Discurso no Senado Federal

DANDO CONHECIMENTO A CASA DOS ESTUDOS E CONCLUSÕES A QUE VEM CHEGANDO NO EXERCICIO DA RELATORIA DOS TRES PROJETOS, ORIUNDOS DA CAMARA DOS DEPUTADOS, ACERCA DO RITO SUMARIO, LIMINARES E INTERVENÇÃO DO MINISTERIO PUBLICO NAS CAUSAS LIGADAS A REFORMA AGRARIA.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • DANDO CONHECIMENTO A CASA DOS ESTUDOS E CONCLUSÕES A QUE VEM CHEGANDO NO EXERCICIO DA RELATORIA DOS TRES PROJETOS, ORIUNDOS DA CAMARA DOS DEPUTADOS, ACERCA DO RITO SUMARIO, LIMINARES E INTERVENÇÃO DO MINISTERIO PUBLICO NAS CAUSAS LIGADAS A REFORMA AGRARIA.
Aparteantes
Ademir Andrade, Bernardo Cabral.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/1996 - Página 17974
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, CONCLUSÃO, AMPLIAÇÃO, ESTUDO, ORADOR, QUALIDADE, RELATOR, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, RITO SUMARIO, CONCESSÃO, LIMINAR, INTERVENÇÃO, MINISTERIO PUBLICO, AGILIZAÇÃO, PROCESSO, DESAPROPRIAÇÃO, REFORMA AGRARIA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, DIREITO DE PROPRIEDADE, PRIORIDADE, ATENDIMENTO, FUNÇÃO, NATUREZA SOCIAL.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, leio e leio em O Globo de hoje, notícia referente ao clima nada satisfatório existente no Pontal do Paranapanema. Setecentas famílias, lideradas pelo Movimento dos Sem-Terra, ocuparam a Fazenda Rancho Grande e ameaçam ocupar outras fazendas da região, enquanto a União democrática Ruralista estimula o armamento de mais de 800 fazendeiros.

A reação dos ruralistas impede que a Fazenda Santa Rita também seja invadida pelos sem-terra. A propriedade é guardada por seguranças armados, que acompanham a movimentação das 1.800 famílias dos sem-terra, acampadas a alguns metros do portão principal, lideradas por José Rainha Júnior.

Esse clima de tensão no acampamento, segundo o jornal O Globo, aumentou nos últimos 15 dias com a morte do fazendeiro Marcelo Negrão, dono da Fazenda Santa Rita. O fazendeiro morreu por problemas cardíacos, atribuídos por sua família à ação dos sem-terra.

Tudo isso demonstra, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que há um clima de beligerância, um clima de inquietação, o que preocupa todos aqueles que têm responsabilidade de procurar soluções que pelo menos minorem o grave problema existente no campo.

Assistimos, de um lado, às invasões das propriedades rurais, na maioria das vezes produtivas; de outro, aos fazendeiros armando-se para conter esse clima de invasão.

Esses acontecimentos são muito preocupantes para todos do Congresso Nacional, que temos a nossa parcela de responsabilidade. É coisa que não se pode admitir. A solução dos conflitos, necessariamente, terá que passar pela melhor aplicação do Direito, ou seja, pelo Poder Judiciário.

Venho a esta tribuna hoje, Sr. Presidente, trazendo a preocupação com a reforma agrária, para dizer a esta Casa que devemos analisar em breve três projetos de lei oriundos da Câmara dos Deputados. Atribuiu-me a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania esses três projetos para relatar. Eles têm íntima relação um com o outro. Um deles diz respeito ao rito sumário; o outro, à concessão ou não de liminares nas ações movidas pelos proprietários para desalojar aqueles que invadem as suas propriedades; e o outro, à intervenção do Ministério Público nessas causas.

Como dois desses projetos já estão comigo há seguramente trinta dias, Sr. Presidente, Srs. Senadores, e o terceiro foi-me entregue na semana, penso que tenho o dever de vir a esta Casa para dizer que estudo meticulosamente esses assuntos e que já tenho até opinião formada em um deles.

