Discurso no Senado Federal

ENCAMINHANDO A MESA PROJETO DE LEI, DE SUA AUTORIA, QUE DISPÕE SOBRE TAXAS DE JUROS NOS FINANCIAMENTOS DE IMOVEIS HABITACIONAIS E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA HABITACIONAL.:
  • ENCAMINHANDO A MESA PROJETO DE LEI, DE SUA AUTORIA, QUE DISPÕE SOBRE TAXAS DE JUROS NOS FINANCIAMENTOS DE IMOVEIS HABITACIONAIS E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.
Aparteantes
José Roberto Arruda.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/1996 - Página 17460
Assunto
Outros > POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, FINANCIAMENTO, HABITAÇÃO POPULAR, CORREÇÃO, POLITICA, SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH), CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), ADAPTAÇÃO, ESTABILIDADE, MOEDA.
  • LEITURA, PROJETO DE LEI, EQUIPARAÇÃO, JUROS, SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH), REMUNERAÇÃO, CADERNETA DE POUPANÇA, DEFINIÇÃO, PRAZO, REAJUSTAMENTO, SALDO DEVEDOR, PRESTAÇÕES, PROTEÇÃO, MUTUARIO, AUSENCIA, AUMENTO, SALARIO.
  • CRITICA, GOVERNO, UTILIZAÇÃO, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), PROGRAMA, PRIVATIZAÇÃO.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou ingressando nesta Casa com um projeto de lei que considero da mais alta importância para o financiamento da habitação popular.

No momento em que o Brasil luta pela estabilidade econômica, com a inflação atingindo o índice desejável, não é possível que os mutuários da habitação, beneficiados com o financiamento da Caixa Econômica e das demais instituições financeiras deste País, sejam obrigados a pagar uma taxa de 12% de juros para a obtenção desse benefício.

Por outro lado, o saldo devedor é corrigido, e nessa correção o Governo não leva em consideração o fato de que a maioria dos mutuários do Sistema Financeiro da Habitação é de funcionários públicos ou de assalariados da empresa privada, efetuando-a, normalmente, acima dos índices de aumento da remuneração ou do salário dos trabalhadores.

Considero essa atitude do Governo injusta, inconcebível. Se o mutuário tomar dinheiro emprestado na Caixa Econômica para construir uma casa, irá pagar 12% ou 13% de taxa de juros. Porém, se esse mesmo usuário empresta um dinheiro seu à Caixa Econômica, irá receber de remuneração apenas 6%. Isso significa que a Caixa Econômica está negociando com o dinheiro do povo brasileiro e ganhando mais de 100% de remuneração.

Por esse motivo, Sr. Presidente, estamos apresentando este projeto de lei, que esperamos seja aprovado pela Casa, porque visa a corrigir essa distorção, esse avanço do Governo sobre o dinheiro da população. Se a Caixa Econômica existe, se o Sistema Financeiro da Habitação existe, tem que cumprir a sua finalidade social, tem que distribuir os recursos, não digo de forma aleatória, mas criteriosa. Cobrando uma taxa exorbitante quanto essa, dando mau exemplo, não há nenhuma função social a ser exercida pelo Sistema Financeiro da Habitação.

Assim, Sr. Presidente, passo a ler os termos do projeto:

      "Art. 1º - A taxa de juros cobrada nos financiamentos de imóveis a cargo do SFH (Sistema Financeiro de Habitação) não poderá ultrapassar a remuneração paga pela Caixa Econômica Federal aos depositantes da caderneta de poupança."

Isso significa que se a Caixa Econômica remunera em 6% a quem deposita na caderneta de poupança, não pode cobrar uma taxa superior a 6% do mutuário beneficiário do Sistema de Habitação.

      "Art. 2º - A correção do saldo devedor dos financiamentos concedidos pelo SFH (Sistema Financeiro de Habitação) ocorrerá no máximo uma vez por ano e, se o mutuário for assalariado ou funcionário público, o reajuste da prestação mensal e do respectivo saldo devedor não poderá, em nenhuma hipótese, ser maior do que o índice de aumento da remuneração percebida."

O que está acontecendo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é que o Governo Federal não concede aumento aos seus servidores, os trabalhadores não estão recebendo aumento, o salário mínimo teve um aumento ínfimo de 12%; entretanto, a correção do saldo devedor está acima dos 20%. Essa situação está levando ao desespero milhares e milhares de mutuários em todo o Brasil, que, não tendo possibilidade de acompanharem essa correção ou esse reajuste injusto do saldo devedor dos seus débitos perante a Caixa Econômica, estão abandonando esses financiamentos, vendendo o imóvel onde moravam, onde residiam, para outra pessoa que tenha condição de pagá-lo, ou entrando em um eterno processo de inadimplência, o que causa prejuízos enormes ao próprio Sistema Financeiro de Habitação.

