Discurso no Senado Federal

PRESENÇA DE DIRIGENTES DO COMITE OLIMPICO INTERNACIONAL NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, QUE DESEJA SEDIAR AS OLIMPIADAS DE 2004. ANALISE DA DECADENCIA DOS CLUBES DE FUTEBOL NO RIO DE JANEIRO.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESPORTE.:
  • PRESENÇA DE DIRIGENTES DO COMITE OLIMPICO INTERNACIONAL NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, QUE DESEJA SEDIAR AS OLIMPIADAS DE 2004. ANALISE DA DECADENCIA DOS CLUBES DE FUTEBOL NO RIO DE JANEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/1996 - Página 18942
Assunto
Outros > ESPORTE.
Indexação
  • COMENTARIO, PRESENÇA, DIRIGENTE, ORGANISMO INTERNACIONAL, MUNICIPIO, RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ANALISE, SITUAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, PRETENSÃO, SEDE, OLIMPIADAS.
  • FRUSTRAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, AUSENCIA, CLASSIFICAÇÃO, CLUBE, FUTEBOL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CAMPEONATO NACIONAL.
  • SAUDAÇÃO, CLUBE, FUTEBOL, VITORIA, CAMPEONATO NACIONAL.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o esporte sempre está na ordem do dia das preocupações dos cidadãos, hoje principalmente no Rio de Janeiro, onde dois fatos despertam as atenções gerais: a presença dos representantes do Comitê Olímpico Internacional e a desclassificação de todos os seus clubes no Campeonato Nacional de 1996.

Os dirigentes do COI foram analisar as condições e perspectivas da cidade, em sua pretensão de ser a sede dos Jogos Olímpicos de 2004 - um desafio que vai desde a construção de pistas e quadras para as provas, até o desenvolvimento de uma infra-estrutura capaz de assegurar hospedagem, alimentação, segurança e transporte para milhares de atletas e centenas de milhares de dirigentes, convidados e turistas de todos os cantos do mundo. É realmente uma tarefa gigantesca, que exigirá toda a criatividade e toda a disposição que o povo do Rio demonstra na produção de suas grandes festas.

O principal obstáculo à indicação, sem dúvida, estará no fator segurança, pois é maior do que se pensa a repercussão, no exterior, das notícias sobre chacinas, trocas de tiros entre quadrilhas ou entre quadrilhas e policiais, mortes causadas por balas perdidas e o preocupante cinturão de miséria e de criminalidade que cerca toda a antiga Cidade Maravilhosa. Estamos torcendo a favor. Desejamos e nos dispomos a colaborar no que for possível para a solução do drama que desespera os cariocas. Mas, esse problema, como qualquer outro, só é resolvido quando é enfrentado clara e corajosamente.

O grande perigo, e isso deve ser dito com lealdade, é a idéia de propor uma trégua aos grandes criminosos que dominam ferozmente as favelas cariocas. Essa paz ilusória, se vier a ser feita, ostensiva ou reservadamente, renderá prejuízos imensos à população, nos anos futuros, porque os traficantes certamente vão aproveitá-la para reforçar e ampliar seus sistemas de defesa e de terror sobre o território dominado.

Rio 2004 é mais do que um slogan - é a necessidade de afirmar a dignidade, a hospitalidade e a imagem gloriosa da antiga Capital Federal.

Mas, hoje, o esporte carioca está em baixa, arrasado pela péssima trajetória de seus clubes no Campeonato Nacional de Futebol. Todos os times do Rio foram desclassificados e ficaram sem vaga no turno final do certame e, pior ainda, o Fluminense está rebaixado para a Segunda Divisão, expelido da categoria principal no próximo ano.

O Botafogo, Campeão Brasileiro de 1995, despediu-se da mais melancólica forma, em um jogo sórdido, vergonhoso, obrigado a simular contusões de jogadores para ficar sem o elenco mínimo e, assim, escapar de uma goleada ainda mais vexatória do que a que já estava sofrendo na partida.

O Vasco da Gama, sempre um caldeirão de paixões e de atitudes irracionalmente predatórias de seus dirigentes, também passou o turno classificatório debaixo de derrotas e de crises sucessivas, mesmo fazendo contratações de grande risco, como a que elevou o jogador Edmundo à categoria de salvador da pátria. Não poderia dar certo mesmo!

O Flamengo montou vários elencos, mas não conseguiu definir um time. Vendeu, comprou, devolveu, emprestou, tomou emprestado jogadores às dezenas; propiciou viagens internacionais aos dirigentes, procuradores e empresários; girou dezenas de milhões de dólares em operações nebulosas; reincidiu no erro ao trazer de volta profissionais que teriam sido excluídos de seus quadros justamente por serem desprovidos dos mais elementares requisitos emocionais e sociais exigíveis dos atletas.

Em todo esse quadro, destaca-se a ação incompetente e amadorística do futebol do Rio de Janeiro - isso para não darmos guarida às acusações e às suspeitas de graves irregularidades em contratação e dispensa de jogadores. Não passa um dia sem que a imprensa fale em cartolas beneficiários ou intermediários de transferências milionárias. São constantes as denúncias de que os preços dos passes divergem: um é o valor anunciado; outro, o efetivamente realizado, ficando a diferença para os intermediários de dentro e de fora dos clubes.

Os jogadores de futebol não são anjos, nem vítimas indefesas do sistema. Ao contrário, como em qualquer outra profissão, nessa existem os bons e os maus elementos, os profissionais sérios e os desonestos, os trabalhadores que cumprem suas obrigações, e os relapsos, irresponsáveis. O que agrava a situação é o status de submissão absoluta à vontade dos dirigentes, uma relação quase medieval em que trabalhadores são abertamente vendidos e comprados, num quadro que ofende os mais elementares princípios da dignidade humana.

