Discurso no Senado Federal

PROTESTOS DE FAZENDEIROS DO MUNICIPIO DE CACERES/MT, FRONTEIRA COM SAN MATHIAS, CIDADE BOLIVIANA, EM REPUDIO AOS SAQUES OCORRIDOS EM SUAS FAZENDAS. ABANDONO DO SETOR ALGODOEIRO. COMENTANDO ARTIGO DO EX-SECRETARIO DE AGRICULTURA DO ESTADO DE SÃO PAULO PROFESSOR ROBERTO RODRIGUES, PRESIDENTE DA ALIANÇA COOPERATIVISTA INTERNACIONAL PARA AS AMERICAS, QUE ABORDA O GENOCIDIO NA COTONICULTURA DO BRASIL.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • PROTESTOS DE FAZENDEIROS DO MUNICIPIO DE CACERES/MT, FRONTEIRA COM SAN MATHIAS, CIDADE BOLIVIANA, EM REPUDIO AOS SAQUES OCORRIDOS EM SUAS FAZENDAS. ABANDONO DO SETOR ALGODOEIRO. COMENTANDO ARTIGO DO EX-SECRETARIO DE AGRICULTURA DO ESTADO DE SÃO PAULO PROFESSOR ROBERTO RODRIGUES, PRESIDENTE DA ALIANÇA COOPERATIVISTA INTERNACIONAL PARA AS AMERICAS, QUE ABORDA O GENOCIDIO NA COTONICULTURA DO BRASIL.
Aparteantes
Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 17/10/1996 - Página 17122
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, PROTESTO, FAZENDEIRO, FRONTEIRA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, OMISSÃO, GOVERNO, REFERENCIA, ROUBO, PROPRIEDADE RURAL, CONTRABANDO, TRAFICO, REGIÃO.
  • ANALISE, TEXTO, AUTORIA, ROBERTO RODRIGUES, PRESIDENTE, ORGANIZAÇÃO, COOPERATIVISMO, AMBITO INTERNACIONAL, DENUNCIA, OMISSÃO, ABANDONO, GOVERNO, SETOR, AGRICULTURA, CULTIVO, ALGODÃO, AUMENTO, DESEMPREGO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT).
  • SOLICITAÇÃO, ARLINDO PORTO, FRANCISCO DORNELLES, PEDRO MALAN, ANTONIO KANDIR, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA AGRICULTURA (MAGR), MINISTERIO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO (MIC), MINISTERIO DA FAZENDA (MF), MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), ATENÇÃO, REFORÇO, SETOR, CULTIVO, ALGODÃO, PAIS.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna do Senado nesta tarde a fim de abordar dois assuntos importantes para o meu estado.

O primeiro deles é o protesto, iniciado no final da semana passada e com prosseguimento nesta, promovido pelos fazendeiros da região da grande Cáceres, fronteira com San Mathias, cidade boliviana ao extremo oeste do meu Estado, hoje zona de livre comércio.

Nos últimos dois anos, mais de 100 fazendas foram assaltadas por maus brasileiros e maus bolivianos, que usam o poder da força para atemorizar os produtores rurais daquela região e roubar-lhes equipamentos e veículos, chegando, às vezes, a matar funcionários das fazendas.

Nos últimos dias, a tensão chegou ao ponto máximo, ocasionando o fechamento da BR-070, que liga Cáceres a San Mathias, na Bolívia. Todos os fazendeiros fizeram um cordão de isolamento naquela rodovia internacional, impedindo qualquer circulação de veículos com destino à Bolívia ou ao Brasil. Isso ocasionou protestos brasileiros e bolivianos, porque uma das medidas tomadas foi o corte de energia elétrica da Cidade de San Mathias e de outras pequenas vilas bolivianas abastecidas pelas Centrais Elétricas de Mato Grosso - Cemat.

Os proprietários brasileiros tomaram essa atitude para que houvesse uma reação das autoridades bolivianas. Essas, infelizmente, não tomaram conhecimento. Pelo contrário, o subprefeito do Município de San Mathias, Sr. Fausto Achaval Salvatierra, e integrantes da Guarda Nacional da Bolívia têm dado cobertura aos assaltantes e assassinos, favorecendo a recepção desses equipamentos e veículos roubados que, em sua maioria, são trocados por tóxicos (mormente cocaína) que passam a ser transportados para o Brasil.