De sorte que acho da maior justeza que o Senado Federal, com esse projeto, tome um posicionamento que venha a colocar nos seus devidos lugares a função social que deve ser exercida pela Caixa Econômica Federal. Ela existe não para dar dinheiro, mas para garantir ao povo brasileiro, como está inserido na própria Constituição Federal, o direito inalienável do cidadão de ter a sua morada para dar abrigo à sua família. No momento em que a Caixa Econômica cria obstáculos a esse direito, desaparece a sua função social. Ela fere a Constituição e comete uma injustiça, principalmente contra a classe média, que está espremida por falta de uma correção dos seus salários, de um reajuste que poderia dar uma situação condigna ao cidadão brasileiro. Os trabalhadores, quando têm emprego, recebem um salário que é insuficiente para alimentar sua família, quanto mais para pagar reajustes exorbitantes que estão sendo cobrados pelo Sistema Financeiro de Habitação.

Enquanto o Governo alardeia a aplicação de recursos vultosos no Sistema - quase R$1 bilhão, distribuídos em R$600 milhões para a classe média e R$385 milhões para aqueles que possuem uma baixa renda -, esconde um fato inusitado: o Governo se aproveita da necessidade das famílias brasileiras de terem uma residência para morar, passando a cobrar desses pobres brasileiros juros exorbitantes. Ou seja, enquanto deveria ser um exemplo às instituições privadas, passa a ser o primeiro a dar um mau exemplo quando exige dos mutuários um lucro acima de 100% para a Caixa Econômica Federal.

Sr. Presidente, espero que o Senado cumpra a sua missão de vigiar e fiscalizar, justa e coerentemente, as ações do Governo. Não propomos um projeto radical, nem mesmo uma proposição para estancar a sua possibilidade de investimento; mesmo porque é estranhável que o Governo Federal esteja a incentivar, como já foi noticiado hoje, não só a privatização, mas que o dinheiro do FGTS do trabalhador seja empregado nas privatizações.

Isso é uma temeridade! O dinheiro sagrado do trabalhador, que é conquistado com suor, esforço e lágrimas, está sendo agora, por iniciativa do próprio Governo, num projeto que vai ser enviado para o Congresso Nacional, desviado para finalidades de risco, porque nunca sabemos se uma privatização vai ser boa ou má. Acredito que a privatização, em muitos casos, até se justifica; mas transformar o dinheiro do Fundo de Garantia em um fundo de ações para garantir um programa de Governo está errado. O Fundo de Garantia do trabalhador é para ser aplicado conforme foi inicialmente proposto, desde a criação do antigo Banco Nacional de Habitação, hoje Caixa Econômica Federal, para a construção de moradia popular.

Sr. Presidente, o Governo surpreende os trabalhadores de todo o Brasil, dizendo que 50% do saldo do Fundo de Garantia do trabalhador pode ser aplicado nas privatizações. Ora, o programa de privatização é da responsabilidade do Governo, não do trabalhador.

O Sr. José Roberto Arruda - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES - Com muito prazer concedo o aparte a V. Exª, Senador José Arruda.

O Sr. José Roberto Arruda - Apenas para registrar, Senador Valadares, que o projeto a que V. Exª acaba de se referir eu também não apoiaria. Só que esse projeto não existe da forma como V. Exª colocou.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES - Qual projeto, Senador?

