Discurso no Senado Federal

COMPORTAMENTO DAS FABRICAS DE CIGARRO BRASILEIRAS, QUE SIMULAM EXPORTAÇÃO VISANDO ALTOS LUCROS E LESAM O FISCO. PROJETO DE LEI DO SENADO 242, DE 1996, QUE ALTERA A LEGISLAÇÃO DO IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS EM RELAÇÃO AOS CIGARROS DESTINADOS A EXPORTAÇÃO, APRESENTADO POR S.EXA. NA SESSÃO DE ONTEM.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • COMPORTAMENTO DAS FABRICAS DE CIGARRO BRASILEIRAS, QUE SIMULAM EXPORTAÇÃO VISANDO ALTOS LUCROS E LESAM O FISCO. PROJETO DE LEI DO SENADO 242, DE 1996, QUE ALTERA A LEGISLAÇÃO DO IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS EM RELAÇÃO AOS CIGARROS DESTINADOS A EXPORTAÇÃO, APRESENTADO POR S.EXA. NA SESSÃO DE ONTEM.
Aparteantes
Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/1996 - Página 18363
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • DENUNCIA, INDUSTRIA, CIGARRO, SONEGAÇÃO, IMPOSTO DE RENDA, FRAUDE, EXPORTAÇÃO, AMERICA LATINA.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, PROIBIÇÃO, VENDA, BRASIL, CIGARRO, CERVEJA, DESTINAÇÃO, EXPORTAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, UTILIZAÇÃO, MARCAÇÃO, EMBALAGEM.
  • NECESSIDADE, COMBATE, EVASÃO FISCAL, ESPECIFICAÇÃO, SONEGAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI), CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).
  • CRITICA, CORRUPÇÃO, SERVIDOR, FISCALIZAÇÃO, FRONTEIRA, REMESSA, DENUNCIA, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), MINISTERIO DA FAZENDA (MF), RECEITA FEDERAL.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, IMPRENSA, DENUNCIA, SONEGAÇÃO, QUESTIONAMENTO, RELAÇÃO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, INDUSTRIA, CIGARRO, DEPENDENCIA, PROPAGANDA.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por duas ou três vezes eu já trouxe ao conhecimento deste Plenário a denúncia sobre o comportamento das fábricas de cigarro brasileiras, que simulam exportações para os países latino-americanos: Paraguai, Uruguai, Argentina, Chile, Bolívia, e transformam essa suposta exportação de cigarros em um mecanismo para fraudar o Fisco brasileiro. Cheguei a essa conclusão durante a recente campanha eleitoral, ao visitar os municípios de fronteira. Os primeiros números que obtive estão sendo confirmados pelas informações que me chegam: mais de 150 mil caixas de cigarro são exportadas para o Paraguai por uma única empresa. Cento e cinqüenta mil caixas de cigarro a US$200 a caixa somam um valor de US$30 milhões por mês de cigarro exportado para um país de 4,5 milhões de habitantes. Os paraguaios não fumam esse cigarro. Ou ele volta sob a forma de contrabando, ou descaminho, que é o termo técnico mais adequado, ou nem sequer atravessa a nossa fronteira, apenas sendo carimbada a nota fiscal.

Trinta milhões de dólares em caixas de cigarros vendidas no mercado interno proporcionariam arrecadação de R$211 milhões de ICM e de IPI.

Se esses cigarros fossem importados, a alíquota de importação seria 330% do valor. No entanto, essas empresa simulam conscientemente a importação, e as autoridades brasileiras até agora não tomaram nenhuma providência conseqüente. Os cigarros obtidos através do descaminho e os cigarros que jamais atravessaram as fronteiras brasileiras são vendidos nas feiras de todas as grandes cidades brasileiras.

Eu esperava, Sr. Presidente, que a nossa imprensa investigativa, com toda a sua capacidade de mobilização, levasse a denúncia a sério e aprofundasse a investigação. Mas vejo apenas o silêncio, algumas pequenas notas em jornais e a movimentação subterrânea dos lobistas, tentando obter mais informações sobre meu pronunciamento. Resolvi dar conseqüência a essa denúncia e tentar resolver o problema via Parlamento. Apresentei ontem o seguinte projeto de lei - acrescentei cerveja em lata, que é objeto do mesmo contrabando, do mesmo descaminho:

      "O CONGRESSO NACIONAL decreta:

      Art 1º - Os cigarros e cerveja em lata destinados à exportação não poderão ser vendidos nem expostos à venda no País, devendo a embalagem de cada maço ou carteira de vinte unidades e lata de cerveja, bem como os pacotes e outros envoltórios que os contenham, exibir obrigatoriamente tarja vermelha com os seguintes dizeres impressos em letra de cor branca: "Produto para exportação - Venda proibida no Brasil."

      § 1º A tarja, situada em toda a extensão da frente, verso e laterais da parte inferior do maço de cigarro ou da carteira ou lata de cerveja terá a altura mínima de quinze milímetros.

