Discurso no Senado Federal

HISTORICO DA INSTITUIÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA. DEFENDENDO O APERFEIÇOAMENTO DAS NORMAS PARA EDIÇÃO E TRAMITAÇÃO DAS MEDIDAS PROVISORIAS, EM RELATORIO QUE APRESENTARA A COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEDIDA PROVISORIA (MPV).:
  • HISTORICO DA INSTITUIÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA. DEFENDENDO O APERFEIÇOAMENTO DAS NORMAS PARA EDIÇÃO E TRAMITAÇÃO DAS MEDIDAS PROVISORIAS, EM RELATORIO QUE APRESENTARA A COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/1996 - Página 17497
Assunto
Outros > MEDIDA PROVISORIA (MPV).
Indexação
  • ANALISE, INSTRUMENTO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), SITUAÇÃO, URGENCIA, EXECUTIVO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, ORADOR, RELATOR, EMENDA CONSTITUCIONAL, COMISSÃO, ADESÃO, LIDERANÇA, GOVERNO, DEBATE, LIDER, PARTIDO POLITICO, AUTORIDADE, GOVERNO FEDERAL, NECESSIDADE, OPINIÃO, JUDICIARIO, DEFESA, APERFEIÇOAMENTO, MODELO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
  • DETALHAMENTO, PROPOSTA, ORADOR, AMPLIAÇÃO, VIGENCIA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS, ANTERIORIDADE, PUBLICAÇÃO, REMESSA, SIMULTANEIDADE, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, TRANSFORMAÇÃO, PROJETO DE LEI, REGIME DE URGENCIA, REVEZAMENTO, TRAMITAÇÃO.
  • PROPOSTA, CRIAÇÃO, COMISSÃO MISTA, CARATER PERMANENTE, PARECER, ADMISSIBILIDADE, PROIBIÇÃO, REEDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REGULAMENTAÇÃO, PERDA, EFICACIA.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, creio que esta é uma coincidência positiva, porque estou falando logo após um pronunciamento alentado, substantivo, importante do Senador Humberto Lucena, que trouxe a esta Casa suas preocupações sobre uma grave, importantíssima e decisiva questão institucional do nosso País: a edição de medidas provisórias com força de lei.

A medida provisória é um instrumento jurídico institucional que nós brasileiros, na Constituição de 1988, introduzimos, copiando o modelo italiano, os provvedimenti provvisori con forza di legge, que são instrumentos antigos - eu diria -, sistematicamente usados como um meio, uma forma, um caminho de que o governo dispõe para dar provimento ao processo legislativo quando são exigidas agilidade e rapidez, alternativas que muitas vezes o Poder Legislativo, por sua natural lentidão - eu diria, Sr. Presidente, por sua necessária lentidão -, não pode ter.

O Poder Legislativo é, necessariamente, um ambiente de reflexão, de avaliações demoradas, de análises aprofundadas. O Legislativo não se caracteriza como um Poder ágil, dinâmico, capaz de rapidamente prover soluções para questões sociais, políticas ou econômicas intrincadas. Eu diria que o Poder Legislativo é aquele que dá as soluções mais sábias, mais democráticas, mais representativas, mais abrangentes, mais socialmente amplas de um processo político democrático. Mas ele seguramente não é o mais ágil e nem pode ser. Ele não é um órgão ágil, dinâmico, instrumentalmente ativo, em nenhum lugar do mundo, nem na Inglaterra, onde se inventou o Parlamento, nem no Brasil, onde houve tanta luta para manter aberta e em funcionamento essa Instituição.

Portanto, as medidas provisórias que introduzimos no Brasil, estabelecendo aqui uma reprodução do modelo italiano, trouxeram para todos nós, ao longo desses anos pós-constituinte, uma experiência e um ensinamento que acabaram mudando também a concepção, o entendimento e a visão que nós parlamentares sempre tivemos desse instituto.

Quando o instituímos - e entre os atuais Senadores há muitos que, assim como eu, também foram Constituintes -, nós o víamos como um instrumento excepcional, como algo a ser usado extraordinariamente, em momentos raríssimos, peculiaríssimos do processo político institucional.

