Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O PLANO DE METAS INTITULADO 'BRASIL EM AÇÃO', ANUNCIADO PELO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO. IMPORTANCIA DA CONCLUSÃO DAS OBRAS FEDERAIS PARALISADAS AO LONGO DOS ANOS, ANTES DE SE INICIAREM OUTRAS. DESTACANDO O TRABALHO REALIZADO PELA COMISSÃO DE OBRAS INACABADAS.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO FEDERAL.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O PLANO DE METAS INTITULADO 'BRASIL EM AÇÃO', ANUNCIADO PELO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO. IMPORTANCIA DA CONCLUSÃO DAS OBRAS FEDERAIS PARALISADAS AO LONGO DOS ANOS, ANTES DE SE INICIAREM OUTRAS. DESTACANDO O TRABALHO REALIZADO PELA COMISSÃO DE OBRAS INACABADAS.
Aparteantes
Emília Fernandes.
Publicação
Publicação no DSF de 19/10/1996 - Página 17245
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO FEDERAL.
Indexação
  • ANALISE, PLANO DE AÇÃO, GOVERNO, CRITICA, FALTA, PRIORIDADE, CONCLUSÃO, OBRA PUBLICA, AUSENCIA, VALORIZAÇÃO, PATRIMONIO PUBLICO, DINHEIRO, CONTRIBUINTE, DESCUMPRIMENTO, COMPROMISSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, PLANO DE AÇÃO, AUSENCIA, FORMALIDADES, TRAMITAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, DEFICIENCIA, DETALHAMENTO, FONTE, DISCRIMINAÇÃO, RECURSOS, PROJETO.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o propósito do Governo Federal, amplamente noticiado, de fazer deslanchar um Plano de Metas para os dois últimos anos da atual administração - que se chamou, não de plano, mas de "Brasil em Ação" - suscitou, a princípio, um justificável júbilo. É evidente que todo o povo brasileiro anseia pelo dia em que, tendo sido superadas as grandes dificuldades nacionais, possa o Brasil, afinal, reingressar numa fase desenvolvimentista. Só assim, poderemos atender às angústias dos nossos compatriotas desempregados, especialmente da juventude que, pronta para integrar o mercado de trabalho, não encontra as oportunidades para as quais se considera preparada.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, para encontrar-se soluções para tantos dos nossos problemas, o fundamental, como todos sabemos, é que sejam injetados volumes consideráveis de recursos em nossa economia. É preciso que surjam empreendimentos da área pública e especialmente da área privada, que se traduzam em fábricas e outros empreendimentos industriais e comerciais, capazes de criar as atividades econômicas tão necessárias para absorver os que, hoje em dia, aguardam a oportunidade e o direito de usufruir renda para o seu sustento e o de seus familiares.

Ora, não se podia deixar, portanto, de aplaudir as metas anunciadas pelo Presidente da República, que estaria reservando bilhões e bilhões de reais para investimentos em todo o País.

Confesso, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que me mantenho preocupado com a programação anunciada pelo Palácio do Planalto. Já ocupei esta tribuna para registrar a decepção de muitos com o fato de que o programa "Brasil em Ação", ao contrário do que se esperava, não confirmou a palavra do próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso de que não daria início a obras novas antes de concluídas as obras federais paralisadas ao longo dos anos.

Na verdade, tenho para mim que um plano que fixasse como meta a conclusão das 2.214 (duas mil duzentos e quatorze) obras paralisadas alcançaria a mais alta relevância econômica e mesmo histórica. Com cerca de R$14 bilhões teria sido atingida tal meta, cuja repercussão econômica e social seria considerável. E nada impediria que outras obras - entre as que estão abrangidas nos R$80 bilhões estimados pelos planejadores - igualmente fossem acrescentadas ao desejo governamental de investir em todo o País.

