Pronunciamento de Roberto Requião em 22/11/1996
Discurso no Senado Federal
SURPRESA DE S.EXA. COM A REALIZAÇÃO DE SESSÃO DELIBERATIVA EXTRAORDINARIA, ONTEM PELA MANHÃ. OPERAÇÃO INJUSTIFICAVEL DE PAGAMENTO DE DIVIDA DA ITAIPU PARAGUAI AO GOVERNO DO BRASIL, ATRAVES DA UTILIZAÇÃO DE TITULOS DA DIVIDA EXTERNA BRASILEIRA. REELEIÇÃO. COMUNICANDO A ELABORAÇÃO DE PROJETO DE LEI QUE GARANTE O DIREITO DO CONTRADITORIO NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. CRITICAS A PROPOSTA DE INDEPENDENCIA DO BANCO CENTRAL E AO PROCESSO AÇODADO DE PRIVATIZAÇÃO DE EMPRESAS PUBLICAS.
- Autor
- Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
- Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
REGIMENTO INTERNO.
REFORMA CONSTITUCIONAL.
TELECOMUNICAÇÃO.:
- SURPRESA DE S.EXA. COM A REALIZAÇÃO DE SESSÃO DELIBERATIVA EXTRAORDINARIA, ONTEM PELA MANHÃ. OPERAÇÃO INJUSTIFICAVEL DE PAGAMENTO DE DIVIDA DA ITAIPU PARAGUAI AO GOVERNO DO BRASIL, ATRAVES DA UTILIZAÇÃO DE TITULOS DA DIVIDA EXTERNA BRASILEIRA. REELEIÇÃO. COMUNICANDO A ELABORAÇÃO DE PROJETO DE LEI QUE GARANTE O DIREITO DO CONTRADITORIO NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. CRITICAS A PROPOSTA DE INDEPENDENCIA DO BANCO CENTRAL E AO PROCESSO AÇODADO DE PRIVATIZAÇÃO DE EMPRESAS PUBLICAS.
- Aparteantes
- Edison Lobão, Geraldo Melo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 23/11/1996 - Página 18861
- Assunto
- Outros > REGIMENTO INTERNO. REFORMA CONSTITUCIONAL. TELECOMUNICAÇÃO.
- Indexação
-
- PROTESTO, ALTERAÇÃO, HORARIO, SESSÃO, DELIBERAÇÃO, PREJUIZO, BRASIL, PAGAMENTO, DIVIDA, EMPRESA ESTATAL, PAIS ESTRANGEIRO, PARAGUAI.
- CRITICA, PRIORIDADE, ASSUNTO, REELEIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, ATENDIMENTO, BANCADA, ESTADO DO PARANA (PR).
- ANALISE, POSSIBILIDADE, CORRUPÇÃO, PROCESSO ELEITORAL, REELEIÇÃO.
- DEFESA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, EDUARDO SUPLICY, SENADOR, EQUIVALENCIA, TEMPO, GOVERNO, UTILIZAÇÃO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, ESTABELECIMENTO, PRINCIPIO DO CONTRADITORIO, OPOSIÇÃO.
- JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ALTERNATIVA, LEI DE IMPRENSA, DEFESA, GARANTIA, PRINCIPIO DO CONTRADITORIO.
- OPOSIÇÃO, INDEPENDENCIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), CRITICA, FALTA, SOBERANIA NACIONAL, PROCESSO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, MUNDO.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fui surpreendido pela sessão deliberativa que ocorreu ontem pela manhã. Acompanhava a nossa publicação do Senado e nela constava a análise da autorização para que uma companhia estatal paraguaia pagasse Itaipu com títulos da dívida externa brasileira, quinta-feira à tarde.
Por outro lado, preocupado com o absurdo, ridículo processo de cassação de mandato que movem contra mim, no Paraná, estudava os autos e conversava com advogados. Não vim ao Senado pela manhã, mas no horário normal da sessão plenária deliberativa estava aqui. Não havia mais nada a deliberar e a barbaridade da autorização ao Paraguai já havia sido concedida.
Quero registrar, aqui, a minha posição. Do que se trata? Trata-se de autorizar uma estatal paraguaia a pagar Itaipu com títulos da dívida externa brasileira. A medida é absoluta e completamente injustificável. E por quê? Porque ela é feita através de uma engenharia financeira extremamente sofisticada e nebulosa.
Sendo Itaipu propriedade do Paraguai e do Brasil, se quisermos conceder um desconto para a estatal paraguaia, basta que o Brasil concorde com o desconto e que o mesmo seja dado sobre a totalidade da dívida. Por que envolver nisso comissões, bancos e compras de títulos da dívida externa brasileira, que são repassados a Itaipu e que Itaipu repassa ao Tesouro Nacional?