No entanto, ao contrário, acabou-se estabelecendo uma espécie de convergência de interesses negativos ou de uma aproximação passiva e tácita de maus interesses.

De um lado está o Governo, o Poder Executivo. Neste ponto, refiro-me à instituição e não ao atual Governo ou ao atual Presidente. Aliás, em defesa do atual Presidente, deve-se dizer que S. Exª, entre todos, é o que menos editou novas medidas provisórias individualmente, embora tenha o encargo de muitas reedições. Seguramente, se nada for feito, o próximo Presidente terá uma sobrecarga, um número ainda maior de reedições de medidas provisórias, que se estenderão indefinidamente no tempo.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso seguramente não é uma personagem que deve ser estigmatizada ou condenada nesse processo. Os Presidentes Itamar Franco, Fernando Collor e José Sarney editaram um número maior de medidas provisórias. De modo que não estamos fazendo uma análise circunstanciada sobre um determinado Presidente, mas sim sobre um instituto constitucional chamado medidas provisórias, sobre os chamados provvedimenti provvisori da Constituição italiana.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, recebi do Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Senador Iris Rezende, a incumbência de relatar o trabalho resultante da Comissão Especial, qual seja, a proposta de emenda constitucional às medidas provisórias.

Dezesseis dias após ter recebido essa matéria, apresentei desta tribuna a minha proposta, ainda com elaboração primária. Não era uma proposta inteiramente acabada e também não era, pode-se dizer, algo sobre o que eu tivesse construído absoluta convicção, até porque convicção política no Parlamento, muitas vezes, não depende tão-somente de auto convencimento ou de livre arbítrio intelectual. A convicção num Parlamento depende muitas vezes de um senso coletivo, de uma capacidade de apreender o sentir coletivo. Formar convicções isoladas, individualistas, egocêntricas, muitas vezes pode ser uma opção desastrosa e até antidemocrática na vida parlamentar. Não estou me referindo aqui às opções éticas ou morais que o indivíduo faz no campo da sua consciência, mas a opções políticas, que no Parlamento são opções de senso coletivo.

É por isso que quero dizer, Sr. Presidente, que naqueles dias, logo após ter recebido o encargo, não tinha ainda uma convicção baseada no senso coletivo, em uma experiência abrangente, em uma audiência mais rebuscada, mais criteriosa dos diversos representantes dos partidos políticos com assento nesta Casa.

Hoje, passados mais alguns dias, ou mais algumas semanas, posso dizer que aquela proposta não é mais uma idéia original ou individual do Senador José Fogaça. Ela - penso eu - adquiriu certo patamar de senso coletivo, porque discutimos, conversamos, debatemos e eu não me limitei, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a ouvir apenas os Senadores da minha Bancada, mas também os Líderes do Governo no Senado e no Congresso, Senadores Elcio Alvares e José Roberto Arruda.

A estes dois fiz uma exposição e obtive deles senão a aprovação, mas, digamos assim, uma primária adesão às propostas, pelo menos o assentimento e o reconhecimento de que a idéia tinha o seu conteúdo lógico, e que poderia caminhar com suas próprias pernas porque o debate a conduziria. Ouvi Líderes de outros partidos, ouvi Senadores desta Casa, ouvi presidentes de partidos, Ministros de Estado, cheguei mesmo a conversar durante duas horas com o vice-Presidente da República, o ex-Senador Marco Maciel.

Daí, produzi uma proposta, Sr. Presidente, que entreguei à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, recebendo de seu Presidente, Senador Iris Rezende, a informação de que essa proposta será, senão votada, pelo menos apresentada, relatada e discutida na próxima reunião, ou seja, na próxima quarta-feira naquela Comissão.