O que me parece incoerente é que em uma excepcional programação de investimentos, como a do "Brasil em Ação", não se tivesse atentado para a premente necessidade de se salvar o sacrifício imposto aos contribuintes com as obras federais iniciadas e não concluídas.

Pergunto-me, Srs. Senadores: quantas das obras do "Brasil em Ação", que se iniciarão sob a atual administração, não estariam condenadas no futuro a se transformarem igualmente em obras inacabadas? Digo isso porque, ao darmos continuidade ao início de obras novas - não consideradas rigorosamente emergenciais - sem a conclusão das anteriores iniciadas, estaremos consolidando entre nós uma "cultura" da indiferença, em cujo contexto sobreleva-se um óbvio tripúdio ao dinheiro suado dos que pagam impostos. Aliás, impostos que compõem uma carga tributária que, segundo os especialistas no assunto, é uma das maiores do mundo.

Também me preocupa o fato de o referido "Brasil em Ação" não ter existência formal, pois, apesar de apresentar características de um plano nacional de desenvolvimento, como previsto no inciso IV do art. 48 da Constituição Federal, ainda não foi submetido ao Congresso Nacional, como exige a Constituição. Projeto dessa magnitude terá de ser submetido ao crivo dos representantes do povo, a quem deve competir, afinal, o soberano direito de escolher as prioridades nacionais.

De acordo com o expediente que encaminha o texto do programa, diz-se que se "trata de um programa voltado a intensificar a gestão de 42 projetos básicos de investimento na área social e de infra-estrutura, num montante total de cerca de R$80 bilhões, capaz de gerar, em sua condição mais ampla, algo em torno de 1 milhão e 500 mil empregos novos".

As informações apresentadas no trabalho não estão suficientemente detalhadas de forma que permitam concluir sobre a viabilidade da origem dos recursos ou de seu verdadeiro destino. Os dois quadros que o acompanham, no entanto, mostram que está previsto um montante total de R$79.234.500 bilhões para todo o período abrangido, sendo R$54 bilhões para o biênio 97/98, sem, no entanto, discriminar o valor de cada exercício.

Por outro lado, do total de recursos de origem fiscal a ser despendido no biênio, pode-se dizer que R$6.729 bilhões referem-se a ações de natureza social e apenas R$3.558 bilhões são destinados a investimentos de infra-estrutura, praticamente o mesmo valor deste ano.

Além disso, que outras fontes são essas, que, a despeito de sua relevância (mais de 41%) não puderam ser discriminadas? Por outro lado, não se esclareceu como serão aportados os significativos recursos do setor privado.

Segundo o programa anunciado, a título de investimentos no biênio, estão previstas ações como a pavimentação da BR-174, Hidrovia do Madeira, recuperação da BR-364, Hidrovia do São Francisco, novo modelo de irrigação, Pró-água, Prodetur, Porto de Pecém, recuperação descentralizada de rodovias, Hidrovia Tocantins-Araguaia e assim por diante.

Como se nota, mais da metade dos recursos terá aplicação em âmbito nacional, e as poucas informações constantes do trabalho não permitem visualizar a sua distribuição em termos de Unidade da Federação, tampouco de região.

Quando comparamos as obras propostas pelo Governo com as inacabadas, notamos, com absoluta clareza, que não houve qualquer intenção em conciliar as duas coisas. Assim, as obras paralisadas que constam do programa foram incluídas quase que por acidente. Senão, vejamos:

a) No caso das estradas, o programa é extremamente tímido: pavimentar a BR-174, duplicar a Fernão Dias, recuperar a BR-364, adequar a "Rodovia Mercosul". Permito-me perguntar, então: e as dezenas de outras rodovias já abertas em todo o País, mas principalmente no Nordeste, que estão à espera do tão prometido asfaltamento?

A Srª Emilia Fernandes - Permite V. Exª um aparte?

O SR. EDISON LOBÃO - Pois não. Ouço, com muito prazer, o aparte de V. Exª, nobre Senadora Emilia Fernandes.

