Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS SOBRE O SUBSTITUTIVO DO RELATOR, DEPUTADO JAIRO CARNEIRO, AS PROPOSTAS DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 96/92 E 112/95, QUE TRATAM DA REFORMA DO JUDICIARIO, NA AVALIAÇÃO DO ADVOGADO SERGIO FERRAZ, MEMBRO DA COMISSÃO ESPECIAL INDICADA PELO PLENARIO DA OAB PARA ANALISAR O PROJETO.

Autor
Odacir Soares (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • COMENTARIOS SOBRE O SUBSTITUTIVO DO RELATOR, DEPUTADO JAIRO CARNEIRO, AS PROPOSTAS DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 96/92 E 112/95, QUE TRATAM DA REFORMA DO JUDICIARIO, NA AVALIAÇÃO DO ADVOGADO SERGIO FERRAZ, MEMBRO DA COMISSÃO ESPECIAL INDICADA PELO PLENARIO DA OAB PARA ANALISAR O PROJETO.
Publicação
Publicação no DSF de 10/09/1996 - Página 15599
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • COMENTARIO, SUBSTITUTIVO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFORMA JUDICIARIA, AUTORIA, JAIRO CARNEIRO, DEPUTADO FEDERAL, MOTIVO, ANALISE, CRITICA, PROJETO, SERGIO FERRAZ, ADVOGADO, PARTICIPANTE, COMISSÃO ESPECIAL, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), DESTINAÇÃO, EXAME, PROPOSIÇÃO.

           O SR. ODACIR SOARES (PFL-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o discurso reformista, em nosso País é tão martelado, tão insistentemente apregoado que, quem não nos conhecesse, haveria de julgar-nos o País das reformas.

           Abre-se um jornal, ouve-se falar um homem público, ingressasse no plenário de qualquer de nossas Casas Legislativas e, dificilmente, seremos poupados de ouvir o reclamo de alguma reforma urgente que venha por termo a essa ou aquela mazela crônica que persiste comprometendo alguma instituição nacional.

           Se pareço exagerar é só conferir o elenco das reformas que andam na ordem do dia: reforma agrária, reforma administrativa, reforma fiscal, reforma eleitoral, reforma partidária, reforma ortográfica, reforma do ensino, reforma constitucional, reforma universitária, reforma penitenciária, reforma da polícia, reforma do judiciário....

           Em meio a esse emaranhado de reformas, tenho certeza, outras muitas, deixaram de ser citadas, mas andarão, certamente, na boca de nossos incuráveis reformistas.

           O que haverá de errado, conosco que tantas coisas reformamos e, não obstante, as coisas continuam como sempre, irredutíveis, irreformáveis?

           Terá sido Roberto Campos, creio eu, quem, em conferência proferida aos estudantes da PUC, RJ, lhes fez observar os comportamentos diferentes demonstrados por brasileiros e ingleses, em matéria de reformas.

           Os brasileiros, notou Roberto Campos, mudam o nome das coisas, mas as coisas eles as deixam como sempre estiveram. Já os ingleses tratam de mudar as coisas, conservando os nomes que elas vinham tendo.

           E citava o exemplo da reforma operada no setor energético daquele País, logo após o advento da era nuclear.

           A estrutura do órgão foi, então, atualizada, nela se introduzindo novo departamento ligado à pesquisa e exploração da energia atômica.

           Mas ao encarregado da admistração desse setor, continuou-se atribuindo o velho nome de Lorde acendedor dos lampiões de sua Majestade.

           Que no Brasil as reformas se fazem de modo inverso, não há como negar.

           Haja vista o próprio nome do País que já se chamou Terra de Santa Cruz, de Vera Cruz, Brazil (com "z"), Brasil (com "s"), Estados Unidos do Brasil, República Federativa do Brasil, e já se anuncia, como nova reforma em cogitação, a mudança do nome do País que passaria a ser chamado simplesmente de Brasil!

           A despeito dessa pletora de reformas - reformado que for o nome do Brasil - só nos resta, agora, promover a única reforma que ainda não intentamos: a reforma do homem brasileiro. Efetivamente,só uma profunda transformação operada dentro de cada brasileiro será capaz de habilitá-lo a levar a cabo seus projetos de transformação do Brasil, operando mudanças profundas em suas instituições, e não apenas nos nomes que as rotulam, ou nas fachadas que as encobrem.

