Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM PELO CINQUENTENARIO DA FENAJ - FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM PELO CINQUENTENARIO DA FENAJ - FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/1996 - Página 15619
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CINQUENTENARIO, FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS, OPORTUNIDADE, ANALISE, TRABALHO, IMPRENSA, PROBLEMA, SONEGAÇÃO, INFORMAÇÃO, RESPONSABILIDADE, DEMOCRACIA, DEFESA, INDEPENDENCIA, GOVERNO, CLASSE POLITICA.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srªs e Srs. convidados, considerado pelo New York Times o maior intelectual norte-americano vivo, Noam Chomski, em entrevista ao Jornal do Brasil, edição de último sábado, ao ser indagado sobre o papel da imprensa, afirmou:

      A mídia deveria ser o que todos anunciam no discurso de formatura: o alicerce de uma sociedade democrática, que desafia a autoridade e oferece ao povo a oportunidade igual de aprender e participar. Só que as pessoas que estão discursando não sabem que elas estão mentindo, na pior das hipóteses, ou sabem que estão mentindo, mas acham que esta é a única maneira de funcionar".

Nessa ocasião, em que comemoramos o cinqüentenário da Federação Nacional dos Jornalistas Profissionais, gostaríamos de refletir sobre a feliz síntese formulada pelo notável professor de lingüística do Massachusetts Institute of Technology - MIT acerca da função a ser empreendida pelo jornalismo no seio das sociedades democráticas.

De fato, o binômio "liberdade de informar - direito à informação", -- ou na expressão de Chomski "desafio da autoridade" e "oportunidade igual de aprender e participar" -- é requisito indispensável à conformação dos povos e à constituição do caráter dos indivíduos.

A sonegação da informação - informação aqui entendida em sua verdadeira acepção, ou seja, a veiculação da verdade -, quer pela via da censura, quer pela manipulação dos dados, mediante expediente os mais variados, tais como a supressão do contraditório, a ênfase na versão com nítido intuito de desvirtuamento do fato, é, pois, elemento de impugnação do rótulo democrático, reivindicado pelos agrupamentos humanos politicamente organizados.

Com efeito, quando se trata de aferir o efetivo cumprimento da função do jornalismo a partir da interferência ou não do Estado no ofício de informar, a tarefa é simples. Desafiada a autoridade com a divulgação de notícia que vá de encontro a seus interesses, se essa responde com o cerceamento de sua veiculação, evidentemente não há liberação de informação.

Mais complexo, entretanto, é o trabalho de denunciar o desvirtuamento da informação, quando, por diversas circunstâncias, os próprios meios de comunicação submetem o que deve ser divulgado a ditames que não proporcionam o florescimento da verdade, o que se obstaculiza por circunlóquios, por destaques para interpretações distorcidas, pela triagem direcionada no acesso às páginas dos jornais, aos microfones das rádios e às câmeras de TV.

Este segundo critério de dominação, que é a negação do oferecimento ao povo da igual oportunidade de aprender e participar, parece ao mais comum dos cidadãos algo anódino; reforçando-lhe o senso comum, não permite que a informação correta possa ser assimilada como matéria-prima para formação da personalidade, para o aprimoramento do juízo de valoração ética, para o desenvolvimento dos laços de solidariedade e fraternidade das manifestações culturais, políticas ou econômicas.

É a grave ausência de percepção de que a imprensa tem relevante missão a cumprir no estímulo ao espraiamento da verdade rigorosa que nos faz partícipes de um tempo em que impera a mediocridade, a irresponsabilidade e a violência entre os homens. Pois se aos amplos contingentes é vedada, pelo bloqueio, a informação apropriada, a evolução da capacidade de discernir, mais distante se torna a possibilidade do consenso democrático, mais próximo se divisa o mundo da barbárie, fruto da elevação do individualismo ao paroxismo.