A Srª Emilia Fernandes - Nobre Senador, minhas preocupações somam-se às que V. Exª manifesta da tribuna. Realizamos um trabalho conjunto, como integrantes da Comissão Especial que estudou e mapeou, em todo o Brasil, as obras inacabadas de responsabilidade da União. Na Presidência da Comissão estava o Sr. Senador Carlos Wilson e, na Relatoria, o Sr. Senador Casildo Maldaner. Todos os membros da Comissão ficamos profundamente preocupados com o resultado das análises. O trabalho foi realizado com muita responsabilidade. Ouvimos autoridades competentes, governadores, prefeitos, vereadores, lideranças locais de diferentes regiões do País. In loco, tivemos a oportunidade de constatar que se brinca e se joga fora o dinheiro do contribuinte. Em muitos casos, as pessoas não são nem responsabilizadas. Isto nos deixou profundamente preocupados. Fizemos esse trabalho na certeza de que seria uma contribuição para o próprio Governo Federal olhar mais detalhadamente, detidamente, observando o que poderia e o que deveria ser levado adiante, ou se até alguma obra deveria ser paralisada realmente, porque algumas nem sequer haviam sido iniciadas - não se encontrou praticamente a obra. Muitas obras - importantes obras - foram encontradas quase que em fase de conclusão. Se houvesse boa vontade e ainda uma destinação de recursos por parte do Governo Federal muita coisa poderia ser feita. Então, preocupa-nos também, assim como a V. Exª, essa desatenção, até certo ponto, com esta Casa, com essa Comissão que fez um trabalho sério. E, principalmente, porque neste País sempre ouvimos dizer que as coisas não vão para frente exatamente pela falta de continuidade. Entra governo, sai governo, isso ocorre em todos os níveis, seja municipal, estadual e federal, e não se dá continuidade aos projetos, porque não havia prioridade ou não foram iniciados por determinado partido ou governo. Isso realmente nos deixa profundamente entristecidos, toda essa situação de abandono em que se encontram a educação, a saúde e tantos outros setores, seja na parte de construção de rodovias, seja na de recuperação das mesmas. Pode-se até questionar esse projeto, quando as redes ferroviárias foram abandonadas e apostou-se nas rodovias. Pessoalmente eu faço esse questionamento. Mas, por outro lado, no momento em que o País assumiu essa política, no mínimo ela deveria ter continuidade. Porque hoje o que vemos são estradas que só têm o nome de estrada, na realidade não existem, dificultando toda ordem de desenvolvimento e, acima de tudo, colocando em risco as pessoas constantemente. Esses são apenas exemplos. O básico do meu aparte é somar-me à preocupação de V. Exª, cujo pronunciamento serve até como um certo apelo ao Governo Federal para que dê atenção à questão. É lógico que não esperamos que as mais de duas mil obras que conseguimos levantar sejam levadas adiante, mas que algumas obras, importantes para cada região e cada estado, e principalmente pelo estágio em que muitas já se encontram, em termos de aplicação de recursos, recursos que não são nossos mas do povo brasileiro, que contribuiu e está ali pedindo a obra, que não saiu até agora, sejam revistas por parte do Governo Federal. Cumprimento V. Exª e me somo às suas preocupações.

O SR. EDISON LOBÃO - É valiosa a manifestação de V. Exª neste passo do meu discurso. Foi V. Exª exatamente relatora dos trabalhos da Comissão de Obras Inacabadas, na viagem que fizemos ao Norte do País, visitando Estados da Amazônia brasileira. Assistimos juntos ao descalabro de tantas e tantas obras realmente abandonadas, ao longo dos anos, pelas administrações federais e estaduais, às quais tais obras haviam sido delegadas. E V. Exª, Senadora Emilia Fernandes, elaborou um trabalho admirável como relatora que foi daquela viagem - eu presidia o grupo naquele instante. Esse trabalho, depois de concluído pelo Senador Casildo Maldaner, como relator-geral, e pelo Senador Carlos Wilson, como Presidente da Comissão, foi levado ao Presidente da República, que prometeu solenemente que não permitiria que nenhuma obra nova fosse iniciada, salvo se de extrema urgência, antes que tantas outras obras inacabadas - essas que constam do nosso relatório, 2.214 obras - fossem totalmente concluídas.

