Discurso no Senado Federal

QUADRO DE DESIGUALDADES E CARENCIAS RELATIVAS AO PERFIL DA POBREZA NO BRASIL.

Autor
José Alves (PFL - Partido da Frente Liberal/SE)
Nome completo: José Alves do Nascimento
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • QUADRO DE DESIGUALDADES E CARENCIAS RELATIVAS AO PERFIL DA POBREZA NO BRASIL.
Aparteantes
Bernardo Cabral.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/1996 - Página 4760
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, PAIS, COMPARAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, CARENCIA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL.
  • AUMENTO, DESIGUALDADE SOCIAL, DESIGUALDADE REGIONAL, PESQUISA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), BANCO MUNDIAL, CONCENTRAÇÃO, POBREZA, REGIÃO NORDESTE.
  • NECESSIDADE, CONTENÇÃO, DESEMPREGO, PRIORIDADE, AGRICULTURA, PEQUENO PRODUTOR RURAL, APOIO, SUBSIDIOS, CREDITO AGRICOLA, ASSISTENCIA TECNICA, JUSTO PREÇO.
  • NECESSIDADE, INVESTIMENTO, IRRIGAÇÃO, TURISMO, REGIÃO NORDESTE.

O SR. JOSÉ ALVES (PFL-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a economia brasileira, que já ocupou a oitava posição, em meados da década de 70, mesmo com as fases recessivas por que passou, parando de crescer com relação aos índices mais elevados que atingiu no período chamado de milagre brasileiro, ainda se coloca entre as dez maiores economias do mundo, com um potencial de desenvolvimento fantástico. Tem uma situação privilegiada nas Américas, quando consideramos fatores geográficos, climáticos, recursos naturais, capacidade industrial e agrícola instalada, serviços e equipamentos de infra-estrutura, nível de progresso tecnológico e capacidade criadora dos seus trabalhadores e da população em geral, o que tem demonstrado, ao longo dos anos, as extraordinárias condições do País de responder positivamente a estímulos e incentivos de progredir em qualquer área de atividade econômica, cultural ou desportiva.

Um país que progrediu como poucos na área de petróleo, siderurgia e mineração, telecomunicações, informática, construção civil, especialmente em construção de grandes usinas hidrelétricas, produção industrial e agrícola de elevada qualidade, posicionando-se, com destaque, na pauta mundial de exportações, quando há pouco mais de 50 anos era um País meramente importador de produtos manufaturados, apesar de ter crescido tanto, em quase todos os setores, ainda mantém imensas disparidades econômicas, sociais e regionais. São dois brasis: um, de primeiro mundo, rico e bem-servido; outro, de terceiro ou quarto mundo, pobre e desamparado.

Sou um entusiasta das grandes conquistas e dos permanentes sucessos que temos alcançado em todas as áreas da atividade econômica, cultural ou desportiva de nosso País, em muitos setores nada ficamos a dever com relação ao progresso alcançado em outros países desenvolvidos.

A inteligência brasileira tem cumprido enormes desafios em termos de coragem, competência e criatividade na realização de tarefas grandiosas ou complexas, e seria cansativo enumerá-las, porque se diversificam desde importantes contribuições à ciência universal e tecnologia de ponta, até construções em imensas obras de engenharia.

O Brasil rico é admiravelmente desenvolvido, mas há uma triste realidade neste cenário, que é a existência de um País pobre e malservido, um Brasil abandonado ao seu próprio sofrimento e às suas carências.

Ainda somos um País em que 10% dos mais ricos detêm quase 50% da renda nacional, enquanto os 10% mais pobres ficam com menos de 1%, mais precisamente 0,7% de todos os rendimentos produzidos no País. Esses dados, que refletem um aspecto relevante da distribuição de renda na população, constam da edição anual da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), divulgada anteontem pelo IBGE.

As disparidades regionais e as desigualdades sociais são uma tragédia entre nós, porque esses desequilíbrios, ao longo das últimas décadas, independentemente da situação recessiva ou do crescimento do País, têm aumentado progressivamente com sérias repercussões na vida dos brasileiros.

Um outro relatório do Banco Mundial, elaborado por pesquisadores e estudiosos brasileiros e publicado no ano passado com o título de "Avaliação da Pobreza no Brasil", aponta uma série de informações sobre o perfil deste fenômeno social entre nós, que, desde algum tempo, já tem contornos de uma verdadeira tragédia, porque a pobreza, a miséria e a fome são geratrizes de problemas como a marginalidade e a violência. Com base neste estudo, temos 42 milhões de pobres e, destes, 24 milhões abaixo da linha de pobreza, entre os quais milhões de indigentes.

Falo sobre este assunto, Sr. Presidente, constrangido, porque a metade da população em situação de pobreza no Brasil é constituída de pessoas residentes no Nordeste, e na outra metade, dispersa pelo País, ocupando, na sua maior parte, as periferias urbanas, muitos também são migrantes de nossa região, uma região que participa com 30% da população nacional. Mas um em cada três nordestinos está vivendo abaixo da linha de pobreza, e um quarto de suas crianças, com menos de cinco anos, está sofrendo de desnutrição crônica.