Vou admitir no meu relatório, sem dúvida nenhuma, a intervenção do Ministério Público em todas as ações possessórias de interesse coletivo, para ajudar na solução dos conflitos.

Todos nós sabemos que o Constituinte de 1988 deu ao Ministério Público uma série de novas atribuições. Entendo e considero que este projeto que veio da Câmara dos Deputados é de fundamental importância, pois permite que o Ministério Público, agindo como fiscal da lei e como defensor da sociedade - ele que já tem inúmeras atribuições -, colabore nos conflitos agrários em nosso País. Temos que deixar isso bem explicitado no parecer que vamos emitir, ao ratificar o projeto que veio da Câmara dos Deputados, no que diz respeito à participação do Ministério Público.

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª me concede um aparte?

O SR. RAMEZ TEBET - Tem V. Exª a palavra.

O Sr. Ademir Andrade - Senador Ramez Tebet, tenho acompanhado de perto este assunto porque, até pelo acesso que os sem-terra, os trabalhadores rurais de uma maneira geral, têm a nós, sou obrigado a permanentemente estar em contato com eles. Percebo que há uma total falta de responsabilidade, um total desinteresse por parte do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Hoje em dia, a maioria dos fazendeiros, dos proprietários rurais - eu pelo menos conheço mais de cem casos somente na minha região -, está interessada em negociar com o Governo pelo preço que ele paga pela desapropriação de suas terras. Grande parte dessas terras já está ocupada. Foi feito quase que um acordo entre trabalhadores e proprietários. Os processos estão em andamento, mas não chegam a conclusão alguma. O Governo não consegue terminar a desapropriação dessas terras, pois não coloca recursos à disposição do Ministério da Reforma Agrária. Diria que o Presidente Fernando Henrique Cardoso é um homem que sabe conversar muito, mas que age pouco. Sua Excelência conhece pouco a realidade do nosso País. Sua Excelência apresenta mil propostas e mil soluções que não chegam a canto algum. Não vemos coisa alguma se concretizar. Traz crianças ao Palácio e, no dia seguinte, elas estão trabalhando no canavial novamente. O Presidente Fernando Henrique deveria se envergonhar disso. Deveria colocar os pés no chão e se conscientizar de que não é um supersenhor; ele é um cidadão, é um homem como outro qualquer. Sua Excelência se empolgou demais com o cargo que ocupa e esqueceu a realidade. O Presidente está vivendo muito distante da realidade, cercado por pessoas que não o colocam a par das necessidades do povo. E não está conseguindo concretizar nenhum de seus objetivos, muito menos seu tímido projeto de assentamento de reforma agrária. Sinceramente, tenho vergonha do Presidente do meu País. Vergonha pela sua atitude em várias questões: na reforma agrária, na forma como agiu com os garimpeiros de Serra Pelada e ainda está agindo. É revoltante! Ou o Presidente se conserta, muda sua maneira de ser, coloca os pés no chão e acorda para a realidade, ou não conseguirá mais se eleger a coisa alguma neste País. Muito obrigado, Senador Ramez Tebet.

O SR. RAMEZ TEBET - Senador Ademir Andrade, vou me permitir discordar de V. Exª quanto aos conceitos emitidos com relação ao Presidente da República. Estou relatando os projetos a que me referi e tenho notado, por parte do Presidente da República e por parte do Ministro da Reforma Agrária, Raul Jungmann, a vontade de resolver o problema agrário do País. É difícil. Reconhecemos o clima de dificuldades que o País atravessa. Mas todos nós, ao invés da crítica fácil, devemos apontar os problemas e procurar ajudar a solucioná-los. A crítica às vezes é muito fácil. Mas quando vamos enfrentar a realidade, meu caro Senador, as coisas são difíceis.