No entanto, não é isso que espelha o Plano de Metas do Governo Federal. Não me insurjo contra ele, porque a intenção é boa - promover o desenvolvimento e gerar novos empregos -, mas num programa de R$80 bilhões, por que não contemplar as obras antigas com apenas R$14 bilhões? Sobrariam ao Governo Federal algo em torno de R$67 bilhões para suas obras novas, de acordo com o plano concebido - no meu entender, mal concebido esse Plano de Metas do Governo Federal.

Então, é com esses descalabros que nós do Parlamento não podemos estar de acordo. Tenho dito aqui seguidas vezes que apóio o Governo do Presidente Fernando Henrique, acho-o razoavelmente bem orientado na ação administrativa, mas não posso estar de acordo com decisões precipitadas, desastradas como esta a que estamos aludindo.

Continuo no exame deste programa:

b) O programa de recuperação descentralizada de rodovias, no valor de R$120 milhões, não oferece a necessária discriminação para que se possa fazer uma avaliação sobre quais rodovias e em que extensão serão recuperadas;

c) Escolas: o programa não prevê, nem a conclusão das escolas que já foram iniciadas, nem a construção de novas. É possível que se pretenda concluí-las todas em 1996, pelo menos os CAICs, deixando as demais para as prefeituras municipais;

d) Hospitais, postos de saúde, hemocentros: está prevista a alocação, no biênio, de penas R$1,8 milhão, para "reformar, completar ou ampliar a construção de ..." Estranhamente, o programa não menciona o valor de US$300 milhões, a serem transferidos pelo Banco Mundial, cujo empréstimo foi aprovado pelo Senado Federal;

e) Obras de saneamento: há a previsão de 788,0 milhões para as ações de saneamento básico, sem qualquer detalhamento, podendo, portanto, estarem aí contempladas algumas das obras hoje paralisadas;

f) A irrigação, com o "Novo Modelo de Irrigação".

De um estudo que solicitei à Consultoria de Orçamento do Senado sobre o anunciado Plano de Metas, obtive dos seus especialistas as seguintes opiniões conclusivas:

a) O programa Brasil em Ação não tem existência formal, nem se trata de uma parte ou alteração do Plano Plurianual. É apenas um documento destinado a orientar a elaboração e apreciação da proposta do orçamento para os próximos exercícios e como tal deve ser tratado;

b) Os dados e as informações fornecidos são muito gerais, os programas não apresentam qualquer detalhamento, o que impede uma análise técnica adequada, que permita concluir sobre a sua consistência, e principalmente sobre a viabilidade da origem dos recursos, verificar a sua verdadeira destinação. Parece tratar-se de um programa elaborado sem obediência ao processo normal de planejamento;

c) A seleção e escolha dos programas a serem implementados, ou seja, a definição de prioridades, não foram discutidas com a sociedade, deixando, portanto, caminho livre para sua rediscussão, análise pelos Parlamentares, que deverão introduzir as alterações que julgarem convenientes, por ocasião da apreciação da proposta orçamentária."

E aqui valem outra vez as observações da Senadora Emilia Fernandes sobre a possibilidade e a oportunidade de ainda se rever esse plano de metas do Presidente da República.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, na esperança de que, nos planos futuros, prevaleçam o propósito e a certeza de que uma obra iniciada será seguramente concluída; de outro modo estaremos desservindo ao povo brasileiro.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/10/1996 - Página 17245