É uma operação extremamente nebulosa e injustificável, principalmente neste momento em que o Brasil pode resgatar os seus títulos livremente, porque o Senado autorizou a antecipação do resgate, viabilizando a possibilidade de o País comprar títulos no mercado secundário, o que não acontecia anteriormente.
Queria trazer a minha opinião a este Plenário. Tenho a certeza de que, com as informações que detinha, pois fui Relator da matéria, poderia ter alterado alguns votos. Isso não aconteceu, pela precipitação de uma sessão sobre a qual muitos Senadores não tiveram informação e pelo fato de o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, com esse processo absurdo, ter desviado a minha atenção do problema. É o primeiro resultado dessa tentativa de cassação: a diminuição da minha capacidade de atuação no plenário; talvez essa desatenção provocada pelo processo tenha possibilitado que mais uma barbaridade tramitasse sem o necessário contraditório no plenário do Senado.
Quero aproveitar a oportunidade para discutir um pouco essa história de reeleição, assunto abordado pelo nobre Senador Jefferson Péres.
A Bancada do Paraná tem insistido em uma reunião com o Presidente da República e não tem recebido resposta. Pessoalmente, Senador Jefferson Péres, considero ridículo votar contra porque não existe a possibilidade da reunião; trata-se de uma atitude menor. No entanto, essa obsessão do Governo Federal pela reeleição deve ter um freio.
A reeleição não existe na tradição republicana do Brasil. Os Presidentes militares - Castello Branco, Costa e Silva, Geisel e Figueiredo - jamais pensaram em se reeleger. Em nossa História, apenas um Presidente tentou e conseguiu uma reeleição, não tendo assumido o cargo porque ficou doente e morreu: Rodrigues Alves, em 1902.
Vamos refletir um pouco mais sobre a reeleição nesse sistema presidencialista quase imperial em que vivemos. Um Presidente da República, candidato à reeleição no exercício do mandato, tem a chave do cofre, controla a mídia, de certa forma, conduz a opinião pública. Em determinado momento, enfrenta um forte candidato apoiado por uma coligação consistente de pequenos partidos. No exercício do poder, o Presidente da República conversa com um desses pequenos partidos e a ele oferece um ministério. A expectativa da vitória é substituída pela existência concreta da participação no poder da República. A outro pequeno partido oferece a presidência de uma estatal, uma diretoria importante. E o processo eleitoral se corrompe, de forma absoluta.
Reeleição no Brasil é sinônimo de catalisação do processo corruptor que ocorre durante os períodos eleitorais. A corrupção já existe, o poder econômico dela participa com força. Ao invés de pensarmos em potencializar esses absurdos, deveríamos - isso, sim - analisar com muito carinho e aprovarmos uma medida como a apresentada pelo Senador Eduardo Suplicy, que tive a oportunidade de relatar no plenário na quarta-feira.
Determina o referido projeto que, a cada convocação de uma rede de televisão pelo Presidente da República ou por algum de seus ministros, pelo Governo Federal, sucede-se a abertura de um espaço para que a oposição estabeleça o contraditório.
Vivemos, neste momento de informatização, de comunicação rápida, de televisão, de telefonia, de grandes redes de rádio e de jornais poderosos, numa espécie de grande júri da opinião pública, o qual só pode decidir, praticamente, só pode pensar, só pode construir a sua consciência se o contraditório se estabelecer com clareza. A fala exclusiva, imponente e imperial do Presidente e de seus ministros contraria o princípio constitucional do contraditório e da liberdade de expressão.
Ao invés de reeleição, o Congresso Nacional deveria aprovar o projeto de lei do Senador Eduardo Suplicy. Ele não pede a licença, a autorização para que a oposição convoque uma rede de rádio e televisão; simplesmente estabelece que, a cada vez em que o Executivo tomasse a iniciativa de convocar as redes, a oposição teria o mesmo tempo para colocar o contraditório, informar a população e estabelecer uma igualdade de condições de discussão que levassem a população a fazer um juízo acertado.
Fui Governador e Prefeito; ninguém me ilude mais sobre a famosa liberdade de comunicação. A imprensa, lamentavelmente, gravita em torno dos governos. Talvez a economia não seja tão forte para que tenhamos redes, jornais e rádios independentes. Gravita. Gravitou em torno do meu e gravita em torno do governo do meu sucessor, oposição a mim neste momento.
