Discurso no Senado Federal

CONGRATULANDO-SE COM A REELEIÇÃO DO JORNALISTA PAULO CABRAL PARA A PRESIDENCIA DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE JORNAIS - ANJ. QUESTIONANDO A QUALIDADE DOS PROGRAMAS DE TELEVISÃO BRASILEIRA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. TELECOMUNICAÇÃO.:
  • CONGRATULANDO-SE COM A REELEIÇÃO DO JORNALISTA PAULO CABRAL PARA A PRESIDENCIA DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE JORNAIS - ANJ. QUESTIONANDO A QUALIDADE DOS PROGRAMAS DE TELEVISÃO BRASILEIRA.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/1996 - Página 1629
Assunto
Outros > HOMENAGEM. TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • CONGRATULAÇÕES, REELEIÇÃO, PAULO CABRAL, JORNALISTA, PRESIDENCIA, ASSOCIAÇÃO NACIONAL, JORNAL, BRASIL.
  • DEFESA, REGULAMENTAÇÃO, LEI DE IMPRENSA, TRAMITAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, DISCIPLINAMENTO, PROGRAMAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, AUMENTO, RESPONSABILIDADE, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, DIVULGAÇÃO, NOTICIARIO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de entrar no objeto do meu pronunciamento, especificamente, queria me congratular com a reeleição do jornalista Paulo Cabral para a presidência da Associação Nacional de Jornais.

Cearense, inclusive militou na política estadual, foi prefeito de Fortaleza, deputado estadual, depois galgou elevados postos no condomínio dos Diários Associados, do qual hoje é presidente, e é reeleito para a presidência da Associação Nacional de Jornais, onde tem se desincumbido de maneira altamente elogiável nas suas funções. E aqui estou recebendo o apoio dos Senadores Bernardo Cabral e João França, que comigo também se congratulam com a reeleição do Presidente da ANJ, jornalista Paulo Cabral.

Li, na imprensa, que S. Sª, em seu discurso de posse, defendeu intransigentemente a liberdade de imprensa. Não há democracia onde não há liberdade de imprensa; as duas caminham juntas. Ele condenou - e aí talvez a nossa concordância não seja absoluta - o projeto da Lei de Imprensa que está tramitando no Congresso Nacional. Aliás, o Senador Josaphat Marinho foi o autor do projeto, relatado pelo Senador José Fogaça e remetido à Câmara dos Deputados, onde tem tido uma tramitação lenta. Diariamente há pronunciamentos de Senadores e Deputados demonstrando um certo inconformismo com o tratamento que a imprensa tem dado a certas questões, seja no que tange à atuação de homens públicos, seja em relação a outras questões.

Quero abordar hoje aqui uma delas, valendo-me de copioso material divulgado nos jornais de Brasília, de São Paulo e do Rio de Janeiro.

As matérias referem-se a programas de televisão. Há aqui, por exemplo, um artigo do jornalista José Nêumanne, "Lenocínio no ar", referindo-se a um programa, transmitido em uma determinada rede de televisão, de cunho - para não usar o termo pornográfico - pelo menos licencioso. Tais programas não são apresentados agora mais durante as madrugadas para divertir noctívagos, mas em horários em que adolescentes e crianças podem vê-los, deparando-se com cenas que não são nada recomendáveis.

O artigo publicado no Jornal da Tarde, sexta-feira, 6/9, termina assim:

      "Antes que os brasileiros de bem se vejam obrigados a pedir censura para o lenocínio eletrônico via satélite, é bom que sejam impostos limites claros para essa banalização venal do prazer".

Há outras matérias. Por exemplo, o Jornal do Brasil, de terça-feira, 10/09/96, traz a seguinte manchete: "Globo monta circo dos horrores".

Ou seja, programas de televisão exploram o insólito, exploram deficiências físicas das pessoas ou expõem certas pessoas ao ridículo, querendo com isso fazer humor, atrair a atenção da audiência. É, evidentemente, algo com que não podemos concordar. Não é maneira de obter-se audiência, sob qualquer pretexto, expor as pessoas ao ridículo ou fazer certos tipos de programas que constrangem.

Está aqui no Jornal da Tarde, de quarta-feira, 11/09/96 a seguinte manchete: "Faustão contra baixarias na TV - diz que Globo procurou SBT para ambos melhorarem o nível das tardes de domingo. Emissora paulista nega."

O Ministério da Justiça, recentemente, aboliu qualquer tipo de legislação ou de decreto, ou regulamentação - está aqui presente o ex-Ministro da Justiça, Senador Bernardo Cabral - a pretexto da liberdade de imprensa. Nós não vamos discutir esse assunto, até para respeitar a Constituição, que diz ser livre a manifestação de pensamento, e, portanto, a expressão das pessoas. Agora, pergunto: qual é o termo para isso, qual é o limite para isso?