      § 2º Nos pacotes, latas e demais envoltórios, a tarja, na forma do parágrafo anterior, situada perpendicularmente à sua maior dimensão, não poderá ter altura inferior à quinta parte desta.

      § 3º Caso a embalagem tenha cor vermelha ou semelhante, a tarja será verde e os dizeres em letra branca.

      Art. 2º Esta lei entra em vigor trinta dias após a sua publicação.

      Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário."

Justifico o projeto da seguinte maneira:

      "A palavra vergonha não é mais suficiente para definir a situação da venda ilegal de cigarros em nossas cidades. Cigarros destinados originariamente à exportação e que são reintroduzidos clandestinamente no País ou - pior - que daqui sequer chegam a sair são vendidos aos milhares de pacotes nos centros das grandes cidades, à vista de todos e debaixo do nariz das autoridades que deveriam coibir tais práticas criminosas e lesivas à economia nacional.

      Em nossas capitais não são poucas as praças em que encontramos camelôs atrás de seus tabuleiros ou portando uma sacola repleta de cigarros "paraguaios", oferecidos aos transeuntes por um preço bastante atraente. Como esses produtos são idênticos aos destinados à venda interna, fica fácil concluir que a preferência do consumidor inclinar-se-á para a mercadoria mais barata.

      O prejuízo causado à Fazenda Nacional é deveras significativo, pois as operações de exportação de cigarros para o Paraguai e demais países do Cone Sul (que não saem fisicamente do Brasil ou que retornam clandestinamente para cá) vêm crescendo bruscamente nesses últimos anos. Como a exportação não está sujeita a nenhum tributo, subtraem-se dos cofres públicos o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que incidiria sobre o cigarro à alíquota de 330% (trezentos e trinta por cento), e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS), cuja alíquota, no caso, seria de 25% (vinte e cinco por cento), cumulativo com o IPI.

      Além disso, a lei tributária federal confere aos exportadores crédito, para abatimento do IPI devido, equivalente ao valor das contribuições relativas ao PIS e à COFINS, o que faz agravar o dano que essa modalidade de evasão ilegal causa ao Erário, tão carente de recursos para prover as mais elementares necessidades públicas com saúde, educação e segurança. Situações dessa natureza, não atacadas por comodidade e inoperância da Administração Pública, levam esta a propor a criação de novos tributos, como a recém-aprovada CPMF, com o objetivo de compensar as perdas decorrentes das mais variadas e amplamente conhecidas modalidades de sonegação fiscal."

A sonegação de impostos sobre cigarro importa em recursos mais vultosos do que os recursos a serem arrecadados no próximo ano pela CPMF.

      "A ausência de todos esses tributos na exportação faz com que o preço desses cigarros, a despeito do risco e das possíveis propinas envolvidas nas operações ilegais, possa ser reduzido em nosso mercado à metade do preço de varejo do mesmo cigarro destinado legalmente ao mercado interno, o que cria, inclusive, um caso de concorrência desleal, em detrimento de comerciantes honestos e regularmente estabelecidos.

      É claro que perdem, também, os Estados e Municípios. Ambos, pela sua participação no ICMS, que deixa de ser arrecadado em decorrência da exoneração das exportações e pela redução na receita do IPI, imposto que integra o Fundo de Participação dos Estados e dos Municípios.

      O livre comércio dos cigarros, objetos do crime de descaminho, salta aos olhos, ensejando, até mesmo, a desconfiança da opinião pública na lisura de comportamento característica dos agentes encarregados da fiscalização tributária."

Algumas fábricas de cigarro, como por exemplo a Phillip Morris, do Paraná, foram praticamente financiadas com recursos públicos, através do artifício de participação acionária do Erário, pelo Fundo de Desenvolvimento do Estado na composição dessas empresas.

      "Note-se que, atingidas em seus direitos as três esferas de Poder, salvo esperteza magnífica dos comerciantes ilegais de cigarros, é inevitável concluir pela omissão ou corrupção dos servidores dos Fiscos federal, estadual e municipal.

      É, efetivamente, um grande vexame demonstrado por um Poder Público incapaz de desempenhar uma de suas mais comezinhas funções, que é a de reprimir atos ilícitos praticados à luz do dia e sob as barbas das autoridades, e urge que alguma medida de resultado efetivo seja adotada, não bastando as simples denúncias, já reiteradamente apresentadas à Receita Federal, que até agora nenhum efeito surtiram."

Hoje, o Governo Federal lança o Programa de Demissão Voluntária, para excluir da folha de pagamento da União 55 mil funcionários públicos. Uma avaliação ligeira do prejuízo que a União e os Estados têm com o IPI e com o ICMS demonstra que a sonegação pagaria por mês quatro vezes o salário desses 55 mil funcionários públicos.

O Sr. Romeu Tuma - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Roberto Requião?

