Pronunciamento de Roberto Requião em 26/11/1996
Discurso no Senado Federal
SONEGAÇÃO DE IPI POR CONTRABANDISTAS DE CIGARROS. RAPIDO ENFOQUE DE UMA TESE ACERCA DA DURAÇÃO DO MANDATO PRESIDENCIAL E A REELEIÇÃO. APRESENTANDO PROJETO DE LEI QUE TRATA DO DIREITO A REPLICA, DO DIREITO DE RESPOSTA A PESSOA OFENDIDA EM MATERIA DIVULGADA EM VEICULO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. ESCLARECIMENTOS QUANTO A CASSAÇÃO DE SEU MANDATO PELO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARANA.
- Autor
- Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
- Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA FISCAL.
REFORMA CONSTITUCIONAL.
IMPRENSA.:
- SONEGAÇÃO DE IPI POR CONTRABANDISTAS DE CIGARROS. RAPIDO ENFOQUE DE UMA TESE ACERCA DA DURAÇÃO DO MANDATO PRESIDENCIAL E A REELEIÇÃO. APRESENTANDO PROJETO DE LEI QUE TRATA DO DIREITO A REPLICA, DO DIREITO DE RESPOSTA A PESSOA OFENDIDA EM MATERIA DIVULGADA EM VEICULO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. ESCLARECIMENTOS QUANTO A CASSAÇÃO DE SEU MANDATO PELO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARANA.
- Aparteantes
- Antonio Carlos Valadares, Pedro Simon.
- Publicação
- Publicação no DSF de 27/11/1996 - Página 19014
- Assunto
- Outros > POLITICA FISCAL. REFORMA CONSTITUCIONAL. IMPRENSA.
- Indexação
-
- REITERAÇÃO, DENUNCIA, SONEGAÇÃO FISCAL, EXPORTAÇÃO, CIGARRO, JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBJETIVO, IDENTIFICAÇÃO, CONTRABANDO.
- PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AMPLIAÇÃO, MANDATO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
- JUSTIFICAÇÃO, LEITURA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ESTABELECIMENTO, REPLICA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, DIREITO DE RESPOSTA, OFENSA.
- REGISTRO, ATUAÇÃO, ORADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO PARANA (PR), EX PREFEITO, CAPITAL DE ESTADO, CONFLITO, JUDICIARIO, ESCLARECIMENTOS, VICIO, PROCESSO, TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL (TRE), CASSAÇÃO, MANDATO.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta oportunidade, quero enfocar três assuntos relevantes.
Em primeiro lugar, trago a este Plenário mais algumas informações que dizem respeito à sonegação de IPI, por parte de contrabandistas de cigarros. Essas informações podem nos ajudar a esclarecer esse capítulo "negro" da sonegação de impostos no Brasil.
Em segundo lugar, farei um enfoque rápido de uma tese sobre a duração do mandato presidencial e a reeleição.
E, em terceiro lugar, quero apresentar ao Plenário um projeto de lei, já prometido e anunciado, que trata do direito à réplica, do direito à resposta rápida e imediata às pessoas agredidas nos meios de comunicação, deixando de lado o problema criminal e das indenizações civis para os Códigos Comuns.
A respeito do cigarro, recebi a informação de que a Receita Federal exige selos para cigarros de exportação por via terrestre, o que não ocorre quando a exportação é feita por via marítima.
Setenta e cinco por cento dos cigarros produzidos no Brasil são fabricados pela Companhia Souza Cruz, que os exporta sem o selo que caracteriza o cigarro de exportação por via marítima. Essa empresa deixa de utilizar os meios rodoviários que levam carga de cigarros ao Paraguai ou à Argentina em dois dias, em 48 horas, e opta pelo transporte marítimo, que dura até 20 dias.
Segundo informações que recebi, a Sudam e Phillip Morris têm reclamado desse processo.
É um argumento a mais em defesa do projeto de lei que apresentei a este Senado, estabelecendo uma tarja vermelha ou verde, segundo a cor das embalagens, nas carteiras de cigarro e nas caixas, onde deverá ser escrito o seguinte: "produto de exportação, venda proibida no Brasil". Isso acabaria com o privilégio da Souza Cruz e tornaria facilmente identificável os contrabandos ou os descaminhos que ocorrem com cigarros exportados ou supostamente exportados, pois temos notícia que em muitas ocasiões apenas a nota fiscal passa pela aduana.