Na Inglaterra, por exemplo, a BBC tem um rigoroso código de ética da própria emissora. Aqui, fala-se que a ABERT, que é o órgão que congrega as emissoras de rádio e de televisão, ou que cada emissora iria estabelecer um código de ética. Entretanto, o que podemos observar no momento é o absoluto descontrole, o absoluto desregramento.

Não sou moralista, não estou movido aqui por nenhum tipo de desejo de fazer censura de caráter moral, religioso ou seja o que for, mas reconheço que, a continuarmos assim, vamos entrar numa liberalidade perigosa. Estão-se atingindo crianças, adolescentes, pessoas que ainda não estão com a sua formação concluída. Portanto, eu me pergunto: o que devemos fazer diante disso?

O Sr. Jefferson Péres - V. Exª permite-me um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço o Senador Jefferson Péres, com toda a atenção.

O Sr. Jefferson Péres - Senador Lúcio Alcântara, os jornais dos últimos dias têm-se ocupado muito desse assunto, diante das baixarias que aconteceram em alguns programas de grande audiência, em horário em que as crianças ainda assistem à televisão. Evidentemente, ninguém deseja a censura à televisão; como bem disse V. Exª, ninguém quer censura à televisão, porque a própria Constituição proíbe e porque isso não seria bom. A censura é sempre perigosa. No entanto, a licenciosidade atual realmente não pode continuar. É uma empulhação, Senador Lúcio Alcântara, dizer-se que o telespectador sempre pode mudar de canal ou desligar. Ora, em primeiro lugar, muitas vezes os programas nos tomam de surpresa; em segundo lugar, nem sempre as crianças estão sob as vistas dos pais. Muitas vezes elas estão sozinhas porque os pais saíram ou não se encontram naquele aposento, e as crianças assistem a esses espetáculos que, sem nenhum moralismo - todos de bom-senso concordarão -, são impróprios realmente para um público infantil. Como a censura não é desejável, há duas opções: ou a ABERT estabelece um rígido código de ética - e leio hoje, com satisfação, num dos jornais, que ela está elaborando ou que já teria elaborado esse código -, ou então, Senador Lúcio Alcântara, o Ministério da Justiça volta a estabelecer as faixas etárias. Como está, com a libertinagem atual, não é possível.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Senador Jefferson Péres, o artigo "Boni condena excessos", do Jornal do Brasil de quarta-feira, 11 de setembro, diz: "O Vice-Presidente de Operações da Globo repreende diretores pelo mau gosto do Domingão do Faustão e do Sai de Baixo". É a seguinte declaração atribuída ao Diretor Carlos Manga: "Foi um tiro que saiu pela culatra." "Talvez tenhamos errado em não falar que o Rafael foi abandonado pelos pais".

A exposição ao ridículo de uma pessoa de estatura mínima é até uma ofensa aos direitos humanos. É a exploração do bizarro, do insólito, ridicularizando as pessoas.

Já o artigo "Domingo de horrores", do Correio Braziliense de quarta feira, 11 de setembro, diz:

      "...seios, coxas e traseiros femininos se tornaram munição obsoleta na guerra pela audiência travada entre a Globo e o SBT todas as tardes de domingo. Para manter a liderança, os produtores de Domingo do Faustão e Domingo Legal perdem de vez o bom senso e apelam cada vez mais para o bizarro."

Há, felizmente, uma grita da imprensa escrita contra esse tipo de programa que está incomodando a sociedade por suas características e pela forma como penetra, como V. Exª disse muito bem, em todos os lares.

Nos Estados Unidos atualmente existe uma lei que obriga a colocação de um chip no aparelho de televisão que permite aos pais, quando saem de casa, programarem o televisor para somente captar determinados canais. É uma forma de censura, mas é uma maneira adequada para que as crianças não tenham acesso a esse tipo de programas que são impróprios realmente para elas, que não estão na faixa etária que permita apreciar esses programas que podem comprometer seriamente sua formação.

