Discurso no Senado Federal

DIFICIL SITUAÇÃO DOS PRODUTORES DE ALCOOL NO PAIS. PREOCUPAÇÃO COM OS EFEITOS RESULTANTES DA APLICAÇÃO DAS PORTARIAS 74 E 144, DOS MINISTERIOS DA FAZENDA E DAS MINAS E ENERGIA, RESPECTIVAMENTE, PARA O SETOR SUCROALCOOLEIRO. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DO PROALCOOL.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • DIFICIL SITUAÇÃO DOS PRODUTORES DE ALCOOL NO PAIS. PREOCUPAÇÃO COM OS EFEITOS RESULTANTES DA APLICAÇÃO DAS PORTARIAS 74 E 144, DOS MINISTERIOS DA FAZENDA E DAS MINAS E ENERGIA, RESPECTIVAMENTE, PARA O SETOR SUCROALCOOLEIRO. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DO PROALCOOL.
Aparteantes
Edison Lobão, Geraldo Melo.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/1996 - Página 19244
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • APREENSÃO, CONTINUAÇÃO, PROGRAMA NACIONAL DO ALCOOL (PROALCOOL), MOTIVO, PORTARIA, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), EFEITO, AUMENTO, PREÇO, DESEQUILIBRIO, SETOR.
  • DEFESA, SUBSIDIOS, ALCOOL, PRESERVAÇÃO, ALTERNATIVA, ENERGIA, MANUTENÇÃO, EMPREGO, VANTAGENS, RELAÇÃO, PETROLEO, PROTEÇÃO, MEIO AMBIENTE.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, LIDER, GOVERNO, SENADO, REAVALIAÇÃO, SITUAÇÃO, REVOGAÇÃO, PORTARIA.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é opinião francamente predominante a de que deve ser preservada a grande conquista nacional que foi a implantação do Programa do Álcool, um combustível automotivo, alternativo aos derivados de petróleo.

Pensam assim os políticos, os economistas, os ambientalistas e a sociedade em geral. No entanto, devo ocupar esta tribuna para, mais uma vez, apontar a importância do álcool energético, essa criação brasileira ímpar, pois volta a enfrentar uma situação perigosa. Nesse momento, a ameaça vem de duas portarias, uma do Ministério da Fazenda e a outra do Ministério das Minas e Energia, que determinam que seja o álcool exposto a uma precoce e deletéria concorrência de mercado, e que sujeitam o setor sucroalcooleiro a um desequilíbrio econômico que lhe pode ser fatal.

A Portaria nº 64, do Ministério da Fazenda, libera totalmente os preços da cana-de-açúcar fornecida às usinas e destilarias autônomas do açúcar e do álcool para fins carburantes de todos os tipos. A portaria entra em vigor a partir de 01 de janeiro de 1997.

A outra Portaria, Sr. Presidente, Srs. Senadores, é a de nº 114, do Ministério das Minas e Energia, que extingue no transporte de combustíveis, a chamada conta FUPA, Frete de Uniformização de Preços do Álcool. Também essa portaria entra em vigor no dia 01 de janeiro próximo.

O efeito imediato dessas medidas, se entrarem em vigor, será o aumento de 25% no preço do álcool para aqueles quatro milhões e trezentos mil veículos que utilizam exclusivamente esse combustível. Também subirá o preço do álcool anidro. Mas a grande ameaça que trazem consigo é o desmoronamento do setor alcooleiro, que emprega diretamente oitocentas mil pessoas no Brasil.

O Proálcool não pode subsistir sem uma certa dose do subsídio, enquanto perdurar a situação atual de preços baixos de petróleo no mercado internacional. O Proálcool foi criado como uma alternativa estratégica para o Brasil, e assim deve ser mantido, especialmente levadas em conta as vantagens que ele oferece que não são computáveis por um mecanismo de preços simplista. Não é possível, sem a adoção de medidas prévias em defesa do álcool, impor a convivência, no mesmo sistema de preços, entre um combustível fóssil e outro renovável.

Ao invés de destruir o Proálcool, o Brasil deve orgulhar-se de tê-lo. O álcool combustível brasileiro é um exemplo para o mundo todo, é a evidência viva de que a humanidade não precisa depender do petróleo para movimentar veículos. O petróleo, no momento, barato tem inúmeros inconvenientes para o Brasil e para o mundo.