Há uma luta desigual. A polícia matogrossense da guarnição do 6º BPM, sediada em Cáceres, usa revólveres calibre 38; enquanto os bandidos usam armas de grosso calibre, com tecnologia mais avançada. O Exército Brasileiro praticamente abandonou nossas fronteiras. Os cortes que ocorreram deixaram a linha seca que há entre os dois países muito pouco guarnecida. Isso traz àquela região uma enorme insegurança.

Há centenas de brasileiros delinqüentes, chefiados por bolivianos, que se aproveitam dessa situação. Só nesse período várias vidas foram perdidas e mais de 100 fazendas foram saqueadas.

Isso é muito triste para nós que fazemos fronteira com a Bolívia e que queremos a integração do continente latino-americano. Além disso, uma das grandes saídas para o nosso desenvolvimento é justamente pelo Pacífico, passando por Cuiabá, Cáceres, San Mathias, Santa Cruz de La Sierra, com duas opões de saída: o Porto de Arica, no Chile, ou o Porto de Ilo, no Peru.

O Sr. Romero Jucá - Permite V. Exª um aparte?

O SR JÚLIO CAMPOS - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Romero Jucá - Senador Júlio Campos, V. Exª faz uma denúncia grave e extremamente importante para a população do Mato Grosso. Gostaria de apoiar as palavras de V. Exª e sugerir que essa denúncia seja encaminhada pela Mesa à Polícia Federal, ao Itamaraty - ao Ministro das Relações Exteriores - e também ao Ministro do Exército. Não é possível que as autoridades federais se omitam num momento desses e deixem, como V. Exª relata, a população da fronteira entregue à própria sorte em meio ao contrabando e o narcotráfico. Quero aplaudir V. Exª pela preocupação com a população do seu Estado e dizer que, em nome do PFL, estamos solidários não só com a denúncia, mas também com o pedido de providências que V. Exª está encaminhando.

O SR. JÚLIO CAMPOS - Muito grato fico ao Senador Romero Jucá, Líder em exercício do Governo nesta Casa e da nossa Bancada, o PFL. Tenho, realmente, que lamentar a situação difícil em que vivem as cidades fronteiriças de Mato Grosso, principalmente a região da grande Cáceres, que faz fronteira em linha seca com o território boliviano.

O nosso grande sonho de integração está indo abaixo, porque a rodovia que serviria para integrar Mato Grosso com o resto da América do Sul hoje está servindo de rota para os narcotraficantes que têm dela usado e abusado.

Por exemplo, o jornal Folha do Estado, de Mato Grosso, editado em Cuiabá, diz que os moradores do vilarejo próximo ao posto da Guarda Nacional disseram ter visto alguns fazendeiros, acompanhados de funcionários da CEMAT, cortando... Ora, é o último recurso que tinham. Dessa forma, estão dando um alerta para o governo boliviano. Se não houver uma segurança mínima, não será possível fornecer energia elétrica para aquela cidade. Além disso, há o problema da rota.

A Polícia Federal, lamentavelmente, tem um pequeno posto na cidade de Cáceres, que conta com menos de trinta policiais. Não é possível que uma fronteira com mais de 500 quilômetros de linha seca esteja a cargo de apenas trinta homens.

Neste instante, faço um apelo para que o Itamaraty, o nosso Ministério das Relações Exteriores, intervenha com urgência junto ao governo boliviano.

Já houve, inclusive, ameaças por parte dos narcotraficantes, quando a polícia de Mato Grosso, uma pequena guarnição do Exército brasileiro naquela região, policias federais e mais a Polícia Rodoviária resolveram interferir. Eles disseram que, se for construído o gasoduto Brasil-Bolívia, eles o explodirão. Antes da obra ser iniciada já há ameaças, porque eles acham que aquela fronteira tem que estar livre para que possam fazer os absurdos contrabandos e assaltos que têm feito.

O segundo assunto que vou abordar na tarde de hoje, Sr. Presidente, é um artigo muito bem produzido pelo Dr. Roberto Rodrigues, que é ex-Secretário da Agricultura de São Paulo e presidente da Aliança Cooperativista Internacional para as Américas. Ele aborda o genocídio na cotonicultura do Brasil e os erros sucessivos do Governo com relação a esse assunto.

Quero apenas realçar alguns trechos desse artigo, o qual vou pedir para ser incluso no meu discurso:

      Poucas atividades foram tão dramaticamente prejudicadas por políticas públicas nefastas como a cotonicultura. Sucessivos erros nas ações governamentais, frutos até da visão estreita e de curto prazo de alguns segmentos da área têxtil, transformaram o Brasil, de grande exportador mundial de fibra de algodão, em segundo maior importador. Isso ocorreu em pouco mais de cinco anos.

