Discurso no Senado Federal

TEOR DE CORRESPONDENCIA DA ASSOCIAÇÃO DOS PECUARISTAS DO AMAZONAS, RECEBIDA POR S.EXA. RELATANDO AS DIFICULDADES DA AGRICULTURA EM TODO O ESTADO, APONTANDO EQUIVOCOS DA POLITICA AGRICOLA DO GOVERNO FEDERAL E PROPONDO ALGUMAS SUGESTÕES.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • TEOR DE CORRESPONDENCIA DA ASSOCIAÇÃO DOS PECUARISTAS DO AMAZONAS, RECEBIDA POR S.EXA. RELATANDO AS DIFICULDADES DA AGRICULTURA EM TODO O ESTADO, APONTANDO EQUIVOCOS DA POLITICA AGRICOLA DO GOVERNO FEDERAL E PROPONDO ALGUMAS SUGESTÕES.
Publicação
Publicação no DSF de 05/11/1996 - Página 18059
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ANALISE, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, BRASIL, PRIORIDADE, INDUSTRIALIZAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, AGRICULTURA, DIREÇÃO, BENEFICIO, PRODUTOR RURAL, LATIFUNDIO.
  • PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, PEQUENO PRODUTOR RURAL, PROBLEMA, CREDITO AGRICOLA, AUSENCIA, ASSISTENCIA TECNICA, DEFICIENCIA, INFRAESTRUTURA, PRODUÇÃO, COMERCIALIZAÇÃO, INFERIORIDADE, QUALIDADE DE VIDA, FALTA, SEGURANÇA, PREÇO.
  • DEFESA, REIVINDICAÇÃO, ASSOCIAÇÃO RURAL, PECUARIA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), MELHORIA, POLITICA AGRICOLA, VALORIZAÇÃO, AGRICULTURA.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dias atrás, recebi da Presidência da Associação dos Pecuaristas do Amazonas correspondência relatando a difícil situação por que passa todo o setor agrícola do meu Estado. Além de mostrar os pontos vitais que necessitam urgentemente da atenção do Governo Federal para que a agricultura amazonense consiga superar a sua crise, a Associação pediu a minha intervenção e prontamente resolvi trazer o assunto a este plenário.

Às vésperas da Cúpula sobre Alimentação que acontecerá em Roma, no corrente mês, o problema agrário continua dos mais discutidos por toda a parte, principalmente nos países em vias de desenvolvimento.

Em nosso País, as políticas econômicas que foram elaboradas nos últimos cinqüenta anos sempre privilegiaram a idéia de que o desenvolvimento era conseqüência direta da industrialização. Seguindo esse raciocínio, bastava aplicar uma estratégia eficiente ao crescimento industrial para se alcançar rapidamente a plena transformação das estruturas sociais. Tal concepção, entretanto, era encarada apenas em seu aspecto econômico propriamente dito, deixando de lado, como variáveis secundárias, as implicações de ordem sociológicas que se operariam nas velhas estruturas. Assim, sempre se deu enorme oportunidade ao setor secundário da economia, através de incentivos fiscais, de subsídios e de uma gama de favores governamentais. Com isso, ele pôde, ao longo dos anos, desenvolver-se e, ao mesmo tempo, apoderar-se de rendas consideráveis geradas plena agricultura. Inegavelmente, isso provocou uma concentração social e espacial muito grande da riqueza produzida, em mãos de alguns grupos poderosos. Dessa maneira, algumas empresas nacionais importantes e conglomerados multinacionais em atividade no País compunham a cena do chamado "milagre econômico brasileiro" do início da década de 70. Ao mesmo tempo, o sistema agrícola amargava um desenvolvimento desordenado e elitista, imposto de fora pelos interesses do "complexo agribusiness", dominado integralmente pelo grupo dos sete países mais ricos do mundo.

Infelizmente, a agricultura sempre foi vista em nosso País com desconfiança e com uma significativa dose de preconceito. A meu ver, esse julgamento de valor, detentor, portanto, de raízes históricas, tem determinado, desde os primórdios, os fundamentos de todas as políticas agrícolas governamentais. Ele explica, ao mesmo tempo, os motivos do fracasso das sucessivas estratégias aplicadas ao setor e, também, os aspectos importantes da divisão internacional do trabalho, na qual estamos inseridos.