Em primeiro lugar, quero dizer que esta é uma questão institucional da maior relevância, um ponto culminante desse processo institucional de democratização do País. O Brasil é um país em processo de democratização. E por que digo isso? Não que hoje, diante de nós, estejam inimigos da democracia que devam ser derrubados, não. Hoje, os inimigos, os adversários do processo democratizante estão nos nossos erros, na nossa incapacidade de reconhecer, de identificar e de montar o melhor modelo institucional. Os nossos inimigos, os inimigos do processo de democratização estão, muitas vezes, na nossa desinteligência, na nossa discordância, na nossa incapacidade de articular soluções abrangentes que atendam ao interesse coletivo.

Portanto, para a democratização brasileira optar por um modelo inteligente de medidas provisórias é democratizar. Eu não diria, Sr. Presidente, que a pura e simples supressão das medidas provisórias fosse um modelo inteligente. Não creio que um Congresso possa fazer isso pelo aspecto institucional relevante da medida provisória, que foi originária de um Poder Constituinte.

Para suprimir as medidas provisórias seria necessária uma revisão constitucional institucionalmente estabelecida ou nova Assembléia Nacional Constituinte, com poder originário. Não creio que suprimir, varrer, zerar medidas provisórias seja próprio de um Congresso. Esse é um tema que poderia ter o seu caráter polêmico, ser discutido e rejeitado por quem quer que fosse. Creio ser possível aperfeiçoar o modelo, e este, sim, é o papel de um Congresso, é o papel de representantes eventualmente eleitos pelo povo do nosso País.

Por isso, Sr. Presidente, estou apresentando uma tentativa de modelo. Quero dizer, desde logo, que apesar de entender que essa é uma proposta muito próxima daquela que imagino ser a mais adequada, não tenho a pretensão, nem a vaidade de supor que estou trazendo a solução acabada. Creio que, no âmbito da própria Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania haverá emendas e alterações e diria que no plenário, inegavelmente, surgirão novas opções, tentativas de modificação.

O que estou imaginando para esse debate é que há atores do cenário político brasileiro que não podem ser descurados. Não é possível mudar esse instituto sem ouvir o próprio Poder Executivo. Por isso, estive com o vice-Presidente Marco Maciel, que gentilmente me concedeu uma audiência de duas horas, aliás, devo dizer que S. Exª me convocou, sem que eu lhe tivesse telefonado ou pedido.

Considero o Poder Executivo, Sr. Presidente, Srs. Senadores, um ator importante, o Poder Legislativo, é óbvio, não pode ficar de fora - a sociedade civil está representada nos partidos políticos que aqui têm assento -, mas é preciso também ouvir o Poder Judiciário, que lida com as questões que emanam das medidas provisórias. É esse o périplo, é essa a audiência que tenho procurado manter com os diversos atores que compõem o cenário democrático do País.

Sr. Presidente, devo dizer que para elaborar esta proposta vivi algumas experiências positivas e estimulantes, mas enfrentei um momento difícil do processo político brasileiro, porque a recebi exatamente no momento em que se iniciavam as campanhas eleitorais municipais e num momento de notório esvaziamento do Congresso Nacional.

De forma que, mesmo dentro desse pequeno período crítico e difícil, procuramos estabelecer o debate, ouvir autoridades, representantes dos diversos setores políticos e, ao final, estamos fazendo esta proposta. Tal como na proposta Josaphat Marinho, estamos ampliando a vigência da medida provisória para sessenta dias.

Há uma reclamação, um clamor, e creio que tem certa procedência, de Deputados e Senadores - e isso também se ouve da sociedade civil - quanto ao fato de que algumas medidas provisórias vêm de forma abrupta, de sopetão, de forma surpreendente e inesperada. Algumas expressões que ouvi nesta Casa foram que as medidas provisórias são elaboradas na calada da noite e, no outro dia, aparecem como uma bofetada para o povo brasileiro nas páginas do Diário Oficial. Ouvi essa expressão. Portanto, há um clamor no sentido de não se estabelecer medidas provisórias como algo que possa surpreender a comunidade, a sociedade civil, os agentes econômicos.

Estamos propondo que o Presidente da República deva comunicar ao Presidente do Congresso Nacional com antecedência de 48 horas, através de uma resumida exposição de motivos, a publicação no Diário Oficial de medida provisória recém editada; salvo, evidentemente, nos casos em que o sigilo ou a reserva seja imprescindível ao interesse público.