O segundo assunto que quero abordar diz respeito à duração do mandato presidencial. Não me parece razoável, para que um Presidente da República consiga executar o seu programa de governo, com um mandato de quatro anos. Portanto, estou elaborando uma proposta de emenda constitucional expandindo o mandato presidencial para cinco anos. A essa proposta, acrescento o direito de o Presidente da República, ao completar o seu mandato, exercer um cargo de Senador honorário com as imunidades, a justificativa para o seu salário e, mais que isso, com as possibilidade de influenciar e falar no Senado da República, sem direito a voto.
Cinco anos é um mandato razoável para o regime presidencial. Se estivéssemos no regime parlamentarista, proporia seis anos.
Vale isso para o atual Presidente da República? Não sei. Quem deve decidir é o povo brasileiro, é a cidadania, através do voto.
Estou propondo, nessa emenda constitucional, a realização de um referendum, que estabeleceria se esse dispositivo, que amplia o mandato do Presidente da República para cinco anos, vigeria para este Presidente ou apenas para o próximo. Esse referendum seria uma espécie de reeleição, uma expansão do mandato de quatro anos para cinco, consentida pelo voto popular. Estou elaborando esse projeto e o trago ao Senado da República, para que os Srs.. Senadores me ajudem a refletir sobre ele.
O terceiro tema que quero abordar diz respeito a um projeto de lei, à semelhança das leis que existem em muitos Estados alemães, que estabelece o direito de réplica. Este projeto tem as seguintes disposições:
Art. 1º - Ao ofendido em matéria divulgada em veículo de comunicação social fica assegurado o direito de resposta.
§ 1º - A resposta observará:
I - se na imprensa escrita, as mesmas dimensões que a matéria que a originou;
II - se por imagem, a duração da matéria original acrescida de três minutos;
III - se por som, a duração da matéria original acrescida de dez minutos.
§ 2º - O ofendido poderá requerer que a resposta seja publicada no mesmo dia, horário e espaço em que o foi a ofensa.
§ 3º. O pedido de resposta, quando formulado com base nesta Lei, será encaminhado diretamente ao veículo de comunicação em que foi divulgada a matéria ofensiva, independentemente de quem tenha praticado a ofensa.
Art. 2º. Se o veículo de comunicação não divulgar a resposta em sete dias, a contar do protocolo do requerimento, caberá ação judicial.
Por que sete dias? Porque o ofendido poderá escolher, definir, que a resposta seja dada no mesmo dia da semana, no mesmo horário e no mesmo espaço em que ele foi agredido.
Para isso nós precisaríamos, então, deste espaço de sete dias. Os sete dias que completam sete dias da próxima semana.
Art. 3º. Ao ajuizar a ação, o autor a instruirá com as provas da ofensa e o pedido de resposta não atendido.
Art. 4º. É competente para conhecer o feito o Juízo Cível do domicílio do ofendido, ou, se este preferir, aquele onde a ofensa tenha causado maiores danos.
Parágrafo único Se a divulgação tiver ocorrido em cadeia de rádio, televisão ou na imprensa escrita, para mais de um Estado, de igual forma e alcance será a resposta.
Art. 5º. O juiz, após ouvir o veículo de comunicação, em até 48 horas, conhecerá do pedido liminarmente e fixará a data para publicação da resposta, em prazo não superior a sete dias.
§ 1º. Se descumprida a determinação judicial pelo órgão de comunicação, o mesmo juiz que decidiu o feito fixará multa em favor do ofendido, em valor correspondente a 1% (um por cento) ao dia do faturamento bruto, verificado no balanço do ano anterior do veículo de comunicação, corrigido monetariamente.
§ 2º. Persistindo a recusa, após dez dias da determinação judicial, o mesmo magistrado determinará o fechamento do órgão de comunicação enquanto durar a recusa.
Art. 6º. A resposta, publicada pelo veículo de comunicação, atendendo a pedido na forma do art. 1º ou por determinação judicial, não importa despesa para o ofendido.
Parágrafo único. Não se incluem na gratuidade as custas processuais nem os ônus de sucumbência processual.
Art. 7º. Não são admitidos a reconvenção e o litisconsórcio.
Art. 8º. Na ação de que trata esta Lei, objetivando a oportunidade de responder a ofensa, não é permitida a acumulação de pedidos.
Parágrafo único. Os pedidos de reparação de danos morais e materiais e os de ordem penal far-se-ão em ações próprias.
Art. 9º. Esta lei obedece a rito especial, e o curso da ação, desde a data do ajuizamento até a decisão, não poderá ultrapassar a trinta dias.
