Discurso no Senado Federal

PROTESTO CONTRA A EXTINÇÃO DA FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO, COGITADA PELO GOVERNO FEDERAL.

Autor
Carlos Wilson (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • PROTESTO CONTRA A EXTINÇÃO DA FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO, COGITADA PELO GOVERNO FEDERAL.
Publicação
Publicação no DSF de 02/11/1996 - Página 18026
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • APREENSÃO, EXTINÇÃO, FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO (FUNDAJ), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ELOGIO, TRABALHO, PESQUISA, SOCIOLOGIA, QUALIDADE DE VIDA, TRABALHADOR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO NORTE.

O SR. CARLOS WILSON (PSDB-PE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cogita o Governo Federal extinguir um certo número de entidades da Administração Pública, entre as quais se inclui a Fundação Joaquim Nabuco, com sede na Capital pernambucana e vinculada ao Ministério da Educação.

Atribui-se tal intenção ao Ministro da Administração e Reforma do Estado, Bresser Pereira, que pretenderia introduzir profundas modificações, tais como o enxugamento e a flexibilização, na gestão dos entes públicos de âmbito federal.

O simples anúncio de tal medida vem dando margem a numerosos protestos de quantos conhecem e, por conseguinte, respeitam e admiram o trabalho de uma Fundação que já se aproxima do seu cinqüentenário de existência, com notável folha de bons serviços prestados às comunidades nortista e nordestina, em particular, e à sociedade brasileira, de uma forma geral.

Conhecedor da experiência do Ministro Bresser Pereira e da seriedade do Presidente Fernando Henrique Cardoso, sinto-me, como pernambucano e homem público, no dever de chamar a atenção para os riscos de eventual medida dessa natureza. Faço-o previamente, antes que se confirmem as informações ainda incipientes sobre a extinção da referida entidade, para que não venhamos a correr riscos desnecessários, que possam prejudicar a trajetória de êxito da Fundação Joaquim Nabuco.

Quero lembrar aos nobres colegas do Parlamento que a Fundação Joaquim Nabuco nasceu de um projeto do notável escritor e sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, então Deputado Federal Constituinte. Corria o ano de 1949, e a proposta de Gilberto Freyre de criação do Instituto Joaquim Nabuco prestava justa homenagem ao centenário de nascimento daquele coestaduano que brilhou como político, diplomata, escritor e destacado reformador social que se tornou conhecido como "O Abolicionista".

O projeto, convertido na Lei nº 770, de 21 de julho de 1949, criava o Instituto Joaquim Nabuco para dedicar-se ao estudo sociológico das condições de vida do trabalhador brasileiro, na área hoje compreendida pelas Regiões Norte e Nordeste, objetivando contribuir para a melhoria de tais condições. Transformada em fundação pelo Decreto nº 84.561, de 15 de março de 1980, o Instituto Joaquim Nabuco foi a primeira instituição de pesquisa, em todo o Brasil, criada por iniciativa do Congresso Nacional. Cabe acrescentar, aliás, que a Fundação Joaquim Nabuco, como hoje se denomina, é a única fundação pública em funcionamento, instituída a partir de proposta do Poder Legislativo, o que torna ponto de honra para nós, Parlamentares, a sua manutenção.

Entretanto, Srs. Senadores, minha disposição em lutar pela manutenção dessa entidade não se fundamenta unicamente, nem mesmo basicamente, em suas origens. A Fundação Joaquim Nabuco é para nós, pernambucanos, motivo de orgulho. Trata-se de uma entidade voltada para a pesquisa social e econômica, que desenvolve atividades científicas e culturais, contemplando em seus estudos as condições de vida do trabalhador nordestino e nortista, bem como o conhecimento antropológico do homem dos trópicos. 

A compreensão mais aprofundada do que é a Fundação Joaquim Nabuco requer o conhecimento de sua estrutura e o acompanhamento dos seus trabalhos. Sucintamente, podemos dizer que a Fundação compõe-se de uma superintendência e seis institutos, estes direcionados para atividades fins: pesquisas sociais, documentação, desenvolvimento científico e cultural de caráter extensionista; computação científica e cultural, que desenvolve softwares específicos; tropicologia, que estuda a vida do homem nos trópicos; e de estudos sobre a Amazônia, que representa o braço da entidade na Região Norte.