Não é possível que uma medida provisória como a do Plano Real - que criou uma moeda - possa ser divulgada com antecipação, antes de publicação no Diário Oficial. Medidas provisórias que afetam o sistema financeiro, que podem provocar corrida aos bancos, que tenham implicações notórias de interesse público, evidentemente, ficariam como exceção. Mas, nesse caso, o Presidente da República justificaria, em sua exposição de motivos, as razões do sigilo e, portanto, da publicação com o desconhecimento prévio do Congresso.

Quero dizer, Sr. Presidente, que não estou fazendo nada de novo. Já que o nosso modelo é o modelo dos provvedimenti provvisori italiano, já que o nosso modelo é o das medidas provisórias italiano. Estou também estabelecendo aqui um instituto da constituição italiana, que é o de que o conselho de ministros decide colegiadamente e comunica ao congresso italiano - à câmara dos deputados e ao senado - a decisão de publicar em determinado prazo uma medida provisória. Portanto, não se trata de nenhuma idéia original, nenhuma invenção extraordinária, trata-se de, apenas, continuar reproduzindo um modelo que aqui adotamos.

Uma terceira mudança que estamos propondo é relativa à votação no Congresso Nacional, entendido o Congresso como a reunião das duas Casas em sessão conjunta. A verdade é que o Congresso não se reúne ou não tem se reunido. A verdade é que, por diversas razões, sejam elas de ordem prática, de ordem institucional, de ordem política - não importando por que nem como -, o fato inegável e irrecusável é que o Congresso não se reúne.

Ouvi de diversos Deputados e Senadores a reivindicação no sentido de que as medidas provisórias fossem encaminhadas, portanto, em separado para cada uma das casas legislativas, numa tramitação regular constitucionalmente estabelecida, ao invés de serem remetidas para o Congresso Nacional, em sessão conjunta.

Ora, essa é uma opção possível, não é inviável. Devo até dizer que na proposta da Comissão Especial, com alentados quatro volumes que recebi de quase 700 páginas, na proposta da Comissão Especial, modelada pelo inteligentíssimo Senador Josaphat Marinho, estabelece-se a seguinte possibilidade: a de que uma medida provisória não votada no prazo de sessenta dias - já que S. Exª também opta pelos sessenta dias de vigência - seja encaminhada para a Câmara dos Deputados e transformada em projeto de lei em regime de urgência.

A proposta da Comissão Especial, portanto, estabelece que a medida provisória não votada passe a ser um projeto de lei ordinário, com tramitação nos termos do art. 64 da Constituição, que estabelece a sua apreciação urgente em 45 dias, que é, digamos assim, uma prerrogativa que tem o Poder Executivo quando quer solicitar do Congresso maior agilidade nas votações. Nesses casos, ele pode pedir, solicitar, requerer a votação em regime de urgência.

Qual o problema dessa proposta e por que com ela não concordei? Não concordei por uma razão: primeiro, porque hoje as medidas provisórias pertencem ao universo das duas Casas - tanto ao Senado quanto à Câmara. Quando se estabelece que uma medida provisória deve ir direto para a Câmara, reproduz-se aquele modelo tão condenado, tão criticado aqui no plenário do Senado - aquele modelo de iniciar um processo de votação na Câmara, fazerem-se lá todos os arranjos, estabelecerem-se lá todas as situações e acordos, e depois, "prato feito", a situação resolvida ter que ser simplesmente homologada pelo Senado em 24 horas, sob pressão da imprensa e da opinião pública, sob exigência do Poder Executivo.

Ora, na verdade, esta é uma solução que fortaleceria esse cenário, que traçaria o mesmo cenário com cores muito mais fortes, e colocaria o Senado, mais uma vez, nesse papel homologatório, secundário, subordinado, que tanto os Líderes e os Senadores querem aqui rejeitar, repelir.