O Sr. Bernardo Cabral - Sr. Senador Lúcio Alcântara, V. Exª me concede um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço o nobre Senador, com prazer.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador Lúcio Alcântara, V. Exª aborda um tema para o qual é difícil se encontrar uma situação razoável, pois traz a tona vários aspectos. Primeiro, um problema familiar grave, qual seja, o da educação dos adolescentes. Segundo, o problema da censura. Terceiro, o meio termo. Quando V. Exª começou dizendo que antigamente os programas destinavam-se aos noctívagos e que hoje são transmitidos mais cedo - veja bem - V. Exª referiu-se ao horário do sul do País, pois alguns Estados têm duas horas de diferença apenas no fuso horário. No Acre, por exemplo, o garoto assiste às 20h àquilo que é levado às 22h nos outros estados. Ele começa a ser despertado para o que chamamos de anomia, que é um desvio de comportamento, à vista de um órgão que deveria ser o primeiro a ter cuidado com sua programação. V. Exª lembra a época que estive no Ministério da Justiça, mas, como já se vão seis anos, digo-lhe o que fizemos. Eu e o encarregado desse Departamento no Ministério da Justiça fizemos uma reunião com todos os diretores de programação das TVs, demonstrando o número de cartas que, àquela altura, já chegavam ao Ministério da Justiça pedindo censura - o termo é esse - às novelas que traziam embutidas na sua programação cenas não muito recomendadas. Ora, se fôssemos censurá-las, iríamos contra a Constituição, para a qual V. Exª tão bem contribuiu para o seu texto. Com essa reunião houve uma espécie de autolimitação, imposta pela própria emissora. Durante algum tempo, até eu sair do Ministério, realmente os programas foram melhorados. Agora, V. Exª chama atenção para um outro aspecto, que já não é só o sexo na base eletrônica, mas é a diminuição do ser humano, é alguém ser levado ao ridículo de fazer rir, em função de um desalento que já lhe marcou para o resto da vida. Ora, a abordagem de V. Exª é inequívoca e induvidosamente difícil, que V. Exª consegue transformar com facilidade, à vista da sua experiência de médico e de político lidando com o ser humano. O que eu quero trazer à colação, Senador Lúcio Alcântara, é mostrar que precisamos ter cuidado, nós, os políticos, em não apontar somente o caminho mas também indicar a solução. V. Exª é fértil nesse campo, porque, como dizia, exercendo a Medicina, faz o diagnóstico e dá a terapêutica. Tenho a certeza de que, ao final, V. Exª vai convocar seus Colegas, seus Pares, para que todos, juntos, possamos levar à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, da qual V. Exª é vice-Presidente, algum trabalho neste sentido. Quando mais não seja, convidar os editores dos programas de televisão para trocar idéias conosco a esse respeito. Meus cumprimentos.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Muito obrigado, Senador Bernardo Cabral. Realmente, não há uma receita para esse propósito. E é até um tema delicado, porque muitas pessoas identificam isso como uma espécie de moralismo, de alguma motivação que cerceie o direito de expressão, a liberdade de expressão que a Constituição assegura. Mas não é o caso. O que pretendo é que a questão seja discutida.

Veja V. Exª, por exemplo, que a edição de quarta-feira, dia 11 de setembro de 1996, do jornal Folha de S.Paulo, traz a seguinte manchete: "Diretor quer código de ética para domingo".

No domingo passado, o programa "Domingão do Faustão" apresentou ao vivo o garoto Rafael, de 15 anos. Ele tem problemas de crescimento e mal chega à altura do joelho de Fausto Silva. Como o jovem imita o cantor Latino, foi apelidado de Latininho.

      "Não gosto disso - afirmou o apresentador à Folha. Uma coisa é comandar um programa popular, outra é descambar para o popularesco".

Faustão disse que colocou Latininho no ar em comum acordo com Manga.

      "Ele também detesta apelação, acontece que a concorrência nos pressiona e a gente tem que enveredar pelo sensacionalismo" - desculpa-se. O Domingo Legal de Gugu Liberato costuma exibir mulheres seminuas e aberrações, como o menino lobisomem do México".

Penso que aqui cabe inclusive a intervenção do Ministério Público, da Justiça, do Juizado de Menores, para evitar que essas crianças sejam manipuladas, sejam alvo do ridículo, para provocar algum tipo de humor negro. 

      "A briga pela audiência precisa de parâmetros, o vale-tudo não vai nos levar a lugar nenhum", afirma Fausto Silva.

Então, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que quero com este pronunciamento é chamar a atenção para a necessidade de se estabelecer esses parâmetros, ou com a ação do Poder Público, do Estado, ou, se a melhor fórmula for a do sistema de auto-regulamentação, que essas emissoras de televisão se autodisciplinem, no sentido de preservar as nossas crianças, de preservar os telespectadores dessas exibições que não acrescentam nada no sentido de melhorar a nossa cultura, o lazer sadio que todos nós precisamos e ao qual temos direito.

Em relação à Lei de Imprensa, entendo que o que o Congresso tem que fazer é encontrar uma solução justa, nada que traga uma censura econômica à imprensa, nada que inviabilize a sua liberdade de expressão, mas que também dê aos jornalistas e aos proprietários dos órgãos de comunicação maior responsabilidade na veiculação e difusão de notícias e informações.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/1996 - Página 1629