Discurso no Senado Federal

ESTRANHEZA COM RELAÇÃO A APROVAÇÃO PELA COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, ONTEM, NA AUSENCIA DE S.EXA., QUE ERA O RELATOR DA MATERIA, DE AUTORIZAÇÃO PARA QUE A UNIÃO RECEBA PAGAMENTO DE DIVIDA DE ENERGIA ELETRICA FORNECIDA PELA HIDRELETRICA DE ITAIPU A ANDE, COMPANHIA ESTATAL PARAGUAIA, TITULOS DA DIVIDA EXTERNA BRASILEIRA, ADQUIRIDOS COM DESAGIO NO MERCADO SECUNDARIO. CONSIDERAÇÕES SOBRE PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, DENTRO DO CONTEXTO DA SOBERANIA NACIONAL. COBRANDO UMA PROVIDENCIA OFICIAL QUANTO A SUA DENUNCIA ENVOLVENDO A EXPORTAÇÃO DE CIGARROS PARA O PARAGUAI, QUE POSTERIORMENTE SÃO COMERCIALIZADOS NO MERCADO NACIONAL COMO CONTRABANDO, GERANDO EVASÃO FISCAL NA FORMA DE SONEGAÇÃO DE IPI E ICMS.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. REGIMENTO INTERNO.:
  • ESTRANHEZA COM RELAÇÃO A APROVAÇÃO PELA COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, ONTEM, NA AUSENCIA DE S.EXA., QUE ERA O RELATOR DA MATERIA, DE AUTORIZAÇÃO PARA QUE A UNIÃO RECEBA PAGAMENTO DE DIVIDA DE ENERGIA ELETRICA FORNECIDA PELA HIDRELETRICA DE ITAIPU A ANDE, COMPANHIA ESTATAL PARAGUAIA, TITULOS DA DIVIDA EXTERNA BRASILEIRA, ADQUIRIDOS COM DESAGIO NO MERCADO SECUNDARIO. CONSIDERAÇÕES SOBRE PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, DENTRO DO CONTEXTO DA SOBERANIA NACIONAL. COBRANDO UMA PROVIDENCIA OFICIAL QUANTO A SUA DENUNCIA ENVOLVENDO A EXPORTAÇÃO DE CIGARROS PARA O PARAGUAI, QUE POSTERIORMENTE SÃO COMERCIALIZADOS NO MERCADO NACIONAL COMO CONTRABANDO, GERANDO EVASÃO FISCAL NA FORMA DE SONEGAÇÃO DE IPI E ICMS.
Aparteantes
Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/1996 - Página 17903
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. REGIMENTO INTERNO.
Indexação
  • PROTESTO, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, CONCESSÃO, SUBSIDIOS, EMPRESA DE ENERGIA ELETRICA, PAIS ESTRANGEIRO, PARAGUAI, OPORTUNIDADE, GOVERNO FEDERAL, PRETENSÃO, VENDA, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), DEMISSÃO, FUNCIONARIO PUBLICO.
  • REITERAÇÃO, DENUNCIA, SONEGAÇÃO, IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI), IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), EMPRESA DE FUMO, EXPORTAÇÃO, CIGARRO, COBRANÇA, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero apenas alguns minutos para registrar o fato de que ontem, na minha ausência - eu era o Relator da matéria -, a Comissão de Assuntos Econômicos aprovou uma autorização para que a União, o Erário Nacional, receba as dívidas da energia elétrica fornecida por Itaipu para a ANDE, companhia estatal paraguaia, em títulos da dívida pública brasileira comprados no mercado secundário de New York.

É um subsídio direto - sequer podemos dizer que é indireto - a uma estatal paraguaia, um subsídio altamente suspeito. Se fosse intenção do Governo brasileiro, por algum motivo diplomático ou da política entre os dois países, conceder um abatimento para o consumo de energia elétrica feito pelo Paraguai, podia fazê-lo de forma simples, limpa, clara e direta: autorizando Itaipu a dar o desconto. Por exemplo, pagaria não 100% da dívida, mas 75% em dinheiro, em dólar, como estabelecem as relações entre os dois países, em moeda forte.