Concordo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. Se o Senado pertence a um universo institucional equivalente ao da Câmara relativamente às medidas provisórias, ele não pode ficar secundarizado nessa questão, não pode secundar a Câmara, precisa ter com a Câmara um nível de equilíbrio institucional. Estamos propondo que a matéria deva ir em regime de urgência, sim, mas alternadamente, para uma Casa ou outra, de acordo com um sistema e um critério de alternância rigorosamente observado pela Mesa.

A matéria, portanto, uma vez aprovada ou tendo parecer na Comissão, viria em regime de urgência ou para o Senado ou para a Câmara, conforme o critério de alternância. A matéria não votada em 60 dias adquiriria esse caráter. A matéria em regime de urgência seria distribuída pelo Presidente do Congresso para uma Casa ou outra, conforme a seqüência natural e a seqüência simples do regime de alternância: uma medida para a Câmara, outra para o Senado, e assim subseqüentemente.

Sr. Presidente, num primeiro momento, essa proposta causou-me estranheza, até porque se trata de uma inovação institucional. Mas não há outro meio pelo qual se possa preservar o equilíbrio institucional que hoje existe, porque nas comissões mistas o número de Senadores é igual ao número de Deputados; logo, há um equilíbrio institucional que não pode ser desfeito. Infelizmente, a proposta da Comissão Especial do Senado era uma proposta que encaminhava tudo para a Câmara dos Deputados. Resolvia-se tudo naquela Casa e, depois, tudo vinha para esta Casa já resolvido.

Não sou partidário - e nunca fui autor - daqueles discursos exaltados contra a Câmara dos Deputados. Nenhum dos senhores, seguramente, presenciou um pronunciamento meu nessa direção. O que estou dizendo é que este é um discurso ouvido quase todos os dias no Senado Federal. Portanto, entendi que não poderia dar ainda mais material, mais alimento, mais feedback para esse amplo grupo de senadores, expressivo e representativo, que, quase todos os dias, a cada matéria que se vota, não aceita uma decisão já pronta e acabada que venha da Câmara dos Deputados. Trata-se de um grupo que deseja emendar, reformar, e nem sempre isso acontece porque o modelo institucional empurra para isso inevitavelmente. Casa revisora é assim. Por isso, estamos apresentando uma proposta de alternância.

Há uma outra razão para isso. Estamos propondo também que, ao invés de uma comissão mista criada para cada medida provisória, que se crie uma comissão mista única permanente, num figurino institucional parlamentar semelhante àquele da Comissão de Orçamento. Quem foi membro da Comissão de Orçamento nesta Casa sabe muito bem do que estou falando. Refiro-me a uma comissão que se renova todo ano, que não pode repetir seus membros no ano seguinte, que não é tão pequena em número como são as comissões permanentes da Casa; é uma comissão mista, quer dizer, o número de senadores é igual ao número de deputados.

Essa comissão mista, que propomos ser composta por 17 Senadores e 17 Deputados, teria o prazo de 35 dias para dar parecer sobre a admissibilidade, estabelecer o juízo de admissibilidade da medida provisória quanto aos seus aspectos de relevância e urgência. Teria também a incumbência precípua de dar parecer quanto à constitucionalidade e à juridicidade da medida e, por fim, de dar parecer quanto ao mérito, uma vez superadas estas duas instâncias primárias: a de juízo de admissibilidade e de constitucionalidade e tecnicalidade jurídica da lei.

Ora, Sr. Presidente, essa comissão, sendo um fórum único, sendo um ambiente único, necessário, inevitável, reunindo-se toda semana, ali, sim, vão ser debatidas as matérias; ali, sim, os pareceres vão ser dados; ali, sim, a discussão vai ter conseqüências; ali, sim, vão ser produzidos pareceres que vão resultar em matéria aprovada em plenário relativamente às medidas provisórias.