A Fundação Joaquim Nabuco mantém, em Recife, o Museu do Homem do Nordeste, de reconhecida importância, com mais de 14 mil peças em seu acervo; em Ipojuca, a cerca de 40km da Capital, mantém o Engenho Massangana, importante centro de produção científica e cultural, com alojamentos, biblioteca e toda a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento de pesquisas, bem como de projetos de complementação curricular para estudantes de primeiro e segundo graus, na vertente da educação patrimonial. Nesse local, cuidadosamente restaurado para preservar os padrões originais, Joaquim Nabuco viveu parte de sua infância.

Dispõe a Fundação Joaquim Nabuco de uma biblioteca especializada em Ciências Sociais, com cerca de 70 mil títulos; um Centro de Vídeo e Som, e ainda uma editora com apreciável volume de publicações, procuradas especialmente por cientistas sociais e estudantes universitários.

Sua integração com os mais diversos segmentos da sociedade tem proporcionado resultados os mais profícuos. Entre seus parceiros encontram-se universidades, outros institutos de pesquisa e organismos estrangeiros, como a Fundação Ford.

Poderia falar muito mais do que representa e do que faz por nossa cultura e o nosso desenvolvimento a Fundação Joaquim Nabuco. Não querendo, porém, ser longo, vou salientar apenas que ela foi o único órgão público a receber, em agosto último, a Medalha de Mérito da Ordem da Justiça do Trabalho, conferida pelo Tribunal Superior do Trabalho. Ainda assim, e embora dotada de orçamento quase irrisório, nas rubricas do Ministério da Educação encontra-se esse importante organismo ameaçado de extinção.

Tal hipótese, não é difícil prever, provocou uma avalanche de protestos dos mais variados e respeitáveis segmentos da sociedade pernambucana, nordestina e brasileira, como noticiou o Jornal do Brasil no mês passado, na coluna Informe JB. Ao veicular a proposta governamental, o periódico noticiou, igualmente, o protesto de ninguém menos que os imortais da ABL:

      "(...) Ontem, em clima de rebelião - dizia a nota -, os imortais da Academia Brasileira de Letras decidiram enviar uma carta ao Presidente Fernando Henrique considerando (a possibilidade de extinção) uma afronta a Joaquim Nabuco e a Gilberto Freyre, criador da fundação".

De fato, Srªs e Srs. Senadores, a eventual extinção de tal entidade trai a memória, mais do que de pernambucanos, de dois brasileiros ilustres.

Joaquim Nabuco, que nasceu na capital pernambucana em 1849, honrou não apenas o vernáculo e a diplomacia, mas também a condição de homem público, como parlamentar e reformador social. A escolha de seu nome para designar uma entidade devotada à pesquisa social e ao desenvolvimento não poderia ser mais justa.

Gilberto Freyre, também nascido em Recife, sentir-se-ia traído na homenagem que prestou ao coestaduano. Primeiro titular da cadeira de sociologia na Escola Normal do Recife, o autor de Casa Grande & Senzala foi um marco nas letras nacionais, tanto quanto nas ciências sociais, bastando dizer que sua primeira e mais conhecida obra é referência obrigatória, ainda hoje, para estudantes e sociólogos de todo o Brasil.

Tenho em mãos expedientes da Associação Comercial de Pernambuco - mais uma entre tantas agremiações que, conforme salientei, deploram a possibilidade de a Fundação vir a ser extinta. Após darem um fervoroso testemunho das profícuas atividades da Fundação Joaquim Nabuco, seus dirigentes externam grave preocupação com o futuro da entidade. Acreditam, porém, que o Presidente da República, intelectual e sociólogo, decidirá, com a autoridade de Chefe da Nação e do cientista social que é, pela manutenção da Fundação Joaquim Nabuco.

Também eu, Srªs e Srs. Senadores, ao abordar o risco de uma providência inepta e equivocada, confio em que prevalecerá o discernimento do Presidente da República e de seus auxiliares, uma vez que o desmantelamento de tão respeitada entidade significaria trair os elevados propósitos de Joaquim Nabuco e Gilberto Freyre, resultando no achincalhe da memória nacional e no retrocesso de nossa pesquisa social.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/11/1996 - Página 18026