No entanto, a Comissão de Assuntos Econômicos aprovou uma mensagem do Governo estabelecendo uma estranha negociação, que envolve bancos, corretoras e comissões, e um custo financeiro de 4%. Eu vinha tentando resistir a essa possibilidade há muito tempo. Lamentavelmente, a reunião da Comissão de Assuntos Econômicos começou com uma hora de atraso, e eu a abandonei para atender a um compromisso previamente estabelecido com a Rede Manchete, para participar do programa "Jogo do Poder", com o jornalista Carlos Chagas. A pauta foi invertida, a votação antecipada e a proposta aprovada: subsídio direto a uma empresa estatal paraguaia ao tempo em que o Presidente da República pretende vender a Vale do Rio Doce; ao tempo em que a Eletrobrás pede aos brasileiros que não tomem banho das 18h às 20h para economizar energia; ao tempo em que se fala em enxugar o funcionalismo público, demitindo 55.000 trabalhadores da União; ao tempo em que são fechadas e privatizadas empresas estatais, necessárias ou desnecessárias.

No caso em tela, o julgamento de valor não é sequer oportuno. Neste momento, estamos dando subsídio direto, através de uma operação estranha que envolve bancos e comissões, a uma estatal paraguaia. Por que a filigrana, a enrolação? Por que não o simples abatimento, puro e claro, na tarifa, dando uma demonstração inequívoca de que o Brasil, por circunstâncias diplomáticas e políticas, desejaria, neste momento, privilegiar uma estatal paraguaia? Por que não fazê-lo sem corretoras, bancos, comissões e títulos da dívida externa brasileira?

O Sr. Ney Suassuna - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ROBERTO REQUIÃO - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Ney Suassuna - V. Exª se refere à reunião de ontem da Comissão de Assuntos Econômicos. Aproveito o gancho para deixar no plenário um protesto contra o fato de se ter, simultaneamente, três, quatro reuniões, quando não são as tradicionais. Por exemplo: tentamos ter a reunião da Comissão de Economia na data normal, e não houve. Ontem, houve uma reunião extraordinária. Na mesma hora estavam sendo realizadas reuniões da Comissão de Saúde e da CCJC, que é tradicional. Os Senadores que pertencem a duas comissões terminam não podendo comparecer a uma delas. Ao chegar ao plenário, já tinham resolvido esse e muitos outros problemas importantes. Por quê? Porque não somos onipresentes. Então, devemos manter sempre a data correta da reunião de cada comissão. Não se pode ter duas ou três comissões ao mesmo tempo, porque acaba acontecendo isso que V. Exª está citando, ou seja, assuntos importantes não têm a participação dos parlamentares nas discussões, ou, então, as reuniões são realizadas em data não usual, ou, ainda, invertem a pauta.

O SR. ROBERTO REQUIÃO - Não só a inversão de pauta, Senador, mas também a pauta extra. Se temos interesse em acompanhar determinada matéria, em votação nas comissões, verificamos a pauta que recebemos em nosso gabinete e vemos que a matéria não está incluída; entretanto, repentinamente, por uma proposta de algum Senador e decisão da comissão, a matéria surge em pauta extra e não se tem oportunidade de discuti-la. O contraditório não se estabelece.

Mas quero deixar claro que esse subsídio à companhia ANDE é absolutamente inaceitável, principalmente pela forma como está sendo feito. Não é direto, não é claro. O Paraguai aparenta estar fazendo um favor ao Brasil comprando títulos da dívida externa quando o abatimento poderia ser feito de forma clara, direta e absolutamente tranqüila do ponto de vista de sua licitude.

Atrás desse processo existem algumas coisas realmente inconfessáveis, um processo de abatimento de subsídio claro, cheio de filigranas, no momento em que o Governo fecha estatais brasileiras e não concede o mesmo privilégio às empresas estaduais que distribuem ou geram energia elétrica.

Mas o Governo não discute, a Bancada do Governo não aprofunda as coisas, o voto é disciplinado e irracional e, neste momento, os brasileiros, que pagam energia elétrica a preços corrigidos, estarão subsidiando a energia elétrica de uma estatal paraguaia, para a qual o Governo não pede o enxugamento de funcionários e as demissões.