Esses espaços, como o que o Senador Eduardo Suplicy reivindica, o horário eleitoral gratuito durante as campanhas, a Voz do Brasil, a TV Senado, neste momento em que a embriaguez do mercado e da globalização tomam conta da comunicação, são absolutamente essenciais para que a vontade nacional se manifeste. E ela se manifesta a partir da expressão dos representantes do povo no Congresso Nacional.
Estou apresentando também, neste mesmo sentido, nesta linha de raciocínio, um projeto de lei estabelecendo não uma lei de imprensa ridícula e absurda para jornalistas, pois não existe, Senador Edison Lobão, lei especial para condenar médicos, engenheiros, advogados, sapateiros, pedreiros ou militares, mas existe aí herança da ditadura brasileira, herança do Estado Novo, esta maldita Lei de Imprensa. Estou tentando substituí-la por um projeto inspirado na legislação alemã, que trata do direito ao contraditório, o direito de réplica imediato e efetivo, deixando a calúnia, a difamação possíveis, as indenizações civis para a legislação ordinária e criando um sistema em que, nesse grande júri da opinião pública, ninguém seja agredido sem ter direito de réplica. A imprensa julga, e julga principalmente homens públicos, abala reputações, e a lentidão da Justiça, ao oferecer a possibilidade da resposta, torna essas condenações definitivas, sem que o acusado tenha oportunidade de exercer a sua defesa. Inspiro-me na legislação de alguns estados alemães e garanto a todas as pessoas acusadas, de forma rápida, o direito de réplica; multas pesadas, não aos jornalistas, mas aos órgãos de comunicação que se recusarem a abrir o espaço. Insisto, os jornalistas, se agressivos ou culpados, devem ser julgados pela legislação ordinária, civil ou criminal, mas o juiz, depois de receber o pedido do direito de réplica, que foi recusado ao agredido pelo órgão de comunicação, dá-lhe 48 horas para se justificar e, imediata e liminarmente, garante o direito de resposta. Na televisão, nunca menos de 3 minutos; nos jornais, no mínimo, o espaço utilizado para a acusação; no rádio, nunca menos de 10 minutos. E estaremos pensando, não mais em reeleição, em domínio imperial da comunicação, mas em estabelecer realmente um Estado democrático, a exemplo de outros Estados que existem no mundo, pois, repito, que essa legislação se inspira na legislação de alguns estados alemães.
O Sr. Edison Lobão - V. Exª me permite um aparte?
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Ouço o Senador Edison Lobão com todo prazer.
O Sr. Edison Lobão - Nobre Senador Roberto Requião, creio que a proposta de V. Exª constitui realmente a espinha dorsal deste problema. Ainda ontem, conversava com o grande Jurista brasileiro Dr. Saulo Ramos, numa jornada jurídica que ocorreu no meu Estado, o Maranhão, e ele me dizia que elaborou um projeto, como sugestão ao Congresso Nacional, sobre esta matéria, e que já o enviou para cá. Ficou de encaminhar-me uma cópia, que terei muito prazer em passar às mãos de V. Exª. Ele dizia exatamente isto: é preciso garantir o direito de resposta, o contraditório. Ele não está muito preocupado em punição de jornal, de televisão, de rádio, nem mesmo com penas pecuniárias. A sua preocupação fulcral é no sentido de garantir ao ofendido o direito limpo e legítimo à resposta, a sua defesa, o seu contraditório. Passarei às mãos de V. Exª este documento, assim que chegar.
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Nobre Senador Edison Lobão, essa é exatamente a minha intenção. Também não penso em pena pecuniária; estou pensando apenas numa pena para quem não acolher a decisão judicial. Um por cento do faturamento bruto do veículo, baseado no balanço do ano anterior, corrigido monetariamente ao dia, por dez dias. No décimo dia, o juiz fecha o veículo que não estabelecer o contraditório. Espero que nenhum veículo jamais seja submetido a essa pena e que se estabeleça, de uma vez por todas, o processo democrático da resposta pronta às pessoas acusas.
Esse meu projeto foi redigido há mais de 30 dias. Enviei-o a juristas, a advogados de vários Estados brasileiros. Estou esperando algumas críticas, algumas sugestões. Ele é constitucional, está perfeitamente adequado ao contexto da legislação brasileira. Ele não suprime, neste momento, a Lei de Imprensa - que quero combater quando vier ao plenário do Senado Federal, de volta da Câmara dos Deputados -, mas coloca essa oportunidade da resposta pronta como uma alternativa a essa Lei.