Quando se constata, como foi divulgado por judicioso periódico, neste final de semana, que, hoje em dia, no Brasil, mais de 40% das concessões de rádio e TVs estão outorgadas a agentes políticos aí, então, se vê a dificuldade de concretização nessas plagas das tarefas propostas por Chomski à imprensa: desafiar a autoridade e oferecer ao povo igual oportunidade de aprender e participar.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srs. Convidados, o Brasil somente poderá superar os obstáculos que o separam das nações mais desenvolvidas se puder contar com a colaboração de uma imprensa na exata expressão do professor Mangabeira Unger, que não esteja prostrada ante nossos governantes e a elite dominante deste país. Em seus cinqüenta anos de existência, entrementes, a Fenaj tem sido, pois, exatamente, um sinônimo de luta contra a subalternidade do ato de veicular os acontecimentos; vem se destacando como um baluarte na defesa intransigente do binômio "liberdade de informar - direito à informação". Seu compromisso inarredável com estas palavras de ordem do credo democrático manifesta-se, ao longo dos anos, em cada momento em que se impõe o rechaço à censura, em suas mais distintas modalidades, desde o confisco de material a ser publicado até a sanção penal da manifestação jornalística; em cada ocasião em que trava a discussão sobre a democratização dos meios de comunicação, como na Constituinte e no processo infraconstitucional, tendo em vista o impedimento da monopolização e oligopolização dos meios de comunicação, o estimulo à regionalização das produções, a sujeição das concessões ao crivo consultivo do Conselho de Comunicação Social, como órgão auxiliar do Congresso Nacional; em cada instante em que se faz necessário alertar as autoridades sobre as ameaças e perseguições que recaem sobre jornalistas, ou quando urge cobrar a apuração de crimes contra eles cometidos, em razão do exercício da profissão.

Neste momento em que assistimos à inviabilização do Conselho de Comunicação Social, já regulamentado pela Lei nº 8.389/91, por falta de vontade política das lideranças que configuram a maioria do Congresso Nacional, ao argumento epitelial, fácil, de que o art. 4º do referido diploma legal é um monumento ao corporativismo, a Fenaj desponta como uma entidade sindical que subordina a defesa dos interesses de seus representados aos interesses nacionais. Prova contundente disso está na denúncia recente que fez de irregularidades na concessão e no cálculo de valores de aposentadorias a jornalistas, sem o preenchimento dos devidos critérios legais, com o comprometimento até mesmo de dirigentes sindicais de sua base de representação.

Essa preocupação com a centralidade do geral sempre esteve presente nas sucessivas gestões à frente da Fenaj, sem prejuízo do engajamento nas lutas específicas da categoria profissional dos jornalistas.

Nos anos 50, essa entidade mobilizou-se em torno do movimento pela criação do salário mínimo e assumiu a defesa das bandeiras nacionalistas. Desde o início, opôs-se ao regime militar instaurado em março de 1964 e integrou-se à mobilização pela redemocratização do País.

Mais recentemente, lá estava a Fenaj integrando o Comitê pela Ética na Política, contribuindo na coordenação de esforços da sociedade, que resultaram no impeachment do Presidente Collor, em 1992.

Se enaltecemos o passado da Fenaj, nem por isso podemos deixar de aplaudir suas iniciativas presentes, com vistas ao futuro. Em face da integração do Brasil a um bloco econômico, em parceria com Argentina, Paraguai e Uruguai, já em 1993 a Fenaj convocava um seminário internacional, que tomou lugar em Ouro Preto - MG, para discutir as assimetrias entre os quatro países, no que concerne ao exercício da profissão de jornalismo no Mercosul, e para lançar as bases de uma ação integrada em defesa da liberdade de imprensa e da democratização dos meios de comunicações.

No âmbito das comemorações de seu cinqüentenário, essa entidade desenvolveu o "Projeto 50 Anos" que, a par das questões sindicais e de formação acadêmica, indispensáveis ao futuro da profissão de jornalista, suscita a instigante discussão, de natureza estratégica, a respeito dos caminhos da atividade jornalística em um mundo pautado, nas áreas de comunicação, pela superação de fronteiras, por força do uso de novas tecnologias e pela desregulamentação do setor.

Sr. Presidente, nesta data comemoramos o cinqüentenário da Fenaj, cantando a liberdade como pressuposto intocável para a prática da democracia.

Na oportunidade, ao parabenizar os jornalistas pelo feito, só nos resta recordar Rosa Luxemburgo, para quem

      "uma liberdade que existe apenas para os que apóiam o governo, uma liberdade apenas para os membros de um partido - por mais numerosos que sejam - não é liberdade nenhuma. A liberdade é sempre e exclusivamente liberdade para o que pensa de maneira diferente".

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/1996 - Página 15619