Art. 10. As ações de que trata esta Lei têm curso nas férias forenses.
Art. 11. Ao optar pelos preceitos desta Lei, o ofendido, tacitamente, renuncia aos da Lei nº 5.250, de 09 de fevereiro de 1967.
Art. 12. Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.
Art. 13. Revogam-se as disposições em contrário, exceto as contidas nas Leis nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967, e nº 7.300, de 28 de março de 1985, que continuam em vigor, observado, quanto à sua aplicação, o disposto no art. 11 desta Lei.
JUSTIFICAÇÃO
A proposição que ora submetemos à apreciação desta Casa tem por objetivo oferecer rito especial e célere às respostas a ofensas levadas à mídia, que, hoje, são submetidas à Lei de Imprensa (Lei nº 5.250, de 1967), com suas alterações pelas Leis nºs 7.300/85 e 6.640/79 e pelos Decretos nºs 207/67 e 509/69.
Na verdade, a Lei de Imprensa foi concebida sob a inspiração e os reflexos do Estado Novo e vem sendo utilizada consoante sua concepção. Assim, sua flexibilidade é nenhuma. Sua agilidade é nula. Sua aplicação, impossível. Veja-se, por exemplo, que a exceção da verdade ali contida é frontalmente contrária ao preceito igualitário estampado no art. 5º, caput, da Constituição Federal; no entanto, na prática, perpetua-se a norma legal e não a que lhe é hierarquicamente superior, com o que se contraria a Carta também em relação ao art. 59 e seus incisos.
O projeto que ora trazemos à apreciação, no entanto, não tem por escopo fulminar a atual Lei de Imprensa. Na verdade, o intuito único é permitir, desde já, que as ofensas veiculadas pela mídia - em qualquer de suas modalidades - não fiquem impunes, mas tenham, de fato, a oportunidade de resposta.
É uma acusação feita na mídia que se reflete no grande tribunal da opinião pública. E a ausência do contraditório viabiliza condenações sem que se estabeleça a oportunidade da defesa.
O projeto contempla, ainda, o preceito constitucional que garante o direito do contraditório, art. 5º, inciso LV, da Lei Maior, permitindo que a parte atingida apresente dialeticamente suas razões, a bem da verdade dos fatos e da otimização da segurança e da paz social.
Esclareça-se que este projeto tem fundamento constitucional, conforme se observa no art. 5º, cujo inciso V preceitua:
"V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem".
E porque a resposta constitui direito fundamental, não se deve admitir contornos e desvios que a impeçam, ainda que estes se encontrem em normas legais. Tais desvios somente evidenciam que as normas onde se inserem estão flagrantemente superadas. A circunstância fundamentadora desta proposição, por seu turno, encontra fulcro no § 1º do mesmo art. 5º da Constituição Federal:
"§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata".
São estas as razões que me motivam a requerer apoio à presente proposição.
O Sr. Pedro Simon - V. Exª me concede um aparte?
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Ouço V. Exª com prazer.
O Sr. Pedro Simon - Senador Roberto Requião, V. Exª apresenta duas proposições muito importantes. A primeira é que, lamentavelmente, o tempo de duração do mandato vem sendo debatido desde a Constituinte, e não se chega a uma solução correta. Em 1988, previa-se um mandato de cinco anos, com o parlamentarismo. Eu que não era Constituinte, era governador de Estado, defendia seis anos, no parlamentarismo. Resultou na Constituição que aí está, e o mandato é de cinco anos, sem parlamentarismo e com medida provisória, que é do parlamentarismo. E isto é uma violência dentro do sistema presidencialista. Argumenta o Presidente da República - e de certa forma é verdade - que, como o regime deveria ser parlamentarista, deu-se ao Congresso Nacional algumas atribuições que não são dadas no regime presidencialista. Se o Congresso não funcionasse, o Governo teria que parar. Veio a Revisão constitucional, e eu, que era Líder do Governo Itamar Franco, defendia intransigentemente a tese de que a Constituição deveria ser revisada após cinco anos. Mas a Constituição de 1988 não estabelecia que seriam cinco anos e um dia. Dizia apenas após cinco anos. A minha tese era a de que aquele não era o momento de se fazer a Revisão, pois era um ano eleitoral, com um Congresso já machucado pelo impeachment do Presidente Fernando Collor, pela cassação de parlamentares da CPI do Orçamento e em vésperas de eleição, com candidatos já nas ruas fazendo suas campanhas. Mas fizeram a Revisão. E fizeram pela metade. Baixaram para quatro anos, imaginando que haveria reeleição. Foi a última emenda votada na Revisão. De cinco, baixaram para quatro.
