Discurso no Senado Federal

LUTA PELA IGUALDADE DE OPORTUNIDADE DA MULHER NA SOCIEDADE BRASILEIRA. PROPONDO A INDICAÇÃO DE UMA MULHER PARA O CARGO DE MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

Autor
Emília Fernandes (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • LUTA PELA IGUALDADE DE OPORTUNIDADE DA MULHER NA SOCIEDADE BRASILEIRA. PROPONDO A INDICAÇÃO DE UMA MULHER PARA O CARGO DE MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/1996 - Página 18610
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • ANALISE, EVOLUÇÃO, IMPORTANCIA, PARTICIPAÇÃO, MULHER, SOCIEDADE, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, JUDICIARIO.
  • PROPOSTA, INDICAÇÃO, MULHER, OCUPAÇÃO, CARGO PUBLICO, QUALIDADE, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, SEPULVEDA PERTENCE, JOSE CELSO DE MELLO FILHO, PRESIDENTE, VICE-PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DEFESA, PARTICIPAÇÃO, MULHER, JUDICIARIO.
  • SOLICITAÇÃO, PUBLICAÇÃO, DOCUMENTO, COLETA, ASSINATURA, CONGRESSISTA, VIABILIDADE, PROPOSTA, INDICAÇÃO, MULHER, OCUPAÇÃO, CARGO PUBLICO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).

A SRª EMILIA FERNANDES (PTB-RS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o tema que abordo hoje refere-se à continuidade da luta das mulheres para ocupar os espaços que lhes são devidos no contexto nacional e - por que não dizer - mundial.

Às portas do Século XXI, avança a compreensão de que a sociedade não pode mais prescindir da presença feminina em todos os campos de atividade.

Na produção, apesar de ainda discriminadas e mal remuneradas, as mulheres assumem cada vez mais responsabilidades em praticamente todas as profissões.

No campo da educação, da ciência e das artes, as mulheres também destacam-se, contribuindo com o desenvolvimento cultural da Humanidade.

Na política, a presença feminina vem-se afirmando e crescendo a cada nova eleição, a exemplo da vitoriosa campanha "Mulheres Sem Medo do Poder", realizada neste ano.

Aos poucos, as mulheres, com firmeza e competência, vão ocupando seus espaços. E as instituições, por seu turno, assim como a sociedade, vão absorvendo essa nova realidade que traz ganhos para todos.

A nossa luta por espaço e por igualdade, além da busca do reconhecimento do papel da mulher, é uma caminhada em defesa da plena democratização da sociedade.

Nesse sentido, é fundamental que a igualdade entre homens e mulheres avance em todas as instâncias da organização social, em especial naqueles setores mais recalcitrantes à presença feminina.

Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste momento, nós, as mulheres do Congresso Nacional, estamos defendendo a indicação de uma mulher para o Supremo Tribunal Federal, como forma de corrigir uma injustiça que perdura há 167 anos.

Temos conhecimento das tratativas, divulgadas pela imprensa, envolvendo o nome do Ministro da Justiça, Nelson Jobim, em quem reconhecemos capacidade e por quem temos um grande respeito e que merece a consideração de todos.

A nossa proposta não é contra ninguém, mas, sim, expressa a exigência inadiável de se conquistar o reconhecimento para as mulheres neste espaço da vida pública nacional.

Desde sua fundação, em 1828, quando ainda se chamava Supremo Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal nunca teve uma mulher em seus quadros.

Nunca tiveram entre seus membros uma mulher o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral e o Superior Tribunal Militar.

A única exceção nessa instância do Poder Judiciário é o Tribunal Superior do Trabalho, que tem suas ministras.

Atualmente, a relação comparativa de participação de homens e mulheres no Judiciário expressa a desigualdade existente e a urgência de corrigir essa situação.

Na Justiça Comum, de um total de 5.895 juízes, existem 1.443 mulheres exercendo a função, totalizando 25% das vagas.

Na Justiça Federal, de um total de 387 membros, temos a presença de 88 mulheres.

Na Justiça do Trabalho, onde a participação feminina é mais efetiva, 770 mulheres ocupam vagas de juízas, contra 981 homens.

Nos Tribunais de Justiça, são apenas 13 mulheres para um contingente de 682 homens.

Nos Tribunais de Alçada, para 404 homens, temos 18 mulheres.

Nos Tribunais Regionais Federais, a proporção é de 20 mulheres para 73 homens.

E nos Tribunais Regionais do Trabalho, a presença feminina corresponde a 74 vagas para um total de 225 homens.

Os números demonstram que cresce a presença de magistradas que chegam à carreira por concurso público e de juízas que se afirmam como profissionais dedicadas, competentes e corajosas.

Mas, por outro lado, esses mesmos números evidenciam a dificuldade histórica - e, a meu ver, cultural e política - das mulheres terem o seu espaço reconhecido quando se trata do acesso aos Tribunais Superiores.