Prefiro acreditar que temos, sim, um bom Presidente da República, disposto a solucionar os problemas do País, disposto a fazer as reformas de que necessitamos e entre elas a reforma agrária. Mas que seja uma reforma agrária justa, humana, cristã; que seja uma reforma agrária que atenda aos trabalhadores sem terra, que atenda àqueles que querem realmente trabalhar a terra e àqueles que vivem dela, mas uma reforma agrária também que não inviabilize o sistema produtivo do País.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, continuando o meu raciocínio no sentido de prestar contas a esta Casa e suas Lideranças, principalmente àqueles que têm me procurado, a fim de que eu agilize rapidamente o meu relatório e emita rapidamente os meus pareceres, quero dizer que tais matérias estão relacionadas e que os pareceres serão emitidos quando reiniciarmos nossos trabalhos. Já tenho uma opinião formada, como vinha afirmando antes do aparte do nobre Senador Ademir Andrade, quanto à necessidade da participação do Ministério Público, também no co-objetivo de agilizarmos os processos de desapropriação na sua tramitação perante o Poder Judiciário; mas, para isso, precisamos de, efetivamente, buscar os recursos indispensáveis.

Concordo com V. Exª quando diz que as terras, hoje, no Brasil, caíram muito de preço. A partir do momento em que se encontrem os recursos, que o Tesouro tenha esses recursos, e que realmente haja vontade política para que sejam colocados à disposição do Ministério da Reforma Agrária, tenho certeza de que vamos agilizar os processos de desapropriação em andamento, proporcionando o assentamento de milhares e milhares de trabalhadores que querem realmente trabalhar a terra.

Sou daqueles que entendem que devemos cadastrar os trabalhadores rurais, sabermos realmente quem é trabalhador rural neste País. E, quando existirem recursos para promover as desapropriações, que se façam esses assentamentos, que se coloque na terra o verdadeiro trabalhador rural.

Então, esse é o segundo projeto que tenho sob minha responsabilidade.

O terceiro, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é um projeto que regulamenta ou procura regulamentar a concessão de medidas liminares. Sem dúvida alguma, esse está me preocupando muito e exigindo um aprofundamento maior por parte do Relator que está aqui hoje, para prestar contas a esta Casa. Procuro obedecer os prazos regimentais, que, desta feita, ultrapassei; mas me comprometi com as Lideranças desta Casa e especificamente com aqueles que mais me têm cobrado. Tenho constantemente dado satisfação à nobre Liderança do PT nesta Casa, mas estou consciente de que esses projetos que estão sob minha responsabilidade, que serão votados aqui nesta Casa, vão receber, naturalmente, emendas dos Senadores preocupados com o problema da reforma agrária neste País. Por si só, eles não vão solucionar o problema agrário, o problema que aflige milhões de trabalhadores e preocupa, sem dúvida alguma, o sistema produtivo do País.

O Sr. Bernardo Cabral - V. Exª me concede um aparte, nobre Senador Ramez Tebet?

O SR. RAMEZ TEBET - Com muito prazer, nobre Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador Ramez Tebet, interrompo V. Exª para declarar que esta Casa, ao longo de dois anos, tem acompanhado a atuação de V. Exª, séria, respeitável e respeitada, sabendo que os projetos sobre os quais V. Exª se debruça para dar parecer, ou sobre aqueles que V. Exª é convocado a opinar, sempre têm a marca de quem desempenha o seu mandato com a mais absoluta sinceridade, probidade e voltado para os interesses populares. Quando V. Exª toca neste problema sério, o da reforma agrária, o faz sentindo na pele a experiência que tem no seu Estado, que, por alguns, é considerado latifundiário e, por outros, explorador. Mas ninguém busca a causa; só reclamam-se os efeitos. Presto meu testemunho de que V. Exª tem sido um defensor permanente da idéia de que não haja conflito fundiário, mas que se encontre um modus vivendi para que alguns não percam o seu sagrado direito de propriedade e para que outros não se vejam distanciados de um pedaço de terra que assegure a sua sobrevivência. Queria dar o meu testemunho sobre o trabalho de V. Exª.

