Discurso no Senado Federal

DISCORDANCIAS DE S.EXA. EM RELAÇÃO A INSTITUIÇÃO DO 'PROVÃO'. LAMENTANDO A SAIDA DO MINISTRO ADIB JATENE, DA SAUDE.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.:
  • DISCORDANCIAS DE S.EXA. EM RELAÇÃO A INSTITUIÇÃO DO 'PROVÃO'. LAMENTANDO A SAIDA DO MINISTRO ADIB JATENE, DA SAUDE.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/1996 - Página 18337
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.
Indexação
  • DISCORDANCIA, CRIAÇÃO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), EXAME ESCOLAR, AVALIAÇÃO, EFICIENCIA, UNIVERSIDADE, PAIS.
  • HOMENAGEM, ADIB JATENE, EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), OPORTUNIDADE, SAIDA, MINISTERIO.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (PDT-AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem foi realizado no País o chamado "provão", metodologia adotada pelo Ministério da Educação com o objetivo de avaliar as universidades brasileiras. Quero, nesta oportunidade, expor a minha desconfiança quanto à eficácia dessa metodologia.

Nós sabemos dos males que dominam não só as universidades públicas mas também as privadas. Sobretudo nas universidades públicas, que conheço de perto, porque freqüentei uma delas, há muitas dificuldades, faltam condições ideais para que se faça um bom curso, qualquer que seja ele.

O que mais impressiona no provão é que acredito que o Ministro da Educação e o Governo estejam esperançosos de poderem, com o resultado desses testes, de fato, avaliar as universidades brasileiras. Isso, como disse, impressiona-me, porque considero grande equívoco pensar que apenas avaliando os estudantes pode-se chegar a uma conclusão eficaz quanto à metodologia e ao desempenho da universidade como um todo. Acredito que, para se ter realmente uma avaliação séria e responsável das universidades brasileiras, no mínimo, deveriam ser também avaliados os professores universitários, porque o bom desempenho do aluno, qualquer que seja a etapa de sua educação, seja na escola fundamental, seja na universidade, depende essencialmente de seus professores, de seus mestres. O Ministério da Educação avalia os estudantes, os concluintes, e não avalia os professores. Ele pode estar cometendo um grande equívoco, haja vista que existem estudantes autodidatas. Assim, poderá haver bons alunos de determinada universidade que tinham maus professores ou, ao contrário, poderá haver maus alunos que tiveram bons professores. O mais comum é que os maus alunos resultem de um ensinamento deficiente, o que ocorre na maioria das universidades de nosso País. Por isso, defendemos essa tese. Para que o Ministério da Educação possa cumprir seu real objetivo de avaliar as universidades teria, obrigatoriamente, de avaliar também os professores universitários e não apenas os estudantes. Outra coisa que nos deixa sem compreender direito os objetivos do provão é o fato de o Governo e o Ministro da Educação não terem explicado claramente o que acontecerá, quais serão os passos seguintes com relação a essa avaliação que começou ontem nas universidades brasileiras. O que pretende de fato o Governo? Quais são os seus reais objetivos? É apenas fazer uma avaliação de cursos, uma avaliação da universidade? Será que por trás disso está também o objetivo de diminuir os recursos das universidades públicas que tiverem um desempenho precário, ou seja, cujos ex-alunos não obtiveram um resultado satisfatório nos testes? Será que é influenciar no mercado de trabalho indicando um ranking das melhores universidades brasileiras?

Esse objetivo não me parece claro, e é por isso que temos uma posição de desconfiança e de oposição a essa metodologia, a forma como foi proposta e está sendo executada.

Tomamos conhecimento, pela imprensa, de denúncias de desorganização na implementação e aplicação dessas provas. O Ministério da Educação, que quer avaliar o desempenho das universidades e a eficácia dos cursos, demonstra desorganização na aplicação dessas provas, um sinal de que ele próprio precisa ser avaliado. E quem vai avaliar agora o Ministério da Educação?

Sr. Presidente, deixo registrado, nesta tarde, que o Ministério da Educação precisa reformular a sua proposta, a sua metodologia. Acredito que os estudantes, ao demonstrarem a sua contrariedade e oposição a esse provão, esperavam que o Ministério da Educação, ao propor esse exame, o fizesse de forma mais ampla - além de avaliar as universidades, que pudesse servir como meio de fiscalizar internamente as instituições de ensino do País.

