Discurso no Senado Federal

RELATO DA VIAGEM DOS INTEGRANTES DA COMISSÃO ESPECIAL DO PROJETO CALHA NORTE A REGIÃO AMAZONICA.

Autor
Romeu Tuma (PSL - Partido Social Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • RELATO DA VIAGEM DOS INTEGRANTES DA COMISSÃO ESPECIAL DO PROJETO CALHA NORTE A REGIÃO AMAZONICA.
Aparteantes
Edison Lobão.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/1996 - Página 18366
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • RELATORIO, VISITA, COMISSÃO ESPECIAL, CONGRESSO NACIONAL, AUTORIDADE, FORÇAS ARMADAS, PROJETO, DEFESA, FRONTEIRA, REGIÃO NORTE.
  • COMENTARIO, IMPLANTAÇÃO, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
  • CRITICA, AUSENCIA, ESTADO, FAIXA DE FRONTEIRA, REGIÃO NORTE, EXCESSO, RESPONSABILIDADE, FORÇAS ARMADAS, ATENDIMENTO, SAUDE, POPULAÇÃO.
  • CRITICA, GOVERNO, INFERIORIDADE, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, PROJETO, EFEITO, PRECARIEDADE, SETOR, TRANSPORTE, ENERGIA, COMUNICAÇÕES, DEFESA, FRONTEIRA.

O SR. ROMEU TUMA (PSL-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna para, rapidamente, situá-los a respeito da missão realizada pela Comissão Especial do Calha Norte durante a última semana.

Estivemos na região do Calha Norte com os Senadores Carlos Patrocínio e João França e com os Deputados Giovanni Queiroz e Jair Bolsonaro. A Senadora Marluce Pinto, em razão de temas que seriam discutidos na Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização, não pôde comparecer. O Deputado Vic Pires Franco, Presidente da Comissão, estava em missão no exterior e também não pôde nos acompanhar.

Além da Comissão Mista do Senado e da Câmara, acompanhou-nos também o General Uchoa, membro do Estado Maior do Exército brasileiro e Gerente do Projeto Calha Norte na área do Ministério do Exército; o Coronel Burgos, assessor parlamentar, que muito tem colaborado nas discussões e estudos a respeito de projetos que envolvem a área militar; o Brigadeiro Archimedes, da SAE, também responsável pelo acompanhamento da implantação do Projeto Sivam.

Na visita que fizemos ao Calha Norte, verificamos, numa surpresa feliz, que o Projeto Sivam não se encontra apenas no papel. Hoje, tem ele já dois radares na Região Amazônica, que, em transmissão de dados, conversam com o radar de Manaus, passando as informações necessárias; acompanham as aeronaves civis que trafegam pelo espaço aéreo da Amazônia e tentam localizar aeronaves que possam estar sendo usadas por grupos criminosos que agem naquela imensa fronteira.

Durante a nossa visita, estivemos, primeiro, em Boa Vista, onde fomos recebidos pelo General Tibau, Comandante daquela grande unidade militar, que nos fez uma exposição da responsabilidade da Brigada de Boa Vista no Projeto Calha Norte.

Estivemos também em Tabatinga, onde o Coronel Braga nos fez uma rápida e brilhante exposição sobre a responsabilidade do seu batalhão. O mesmo aconteceu em São Gabriel da Cachoeira, onde o Coronel Pinto Homem também trouxe ao conhecimento da Comissão o desenvolvimento do Projeto Calha Norte.

Sentimos que as únicas presenças do Estado naquela região são as do Exército, da Aeronáutica e da Marinha. Quanto aos outros órgãos e aos pelotões especiais de fronteiras, que teriam a responsabilidade da construção física de unidades para a chamada ocupação de terceiros, deles não se constatou nenhuma presença; raramente, a Funai; vez ou outra, o Ibama e a Polícia Federal; de resto, nada. Isso traz determinadas conseqüências.

Claro que a missão primordial das Forças Armadas é a defesa, a profissionalização do militar; a parte social seria uma conseqüência; porém, em virtude da ausência do Estado, essa passa a ser primordial.