O SR. ROBERTO REQUIÃO - A famosa "síndrome do Lula".
O Sr. Pedro Simon - Exatamente, foi o medo de que Lula ganhasse, porque, naquela altura, ele tinha 45% nas pesquisas. Então, diminuíram o mandato de cinco para quatro anos e não instituíram a reeleição. Isso tem que ser decidido, concordo. Não é o problema do Fernando Henrique ou não Fernando Henrique; não é o problema da reeleição ou não reeleição: essa questão tem que ser decidida. Cumprimento V. Exª pelo projeto que apresentou, assim como V. Exª me cumprimentou quando lhe falei do projeto que havia apresentado, uma tentativa, no ano primeiro do novo Congresso Nacional, tentar-se fazer uma análise geral de toda a Constituição. Felicito V. Exª, também, pela apresentação da segunda proposta, mas o que lamento profundamente é que este Congresso, ao longo do tempo, não tenha coragem para decidir essa matéria. E perdoe o que vou dizer, talvez V. Exª não goste: se há uma matéria da qual este Congresso vai ter dez vezes mais medo de votar do que de qualquer outra e, por isso, não vai decidi-la, é essa que V. Exª apresentou - ela é total, é ser ou não ser. O Congresso não decide resoluções muito mais amenas do que a apresentada por V. Exª, este Poder não tem coragem de dizer qual é o nosso procedimento com relação a uma matéria como essa. Fala-se muito, fica o sim pelo não, o que é verdade pelo que não é verdade. Pode-se dizer horrores de um Parlamento, de um Senador, de um Deputado, e nunca se sabe se é verdade ou mentira. Às vezes, dizem que um Senador é ladrão, vigarista, e não sei mais quantas injúrias. E não acontece nada com o denunciante. Fica a moral do político atingida e não acontece nada com quem fez as denúncias. V. Exª é a "bola da vez", perdoe-me a sinceridade. V. Exª é um homem da maior dignidade, da maior correção. Lá no Paraná, é tido como um homem radical, um homem que diz as coisas de maneira quase apaixonada. Conheço muitos adversário de V.Exª - aliás, conheço adversários que sempre foram adversários e, também, os velhos companheiros que hoje são radicais adversários - e todos falam muito de V.Exª, mas com relação à sua dignidade, à sua seriedade, ao seu trabalho como prefeito, há uma unanimidade. Alguns chegam a dizer: "O Requião pode ser louco, mas é um homem decente.". Isso é uma unanimidade no Paraná. Faço essas afirmações porque me relaciono com os amigos e com os adversários de V.Exª, todos dizem que o Senador Requião é um homem de bem, um homem sério e que fez uma administração impecável. De repente acontece uma decisão que, na minha opinião, atinge muito mais os quatro juízes que participaram do julgamento do que V.Exª. Como vários casos acontecem, ficamos aqui observando. É por isso que nós políticos somos nivelados por baixo. Por exemplo, no caso de um jogador de futebol isso não ocorre. Há um craque como Ronaldinho, que está encantando a Espanha e o mundo; e há o perna-de-pau que não joga nada. Mas não nivelamos um pelo outro. Na Medicina, temos Adib Jatene, que é fantástico na sua especialização, e temos o vigarista que comete irresponsabilidades porque não tem competência e, por vezes, é até criminoso. Mas não se compara um com outro. Temos o grande empresário Antonio Ermírio de Moraes, um homem de bem, digno, e temos os picaretas que estão aí roubando, tapeando, fazendo de tudo. Também aqui não se fazem comparações. Com político, a história muda. Político pode ser honesto apesar de ser político, e o resto está por baixo, porque não se tem coragem de fazer algo como V. Exª está propondo. O que V. Exª está propondo? Alguém falou mal, caluniou, o ofendido pode entrar com um processo. O jornal, a emissora de rádio ou a empresa de televisão vai dizer se publica ou não determinada denúncia. Acredito que não publicará se não tiver provas.
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Em quarenta e oito horas o juiz decide.