Quero também, Sr. Presidente, nesta oportunidade, lamentar a saída do Ministro Adib Jatene do Ministério da Saúde. Faço isso de forma suprapartidária. Todos sabem que sou PDT e não tenho nenhum vínculo político com o Ministro da Saúde, mas tenho no Prof. Jatene um homem competente e, acima disso, um homem comprometido com as mudanças sociais.

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª me permite um aparte?

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Ademir Andrade - Senador Sebastião Rocha, tenho grande admiração por V. Exª. Gosto muito de V. Exª, sou seu amigo pessoal e admiro o seu trabalho. Mas, desta vez, permita-me discordar de V. Exª. O ex-Ministro Adib Jatene foi o ministro da privatização da saúde e fez um mal enorme à saúde pública do nosso Brasil desde que foi ministro do Governo Fernando Collor de Mello. Em outros tempos, Senador, a saúde era muito melhor no nosso Brasil: o INPS tinha o seu corpo de atendimento médico, a Fundação Nacional de Saúde era uma entidade respeitada em toda o País, a Sucam funcionava no combate às endemias na nossa região. O ex-Ministro Adib Jatene destruiu tudo isso e privatizou a saúde. Hoje, com a criação do Sistema Único de Saúde, 90% dos recursos públicos estão sendo destinados a hospitais, clínicas e laboratórios particulares. Hoje, paga-se à saúde privada. O governo, que diz que privatiza para assumir a sua obrigação social para com a saúde, com a educação e com a segurança, na verdade, não faz nada disso. Para mim, o ex-Ministro Adib Jatene pode ser um homem honesto e um bom médico, profissional competente, mas, como político da saúde, foi o pior que o Brasil já teve. Ele não lutou para obter recursos para a saúde pública, mas para melhorar a saúde privada no Brasil, para privilegiar os que comercializam com a saúde. Na minha opinião, o Ministro Adib Jatene não faz falta alguma. Não sei se o que virá terá o mesmo posicionamento político que S. Exª, que é o posicionamento político deste governo que aí está, o Governo Fernando Henrique Cardoso - que é a seqüência do Governo Collor de Melo -, que não consegue resolver nenhum problema fundamental desta Nação. É um Governo incapaz, que só soube resolver o problema da inflação e absolutamente mais nada. Portanto, Senador Sebastião Rocha, o que é preciso mudar é a política de saúde, no sentido de privilegiar a saúde pública, de se ter bons profissionais de saúde, bem remunerados. É preciso acabar com essa história de se remunerar o trabalho desses profissionais pela produção. Hoje em dia, saúde virou mercadoria; o médico recebe pelo número de operações, pelo número de consultas, pelo número de atendimentos, o que se constitui no maior absurdo que já vi na minha vida. Enquanto não se mudar esta política de saúde, não estaremos andando em um bom caminho. Lamento discordar de V. Exª, mas creio que o Ministro Adib Jatene foi o pior ministro para a saúde pública do nosso Brasil.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Senador Ademir Andrade, V. Exª sabe do respeito que também devoto pela sua pessoa e pelas suas posições políticas nesta Casa. Contudo, mantenho a minha avaliação de que o Ministro Adib Jatene buscou o caminho mais correto para a saúde, sobretudo na questão do suporte adequado de recursos para a saúde como um todo.

O que existe na relação do governo com o serviço de saúde privado está na Constituição. A Constituição brasileira permite que os hospitais privados atendam, de forma suplementar, os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde, que complementem os serviços públicos que são inadequados no atendimento à população.

