Discurso no Senado Federal

COMENTARIO AO DISCURSO DA SENADORA MARINA SILVA. CRIAÇÃO DE COMISSÃO TEMPORARIA INTERNA DE INVESTIGAÇÃO, PARA EXAMINAR A MORTE DE CRIANÇAS NA MATERNIDADE ESTADUAL DE RORAIMA.

Autor
Romero Jucá (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. SAUDE.:
  • COMENTARIO AO DISCURSO DA SENADORA MARINA SILVA. CRIAÇÃO DE COMISSÃO TEMPORARIA INTERNA DE INVESTIGAÇÃO, PARA EXAMINAR A MORTE DE CRIANÇAS NA MATERNIDADE ESTADUAL DE RORAIMA.
Aparteantes
Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/1996 - Página 17866
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. SAUDE.
Indexação
  • APREENSÃO, TRANSFERENCIA, SENTENCIADO, HOMICIDIO, CHICO MENDES, LIDER, SERINGUEIRO, PRESIDIO, ESTADO DO ACRE (AC), FALTA, SEGURANÇA, POSSIBILIDADE, FUGA, IMPUNIDADE, SOLIDARIEDADE, MARINA SILVA, SENADOR.
  • REGISTRO, CRIAÇÃO, COMISSÃO, SENADO, INVESTIGAÇÃO, MORTE, RECEM NASCIDO, MATERNIDADE, ESTADO DE RORAIMA (RR), DENUNCIA, IRREGULARIDADE, SONEGAÇÃO, INFORMAÇÃO, INFECÇÃO HOSPITALAR, MOTIVO, CAMPANHA ELEITORAL.

O SR. ROMERO JUCÁ (PFL-RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de tratar do tema específico a que vou me referir nesta tarde, gostaria de registrar também a minha preocupação com relação ao assunto abordado pela Senadora Marina Silva, a quem não aparteei por estar fazendo uma comunicação inadiável.

Mas desejo registrar que, no meu entender, trata-se de um absurdo levar o fazendeiro Darli Alves para cumprir pena no Estado do Acre. Sem dúvida alguma, não há isenção de ânimos, não há condições, não há equilíbrio hoje naquele Estado para que o mandante do assassinato de Chico Mendes cumpra lá a sua pena. O aparelho policial do Estado do Acre é conhecido, bem como os problemas de sua penitenciária, de onde já houve fugas, inclusive a do próprio fazendeiro. Assim, vai repetir-se o que já vem se repetindo em muitos Estados da Amazônia: a impunidade. Essa missa, sem dúvida, já está encomendada: ou vai fugir ou vão matá-lo. Entretanto, a situação do cumprimento da pena - e não quero estar fazendo as vezes de profeta do apocalipse -, por certo, não se efetivará.

Sr. Presidente, como se fizesse agora o aparte que não fiz à Senadora Marina Silva, devo dizer-lhe que, de nossa parte, como Senador da região da Amazônia, aplaudo suas colocações e lhe dou todo o apoio. Presto-lhe toda a solidariedade, porque, sem dúvida alguma, o que se coloca neste plenário é a verdade dos fatos.

Sr. Presidente, gostaria também de falar, nesta tarde, sobre a recém-aprovada Comissão Temporária Interna de Investigação, criada através de requerimento de minha autoria e cuja finalidade é elucidar os fatos que levaram à morte dezenas de crianças no nosso Estado de Roraima.

Como já disse aqui outras vezes, infelizmente o Estado de Roraima, bem como os demais Estados da Amazônia ficam conhecidos nacionalmente não pelo seu desenvolvimento auto-sustentado, pela força do seu povo ou pela capacidade de trabalho da nossa sociedade, mas por fatos e tragédias lamentáveis como a morte do sindicalista Chico Mendes e como o assassinato de mais de 100 crianças na Maternidade Estadual de Boa Vista.

Os fatos, Sr. Presidente, começam a aparecer, estarrecendo a população de Roraima. Não foram só 33 crianças que morreram naquela Maternidade, esse número refere-se apenas ao mês de outubro. Pelo levantamento que a imprensa está fazendo, desde agosto, havia lá um surto de infecção hospitalar.

E por que isso não foi denunciado? Porque estávamos em período de campanha eleitoral, e a Diretora Administrativa da Maternidade era candidata à vereadora. Isso seria prejudicial para as forças políticas do Governo. Por conta disso, mais de 100 crianças morreram - e não apenas 33 -, e ainda não se chegou ao término dessa investigação. Portanto, essa Comissão de Sindicância e de Investigação, aprovada pelo Senado na tarde de hoje, tem uma enorme importância, porque acompanharemos o trabalho do Ministério Público, que tem essa obrigação.

Hoje, o Ministro Adib Jatene me disse que tinha solicitado ao Ministério Público que acompanhasse as investigações e que está mandando também para a Roraima uma auditoria específica do Ministério, objetivando levantar as responsabilidades por esse massacre de crianças indefesas que procuraram a vida e encontraram a morte na Maternidade de Roraima.

Este é um assunto muito sério! Essas crianças, suas mães e suas famílias estavam sob a proteção do Estado, estavam sob os auspícios da Constituição Federal, que garante saúde para todos, mas essas crianças foram assassinadas.