O petróleo é politicamente caprichoso: já provocou crises econômicas e impôs prejuízos terríveis a muitos países por muitos anos, entre os quais o nosso País, o Brasil.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, o petróleo é fisicamente esgotável. Fatalmente se esgotará, e, à medida que fique mais próxima essa crise inescapável, seus preços e seus suprimentos se tornarão um suplício para as sociedade que dele dependerem exclusivamente.

O Sr. Geraldo Melo - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JÚLIO CAMPOS - Com muito prazer, nobre Senador Geraldo Melo.

O Sr. Geraldo Melo - Cumprimento V. Exª inicialmente pela contribuição que dá ao debate de um dos assuntos mais mal discutidos do País. Estou acostumado a ver apresentar-se o Proálcool ao País como algo que tenha feito mal e que seja pesado e oneroso à sociedade. Ainda nesta semana, li nos jornais - e encontro a referência feita no bom sentido por V. Exª - algo sobre a iminência do cancelamento dos subsídios ao Proálcool. Aproveito a oportunidade para pedir que alguém me explique, que alguém me indique, que alguém me mostre que subsídio é esse. Quem é que está pagando subsídios ao Proálcool e quem é que está recebendo subsídios dentro do Proálcool? Tenho a minha vida muito próxima desse segmento e ignoro a existência de subsídios. A não ser que se queira considerar subsídio a falsidade com que se informa ao País a respeito desse assunto. Por exemplo, diz-se que um barril de álcool é mais caro do que um barril de petróleo. Essa comparação não pode ser feita, porque álcool é produto final e petróleo é matéria-prima. Se querem comparar o custo do petróleo, deveriam fazê-lo em relação ao custo da cana e não ao custo do álcool. Na realidade, esse tipo de desinformação que se passa para a população é que deformou totalmente as noções que se têm sobre esse assunto. A não ser também que se considere subsídio o fato de que a Petrobrás, partindo desse tipo de conta, acha que deveria comprar álcool por um preço, e compra por outro. Se ela, pagando o preço que o Governo fixou para o álcool, considerar que isso é um subsídio, tudo bem. Não é um subsídio. Alguém precisará explicar, ao se referir a subsídio de álcool e subsídio de cana-de-açúcar, que subsídio é esse. Porque, afinal de contas, todas as autoridades, todas as entidades, todas as pessoas, todas as informações divulgadas dão conta de que há subsídio para o álcool. Por intermédio de V. Exª, faço um apelo para que seja sanada a minha ignorância. Quero que alguém me diga quem é que paga esse subsídio e para quem o faz. Conheço essa atividade, mas não conheço esse subsídio. Cumprimento V. Exª pela sua contribuição ao País.

O SR. JÚLIO CAMPOS - Muito obrigado, nobre Senador Geraldo Melo. Incorporo, com muita honra, o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento. Tenho certeza absoluta de que a nossa voz será ouvida. Não é justo que os Ministros Pedro Malan, da Fazenda, e Raimundo Brito, das Minas e Energia, por sinal meu correligionário do PFL, não tomem conhecimento da situação difícil que vivem os produtores de álcool deste País.

É necessário, realmente, que o Brasil mude essa imagem de que se dão subsídios para produzir álcool neste País. No meu Estado de Mato Grosso, as portarias que vão vigorar em janeiro causarão prejuízos enormes à Economia e principalmente à geração de empregos.

O Sr. Edison Lobão - Senador Júlio Campos, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JÚLIO CAMPOS - Com muita honra, Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão - Senador Júlio Campos, nessa altura do seu discurso, peço-lhe permissão para interrompê-lo e acrescentar alguns dados a esse problema que considero de grande importância para a economia do País. Em primeiro lugar, quando se diz que o Banco do Brasil, o Banco do Nordeste e o Banco da Amazônia financiam ou financiaram as destilarias de álcool, isso é uma meia verdade; todos esses recursos são oriundos do Banco Central, que, por sua vez, já os recebeu do BIRD, por empréstimo altamente beneficiado com taxas baixas e a longo prazo. Portanto, nem sequer são recursos nacionais, que viessem a onerar os cofres do Banco do Brasil e dos bancos oficiais. Em segundo lugar, o número de empregos que se criou no País com as destilarias de álcool é monumental. Será que isso não tem importância na composição da paisagem social desta Nação? Os homens do campo que passaram a ter um trabalho nas grandes destilarias de álcool - isso não tem importância? Era esta a contribuição que queria trazer a V. Exª.

