Discurso no Senado Federal

REFLEXÃO SOBRE A EDUCAÇÃO NO BRASIL, A PROPOSITO DO DIA DO PROFESSOR.

Autor
Sandra Guidi (PPB - Partido Progressista Brasileiro/SC)
Nome completo: Sandra Zanatta Guidi
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.:
  • REFLEXÃO SOBRE A EDUCAÇÃO NO BRASIL, A PROPOSITO DO DIA DO PROFESSOR.
Publicação
Publicação no DSF de 16/10/1996 - Página 17003
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.
Indexação
  • ANALISE, AUSENCIA, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO, BRASIL, EFEITO, ANALFABETISMO, ABANDONO, ESCOLARIZAÇÃO, ALUNO REPETENTE, INFERIORIDADE, QUALIDADE, ENSINO, FALTA, PREPARO, MÃO DE OBRA, SUBDESENVOLVIMENTO.
  • NECESSIDADE, MELHORIA, QUALIFICAÇÃO, PROFESSOR, AMBITO, FORMAÇÃO PROFISSIONAL, VALORIZAÇÃO, SALARIO.
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, PROFESSOR.

A SRª SANDRA GUIDI (PPB-SC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, "se eu não fosse Imperador" - disse certa vez D. Pedro II - "desejaria ser professor. Não conheço missão maior e mais nobre que a de dirigir as inteligências juvenis e preparar os homens do futuro".

O Imperador não estava brincando. Nas horas vagas, tinha enorme satisfação de assistir às aulas do Colégio Pedro II para acompanhar de perto o progresso dos alunos que ali estudavam.

Conta-se que certa vez, em visita a São Paulo, ele manifestou o desejo de visitar a Faculdade de Direito do Largo do São Francisco. Avisados, os professores empenharam-se em preparar lições brilhantes. Leram obras atualizadas, ensaiaram a exposição em casa, buscaram situações novas e exemplos criativos. No dia aprazado, lá estava o Imperador. Sentado no fundo, como um aluno qualquer. A aula - desnecessário dizer - mereceu o aplauso dos alunos e, claro, do ilustre visitante.

Um estudante, encantado com o alto nível da exposição, foi cumprimentar o professor. Entre elogios e reverências, pediu-lhe que mantivesse, dali por diante, o mesmo nível de ensinamentos. "Essa aula", respondeu-lhe o mestre, "foi aula de imperador".

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brincadeira à parte, o exemplo de D. Pedro II conduz a uma reflexão obrigatória. Se, durante os 107 anos da República, tivesse sido mantido o entusiasmo do imperador pela educação, nossa história teria sido outra. Não estaríamos amargando a realidade que nos constrange, envergonha e condena.

Hoje, Sr. Presidente, no limiar de novo milênio, 20 milhões de brasileiros estão marginalizados pelo analfabetismo. Dos alunos que ingressam na escola, só 60% terminam a quarta série e 50%, a oitava. Destes, 70% repetem pelo menos um ano, consumindo 59,8% do investido em matrículas.

A repetência alia-se a dois outros grandes inimigos: a evasão escolar e a baixa qualidade do ensino. Como resultado, o Primeiro Grau passa a ser, para o País, um sorvedouro de investimentos. E, para os alunos mais necessitados, sinônimo de experiência frustrante, obrigados que são a abandonar a única chance de mudança que teoricamente lhes é posta ao alcance.

O preço dessa realidade indesejada é alto. Muito alto. E muito preocupante. A escolaridade média de nossa força de trabalho é de três anos e meio, uma das mais baixas dos países em desenvolvimento. Ora, considerando que 50% do conhecimento científico da humanidade foi produzido nos últimos dez anos - o que acarretou mudanças profundas nos modos de produção - uma pergunta se impõe: qual será o futuro do País, se a escola não for capaz de preparar o trabalhador para fazer frente aos desafios dos nossos tempos?

Com os recursos humanos que estão sendo preparados, Sr. Presidente, não precisa de bola de cristal para responder a pergunta formulada. O futuro nos reserva uma certeza nesta era de incertezas: a condenação irremediável ao atraso e ao subdesenvolvimento.

Estudo recente do Banco Mundial concluiu que o desenvolvimento assombroso dos países do leste da Ásia se deve a dois fatores conjugados: baixos índices de inflação e alto nível de educação. Com ênfase, claro, no ensino fundamental.

Sr. Presidente, preclaros Senadores, não é por acaso que ocupo a tribuna para falar do ensino. Hoje são 15 de outubro, Dia do Professor. Mais do que oportunidade de merecidas homenagens, é momento de repetir uma verdade acaciana.

A elevação do patamar da qualidade da escola passa, necessariamente e irremediavelmente, pela melhor qualificação do professor. Estou falando, Sr. Presidente, de duas imposições: melhor preparação intelectual e técnica por um lado e, por outro e principalmente, valorização financeira do trabalho no magistério.

O salário médio do professor é de R$78,00, menos que um salário mínimo. Há professores que ganham por mês - pasmem - R$23,00. É claro, são pessoas de baixa qualificação, que vão formar gerações de baixa qualificação.

Junto com o aperto do contracheque - eis outra verdade acaciana - estreita-se a qualidade do ensino. Para ganhar mais, o professor precisa submeter-se à dupla ou tripla jornada de trabalho. Passa o dia inteiro dentro da sala de aula ou do ônibus, indo de uma escola para outra.

É o malabarismo necessário à sobrevivência. De onde tirar tempo para estudar, preparar aulas, atualizar-se? Isso neste final de milênio, em que o conhecimento é a maior fonte de riqueza do homem e do país.

O Ministro da Educação tem-se revelado sensível ao problema. Faz parte do seu discurso a afirmação de que é necessário valorizar o professor do ensino básico, fixando um piso salarial que evite distorções acentuadas.

É pouco. Mas constitui um passo importante, passo que não pode esperar. Precisa ser dado já, acompanhado, claro, de medidas que possibilitem melhor preparo, reciclagem permanente e valorização do magistério.

Só assim se condenará ao desaparecimento o velho círculo vicioso que aprofunda, a cada dia, o nosso vergonhoso gap social. Professores despreparados, que formam alunos despreparados, que serão profissionais despreparados, que, por lhes faltarem condições de competir no mercado de trabalho, estão irremediavelmente condenados a se distanciar cada vez mais da única porta que lhes permite sair da pobreza e do atraso.

Neste Dia do Professor, vale lembrar que uma das causas de nosso subdesenvolvimento é a baixa qualidade do ensino. Olhar para ela obriga a encarar a realidade do professor. É pouco. Mas constitui um procedimento importante neste País que só tem denegrido e humilhado os professores por meio de salários indignos, condições de trabalho desumanas e total falta de respeito profissional.

Neste Dia do Professor, quero cumprimentar todos os professores do Brasil, e quero cumprimentá-los principalmente pela resistência que nos têm mostrado, que é um exemplo que só engrandece a nossa Pátria.

Muito obrigado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/10/1996 - Página 17003