Ainda, seguindo o mesmo raciocínio, podemos dizer que o Brasil conseguiu consolidar uma tipologia agrícola, que fora implantada no período colonial, quando os portugueses estimularam as culturas de exportação e deixaram em plano secundário, entregue à sua própria sorte e aos seus próprios recursos e esforços, a produção destinada ao consumo interno das grandes massas. Até hoje, a política que beneficia as grandes empresas agrícolas, os grandes latifundiários e os capitais internacionais, em detrimento do pequeno e médio produtores, continua comandando o setor primário da nossa economia.

Essa orientação, que leva aos grandes e poderosos o auxílio, o apoio e os favores oficiais, por meio do crédito fácil e subsidiado, da assistência agroeconômica, da pesquisa avançada, da orientação capitalista da comercialização e da garantia de um preço mínimo compensador, deixa o pequeno e o médio produtores na mais completa marginalidade. Eles vivem a mercê da agiotagem dos grandes bancos, da ausência de conhecimentos técnicos e agronômicos aplicáveis às suas culturas, da deficiência de infra-estrutura, o que só tem causado transtornos e mais prejuízos, das dificuldades para o escoamento da produção por falta de estradas vicinais, da falta de escolas, postos de saúde e comunicações na zona rural, da incipiente eletrificação rural e das oscilações constantes dos preços agrícolas. Diante das evidências, não se pode negar que o País se ressente da falta de uma política agrícola.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, são justamente esses os pontos colocados pela Associação dos Pecuaristas do Amazonas na carta a mim endereçada. Daqui deste plenário tenho a honra de servir como porta-voz e defensor dessas reivindicações. Os problemas que atingem os pecuaristas e produtores agrícolas do Amazonas são os mesmos que há no resto do Brasil. O clima pode ser diferente, o sotaque pode ser diverso, os produtos podem não ter semelhança, mas as preocupações, as expectativas e as carências são as mesmas.

Ninguém de bom senso poderá deixar de admitir que a desestruturação da agricultura brasileira poderá acarretar sérias conseqüências para o sistema econômico como um todo. Além disso, apesar de todo o preconceito, é preciso relembrar que todo o complexo agrícola representa cerca de 35% do Produto Interno Bruto, cerca de 60% das exportações e em torno de 28% da força de trabalho do País.

Não acho justo ver pais de família e trabalhadores rurais honestos atravessarem tamanhas dificuldades. Apesar de tudo, não podemos desconhecer que o Presidente Fernando Henrique Cardoso e o Ministro Arlindo Porto, nosso colega, têm realizado esforços no sentido de diminuir essas contradições. Todavia, achamos que as autoridades governamentais ainda podem fazer muito mais do que estão fazendo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os pecuaristas do meu estado são vítimas das altas taxas de juros, da escassez de crédito agrícola para os pequenos, da falta de atenção dos órgãos oficiais, da pressão dos grandes cartéis da bovinocultura, dos preços altos dos animais adquiridos em exposições e da enorme dificuldade de comercialização para os seus produtos.

Esses são, inquestionavelmente, os ingredientes de uma política agrícola ainda pouco objetiva, que deveria, ao contrário, evitar, por todos os meios, que o País se transforme rapidamente numa grande plantação ou em um enorme curral, dominado por algumas megaempresas ou alguns megagrupos, comandados a partir de Washington, Tóquio ou Berlim.

Neste momento, a economia brasileira está precisando de um novo impulso para garantir de vez a estabilização. Não tenho dúvida de que a agricultura é a grande alternativa e, além do mais, uma fonte inesgotável de geração de renda, de divisas e de empregos.

Não nos podemos esquecer de que a necessidade mundial por produtos agrícolas de todas as espécies apresenta-se neste instante com enormes perspectivas.

É hora de o Brasil dar a sua grande virada histórica, criando milhões de empregos, distribuindo renda e contribuindo, decisivamente, para alimentar o mundo.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/11/1996 - Página 18059