Tudo isso acontece num contexto terrível, em que nos encontramos na iminência de ver o subsolo brasileiro alienado, com a venda da Vale do Rio Doce, o maior complexo de mineração do Planeta, o que dará ao grupo que o adquirir um poder político extraordinário no Brasil. Um grupo australiano propõe US$22 bilhões se a compra ou a venda for feita globalmente; não sendo globalmente, o preço cai para US$13 ou 14 bilhões.

Enquanto isso, uma província mineral é descoberta com um milhão de toneladas de ouro, avaliada numa prospecção inicial em US$12 bilhões, mais do que o preço parcelado da Vale do Rio Doce. É mais ou menos a mesma coisa, no meu entendimento, de vendermos o espaço aéreo brasileiro e, daqui para a frente, ou daí em diante, os bem-te-vis e colibris terem que pagar pedágio para voar.

É uma situação rigorosa e absolutamente inexplicável. Não tivesse a Vale do Rio Doce a importância e o tamanho que tem, a privatização de uma jazida aqui e outra ali não seria atentatória à soberania nacional. Mas a insistência da venda e a ocultação de informações no momento em que o próprio conselho de administração da Companhia Vale do Rio Doce nem sequer tem notícia ou informação sobre avaliações feitas por empresas privadas configuram-se, definitivamente, em atentado à soberania nacional. Vender a Vale do Rio Doce é vender também o Palácio do Planalto. Uma empresa desse porte, com essa influência, domina o País e influencia eleições de forma definitiva. É um atentado ao processo democrático, aos conceitos claros de Nação, de Pátria e de soberania que devem presidir a postura de todos os brasileiros e, fundamentalmente, dos Parlamentares.

Estamos vivendo, na República, o "Samba do Crioulo Doido". O Brasil subsidia empresas estatais estrangeiras ao tempo em que quer demitir funcionários públicos, ao tempo em que pretende vender estatais. O País está sem Governo.

Denunciei, neste Plenário, sem uma resposta ou uma providência oficial, até este momento, a sonegação do IPI e do ICMS por parte das fábricas de cigarros. Exportam-se cigarros para o Chile, para o Paraguai, para o Uruguai e para a Argentina. Para o Paraguai, só uma dessas empresas exporta cerca de 150 mil caixas de cigarros por mês. A US$200 a caixa, temos o valor de US$300 milhões mensais de exportação. Sendo o IPI e o ICMS responsáveis por uma tributação de 74%, teríamos um imposto, que deixou de ser recolhido no Brasil pela exoneração fiscal na exportação, da ordem de US$211 milhões.

Esses cigarros não podem ser fumados pelos paraguaios. Para isso, essa população de 4,5 milhões de habitantes deveria fumar, durante 24 horas por dia, um cigarro a cada 10 segundos. Os cigarros voltam como contrabando, Sr. Presidente, ou nem sequer atravessam a fronteira, porque apenas a nota fiscal é carimbada.

Duzentos e onze milhões de dólares! Essa quantia significa exatamente quatro vezes o salário dos 55 mil funcionários públicos federais que o Presidente da República pensa que tem que demitir para equilibrar as finanças brasileiras. É dinheiro demais. Não é corrupção de fiscal de fronteira, é responsabilidade do Presidente da República, do Ministro da Fazenda e do Governo Federal.

A denúncia está sendo reiterada mais essa vez, e espero o mesmo comportamento: o silêncio por parte das fábricas, que não respondem para que não repercuta a denúncia; e o silêncio absoluto por parte do Governo Federal. Duzentos e onze milhões de dólares de sonegação por parte, talvez, de uma única fábrica.

Entrei com requerimento pedindo à Fazenda que me detalhe as exportações de cada fábrica, Philip Morris, Souza Cruz - que não é do Sr. Souza nem do Sr. Cruz, é da British American Tabacco Company e da Sudam -, mês a mês, para cada país. Vamos ver se esses países podem fumar o que compram ou vamos constatar definitivamente a evidência não do contrabando, mas do descaminho, a evidência do carimbo de notas na fronteira.

Até agora, por parte do Governo Federal, apenas o silêncio.

Reitero a denúncia em homenagem aos funcionários públicos federais que devem ser, segundo a vontade do Governo, demitidos. A sonegação do cigarro paga, a cada mês, quatro vezes o salário dos 55 mil funcionários que o Governo pretende demitir.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/1996 - Página 17903