Tomemos como exemplo o caso do atacante Bebeto, que estava na Espanha e, no meio do ano, foi comprado pelo Flamengo. Sem qualquer preocupação humana ou profissional, o clube fez com que se mudasse de volta para o Brasil para, meses depois, negociá-lo novamente com outro clube espanhol. Ou seja, nova mudança internacional, com esposa e filhos: um tumulto de graves proporções em sua vida familiar.

A contrapartida efetiva está em Romário, que se prevalece da força que desfruta nas chamadas torcidas organizadas e na cúpula política do clube para vender-se, comprar-se, escalar-se e derrotar-se. É um grande jogador, sem qualquer dúvida, mas nem sempre faz valer a qualidade técnica; e é nessas horas que prevalece o peso político sobre o valor profissional.

O mais lamentável, entre os dramas dos cariocas, é o vivido pelo Fluminense, glória e destaque nas páginas históricas do esporte brasileiro. Falido, desmotivado, com um elenco abaixo das exigências de seus aficcionados, o Tricolor das Laranjeiras atravessou um ano de horror, mergulhado em dívidas e manipulado por dirigentes indignos dos homens que construíram o clube e o fizeram mundialmente respeitado. A sala de troféus da Rua Álvaro Chaves, uma das mais ricas e gloriosas do País, digna de competir com qualquer potência esportiva do exterior, é, hoje, um recanto abandonado e esquecido, porque o peso maior é o da vergonha, da mágoa.

O Presidente Gil Carneiro de Mendonça renunciou. Nenhum outro paredro se apresenta para assumir efetivamente o controle do clube e a direção dos esportes tricolores. Os belíssimos vitrais da sede foram destruídos a pedradas por torcedores indignados, os salários estão atrasados, e ninguém sabe a situação das obrigações previdenciárias e fiscais do clube.

Está chegando o fim do ano; os times devem entrar em férias logo no início de dezembro. Alguns mais cedo, outros mais tarde, porque certamente haverá a programação dos chamados jogos caça-níqueis, espetáculos melancólicos pelos grotões nacionais - aquilo que João Saldanha tanto denunciava: a transformação dos grandes craques em "leões desdentados de circos mambembes". O incrível é que muitas das quotas, nesses amistosos, são superiores às arrecadações dos jogos oficiais, porque os torcedores mais espertos e acostumados com bons espetáculos nos grandes centros simplesmente abandonaram as arquibancadas há muito tempo. Afinal, ninguém vai pagar para ver os espetáculos de indigência esportiva que fizeram a tônica desses times cariocas.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, muitos poderão perguntar: "O que um Senador do Acre tem a ver com os times do Rio de Janeiro?" Trata-se de uma questão de elementar bom senso: Flamengo, Fluminense, Vasco da Gama, Botafogo são forças esportivas e pólos culturais que transcendem as divisas da cidade do Rio de Janeiro; quando viajam, arrecadam carinho e dinheiro em todos os pontos do território nacional, obrigando-se, assim, a retribuir a atenção e os investimentos que ali recebem.

O esporte é hoje, mais do que nunca, uma força econômica e um fator de integração nacional. No interior do Acre, nos seringais da Amazônia, nas cidades sertanejas, torcer pelo Fluminense é uma forma de sentir-se um efetivo cidadão brasileiro, buscando em outra cidade, a milhares de quilômetros, uma identificação cultural e atávica. Não é à toa que o mais importante jornal do Acre, A Gazeta, de Rio Branco, constantemente abre largos espaços para o futebol carioca; aliás, a sua principal coluna, do próprio Diretor Sílvio Martinello, chorou o ano inteiro as desventuras do seu Botafogo.

Em passado recente, o futebol era politicamente explorado, ganhando uma dimensão partidária que lhe trouxe muitos problemas. Ninguém, em sã consciência, pretende ressuscitar o vínculo deletério. Mas ninguém, também em sã consciência, pode ignorar a importância que esse esporte representa, na divulgação do Brasil em todo o mundo. A maior parte das pessoas que conhecem ou ouviram falar do Brasil fazem ligação imediata com os nossos grandes craques, principalmente o nosso eterno Rei Pelé. Na África, na Ásia, em qualquer país europeu ou mesmo nos Estados Unidos, a resposta é sempre uma só: "Brasil? Oh! Pelé, futebol". Todos nós, certamente, já tivemos essa experiência nas viagens particulares e nas missões oficiais que desempenhamos no exterior. É essa força de imagem que leva o Governo a fazer concessões, doações tributárias e previdenciárias, além de ceder grandes áreas urbanas.

Concluo, Sr. Presidente, apresentando minhas saudações aos oito clubes classificados para as finais do Campeonato Nacional de 1996: Cruzeiro, Guarani, Palmeiras, Atlético Paranaense, Atlético Mineiro, Grêmio, Goiás e Portuguesa de Desportos. E lembrar uma frase do saudoso treinador Fleitas Solich, que fez as glórias do Flamengo na década de 50; quando um repórter lhe perguntou porque seu time havia perdido, ele simplesmente respondeu : "Ganó el maior".

Ganharam os melhores, ganharam os que se prepararam e treinaram com maior responsabilidade para o grande certame, o campeonato da Nação quatro vezes campeã do mundo. Ganharam porque, no futebol, vale a regra de ouro de outro esporte, o boxe: numa luta nem sempre ganha o mais forte e sim o mais disposto.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/1996 - Página 18942