O SR. JÚLIO CAMPOS - Muito obrigado a V. Exª, Senador Edison Lobão. Neste momento, em que há uma crise de emprego no País, em que o nível de desemprego chegou a um patamar dos mais elevados da história do Brasil, nos últimos 30 anos, promove-se uma política destruidora do álcool, acabando com postos de trabalho em todo o interior brasileiro. Há cidades de Mato Grosso, como Nova Olímpia, com duas usinas de álcool, que empregam mais de três mil pessoas em sua volta, com um nível de vida condigno, com o salário em dia, com o pessoal tendo a sua casinha para morar, em vez de se mudar para Cuiabá e as grandes cidades, superlotando-as e causando desemprego. Essa medida é realmente um absurdo. O preço da geração de empregos tem que ser computado no Programa Nacional do Álcool.

O Sr. Edison Lobão - Senador Júlio Campos, permita-me mais uma ligeira intervenção, para acrescentar dois outros dados, que me parecem também importantes. Na medida em que aqui se fecha uma usina produtora de álcool está se abrindo uma perfuração de petróleo no exterior, porque o álcool que deixa de ir para o tanque dos carros nacionais tem que ser substituído por gasolina, sendo o petróleo, em grande parte, importado; estamos gerando, portanto, emprego no exterior. Por outro lado, fala-se hoje, no mundo inteiro, na preservação do meio ambiente, na ecologia. Qual a importância do álcool no tanque dos automóveis? Ele evita a poluição, é antipoluente. Se não produzimos álcool, não temos álcool atuando contra a poluição ambiental e, portanto, deixamos de preservar o meio ambiente. Isso tudo é de uma importância capital, e parece que as pessoas se esquecem dessas informações, desses fatos, dessas realidades, preferindo ficar nos números superficiais, sem uma análise mais profunda da questão.

O SR. JÚLIO CAMPOS - V. Exª antecipou o item seguinte do meu discurso. Diz o meu pronunciamento:

O petróleo é ambientalmente muito agressivo. Ele tem custos terríveis ocultos, que oneram a todos. Sua queima produz gases nocivos à saúde e libera gás carbônico, causador da ameaça do efeito estufa, que preocupa hoje toda a humanidade. A gasolina que o mundo usa tem como aditivo, para aumento da sua octanagem, o chumbo tetraetila, um veneno para a humanidade.

O Brasil foi o primeiro país a eliminar o chumbo tetraetila da gasolina. Em vez de chumbo venenoso, adicionamos álcool anidro. Isso alivia os níveis de poluição de nossas grandes cidades, entre as quais, São Paulo e Rio de Janeiro.

O álcool carburante brasileiro faz com que nosso País tenha o privilégio de ser o único a oferecer, no varejo de comercialização de combustíveis automotivos, uma alternativa ao petróleo, o álcool hidratado, que serve a uma vasta frota de veículos especialmente fabricados para utilizarem esse combustível.

A implantação da alternativa álcool em nosso País foi um projeto nacional bem-sucedido na gestão do saudoso Presidente Ernesto Geisel, que em tão boa hora lançou aquele Programa, hoje uma realidade no território nacional, cuja continuidade foi dada nos Governos seguintes, de João Figueiredo, de José Sarney, de Fernando Collor e de Itamar Franco. Agora, lamentavelmente, parece-me que o Governo Fernando Henrique Cardoso quer acabar com o Programa.

Acima de obstáculos circunstanciais e pequenos sacrifícios, devem assumir essa responsabilidade de manter o Proálcool tanto Governo como sociedade civil.

As centenas de usinas produtoras em funcionamento; o grande aperfeiçoamento alcançado nas tecnologias do ciclo agrícola da cana-de-açúcar e do ciclo industrial do álcool; a criação de motores adaptados ao uso exclusivo do álcool; todas essas são etapas e sucessos das quais não devemos recuar.