           Essa longa introdução, Sr. Presidente, é apenas um preâmbulo, ao desencanto dos comentários que, lamentavelmente, ocorreu-me fazer às Propostas de Emenda à Constituição 96/92 e 112/95, referentes à reforma do Judiciário.

           A reestruturação profunda do judiciário, em todos os seus níveis e ramos, corresponde a uma das expectativas mais antigas da opinião pública brasileira.

           Por ser tão antiga e tão generalizada, tal expectativa vinha configurando, com bastante objetividade, os resultados esperados dessa reestruturação.

           Em verdade, não há quem não anseie por ver a vetusta instituição do judiciário, ostentando novos desempenhos, no que respeita :

·  à agilidade e presteza na apreciação e julgamento dos feitos;

·  à eliminação dos fatores internos que fornecem a impunidade;

·  à simplificação dos ritos e dos excessos burocráticos, que emperram o fluxo dos processos, e solapam a confiança dos cidadãos no Poder Judiciário, já que, freqüentemente, muitos deixam de recorrer aos tribunais por falta de expectativa de ver, ainda em vida, seus direitos reconhecidos;

· ao restabelecimento da austeridade no seio da Magistratura, tantas vezes comprometida pelo notório nepotismo, pelas prolongadas férias forenses e pelos polpudos emolumentos que os magistrados generosamente se autoconcedem.

           Uma lufada renovadora espanando o bolor que recobre as repartições do judiciário e uma recarga energizante em seus mecanismos, do que resultasse uma instituição revitalizada, ágil, eficaz e, sobretudo, democraticamente sintonizada com a cidadania em seus anseios pela extirpação da impunidade, das discriminações, dos privilégios e da improbidade na vida pública brasileira.

           Essa seria, em suma, a reforma judiciária ansiada pela cidadania brasileira.

           Como anda, porém, a Reforma do Judiciário, proposta na Câmara dos Deputados pelas PEC's 96/92 e 112/95 já agora alteradas pelo substitutivo do Relator, deputado Jairo Carneiro?

           Dela tomei conhecimento, Sr. Presidente, ao ler a contundente análise que dela faz o douto advogado Sérgio Ferraz, membro da comissão especial indicada pelo plenário da OAB para analisar o projeto.

           A avaliação por este produzida, foi publicada pelo Jornal do Conselho Federal - OAB, em seu nº 49 de 1996, sob o título de "Reforma do Judiciário", tendo merecido a seguinte manchete ;

           "Projeto é um retrocesso

Relator concede poderes exagerados ao Judiciário e esquece a sua democratização."

           Segue-se a íntegra do parecer, cuja contundência percebe-se, de imediato, em seus itens 2 e 3, que aqui reproduzo :

           "2 - A leitura atenta do Substitutivo torna nítido seu propósito maior : um reforço, em dimensões que jamais haviam sido por nós pressentidas, das competências e atribuições do Poder Judiciário, elevando-o à estatura de personagem incontrastável e incontestável. Em realidade, nunca estivemos tão perto, no Brasil, do estabelecimento de uma verdadeira ditadura do Judiciário - tão temida desde a Antigüidade Clássica - quanto agora.

           3 - Para a concretização de tão ominoso panorama, vertentes ostensivas e alarmantes foram escolhidas..................................

a - aprofundamento e alargamento do poder de iniciativa legislativa dos tribunais;

b - ampliação, vertical e horizontalmente, do indesejável instrumento das súmulas vinculantes;

c - restauração de instrumentos geradores de acromegalia do Judiciário (verbi gratia, procedimentos para fixação apriorística da interpretação das leis).

           Aprovado que seja o Substitutivo, caso o Judiciário exercite, de fato, tudo que a ele é ali ensejado, O LEGISLATIVO estará gravemente esvaziado em suas competências, transformando-se, praticamente, num simples grêmio de políticos, com pouco mais a fazer além do próprio jogo da política! É evidente que, com isso, a própria estrutura da República, com seus três Poderes harmônicos, interindependentes e equilibrados (figuração essencial para a existência de um efetivo sistema de "freios e contrapesos") vai por terra, inexoravelmente. E, com isso, atingiremos um ponto de retrocesso judiciário e institucional sem precedentes na história do País!"