O SR. ROBERTO REQUIÃO - Ouço o aparte do ilustre Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma - Não queria interromper V. Exª, porque o assunto, além de importante, é grave. Mas eu não poderia deixar passar a oportunidade de cumprimentá-lo pela iniciativa desse projeto. E se V. Exª me permite eu o endosso, acompanhando-o nessa iniciativa. É profundamente angustiante ouvir de V. Exª o desleixo de autoridades com respeito ao contrabando e ao problema do cigarro. Isso não é uma coisa nova. Só que, de um ou dois anos a esta data, ele vem se avolumando, inclusive com informações de que fábricas de cigarros nacionais estão sendo montadas no Paraguai para facilitar a velocidade e diminuir o custo operacional. Porque se V. Exª puder ver as embalagens, verificará o contrabando, que é o cigarro fabricado em território nacional, e o cigarro falsificado, que traz conseqüências às vezes mais graves do que o cigarro comum para a saúde. Então, se V. Exª me permitir, sugiro que se convoquem empresários e autoridades da indústria de cigarros para se discutir, em uma de nossas comissões, essas denúncias e essa preocupação de V. Exª. Cumprimento-o por isso.

O SR. ROBERTO REQUIÃO - Muito obrigado, Senador Romeu Tuma.

Recebi a denúncia, por exemplo, de que a fábrica Souza Cruz, que não é do Sr. Souza nem do Sr. Cruz, montou, há três anos, uma importadora de cigarros no Paraguai, em Assunção, onde vem mantendo uma espécie de monopólio da importação de cigarro. É evidente que a Souza Cruz sabe que um país de 4 milhões e meio de habitantes, como o Paraguai, não fuma o cigarro que ela exporta. Se fumasse, todos já teriam morrido; se fumasse, todas as crianças de colo até os mais velhos estariam consumindo um cigarro a cada cinco segundos, durante 24 horas por dia.

Esses proprietários de fábrica de cigarros, esses diretores, ao invés de serem convocados ao Congresso Nacional para explicar o que está acontecendo, deveriam ser convocados para uma Delegacia de Polícia para prestar depoimento.

E estou requerendo, Sr. Presidente, que esta minha denúncia seja enviada ao Ministro da Justiça, ao Delegado da Receita Federal e ao Ministro Pedro Malan, da Fazenda.

Mais adiante, continuando a justificativa:

      "Nossa proposição legal, se acatada pelo Congresso Nacional, com certeza, promoverá redução drástica no mercado ilegal de cigarros, pelo impacto que a faixa vermelha e a expressão nela inscrita causarão nos consumidores. O pequeno selo de controle, atualmente existente, indicando que o produto é destinado à exportação, quase nenhum efeito produz nos compradores desses cigarros. Ao revés, observando a tarja vermelha e a proibição nela contida, o interessado na compra do cigarro refletirá, antes de adquiri-lo, e tenderá a evitar a aquisição de um produto por meios ilícitos.

      Não há como ser contrário a este projeto. Os únicos interessados na manutenção da atual situação são os praticantes do descaminho e comerciantes ilegais de cigarro. Além desses, talvez percam as indústrias de cigarros, não pelo acréscimo (que não existirá) no custo das embalagens em decorrência de sua fabricação com a tarja, mas pela redução em suas exportações, que geram lucros maiores que as vendas no mercado interno.

      Pelas razões expostas, submetemos este projeto ao exame do Congresso Nacional que estará dando um passo na proteção do patrimônio público, e a Fazenda Nacional de certo renderá o seu apoio integral no sentido de sua célere aprovação, para que possa, o quanto antes, surtir os seus efeitos esperados."

Numa terça-feira, o Senado Federal vazio, os Senadores e os Parlamentares provavelmente, de forma justificada ou injustificada, em sua maioria, estão fazendo campanha do segundo turno nos Municípios em que ocorre no País.

Faço uma sugestão à imprensa nacional: ao invés da reiterada denúncia de que esta Casa está sempre vazia, que supere os condicionamentos que tem com a indústria brasileira de cigarros - sem sombra de dúvida o maior anunciante do País - e se debruce sobre o escândalo que é a sonegação. Mais de US$250 milhões por mês seguramente sonegados pelos fabricantes de cigarros, simulando exportações para o Paraguai, de caixas, pacotes e maços que voltam nas mãos dos sacoleiros, ou sequer atravessam a fronteira, pois apenas a nota é carimbada por fiscais corruptos.

Essa operação não pode passar despercebida pela Receita Federal, pela Polícia Federal e pela Fazenda Nacional, porque o volume é extraordinário - insisto: o volume é maior do que o da CPMF.

Sugiro, ainda, à Receita Federal que, levantando o volume das exportações e cotejando-o com a diminuição do recolhimento de impostos internos, taxe, por sonegação ficta, por estimativa, as empresas; teríamos não o valor da CPMF no ano que vem, mas o valor de algumas CPMFs, alguns bilhões de reais sonegados.

Sr. Presidente, mais uma vez, antes de encerrar, quero registrar, desta tribuna, a falta de atenção que a imprensa nacional tem dado à minha denúncia: uma pequena nota aqui, outra ali. O que faz com que eu imagine que o peso dos anunciantes fabricantes de cigarros é mais importante do que a moralidade pública para a imprensa brasileira.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/1996 - Página 18363