O Sr. Pedro Simon - Não vai publicar. O normal de uma emissora de televisão é não publicar. Então, V. Exª pega a denúncia, o pedido de defesa, a negativa da empresa e entra na Justiça. A Justiça decidirá. O jornalista, a rádio ou a televisão argúem a exceção da verdade: "É isso mesmo e eu provo." Então, provem. Agora, todo esse processo pode levar três ou dez anos e nada acontece. O mal é exatamente este: não acontece nada. Nos Estados Unidos ou na Europa há denúncia, acusação, ministros, parlamentares e vigaristas vão para a cadeia. Se o denunciado prova sua inocência porque é honesto, quem faz a denúncia paga o pecado. Dos projetos que conheço e que tratam dessa matéria, esse é o mais corajoso e ousado e é o que aborda mais diretamente a matéria. Perdoe-me - quero que V. Exª não se ofenda -, mas conhecendo esta Casa, posso dizer que esse projeto é o que tem menos chances de ser levado adiante. Meus cumprimentos a V. Exª Conte com meu voto.
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Senador Pedro Simon, sou um cético. E os céticos se caracterizam por não acreditar momentaneamente nas coisas e por um desejo muito grande de voltar a nelas acreditar.
Hoje, a imprensa procede como a Santa Inquisição, levando personalidades públicas ao garrote vil sem a menor possibilidade do contraditório. No processo normal da Lei de Imprensa, alega-se a exceção da verdade. Talvez, após dois, três ou quatro anos, o agredido tenha a oportunidade da resposta, depois de ter sido julgado, arcabuzado pela opinião pública e liquidado no processo eleitoral, sem poder defender-se. Isso foi mais ou menos o que os Juízes do Paraná pretenderam fazer comigo; eles não o farão, porque existe o Tribunal Superior Eleitoral.
O Sr. Pedro Simon - Não é o caso de V. Exª O Tribunal Superior Eleitoral ainda não decidiu a respeito. Há a decisão do Tribunal do Paraná, que, por quatro votos a um, disse que V. Exª é culpado. As informações que me foram dadas por várias lideranças do Paraná são de que está sendo feita uma pesquisa naquele Estado e que 95% da população do Paraná disseram que o que fizeram com V. Exª foi uma injustiça e que V. Exª é um homem de bem. Mas a decisão do Tribunal do Paraná não significa nada. Na pesquisa de opinião pública, 95% dos paranaenses entrevistados - esse é um dado que considero fantástico - dizem que V. Exª é um homem de bem, digno e correto. Talvez, se se perguntasse para esses 95% se eles gostam do Requião ou se votariam nele, o índice diminuiria. Repito: até seus adversários dizem "Requião é um homem de bem, está errada a decisão do Tribunal".
O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES - V. Exª me concede um aparte, Senador Roberto Requião?
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Com muita honra, ouço V. Exª.
O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES - Senador Roberto Requião, o Senado Federal, por meio de um grande número de seus Colegas, teve oportunidade de se manifestar sobre esse triste caso da Justiça Eleitoral do Paraná, que cassou o mandato de V. Exª de forma célere e injusta, atentando contra os princípios mais simples da democracia brasileira. V. Exª, estando no Paraná, talvez tenha sido o último a saber que, naquela noite, o Tribunal estava colocando em julgamento aquele processo que definiria a vida política de um cidadão que recebeu mais de dois milhões de votos da população daquele grande Estado, um dos mais ricos do nosso País, politizado e que não faz escolha aleatória. V. Exª se elegeu Senador em virtude do seu merecimento e do trabalho profícuo que realizou à frente do Governo. Sou testemunha disso, porque na mesma época eu governava o Estado de Sergipe e vi com que dignidade, com que competência V. Exª se houve na administração daquele Estado. Queria referir-me especialmente ao projeto que coíbe, por assim dizer, atitudes arbitrárias da imprensa que coloca como manchetes contra o cidadão, principalmente contra o político, determinadas notícias que não condizem com a verdade. Isso vai repercutir, necessariamente, no futuro do senador, do deputado, do político, que muitas vezes fica irremediavelmente perdido, sem condições de reaver sua honra. A honra é um patrimônio que todos nós construímos ao longo de um passado de luta, de trabalho, de constrangimento, de humilhações, de renúncias. Quantos cidadãos que, à testa de determinados cargos eletivos, se sacrificam, não se submetem aos poderosos, não se submetem às tentações naturais do poder, permanecem na humildade da sua pobreza, na humildade da sua honradez, e vêem sua honra ser estraçalhada publicamente. Dificilmente ela será restaurada. V. Exª, ao apresentar esse projeto, atende aos reclamos de todos os cidadãos que se vêem desprotegidos diante de noticiários falsos, tendenciosos, que muitas vezes são espalhados por incentivo e por estímulo de forças poderosas que querem a sua destruição. V. Exª atingiu o fulcro da questão: apresentou não um projeto de lei de imprensa, mas um projeto que garante o direito de resposta. A meu ver, a lei de imprensa é isso que V. Exª propõe: o direito de resposta pronto e imediato e uma indenização compatível, uma indenização paga pela empresa que proibiu a resposta no devido tempo. V. Exª atingiu em cheio, quero crer, as pretensões do cidadão brasileiro, principalmente daqueles que, no exercício do cargo público são, muitas vezes, atacados de forma imerecida, como V. Exª tantas vezes o foi, principalmente no Estado do Paraná, onde seu nome é sempre considerado uma sombra aos poderosos.