O SR. RAMEZ TEBET - Senador Bernardo Cabral, V. Exª sempre foi muito generoso comigo. De sorte que recolho o seu aparte como um estímulo para o trabalho que venho desenvolvendo nesta Casa e, particularmente, para esses três projetos que estão sob nossa responsabilidade, os quais mexem na legislação substantiva e na legislação adjetiva e, portanto, merecem um meticuloso e profundo estudo por parte de um Relator que tenha a obrigação de melhor estudar a matéria, para que a mesma sirva de norte ao seus Colegas desta Casa.

O nosso objetivo é o mesmo: a paz social. Pretendemos dar a nossa colaboração no sentido de que haja uma efetiva reforma agrária neste País, para que o trabalhador rural seja beneficiado e o sistema produtivo deste País não seja prejudicado e não sofra mais! Realmente, é preciso atentar-se para o direito de propriedade, que hoje tem uma nova dimensão, não é mais absoluto e, muito mais do que ontem, deve atender à sua função eminentemente social.

É com essa preocupação que estamos analisando os três projetos sob a nossa responsabilidade. Formulamos votos de paz no campo. Que ninguém se arme e que o campo não se transforme em uma revolução neste País de tradição cristã, que sempre se entrelaçou, País da harmonia, sem discriminação, País grande na sua extensão territorial, País beneficiado sob todos os aspectos pela natureza. Que neste País haja desenvolvimento em um clima de verdadeira harmonia e paz. É com esse objetivo que estamos analisando essa matéria.

Vamos propor a esta Casa, logo que reinicie os seus trabalhos, os nossos pareceres sobre essas três matérias. Lembro que vamos ter aqui no Plenário do Senado Federal, no dia 19, um debate ao qual comparecerão o Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura - Contag -, o Sr. Francisco Urbano, e o Presidente da Federação Nacional da Agricultura, Sr. Antonio Ernesto Werner de Salvo. Comparecerão, ainda, representantes dos sem-terra na pessoa do Sr. João Pedro Stédile e Gilmar Mauro. Ainda estarão nesta Casa os Srs. Francisco Dal'Chiavon, Presidente da Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil, bem como o Presidente da Sociedade Rural Brasileira, Luiz Marcos Suplicy Hafers. Estarão presentes também dois Ministros de Estado, a saber: o Sr. Raul Jungmann, Ministro Extraordinário da Reforma Agrária, e o nosso colega de Senado, hoje no Ministério da Agricultura, Sr. Arlindo Porto.

Todas essas personalidades aqui estarão presentes para um debate sobre a estrutura fundiária e a reforma agrária neste País. Esse evento será realizado no dia 19, oportunidade que coincide com a data da apresentação - alguns dias depois naturalmente - que terei de fazer do relatório sobre os três projetos que estão sob minha responsabilidade.

Sr. Presidente, estou confiante em que o Congresso Nacional está dando e dará sua parcela de contribuição para que, num breve espaço de tempo, possamos continuar trabalhando na busca da paz social, na busca de mais justiça social para este País; tudo isso em um clima de harmonia, sem que haja o clima hoje existente no Pontal do Paranapanema - região que conheço bem por estar ali pertinho do Estado que represento, o Mato Grosso do Sul, às margens do caudaloso rio Paraná. O clima de tensão ali reinante, um clima realmente preocupante, não é aquele que nós ou as famílias brasileiras desejamos.

Não acredito, Sr. Presidente, que invasão seja uma forma de pressão para se resolverem os conflitos agrários neste País. Acredito firmemente que, por meio de debates produtivos, por meio da vontade política do Governo Federal, do Congresso Nacional, de toda a sociedade brasileira, chegaremos a bom termo - se Deus quiser!

Senador José Eduardo Dutra, representante aqui do Partido dos Trabalhadores, V. Exª tem sido tolerante comigo, mas era essa a afirmativa que fiquei de fazer nesta Casa para tranqüilizar as Lideranças quanto ao trabalho que estou realizando.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/1996 - Página 17974