      Este assunto traz à baila uma questão maior: deve ou não deve o Estado interferir na política agrícola? Em caso positivo, qual é o seu papel? A resposta é óbvia: as políticas públicas, no que diz respeito ao setor agropecuário e agroindustrial, devem-se restringir a dar aos agentes econômicos igualdade de condições para competir - com concorrentes de outros países. Ninguém pleiteia nenhum tipo de privilégio que mascare ineficiência ou desvantagens cooperativas.

Quanto a isso, ele ressalta o seguinte:

      Em 1982, tínhamos 3,6 milhões de hectares cultivados com algodão. Em 1996, serão 970 mil hectares, quatro vezes menos. Para um consumo interno de 850 mil toneladas, teremos no próximo ano uma colheita máxima de 400 mil toneladas de algodão em pluma.

Vamos ter que importar o dobro do que produzimos.

Continua o Dr. Roberto Rodrigues:

      Com isto, gastaremos US$1,15 milhão para importar algodão, óleo, farelo e línter. Vamos perder oportunidade de conquistar mercados externos, que já tivemos. Em 1990, exportamos 47 mil toneladas de fio de algodão e, em 1996, este número caiu para o desprezível seis mil toneladas, oito vezes menos

      Pior ainda. Neste período (1991 a 1996), calcula-se que mais de 200 mil pessoas ficaram desempregadas em toda a cadeia produtiva do algodão. Ora, se um dos grandes problemas atuais do Brasil é o desemprego - já denunciei desta tribuna -, como deixar acontecer, soltando rojões, quando se instala uma fábrica de autopeças criadora de mil empregos?

Comemora-se uma grande vitória. No entanto, só no setor do algodão, 200 mil pessoas estão desempregadas.

Há poucos dias, no Palácio Laranjeiras, no Rio de Janeiro, com as presenças do Governador Marcelo Alencar, de todo o Governo brasileiro, de Ministros de Estado e especialmente do Ministro da Indústria e Comércio, comemorou-se a instalação de uma fábrica de caminhões Volkswagen, que geraria mil empregos. Ocupei a tribuna na oportunidade para elogiar essa decisão.

Entretanto, o setor de algodão está desempregando 200 mil pessoas. Ora, meu Deus, temos que repensar este Brasil!

Hoje mesmo, vi pela televisão, no programa Aqui e Agora, que uma firma de São Paulo resolveu abrir vaga para 15 ou 20 pessoas trabalharem e havia 5.000 pessoas na fila, principalmente jovens.

Há poucos dias, a TELEMAT - Telefônica Mato-Grossense, empresa da Telebrás, fez um concurso em Cuiabá para 50 vagas de Agente Administrativo e teve 7.200 candidatos para 50 vagas.

Com toda essa crise de desemprego, o setor do algodão neste País está abandonado. Aqui diz:

      É surpreendente a cegueira geral quanto a este assunto. A indústria têxtil brasileira se modernizou, o País tem mercado promissor e grandes possibilidades no mercado externo. Temos novas variedades com ótima produtividade e boa qualidade de fibra. A cotonicultura dá origem a empregos, ajuda na balança comercial e garante a estabilidade social no interior do País.

Isso ocorre principalmente em Estados como São Paulo, Mato Grosso, Paraná, Goiás e os do Nordeste, que já foram grandes produtores de algodão. Todavia, nenhum incentivo tem dado mais a esse setor de importância vital para o País.

Portanto, quero registrar, nos Anais desta Casa, esse artigo muito bem feito, muito bem colocado por parte do Engenheiro Agrônomo e Professor Roberto Rodrigues, que é hoje Presidente da Aliança Cooperativista Internacional para as Américas.

Ele conclui o seu artigo dizendo:

      É preciso um pouquinho só de bom senso para resolver tudo isto, sem nenhum custo para a Nação e com geral benefício para o povo.

Neste instante, faço um apelo ao Exmº Sr. Ministro da Agricultura, nosso eminente colega Senador Arlindo Porto, ao Sr. Ministro da Indústria e do Comércio, Deputado Francisco Dornelles, e aos próprios Ministros da área econômica, Dr. Pedro Malan, Dr. Antônio Kandir, para que sensibilizem o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso no sentido de não deixar um setor tão importante para o País, como é o setor algodoeiro, perecer da maneira que vem perecendo. Vamos reerguer a agricultura e a indústria algodoeira neste País, para evitar essa história de importarmos roupas da China a preço de vintém, matando a indústria nacional.

Quero dizer ao Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso que é necessário que seu Governo se volte para esse importante setor deste País. Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/10/1996 - Página 17122