Quem desejar optar por esse processo de garantir o contraditório e a divulgação das suas razões, baseado nesse diploma legal que pretendo apresentar ao Congresso, estará abrindo mão de forma absoluta da Lei de Imprensa, e levará suas querelas, as ofensas pessoais, as indignações que possa pretender ao Direito Comum, aos Códigos Civil e Criminal. Provavelmente, apresentarei esse projeto, no plenário do Senado, na próxima semana.
Era preciso que o País começasse a se preocupar com coisas sérias. Não vim à famosa reunião plenária do Senado de ontem, porque dela não tive conhecimento. Foi anunciada pelo sistema de som do Senado, que não ligo, porque trabalho no meu Gabinete.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, soube que se discutiu aqui o Banco Central independente. Dois Senadores foram aos Estados Unidos aprender com os norte-americanos como funciona um Banco Central independente. Meu Deus, Banco Central independente no Brasil! Dar independência ao Banco que permitiu que acontecesse com o Nacional o que aconteceu, que acontecesse com o Econômico o que aconteceu? Dar independência a um Banco que, por omissão e falta de ação, deixou o Bamerindus, que já foi o segundo banco do Brasil, chegar onde chegou, que deixou vazar informações indevidas e inverídicas sobre a dificuldade do Banco, que o levaram a quase insolvência? Dar independência a essa rapaziada, é tirar a independência do Congresso Nacional; é eliminar a possibilidade de um Presidente da República se eleger com um programa econômico aprovado pela população inteira, e não poder aplicá-lo.
De repente, o Congresso Nacional, fascinado pela economia de mercado, pela globalização e pelas fantasias desse velho liberalismo transformado em religião, neste momento, se debruça sobre essas quimeras. Não é possível tanta submissão.
Vamos falar no plenário do Senado em independência do País; uma independência soberana. Vamos falar em um país aberto para o mundo, empresas estatais ineficientes e desnecessárias privatizadas, mas vamos acabar com esse açodamento de cedermos a todos os desejos dos donos do mundo.
Quero lembrar, mais uma vez, neste plenário, que esta cantada inevitabilidade da globalização se repete como um filme já assistido na História do Mundo. A globalização do nazismo foi tida como inevitável, o Mundo cedeu ao avanço econômico e tecnológico da Alemanha. Na França, o Marechal Pétain aderiu, e Pierre Laval, Presidente do Congresso Nacional, submeteu o Congresso ao desejo dos nazistas. Não era inevitável a globalização e, quando a Alemanha foi vencida, Pierre Laval foi fuzilado e o Marechal Pétain foi condenado à prisão perpétua, porque tinha sido herói da Primeira Guerra contra a Alemanha.
É preciso que o Brasil se abra, que analisemos a modernização, os avanços tecnológicos com inteligência, mas, acima de tudo, com independência e soberania, discutindo essas questões neste fórum, com qualidades e defeitos, que é o Senado e o Congresso Nacional. Não é possível que as privatizações sejam decididas por figuras cruéis como, por exemplo, a ex-diretora do BNDES, Helena Landau, que louvava, tempos atrás, o processo de condução da economia mexicana e escrevia que aquele era o caminho, que nenhum país conseguiria estabilidade sem sacrifício do povo - do povo, não dela, que, depois de muitos erros cometidos, é diretora de um banco privado em São Paulo.
A Vale do Rio Doce deve ser privatizada. Não tenho escrúpulo algum quanto à privatização, mas ninguém sabe o que é a Vale. É a propriedade do subsolo brasileiro. São riquezas não dimensionadas e rigorosamente imponderáveis. E não temos acesso à discussão.
O BNDES abre uma sala especial: a data room, o quarto dos dados. O nome é estrangeiro; a subordinação é absoluta, é semiológica até. Entregam os dados sobre a Vale, vendem o que não conhecem e, no comando desse processo, "helenas landaus", masculinas ou femininas, frias, cruéis, pragmáticas e individualistas, pensando na sua carreira e nas oportunidades que terão em grandes bancos ou organismos internacionais ou nacionais, pensando no emprego, no sucesso pessoal e no sucesso econômico; e o Senado submetido, o Presidente da República sorridente, acreditando neste novo Deus, o mercado, que substitui o conceito de nação, de pátria e de soberania.
O Sr. Geraldo Melo - V. Exª me permite um aparte?
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Com muito prazer, Senador Geraldo Melo.