Encontrarmos no Pelotão de Fronteira um médico, um dentista e um farmacêutico, jovens que, adiando a sua convocação no período legal, são chamados depois de formados, e para lá dirigem-se, onde passam um ano aprendendo todo o segmento da ordem militar e exercendo a sua atividade profissional. Talvez sem experiência, mas com grande valor, porque são os únicos profissionais da área de saúde que estão permanentemente nesses pelotões de fronteira; a eles, nossas homenagens.

Todos os membros da Comissão por várias vezes emocionaram-se, porque sentia-se o espírito de nacionalidade, de civismo e de amor à Pátria, não só nas canções, na presença, nas homenagens que prestaram aos membros da Comissão, como na devoção ao permanente trabalho, pouco se importando com a hora, com o dia, e com aquilo que pudesse trazer conseqüências no futuro.

As comunidades indígenas se socorrem nos pelotões de todas as suas necessidades. Os colonos, os não-nativos, mas cidadãos que vivem na região, também têm como presença física apenas o Pelotão de Fronteira.

Farei um pronunciamento rápido, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pois acredito que a nobre Senadora Marluce Pinto e o Senador Carlos Patrocínio, que foi o relator da viagem, estarão concluindo o relatório final.

Eu não poderia deixar de registrar, nessa viagem, a importância da Comissão Especial, que, por deferência do Líder do PPB, me incluiu na parte que pertencia ao Partido. Sinto-me feliz, porque durante quase uma década percorri aquela região como Chefe de Polícia e hoje volto como Parlamentar. Trago a este Plenário a experiência de uma atividade no Poder Executivo, na Administração Pública, para, dentro do Poder Legislativo, tentar auxiliar a atividade do Projeto Calha Norte.

A extensão territorial tem como conseqüência a dificuldade na vigilância dessas fronteiras. Os pelotões que estão sendo instalados ao longo das fronteiras, além da presença física e da ocupação do Estado nessa região, têm a responsabilidade de manter uma vigilância permanente. Entretanto, eles não estão estruturados como segmentos de defesa porque a falta de meios é patente. Com isso, gera-se um alerta permanente.

Naquela região, há um vazio demográfico assustador. Como exemplo, cito duas cidades: Atalaia, dentro da área de responsabilidade do Comando de São Gabriel da Cachoeira, com 76.441 km², 4,89% do território do Amazonas, com uma população estimada, em 1994, de 47 pessoas - portanto, é de 0.11% a proporção por quilômetro -, tendo 3.021 eleitores. E Tabatinga, a maior área em densidade populacional, que possui 3.199 km² - portanto, representa 0.21% do território do Amazonas -, uma população de 30.070 habitantes, uma densidade de 9.39, e 13.800 eleitores.

Vejam V. Exªs a importância desse Projeto. O Senador José Sarney, na ocasião em que exercia a Presidência do País, constituiu a Comissão Especial, em 1985, para estudar a ocupação física e o desenvolvimento de projetos econômicos naquela região. Estamos praticamente a mais de uma década do início daquele Projeto - cujos dados tenho comigo, mas não os divulgarei agora; deixarei para o relatório final - que, hoje, recebe menos da metade que recebia no seu início. Na realidade, ele deveria ter uma projeção orçamentária muito maior, porque além da implantação das novas áreas, teria que fazer a manutenção daquelas que hoje existem.

Temos pistas de pouso, como única forma de transporte na região. O acesso se dá pela água ou pelo ar, porque por terra é muito difícil, as distâncias são enormes. Voamos num Búfalo, com grandes dificuldades, pois trata-se de um avião, praticamente, de pára-quedistas, portanto, com banco de ferro lateral. Os pilotos, os comandantes, a cada pouso, ficam tentando abrir o motor, dar uma amarradinha com arame, com barbante ou com o que tiverem em mãos, sucateando os outros aviões - canibalismo natural que, hoje, infelizmente ocorre na Aeronáutica.

Quando eu estava na Polícia Federal, existiam nove aviões Búfalos ou Hércules voando. Hoje soube que existem apenas dois. Esse em que nos encontrávamos, ao pousar em Tabatinga, teve um pouso perfeito, pois os pilotos que trabalham na Amazônia conhecem perfeitamente toda a região. Mas, no pouso, a bequilha quebrou e o avião quase desmontou. Por isso, ficamos detidos por quase uma hora entre o local do pouso e o taxiamento até o desembarque dos passageiros que nele se encontravam, inclusive a Comissão. Muito suplente aí deveria estar torcendo.