Temos terras, temos clima, temos tecnologia e temos mão-se-obra para continuar a produzir álcool combustível e devemos continuar a fazê-lo. A cana-de-açúcar é uma fonte de energia extremamente vantajosa do ponto de vista ambiental. Dela se aproveita até o bagaço, para o processo industrial e para a produção de energia elétrica, como já se faz entre nós, principalmente no meu Estado de Mato Grosso.

Tomando-se o ciclo completo da cana energética, ela se revela absorvedora líquida de gás carbônico. Isto é, como qualquer floresta, a lavoura de cana absorve gás carbônico, e uma quantidade de gás carbônico superior à liberada pela queima do álcool que dela se extrai.

Não é hora de implodir o setor sucroalcooleiro brasileiro. Ao contrário, ele deve ser mantido e prestigiado, com as correções de rumo que se fizerem necessárias, desde que prudentes e construtivas.

Muitos não sabem, mas há no mundo um renovado interesse por essa ousada solução brasileira. Delegações de vários países visitam o Brasil para se informar, para admirar nossas realizações nesse setor. Pois, apesar de não estar ocorrendo, no momento, nenhuma crise de petróleo, muitos países preocupam-se com a vulnerabilidade econômica e política desse combustível fóssil e com sua agressividade ambiental. Esses países procuram alternativas ao petróleo, mas não conseguem nada que se iguale ao álcool de cana-de-açúcar como produzido no Brasil, com tecnologia brasileira, orgulhando-se o Mato Grosso de ser um dos Estados mais avançados nesse setor.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é grave a ameaça ao setor sucroalcooleiro deste País, representada pelas portarias do Governo que promovem o encarecimento do álcool, colocando-o em desvantagem em relação aos derivados de petróleo. Essas portarias, assinadas recentemente - a de nº 64 pelo Ministro da Fazenda e a de nº 114 pelo Ministro das Minas e Energia -, devem ser revogadas imediatamente e a situação deve ser reavaliada.

Neste instante, faço um apelo ao Sr. Líder do Governo nesta Casa, Senador Elcio Alvares, no sentido de que chame a atenção dos Ministros do Governo Fernando Henrique Cardoso, para que antes de tomarem medidas como essa discutam o assunto com sua Bancada. 

Parece-me que este Governo, do qual fazemos parte e o qual ajudamos a eleger - o Governo do PSDB, do PFL e do PTB, inicialmente, hoje apoiado também por outros partidos, como o PMDB -, entende de diálogo apenas com o voto contra nesta Casa. Na hora em que votamos contra falam que o Senador está votando por fisiologismo. Não se trata disso. Ninguém está votando por fisiologismo. Estaremos votando contrariados com medidas como essas, que ferem os interesses da cidadania, do nosso Estado e dos setores econômicos nacionais, como o que produz o álcool.

Por isso, Sr. Líder do Governo, esperamos que V. Exª, que estava aqui neste instante, tome conhecimento dessa situação e leve ao Presidente Fernando Henrique e aos seus Ministros a possibilidade de se reavaliar com urgência essas duas nefastas portarias, assinadas nos gabinetes frios, com ar refrigerado, pelos Srs. Pedro Malan e Raimundo Brito. Esperamos que esses Ministros se reúnam conosco para dialogar e ouvir o clamor do interior brasileiro.

Chega de desemprego neste País! Chega de desemprego no interior brasileiro! Até hoje poucas medidas foram adotadas para gerar emprego no Brasil e, lamentavelmente, muitas estão sendo tomadas para diminuir o emprego no interior do País.

O álcool gera emprego e economiza divisas e com o encerramento do Proálcool vamos ter que importar muito mais petróleo, cuja importação é feita em preço de dólar, gerando mais desequilíbrio na balança comercial do Brasil e constituindo mais recursos que os brasileiros têm que gerar para poder, a preço de dólar, comprar petróleo dos nossos exportadores. O álcool evita poluição e o Proálcool, enfim, é um grande programa que o Governo tem que preservar, devendo urgentemente reexaminar essa questão.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/1996 - Página 19244