O Sr. Geraldo Melo - Senador Roberto Requião, receio, com o meu aparte, retornar o discurso de V. Exª a um ponto que penso ter muita importância: a questão da independência do Banco Central. Divirjo de V. Exª apenas em relação à severidade com que se referiu a viagens dos nossos Colegas Senadores aos Estados Unidos. Entendo que o conhecimento vindo de experiências fora do Brasil é útil e não pode ser desprezado. V. Exª mesmo declarava há pouco que em breve apresentará ao Senado uma proposição que aproveita a experiência internacional. Enfim, participo das preocupações de V. Exª com relação à tese da independência do Banco Central. Na verdade, há os países onde o Banco Central é uma instituição independente e também diferente do Banco Central do Brasil, que talvez seja a única instituição, dentro da estrutura operacional do poder público no Brasil, que reúne poderes e atribuições do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Ele é um banco que tem funções operacionais nitidamente executivas, produtor de normas que, na realidade, têm mais efeito, mais capilaridade, mais difusão no sistema econômico do que muitos dos instrumentos jurídicos emanados do próprio Congresso Nacional, e ele é Poder Judiciário na medida em que, muitas vezes, avalia o desempenho de instituições ou de seus administradores e aplica sanções que chegam à indisponibilidade dos bens, que chegam à privação de uma série de direitos que são comuns aos outros cidadãos não atingidos por decisões do Banco Central. Acredito, portanto, que, se a tendência for pela independência e autonomia do Banco Central, num país em que a política econômica e monetária se transformaram e vão, por muito tempo, ser o centro e a alma do poder público do País, então, a divisão, a partilha desse poder como uma instituição autônoma, construída, intelectualmente e ideologicamente a partir do momento em que se estruturou a burocracia nacional - e não foi um momento feliz da democracia no Brasil - eu acredito que, para que se possa cogitar de autonomia do Banco Central, é preciso cogitar de mudança na estrutura de seus poderes. E é preciso também que o Senado comece a cogitar na possibilidade - da mesma maneira em que aprova a indicação e a nomeação de autoridades, não só no Banco Central, mas em todas as instituições federais, ligadas à área econômica - que o Senado comece a cogitar na possibilidade de retirar a aprovação concedida, pois é incompreensível que o Senado, que pode julgar o Presidente da República, e, portanto, retirar-lhe o mandato, não possa, no momento em que esteja insatisfeito com o desempenho de autoridades que tenham convencido o Senado que teriam determinado desempenho que o satisfaria, no momento em que essa satisfação não se manifesta, não há por que o Senado também não poder modificar a manifestação de confiança que tenha feito no início. Portanto, peço desculpas por ter me alongado no meu aparte, mas queria dizer que participo com V. Exª das preocupações e reconheço a seriedade e a gravidade da decisão que possa envolver a decisão de conceder autonomia ao Banco Central.
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Senador Geraldo Melo, estamos pensando paralelamente, pelo menos o sentido do nosso raciocínio é o mesmo. Admiro-me da facilidade com que Senadores podem ir aos Estados Unidos, contraposta à dificuldade com que o menino moreno tenha em conseguir um visto e os óbices colocados a três funcionários da Secretaria do Ministério da Administração para conseguir o visto. Penso que os nossos Senadores deviam ir não só aos Estados Unidos. Minha preocupação é essa, deveriam ir à Alemanha, por exemplo, para estudar a independência do Banco Central no momento da unificação da Alemanha; deveriam ir aos Estados Unidos para ver os limites dessa independência e poderiam fazer uma viagem pouco virtual e muito concreta, através da Internet, pela qual tenho acessado os regulamentos dos bancos centrais do mundo inteiro.
Banco central autônomo é uma coisa; autonomia significa responsabilidade, responsabilidade limitada. Banco central independente significa a revogação do Poder Legislativo e do Senado Federal e significa a inutilização do Presidente da República e das eleições presidenciais no País. O Presidente quer ser reeleito, então submete-se a uma nova eleição. Os meninos do Banco Central teriam uma independência, a garantia de fazer e desfazer o que quisessem. Não tem cabimento. Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido.
O que legitima a ação política na condução da economia é o voto popular do Presidente da República. Banco central independente é um voto de desconfiança ao Presidente da República e ao Congresso Nacional, particularmente ao Senado Federal, que tem prerrogativas constitucionais específicas em relação a empréstimos externos de municípios e de estados.
Temos que ir com muito cuidado nesse caminho. Mas o que se me afigura é que novamente caia a tempestade em cima do Congresso Nacional. De repente, chega o projeto pronto, sendo aprovado rapidamente nas comissões, desaba no plenário e transforma-se num imperativo da modernização, numa exigência da manutenção do Plano Real e do equilíbrio da moeda.
Não é assim. Esse ímpeto quase religioso em torno desta idolatria do mercado teve um fim na França: Pétain foi condenado à prisão perpétua, e Pierre Laval, o Presidente do Congresso, foi fuzilado.
Muito obrigado.