Ouso afirmar que 95% das medidas provisórias irão praticamente sumir do mapa institucional do País, no momento em que se criar e se estabelecer essa comissão mista permanente, única, tal como é a Comissão de Orçamento. E, tal como a Comissão de Orçamento, tem que ser renovada todo ano; e, tal como é na Comissão de Orçamento, tem que ter alternância de presidência. Ora o presidente é do Senado, num ano, ora o presidente é da Câmara, no ano seguinte. A única situação que não se reproduz é a de um relator único. Porque como são medidas provisórias de assuntos tematicamente os mais distintos, os mais diversos, evidentemente deverá haver um relator específico para cada matéria, observada também uma alternância equilibrada entre senadores e deputados.

Estamos propondo também, Sr. Presidente, que seja vedada a reedição de medida provisória que trate dos seguintes temas: matéria de lei delegada, sobre a qual versa a nossa Constituição no que tange à lei delegada; matérias de competência privativa do Ministério Público, do Poder Judiciário, dos Tribunais, que, evidentemente, não podem ser matérias de medida provisória; matéria relativa à lei penal, uma vez que a medida provisória não pode tipificar o crime. Logo, ela não pode ter essa característica de punir, tipificar o crime, criar uma situação de comportamento criminoso, e logo ali ela é rejeitada ou é extinta e perde sua eficácia, e aquilo que foi crime por 30 ou 60 dias deixa de ser. Seria uma anomalia jurídico-institucional, seria um absurdo. Lei penal não pode ser objeto de medida provisória.

Por outro lado, é vedada a edição de medida provisória que trate de matéria especificada em lei complementar. As medidas provisórias são votadas e aprovadas ou rejeitadas por maioria simples, enquanto a lei complementar é votada, aprovada e rejeitada por maioria absoluta. De modo que são incompatíveis, são vasos incomunicáveis a medida provisória e a lei complementar.

Há um problema, Sr. Presidente, ao longo de todos esses anos, desde 1989, procurei verificar qual decreto legislativo foi aprovado pelo Congresso para regular as conseqüências decorrentes da perda de eficácia de uma medida provisória. Sabem V. Exªs quantos decretos legislativos já foram produzidos para regular a perda de eficácia, portanto, as conseqüências jurídicas decorrentes e a cessação e perda no espaço e no tempo de direitos estabelecidos por uma lei que, de repente, passa a não existir mais? Não existe decreto legislativo para esse fim.

O SR. PRESIDENTE (Ademir Andrade) - Senador José Fogaça, gostaria de avisar a V. Exª que a sessão deverá ser encerrada daqui a 2 minutos.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Sr. Presidente, sei que o tempo está-se esgotando. Concluirei o meu discurso.

Apenas gostaria de dizer que não há dúvida de que esse modelo de legislar sobre fatos passados que deixaram de ter validade jurídica equivale a apertar a pasta de dente e, depois, tentar colocá-la novamente dentro do tubo. Não se pode fazer isso de forma alguma. Seria necessário esse tipo de malabarismo intelectual e jurídico para produzir um decreto legislativo regulamentando esse tipo de situação.

Estamos propondo que seja vedada a reedição de medida provisória por meio de um decreto legislativo que determine a cessação da eficácia e não a sua extinção, porque, se tiver que retornar no tempo a nível zero, não há decreto legislativo possível, viável. Decretando, portanto, a cessação da eficácia, é possível regulamentar em decreto legislativo e normatizar as garantias dos direitos que foram estabelecidos enquanto a lei estava em vigência. Isso é possível.

Esse é um modelo inteiramente novo, uma proposta realmente inovadora. É possível vedar a reedição de medidas provisórias mediante esse modelo de decreto legislativo que estamos apresentando.

Essas inovações, evidentemente, não têm caráter irrecorrível, definitivo e absoluto; tem quase que a intenção de sugerir o debate. Apesar de eu ser obrigado a apresentar essa tese sob a forma de relatório, de parecer formal e oficial dentro da Comissão de Constituição e Justiça, dou-a o conteúdo político de uma sugestão, para que os Srs. Senadores se sintam à vontade para criticar, alterar, modificar e abrir a questão sempre no sentido ao qual nos referimos: de um país democratizado pela inteligência, pela competência, pela capacidade e pela eficiência dos seus Parlamentares.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/1996 - Página 17497