É bom lembrar, diante deste debate, que, em 1995, a Delegação Brasileira em Beijing, na Conferência Mundial dos Direitos da Mulher, endossou a Plataforma de Ação Mundial, que inclui, entre outros pontos, o fortalecimento da presença feminina em todos os âmbitos da vida pública, inclusive no Judiciário.

Em seu texto final, no item 190, a Plataforma de Ação de Beijing, da qual o Brasil também é signatário, defende que os Governos devem "comprometer-se em estabelecer o objetivo de equilíbrio entre mulheres e homens nos órgãos e nos comitês governamentais, assim como nas instituições de administração pública e magistratura".

No campo político, essa orientação já foi levada à prática, com grande sucesso, por meio da adoção da cota de 20% para as Câmaras de Vereadores, que ampliou a presença feminina no processo eleitoral deste ano - luta a que daremos prosseguimento, Srs. Senadores, inclusive nas próximas eleições, buscando ampliar a participação das mulheres nas Assembléias Legislativas, na Câmara dos Deputados, no Senado Federal e até mesmo no Poder Executivo.

Agora, portanto, chegou a vez de afirmarmos essa mesma decisão de avançar a luta pela busca da igualdade no terreno do Judiciário. E é o que estamos fazendo.

Nesse sentido, gostaríamos de destacar opiniões de magistrados do País, registradas pela imprensa, que, além da solidariedade, expressam a correção dessa iniciativa.

Segundo o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Sepúlveda Pertence, para quem o machismo ainda é dominante, são urgentes medidas objetivas e vontade política para superar a discriminação contra a participação das mulheres.

Diz ele, em matéria divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo, do final de semana:

      - "Algumas das juízas se incluem entre os melhores representantes da magistratura do país. É curioso observar que, vencido no Judiciário, que sempre paga pela fama do reacionarismo, o machismo ainda domina no ponto das indicações políticas".

Em entrevista divulgada pelo Jornal Folha de S. Paulo, na edição de ontem, o Ministro e Vice-Presidente do STF, José Celso de Mello Filho, afirma a necessidade de renovação do Judiciário e, dentro dessa perspectiva, também defende a abertura da instituição para a presença feminina.

Diz ele:

      - "Toda renovação é importante. Permite, pelo acervo de contribuições que os ministros trazem, a modernização da visão dos problemas. Muitas vezes é preciso que o juiz tenha a percepção exata da realidade social que o cerca, que pode orientá-lo na formulação do ato decisório. Não há nenhum juízo aqui sobre qualquer membro da corte mas a mim me parece que chegou o momento de abrir o tribunal e torná-lo acessível, por uma questão de direito, às mulheres".

Continuando em sua avaliação, diz ainda o Ministro José Celso de Mello Filho:

      - "Eu sei que há, mesmo internamente, reações contrárias, mas é chegado o momento. Nós temos juristas mulheres altamente qualificadas. Mulheres cuja atividade intelectual vem enriquecendo a literatura jurídica nacional. Eu me pergunto: já não vem tarde uma nomeação para o Supremo? Eu acho que é um ato importante."

Em meu Estado, o Rio Grande do Sul, acabamos de dar um exemplo, quando, em 28 de outubro, tomou posse a primeira Desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado, Drª Maria Berenice Dias.

É importante, portanto, que aproveitemos este momento para superar essa histórica discriminação, afirmando a presença feminina nessa instância máxima do Poder Judiciário do País.

Não estamos, é bom que se diga, reivindicando apenas a participação da mulher por ser mulher, mas sim o reconhecimento para alguém que, no exercício de sua profissão, já comprovou suas qualidades e sua capacidade.

Uma mulher no Supremo Tribunal Federal é um atestado objetivo de maturidade do País, da sociedade brasileira e, acima de tudo, dos seus magistrados e dirigentes.

Com certeza, a presença feminina, com suas qualidades específicas, contribuirá para tornar a Justiça brasileira mais abrangente, mais democrática e mais igualitária.

Como um dos instrumentos de viabilização desta proposta, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos construindo, tanto na Câmara como no Senado, um documento que será endereçado ao Presidente da República, com o apoio da Bancada feminina do Congresso Nacional. Assim como hoje, através da Deputada Marta Suplicy, iniciou-se na Câmara a coleta de assinaturas de Deputados e Deputadas, gostaríamos que este documento, que já está assinado pela Bancada feminina do Senado, também fosse assinado pelos Srs. Senadores.

Entendemos que este conteúdo traduz, com certeza, o sentimento das mulheres de todo o País, mas, acima de tudo, traduz o sentimento da igualdade entre homens e mulheres, no qual todos nós, principalmente Parlamentares, devemos nos engajar.

Queremos, inclusive, que, juntamente com o nosso pronunciamento, o texto do abaixo-assinado seja também publicado na íntegra, quando estaremos coletando as assinaturas e enviando ao Presidente da República como manifestação de que esta Casa - não apenas as mulheres, mas o seleto quadro de Senadores que a integram - está engajada na luta pela igualdade de oportunidades para as mulheres.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/1996 - Página 18610