O Sr. Edison Lobão - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ROMEU TUMA - Ouço V. Exª.

O Sr. Edison Lobão - Senador Romeu Tuma, V. Exª fez uma viagem que não chega a ser exatamente um périplo turístico; ao contrário, uma viagem marcada pelo desconforto, mas certamente repleta de muito fascínio. A visita à Amazônia é sempre algo que encanta as aspirações de muita gente. V. Exª e os nossos colegas Senadores, na verdade, foram examinar o Calha Norte, que é um grande Projeto, com serviços extraordinários sendo prestados ao Brasil, como a defesa de nossas fronteiras e a integração nacional. Tenho esperança de que o Sivam possa ser um instrumento, uma alavanca de ajuda, de complemento ao Projeto Calha Norte, para que as fronteiras brasileiras tenham sempre a sua defesa física realizada por esses grupos de brasileiros, civis e militares, que lá se encontram, trabalhando em benefício da Pátria, em benefício de todos. Aguardarei o relatório da Comissão para, sobre ele, manifestar-me, porque tenho um grande apreço pelo Projeto Calha Norte e estou seguro de que esse Projeto, quando foi instituído, estava realmente ornado pelos melhores princípios e pela vocação de servir a Pátria brasileira.

O SR. ROMEU TUMA - Agradeço a V. Exª pelo aparte. Sei que V. Exª é testemunha das atividades da Comissão Especial que propôs a criação do Calha Norte. O Presidente Sarney o aprovou, sancionou e deu início ao projeto. Não sei se V. Exª estava presente, quando S. Exª foi a Tabatinga implantar a segunda fase do Projeto Calha Norte, para que o desenvolvimento econômico pudesse garantir uma ocupação permanente do Brasil naquela região.

Sabemos que, em 1984, o próprio Governo americano, sabedor que Letícia, vizinha a nossa Tabatinga, abrigava os capitais do narcotráfico, começou a projetar uma operação no Peru e na Colômbia, atingindo, em algumas épocas, a Bolívia. O Brasil sempre se posicionou em situação de auto-suficiência dentro de suas condições de defender o seu território não só de forças antagônicas como dos próprios crimes que sempre ameaçam a nossa fronteira.

Isso aconteceu agora, Senador, neste ano, quando os grupos revolucionários da Colômbia ligados aos narcotraficantes agiram contra as forças regulares da Colômbia, invadindo quartéis, matando militares e aprisionando centenas deles, ameaçando a nossa fronteira. E nós estivemos perto desta fronteira - Benjamin Constant e Iauareté, que ficam na Cabeça do Cachorro. O Comando Militar da Amazônia deslocou, dentro das suas possibilidades, forças que pudessem garantir a segurança, dentro de um esquema aquém do que seria necessário para uma defesa real se houvesse uma ameaça de invasão. Graças a Deus, isso não aconteceu. Mas é importante a presença do Exército, da Marinha e da Aeronáutica nessa região.

Contamos aqui com a presença do Sr. Francisco Naurides, Secretário da Comissão, seus assessores e uma plêiade exemplar de servidores desta Casa, que muito nos ajudaram com seus conhecimentos, para que pudéssemos desenvolver com tranqüilidade a missão que nos foi dada pelo Senado Federal.

As grandes reivindicações dos que lá se encontram são:

      - Aquisição de material de consumo para prosseguimento das obras da BR-307 e da rodovia para Maturacá.

São meios de transporte importantes para desenvolver projeto econômico, qualquer que seja a iniciativa que o Governo possa dar.

      - Recuperação da estrada Ipanoré-Urubuquara;

      - Asfaltamento da estrada de São Gabriel ao Porto de Camanaus.

Não é bem um porto, mas um local onde os barcos encontram uma forma de parar e transportar mercadorias que saem e chegam para alimentar os moradores desta região.

      - Conclusão da implantação da microusina de Auaris.