           Sustentando o mesmo tom, segue o relator sua apreciação, artigo por artigo, do texto do Substitutivo. Não raro, porém, engrossa-se o tom de indigna insurgência contra essa ou aquela "patologia", (que é como o relator caracteriza os pontos críticos que ele focaliza no Projeto).

           Repudiando, por exemplo, o instituto da "súmula vinculante", o douto membro da comissão instituída pelo Conselho Federal da OAB, assesta contra ela a seguinte diatribe :

           "no textos do Deputado Jairo Carneiro, três gravíssimas patologias estão consagradas, e devem ser expurgadas :

a) a atribuição a todos os Tribunais Superiores do poder de editar súmulas vinculantes;

b) a sujeição não só dos tribunais à vinculatividade das súmulas, MAS DA PRÓPRIA ADMINISTRAÇÃO, em insuportável desrespeito à cláusula pétrea da separação e independência dos Poderes. O requinte majestático é de tal ordem, que até se cria uma nova figura de crime de responsabilidade. Note-se que o erro de submeter a Administração ao comando vinculante das súmulas se repete em várias outras passagens do Projeto, também a serem expurgadas.

c) a irrecorribilidade das decisões proferidas com invocação às súmulas vinculantes. Ora, qualquer juiz pode enganar-se quanto à inteligência de uma súmula. Além disso, a recorribilidade é uma das garantias fundamentais da cidadania, como tal fundada no básico artigo 5º, inciso LV, da Constituição. Irrecorríveis somente as decisões divinas!"

           Nas disposições transitórias, Sérgio Ferraz, faz, entre outras, esta impugnação ao precatório :

           "Além disso, aprofunda-se ao infinito, EM ABERTA INFRINGÊNCIA AOS DIREITOS E INTERESSE DA CIDADANIA, o iníquo instrumento do precatório, permitindo-se seja ele pago em três exercícios orçamentários (!!!) e a critério do próprio Executivo devedor contumaz(!!!). É um verdadeiro escárnio!"

           A cáustica avaliação da Comissão Especial da OAB, da qual respiguei apenas as mostras mais candentes, não poupou sequer a linguagem e a técnica legislativa exibida no Substitutivo.

           Veja-se como o relator arremata sua análise :

           "Para finalizar, assinale-se haver erros em profusão no Projeto, de linguagem (particularmente, concordância verbal e nominal, regência verbal e preposicional, cacofonias) e até de técnica legislativa (por exemplo, a insólita numeração adotada para os parágrafos, com ordinais mesmo depois do 9º). Nem nos detivemos no particular por terem sido tão numerosas como se demonstrou as teratologias jurídicas perpetradas no texto."

           Não é meu propósito tecer considerações de mérito, seja sobre a proposta substitutiva do deputado Jairo Carneiro, seja sobre a avaliação que desta fez o ilustre relator da Comissão Especial da OAB.

           Isso porque o substitutivo, até o momento, não mereceu a aprovação da Câmara dos Deputados, enquanto que o parecer da Comissão Especial da OAB, ainda será apreciado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados.

           Se, não bastante, achei por bem trazer à colação as graves impugnações assacadas contra o Projeto pelo relator da OAB, foi para, desde já, alertar a Casa sobre o cunho candente e polêmico deste projeto que, mais cedo ou mais tarde, iremos apreciar.

           Quando tal ocorrer, terá chegado o momento apropriado para que aprofundemos a análise do projeto, dele expungindo, se for o caso, todo e qualquer ensejo de esvaziamento das competências do Legislativo, de sorte a não transformá-lo, como teme o relator da OAB, "num simples grêmio de políticos, com pouco mais a fazer além do próprio jogo da política."

           Esse será, também, o momento de decidirmos se as propostas de substitutivo, entre as quais avultam : a criação do Conselho Nacional de Justiça; a extinção dos juízes classistas na Justiça do Trabalho; o impedimento da nomeação de parentes dos juízes para funções de confiança; a extinção da Justiça Militar; a criação de uma Corte Constitucional e outras, constituem a ampla e profunda transformação do Judiciário, ansiada pela cidadania , ou se será necessário o concurso das doutas emendas oferecidas por membros desta Casa, para que as expectativas do povo se consumam em toda a sua plenitude.

É o que penso, Sr. Presidente,


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/09/1996 - Página 15599