ou cultural - que interferem de forma relevante na operacionalização das diretrizes políticas do Sistema Único de Saúde.

Na verdade, o conhecimento dessas particularidades é essencial para que se possa traçar uma estratégia de superação das dificuldades. Assim, os estudiosos da problemática sanitária do Norte apontam três fatores que, primordialmente, devem ser levados consideração:

a) a falta de conhecimento, por parte dos organismos federais, das características próprias da Amazônia. Em função desse desconhecimento, em geral são errôneas as políticas públicas de saúde para a Região Norte, porque são estabelecidas com base em critérios que só têm validade para outras unidades da Federação ou para a média do País;

b) a baixa densidade demográfica da região. O Norte tem algumas cidades populosas, mas também tem incontáveis povoados espalhados pela floresta em locais de difícil acesso. Na região, as distâncias são medidas em dias de navegação por rios ou horas de vôos. Isso, é claro, encarece o custo das operações de saúde.

c) o respeito que a Amazônia inspira nacional e internacionalmente, tendo em vista sua importância para a humanidade como grande reserva de biodiversidade. Ora, esse conceito de respeito à Amazônia deve ser estendido ao homem que ali sobrevive às condições inóspitas da floresta. O caboclo amazônico, como todo cidadão brasileiro, tem direito à saúde, mas ninguém desconhece que é impossível fixar profissionais de saúde em certas áreas. Aí temos um paradoxo: o amazônida tem direito à saúde, mas não existe uma política específica para o seu atendimento.

Considerando esses três fatores, os sanitaristas exigem do Ministério da Saúde que:

a) amplie o seu conhecimento sobre a realidade amazônica, o que pode ser feito rapidamente com a aproximação às secretarias estaduais e municipais de saúde;

b) acolha as sugestões das secretarias estaduais, que melhor conhecem a realidade local, e considere que uma ação de saúde na Amazônia pode custar o triplo do que em outras áreas do País.

Sr. Presidente, solicito à Mesa que sejam registrados nos Anais os dois documentos aos quais faço referência, produzidos pelo Conselho Regional de Secretários de Saúde, Região Norte, no II Encontro das Comissões Intergestoras Bipartites do Sistema Único de Saúde.

Entretanto, registro a minha discordância em relação ao posicionamento dos representantes da Saúde nos Estados do Norte do País, sobretudo porque nenhum deles fez críticas ao que considero mais grave na Saúde Pública brasileira hoje. Tem-se a impressão de que o Sistema Único de Saúde foi criado não para atender a população, mas para privatizar o setor de saúde no nosso País.

Lamento que 90% de todo o atendimento do Sistema Único de Saúde, no Brasil e na Região Norte especialmente, seja feito por hospitais privados, por clínicas e consultórios particulares. Ou seja: o proprietário do hospital presta o serviço à população e recebe do Ministério de acordo com o número de atendimentos, de operações, de internações.

Isso, a meu ver, dificulta a atenção à Saúde Pública no País, primeiro porque o SUS paga muito pouco. As clínicas decidem, por elas mesmas, criar os próprios faturamentos, inventando atendimentos que, na verdade, não existem. Em segundo lugar, a política de priorizar o atendimento à empresa privada no setor de saúde faz com que se liqüide a Saúde Pública no Brasil. É o que se passa com a Fundação Nacional de Saúde. Outro órgão que foi prejudicado foi a Sucam, que combatia a malária na Região Norte. Essa Superintendência desenvolvia um trabalho efetivo, de resultados positivos. Ela foi simplesmente liquidada. Portanto, percebe-se que o Governo, também na Saúde, quer fazer a total privatização.

Lamento que o Ministro da Saúde, que tem defendido a destinação de recursos para essa área - criou até um novo imposto - não pense em melhorar a Saúde Pública no que se refere à possibilidade de ter médicos, dentistas, enfermeiros, funcionários ligados à área de Saúde em hospitais públicos, com salários dignos. Ao contrário, o Governo tem desestimulado, aniquilado a área da Saúde. O próprio INPS, que, em tempos passados, contava com médicos, consultórios, enfim, com uma estrutura, hoje está totalmente desmontado e desmobilizado no País.

Lamento profundamente que os Secretários de Saúde, líderes da Saúde Pública na Região Norte, tendo realizado dois encontros para tratar dessa questão, não tenham debatido, levantado a questão da ação firme do Governo no sentido de privatizar a Saúde Pública brasileira, como está acontecendo.

Considero que esse documento aborda pontos importantes. No entanto - repito - faço a ressalva da minha oposição aos dirigentes desses Conselhos, que não se opuserem ao malefício que o Governo Federal está fazendo com a Saúde Pública brasileira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/09/1996 - Página 15531