O Sr. José Roberto Arruda - O Projeto do Fundo de Garantia para Democratização do Capital das Empresas Públicas Brasileiras. Gostaria de dizer a V. Exª que a cópia da minuta desse projeto será distribuída hoje às Lideranças dos Partidos para receber críticas. Farei questão inclusive de encaminhar ao gabinete de V. Exª uma dessas cópias. Nós, em encontro que tivemos com o Ministro do Planejamento, acertamos que, no prazo de uma semana, ele recolherá as nossas sugestões. Mas o projeto básico que está sendo anunciado pela imprensa hoje não é esse a que V. Exª se refere. O projeto básico diz, em linhas gerais, que haverá a possibilidade - e nunca a obrigatoriedade - de que cada trabalhador brasileiro, se e quando desejar, possa ter a oportunidade - repito, se for do seu desejo - de aplicar 50% do seu Fundo de Garantia, onde ele tem, garantido pelo Estado brasileiro, a correção normal mais 3%. Ele vai ter a opção, se desejar, de aplicar em fundos de investimentos de desestatização. Esse tipo de modelo, que ocorreu em vários outros países do mundo, permite duas possibilidades extremamente saudáveis: primeiro, a democratização do capital, permitindo ao trabalhador brasileiro, também ele, o direito de ser acionista das empresas brasileiras; segundo, pretende esse projeto limitar-se ao valor securitizado do Fundo de Garantia do Tesouro Nacional, não gastando, portanto, nenhum real do depósito do Fundo de Garantia existente hoje, que continuará totalmente aplicado, como é hoje, pelo Conselho do Fundo de Garantia, onde, como V. Exª sabe, têm assento os trabalhadores. Dessa forma, com esta minuta de projeto que vou encaminhar a V. Exª, não tenho a menor dúvida de que poderemos todos recolher da experiência de V. Exª críticas construtivas, que poderão inclusive ser consideradas antes que a minuta se transforme em projeto de lei e seja encaminhado ao Congresso Nacional, onde, mais uma vez, V. Exª, como parlamentar dedicado que é, poderá sugerir outras alterações. Mas há que ficar claro dois pontos fundamentais: a opção não será obrigatória; poderá fazê-la o trabalhador que desejar. E por quê? Porque os próprios trabalhadores estão reclamando que os fundos de investimento no Brasil estão rendendo muito mais do que rende o Fundo de Garantia. Assim, ele poderá fazer essa opção; só que limitada a 50% do seu saldo, por um lado; e, por outro, limitada ao valor securitizado do Tesouro Nacional. Portanto, não gastando sequer um real do valor do Fundo de Garantia em depósito, que hoje serve fundamentalmente ao financiamento das habitações populares. Eram esses esclarecimentos que eu queria trazer a V. Exª.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES - Nobre Senador José Roberto Arruda, agradeço as explicações de V. Exª, mas, com todo respeito que tenho pela autoridade do cargo que V. Exª exerce com tanto brilho, Líder do Governo no Congresso Nacional, prefiro aguardar que essa proposição chegue às nossas mãos para dar uma opinião definitiva.

A imprensa divulgou hoje que a intenção do Governo com esse projeto é usar o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço para acelerar o processo de privatização. Estranhei porque o processo de privatização é de interesse do Governo, ou seja, um projeto do Governo. Envolver o trabalhador, mal-remunerado e, muitas vezes, mal-informado, numa jogada de privatização, creio que é uma temeridade para um país subdesenvolvido como o nosso. É preciso que haja uma orientação perfeita, condizente com a situação do trabalhador, para que esse dinheiro, suado, não venha a ser jogado fora. Essa é a nossa única preocupação.

Quanto à possibilidade de o Fundo de Garantia vir a ser multiplicado por mil, quem nos dera que isso viesse a acontecer. Estou falando do risco do trabalhador, pelas suas próprias condições intelectuais, jogado na fábrica, sem ter tempo sequer de ver televisão, sem tempo e sem dinheiro para comprar um jornal. Dar a ele a possibilidade de ser um investidor com o Fundo de Garantia é um assunto para se pensar duas vezes antes de se aprovar. Até porque os próprios representantes dos trabalhadores já manifestaram preocupação com a perspectiva desse projeto vir a ser aprovado pelo Congresso Nacional.

Para terminar, Sr. Presidente, lerei a justificativa do projeto que dispõe sobre taxa de juros nos financiamentos de imóveis habitacionais e dá outras providências:

      "As prestações da casa própria financiada pelo SFH estão sendo compactuadas com a cobrança de uma taxa de juros de até 100% superior à remuneração que é paga pela Caixa Econômica Federal aos depositantes da caderneta de poupança.

      Por outro lado, o saldo devedor, cuja correção resulta no aumento da prestação mensal que é paga pelo mutuário, vem sendo revisto de forma injusta, causando em muitos casos desespero de milhares de famílias, pois enquanto o salário não sofre qualquer reajuste, a Caixa Econômica e demais financiadores do SFH exigem uma correção superior às majorações salariais ocorridas no período.

      A presente proposição visa, portanto, evitar que os mutuários venham a ser obrigados a pagar uma prestação de seu imóvel em desacordo com a realidade salarial.

      É inconcebível que em um país de inflação baixa como o Brasil o órgão financiador cobre do mutuário uma remuneração de financiamento de imóvel igual ao dobro da percebida pelo mesmo sistema que administra a poupança interna. Ou seja, pode acontecer o fato de o mutuário ter uma poupança remunerada a 6% e esse mesmo mutuário seja obrigado a pagar à mesma instituição que usa o seu dinheiro para financiar imóveis uma taxa de juros de 12% ou 13%.

      Por essas e outras é que o mutuário, quando não desiste do financiamento, torna-se um eterno inadimplente."

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/1996 - Página 17460