Tenho em mãos dezenas de recortes que registraram esses fatos. Falarei apenas em um deles, porque é estarrecedor e demonstra o clima da saúde no Estado de Roraima.

A Folha de S.Paulo ontem publicou, na sua primeira página, a fotografia de um coveiro enterrando uma criança recém-nascida, e ao lado dele, várias covas abertas. A notícia é a seguinte:

      "O coveiro Jairo da Silva, 18, enterra o bebê Gesica Diane, no cemitério Campo da Saudade, em Boa Vista (RR), ao lado de dezenas de covas de crianças já feitas.

Diz o coveiro:

      "A gente deixa tudo cavado, senão fica de última hora e aí não dá. Teve dia que enterrei sete bebês."

As covas já ficam abertas, esperando as vítimas da saúde do Governo do Estado de Roraima, enquanto o Governador passeia de helicóptero, caça tamanduá no lavrado e constrói obras superfaturadas, inclusive na área da saúde. Temos provas e notas fiscais que demonstram o pagamento superfaturado de reajustes de obras do hospital público estadual em Alto Alegre, enquanto tudo isso acontece.

Enquanto se desviam recursos públicos, a saúde de Roraima está à míngua, e os coveiros antecipam o trabalho, abrindo covas para enterrar dezenas de crianças recém-nascidas.

A Srª Marina Silva - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ROMERO JUCÁ - Com prazer, ouço V. Exª.

A Srª Marina Silva - O pronunciamento de V. Exª é muito forte. A Senadora Benedita da Silva já havia enfocado inúmeros problemas referentes à situação da saúde no Brasil. Apresenta V. Exª a situação difícil em que se encontra o Estado de Roraima, fazendo uma denúncia muito grave: que o número é bem maior, aproximadamente 100 crianças; que as pessoas responsáveis sabiam que já havia o surto de infecção hospitalar e silenciaram, porque o fato poderia trazer prejuízos eleitorais. É uma denúncia muito grave porque, se acontece por problemas da saúde, mas não de forma premeditada, deliberada, com a conivência das autoridades responsáveis, é diferente. Mas, se for nas circunstâncias que V. Exª está denunciando, o Ministério Público, a Comissão de Sindicância do Senado Federal devem envidar todos os esforços para que fique provada essa tese de V. Exª para que os responsáveis sejam punidos com a cadeia. Antecipar a morte de quem está nascendo só mesmo numa situação, num ritual quase que louco, infernal. Quando a família inteira se prepara para a vida, para receber um pequeno ente querido que está chegando, os coveiros já estão aguardando com uma cova porque sabem que o número de crianças que morre na maternidade é muito grande. Sou inteiramente solidária com o pronunciamento de V. Exª. Creio que é uma questão de honra e de defesa da vida neste País o esclarecimento desse episódio. Que os responsáveis sejam rigorosamente punidos, para que sirva de exemplo, pois, em primeiro lugar, está o respeito à vida, e não os interesses políticos. O que adianta ganhar uma eleição manchada, maculada pela morte de mais de 100 bebês? Meu Deus, que serviço público prestaria essa criatura que tem uma eleição já carimbada com a morte de inocentes, que poderiam ser bem cuidados se o alerta tivesse ocorrido na época em que se teve conhecimento de que havia um surto de infecção hospitalar?! Muito obrigada.

O SR. ROMERO JUCÁ - Agradeço as palavras de V. Exª, Senadora Marina Silva.

Nas matérias dos jornais, mães e familiares dos bebês mortos já diziam que internamente tomaram conhecimento de que esse surto de infecção já ocorria antes. Algumas mães, desesperadas, ainda disseram aos jornais: "Por que eles não nos avisaram? Teríamos levado as crianças para nascerem em outros locais." A morte de mais de 100 bebês já está comprovada e já estamos com a relação dos bebês mortos e enterrados nos cemitérios municipais de Boa Vista. Portanto, entendo que a comissão do Senado como o Ministério Público devem ir a fundo nessa questão.

Encerro o meu pronunciamento registrando, com muita satisfação, o que me disse o Líder do PT: que V. Exª, Senadora, já foi designada como representante do PT nesta Comissão. Solicito, então, às Lideranças dos partidos que indiquem rapidamente seus representantes, para que já amanhã possamos ter uma primeira reunião e definir algumas questões. Os problemas não estão resolvidos. Atualmente ainda existem 5 crianças com infecção hospitalar no Hospital Materno-Infantil Nossa Senhora de Nazaré, em Boa Vista; outras foram trazidas para cá. As famílias têm muito a dizer; da mesma forma, os médicos daquela maternidade. Sem dúvida, temos muito o que investigar para que as sociedades de Roraima e do Brasil possam, punindo os culpados, discordar desse tipo de crime praticado em nosso Estado.

Não gostaria de falar tema como este, mas como representante de Roraima, da Região Amazônica e como Senador da República, tenho a responsabilidade de ir a fundo nesta questão, trabalhando com meus Pares para, nessa Comissão, indicarmos as providências a serem tomadas e, mais ainda, com o auxílio de Deus, os caminhos que impedirão novas tragédias como esta no cenário nacional.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/1996 - Página 17866