De todos os pobres que vivem na zona urbana, 40% são residentes no Nordeste. A pobreza no Nordeste é desproporcional à sua participação na população e na formação da riqueza e da produção nacional.

Apesar dos recursos e do potencial de nossa região, fatores históricos e condicionantes de ordem econômica e política têm mantido e agravado a realidade regional com relação a outros centros mais desenvolvidos. Basta dizer que, enquanto a incidência da pobreza em Curitiba e Porto Alegre é de 7%, na zona rural do Nordeste este índice chega a 44%.

Quem mais tem contribuído para o agravamento desta triste realidade tem sido o nosso modelo de desenvolvimento, socialmente excludente e altamente concentrador de renda, numa convivência promíscua, antes, com a inflação, que privilegiava o capital especulativo e penalizava o trabalho, impondo à população um terrível imposto inflacionário, e, atualmente, apesar da contenção da inflação e da estabilização da moeda, os juros altos, que têm provocado o endividamento, a inadimplência e a inibição de investimentos que possam gerar empregos e, assim, os meios de subsistência de muitas famílias.

Além dos gastos sociais do Governo e dos programas assistenciais, que têm consumido consideráveis parcelas de recursos, mas ainda um tanto insuficientes, em setores como educação, saúde, previdência, alimentação, saneamento, habitação, serviços urbanos e outros, é urgente que se contenha o desemprego, principal artífice da pobreza e da miséria, e se priorize a agricultura, especialmente a agricultura familiar.

Esta atividade não somente desestimula a migração e o êxodo rural, como também cria ocupações na zona rural, o que é socialmente mais vantajoso do que se concentrarem investimentos na agricultura extensiva, altamente mecanizada, que, embora possa contribuir com monoculturas de exportação, pouco contribui para a geração de empregos no campo.

O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ ALVES - Com muito prazer, Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador José Alves, V. Exª aborda com propriedade essa temática, sobretudo a questão das altas taxas de juros, que no Nordeste causa problemática de difícil elucidação no campo da educação, e que agora V. Exª passa para a agricultura. Quero me associar a V. Exª com relação a essa análise densa, oportuna que faz, demonstrando que o Governo, através da sua área econômica, precisa olhar o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste com um pouco mais de atenção. Temos, e sobretudo V. Exª, no seu Estado, dificuldades que jamais poderão ser resolvidas por uma tecnoburocracia que não entende, porque ali não vive, e não sente o drama do nordestino. De modo que me associo às palavras de V. Exª nessa análise objetiva que está fazendo.

O SR. JOSÉ ALVES - Agradeço ao Senador Bernardo Cabral o seu aparte e, com muito orgulho, incorporo-o ao nosso pronunciamento.

Prossigo nosso discurso, Sr. Presidente. A força da atividade rural, na maior parte dos produtos agrícolas, vem justamente da agricultura familiar e das pequenas propriedades, que empregam 80% da mão-de-obra do campo, mas precisam, urgentemente, do apoio de crédito subsidiado, assistência técnica e preços justos.

As dificuldades no campo, nos últimos anos, estimularam o êxodo rural, contribuindo para a urbanização desordenada das periferias das cidades, aumentando, assim, o cinturão de pobreza, miséria e violência desses centros, transformando antigos produtores e trabalhadores agrícolas em pessoas pobres, indigentes ou bóias-frias.

A erradicação da pobreza no País, minorando as graves disparidades regionais, não se constitui em solução de curto prazo. É uma questão de prioridade, investimentos racionais e vontade política duradoura.

Investimentos substanciais no setor de irrigação no Nordeste, que dispõe em suas bacias hidrográficas de áreas propícias à fruticultura, seriam capazes de beneficiar com emprego e renda mais de 20 milhões de pessoas, contribuindo para o fortalecimento da economia da região.

Dois milhões e meio de hectares que poderão ser irrigados com R$15 bilhões, que é o volume de recursos já comprometido com o Proer, seriam capazes de reverter a situação vergonhosa da pobreza e da indigência no Brasil.

Outra alternativa de investimentos rentáveis na região diz respeito ao imenso potencial da exploração do turismo no Nordeste, que reúne condições excepcionais de clima, natureza, história e cultura para o desenvolvimento desta atividade, uma das que mais crescem no mundo, inclusive enriquecendo regiões como o Caribe, com quem podemos competir alternativamente na oferta mundial de opções aos viajantes estrangeiros.

Concluo este pronunciamento, Sr. Presidente, esperando poder suscitar, entre os membros desta Casa, uma profunda reflexão sobre o quadro de desigualdades e de enormes carências relativas ao perfil da pobreza no Brasil e das soluções que possam resolver questão tão prioritária e urgente para que o nosso País encontre o seu destino de verdadeira grandeza e justiça social.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/1996 - Página 4760