O Ministro Adib Jatene seguia uma linha de governo, como V. Exª muito bem colocou: Governo Collor, Governo Itamar Franco e agora Governo Fernando Henrique Cardoso. Qualquer Ministro da Saúde de um governo neoliberal como este dificilmente fará melhor do que estava fazendo o Ministro Jatene. Essa convicção eu tenho, até em função dos nomes que estão sendo cogitados para assumir o Ministério. São nomes de natureza essencialmente técnica. Lógico que é preciso ter sensibilidade, conhecimento e prestígio político, mas é de natureza essencialmente técnica. Fala-se em colocar economistas, sociólogos, antropólogos, profissionais de outras áreas. Isso me faz colocar em dúvida se o Presidente Fernando Henrique Cardoso não conta, no seu Governo, com profissionais da saúde competentes e que não tenham sensibilidade política. Sei que essa suposição não é verdadeira. Conheço, aqui no Senado, parlamentares não ligados diretamente à saúde, que, certamente, teriam grande desempenho à frente do Ministério da Saúde. O motivo então não é falta ou carência de profissionais da saúde nos partidos governistas. É apenas, parece-me, para fazer uma nova composição política, tendo em vista a reeleição. Parece-me que o Ministro Adib Jatene foi eliminado do Governo muito mais em função de o Presidente Fernando Henrique Cardoso precisar arrumar novamente a Casa, precisar fazer uma nova composição política, tendo em vista não só a reeleição, mas a Presidência do Senado e a Presidência da Câmara dos Deputados, sobretudo essas três ações que o Congresso irá empreender nos próximos meses e que fazem com que o Presidente possa chegar ao ponto do colocar, por exemplo, um técnico de uma outra área.

Sr. Presidente, não sou corporativista e, no meu Estado, já demonstrei isso, quando me opus a algumas questões do setor de saúde e dos próprios médicos. Então não é corporativismo achar que tem que ser obrigatoriamente um médico que deva comandar o Ministério da Saúde. Mas desde que o Presidente conte, entre seus aliados, com pessoas de confiança, do próprio setor, não vejo razão para nomear técnicos de outras áreas.

Eu concluo, mantendo a minha avaliação de que o Ministro Jatene teve talvez o que nenhum outro ministro deste Governo tem, que é a hombridade de enfrentar o Governo, de discutir, de lutar por aquilo que acredita. Eu mesmo condenei, em pronunciamento recente aqui no plenário, a tentativa de privatização dos hospitais, Senador Ademir Andrade. Condeno esses contratos de gestão, essas organizações sociais que o Governo pretende criar por medida provisória. O Governo quer estabelecer que pelo menos 15% dos leitos dos hospitais públicos - olha aonde quer chegar o Governo!... O Senador Ademir Andrade criticou que, em sua grande parte, recursos públicos estão indo para hospitais privados. É uma verdade, e a Constituição permite isso. Mas, agora, o Presidente Fernando Henrique Cardoso quer transformar hospitais públicos em organizações sociais e estabelecer que 15% a 20% dos leitos sejam reservados para os atendimentos particulares. Isso, hoje; pode ser que daqui a um ano seja 30%; mais tarde, 50%.

Aí está um grande equívoco do Governo Fernando Henrique Cardoso e do Ministro Adib Jatene. Tenho muito desprendimento para criticar o Ministro no que considero um erro de S. Exª. E esse era um equívoco que se o Ministro apoiasse publicamente, eu iria combater e discordar, como já fiz no plenário desta Casa.

O setor da Saúde precisa de mais verbas. Os Constituintes de 1988 estabeleceram, por exemplo, que 25% do Orçamento dos Estados, dos Municípios e 18% da União deveriam ser aplicados na Educação. Um acerto; temos que aplaudir. Mas se esqueceram da Saúde, que é outro pilar de sustentação da sociedade. Realmente, Governos anteriores nunca deram a atenção devida ao setor Saúde. Os Constituintes também não o fizeram. Poderiam ter estabelecido o mínimo de aplicação na Saúde.

Conheço Município em meu Estado onde a Prefeitura não aplica um centavo do orçamento próprio na Saúde. Os Secretários têm que utilizar apenas os recursos do SUS que é a remuneração da prestação de serviços, seja ambulatorial, seja hospitalar que o Governo Federal mantém. As Prefeituras, creio que muitas delas, centenas, talvez milhares, e alguns Governos estaduais gastam bem menos do que deveriam com o setor Saúde. Por isso, entendo que deveríamos tentar estabelecer um piso mínimo a ser aplicado na Saúde Pública do País. Muita coisa deve mudar no setor, muita coisa deve ser feita.

Entretanto, minha avaliação é que o Ministro Jatene vinha cumprindo seu papel. Dificilmente outro que o substitua fará melhor.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/1996 - Página 18337