Outra coisa que é interessante são as microusinas que o Projeto Calha Norte procurou desenvolver dentro do projeto original, que são três. Algumas faltam ser concluídas para sua implantação e outras, com o tempo, já estão com dificuldades de funcionamento, pois o problema energético é bastante grave, apesar de tanta água, temos dificuldades por falta de energia hidráulica que poderia haver com o aproveitamento das quedas d´água.

      - Recuperação das microusinas de Querari, São Joaquim, Maturacá e Surucucu.

E por aí vão. São pequenas reivindicações que a própria riqueza da região poderia, em contrapartida, oferecer ao Governo através da implantação de programas.

O interessante, Sr. Presidente, é que no Quartel de Tabatinga estão desenvolvendo pesquisas no campo farmacêutico. Em conversas com as lideranças indígenas, estão recebendo informações sobre as plantas locais que servem para algum tipo de cura e há farmacêuticos no quartel já desenvolvendo, através dessas pesquisas, produtos que poderão ser vendidos no mercado internacional.

Sabe qual foi o alerta dado pelo instituto próprio da Amazônia aos oficiais e químicos que trabalham nessa unidade militar? Que não ofereçam a grupos estrangeiros ou a quem quer que seja a fórmula de como é produzido o medicamento ou qual o tipo de planta que vai servir, porque estão requisitando inscrição, para que não se produzam em nenhum local.

O Brasil começa, dentro dessa visão econômica internacional, a ter a chance de perder seus produtos naturais na atividade farmacêutica. Então, o Governo tem que tomar cuidados, porque, daqui a pouco, um químico ou um farmacêutico, atraído por um futuro melhor, vai levar seus conhecimentos, até por uma questão humanitária. Sabendo que aquilo vai curar uma parcela de pessoas que estejam sofrendo de uma doença, quer trabalhar no sentido de que esses produtos possam ser adquiridos por qualquer pessoa no mercado nacional ou internacional.

Há idéia também de se criar, no eixo do Equador, uma linha de produção de madeira, porque conseqüências graves estão afetando a população local advindas dessas operações de bloqueio da saída de madeiras da região. Lá chegava uma informação - estava para ser confirmada - de que o Presidente Fujimori proibiu o corte de qualquer tipo de madeira da floresta peruana. A área militar e a Polícia Federal aguardavam a cópia desse decreto do Governo peruano para começar a apreender toda a madeira, porque o único meio de transporte da madeira é feito pelo rio.

Assim, fariam o cerco para não permitir mais a passagem da madeira, apreendendo toda ela como ilegal. Porque a grande desculpa é que toda madeira que sai pela Região Amazônica é do Peru. Temos lido nos jornais que, com isso, eles vão fazer uma operação para evitar que isso ocorra.

Está em execução a operação "Porteira Fechada", em decorrência de uma operação internacional, proposta pelo Governo americano junto ao Peru e a Colômbia, para evitar o crescimento do tráfico na região.

E o Brasil, como sempre, assumiu para si a responsabilidade desse sistema, mas com uma grande dificuldade. Estamos pedindo uma audiência ao Ministro das Comunicações, Sérgio Motta, no sentido de que possa, senão doar, pelo menos facilitar a aquisição de um sistema de telefonia via satélite, a fim de que haja uma comunicação mais rápida. Hoje, essa comunicação é muito difícil, o tambor não permite a transmissão através de quilômetros de distância. Não há nenhum meio de comunicação, a não ser via rádio, e com muita dificuldade. Assim, a idéia é a de se instalar um sistema de telefonia via satélite para que possamos ter uma presença mais marcante.

Sr. Presidente, sei que o tempo urge. Tenho vários dados, mas pediria encarecidamente que os Srs. Senadores dediquem a atenção merecida ao relatório final, porque é de grande valia para a segurança do País.

Na última quinta-feira, o Governo apresentou o Projeto de Defesa Nacional, coisa de que há muito tempo não se fala no Congresso Nacional. Esse Projeto inicial faz uma referência direta ao Calha Norte, à Região Amazônica, principalmente à região de fronteira, que fica ao norte do rio Solimões.

Espero, com isso, que o Congresso possa colaborar e trazer uma continuidade mais eficiente, através de verbas que demonstrem a vontade política do Governo sobre essa ocupação física e econômica da Região Amazônica.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/1996 - Página 18366