O SR. ROBERTO REQUIÃO - Senador Antonio Carlos Valadares, agradeço-lhe o aparte.
Quero reiterar que o meu projeto não cerceia a liberdade de imprensa, não inibe as denúncias, mas apenas garante, de forma rápida e concreta, o direito ao contraditório.
No mesmo sentido milita um projeto do Senador Eduardo Suplicy, apresentado há cerca de dez dias no Senado, que dá à oposição o direito de falar em rede de televisão sempre que o Presidente da República convocá-la para manifestar as opiniões oficiais.
Assim, quando o Governo convocar a rede de televisão e manifestar as suas opiniões, a oposição terá direito ao contraditório e durante o mesmo tempo, também em rede, poderá expor ao País a sua visão dos assuntos abordados pelo Presidente da República ou pelo seu ministério em qualquer rede oficial estabelecida pelo Governo Federal.
Como podem ver, o projeto do Senador Eduardo Suplicy milita no mesmo sentido do meu, qual seja, o da construção da democracia. A minha proposta de voltar a estender o mandato presidencial, estabelecendo que ele será de cinco anos, tem o mesmo sentido. Como não ficaria bem ao Congresso oferecer um ano a mais ao Presidente da República, que foi eleito para cumprir quatro anos, proponho o referendo popular. Assim, votamos os cinco anos como disposição permanente na Constituição para os mandatos presidenciais, e o referendo, que é um plebiscito feito a posteriori, que é a consulta popular feita depois da lei, estabelecerá se o povo quer que o Presidente Fernando Henrique seja beneficiário desse aumento de um ano, o que lhe daria mais três anos de governo a partir de agora, ou se isso só valerá para os próximos Presidentes da República. São questões que devem ser enfrentadas, questões que já não podem ser escamoteadas.
No caso da minha cassação no Paraná, essa foi a terceira tentativa, Senador Antonio Carlos Valadares. O art. 102, "n", da Constituição estabelece que, quando uma magistratura for suspeita em determinado caso, por ter interesse específico na matéria, o réu só pode ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal.
Os juízes, por intermédio de sua associação, pediram o meu impeachment na Assembléia Legislativa. Quase todos eles assinaram o pedido, mostrando, com toda a clareza, que não me queriam Governador, mas não conseguiram fazer isso acontecer na Assembléia do Paraná.
Eu estava no Equador, participando de uma palestra para ex-Presidentes latino-americanos sobre a administração pública no Brasil, e o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná estava em recesso. O recesso foi rompido à sorrelfa, fui julgado e cassado.
O Tribunal Superior Eleitoral fez a revisão da sentença.
Na época, o Ministro Torquato Jardim, se não me engano, concedeu-me uma liminar, interrompendo o processo. Depois disso, fez uma consulta ao Tribunal do Paraná para saber se as provas que eu alegava terem sido emprestadas e sem o contraditório eram realmente emprestadas e sem o contraditório. Foi informado de que eram provas antigas.
Quando o processo veio a Brasília para julgamento final, o Ministro Torquato Jardim percebeu que tinha sido enganado pelo Presidente do Tribunal Regional Eleitoral.
Comenta-se que na época o Ministro pensava em tomar uma atitude contra o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná. Acabou aposentando-se, hoje é um dos brilhantes advogados do País, e a medida não foi tomada.
O Presidente do Tribunal Regional Eleitoral, há noventa dias, em entrevista ao jornal Folha de Londrina, dizia: "Devíamos ter cassado o Requião; só não o fizemos porque o Tribunal Superior Eleitoral não permitiu". Presidiu esse segundo julgamento.
O Procurador da República no Paraná propôs o arquivamento do projeto, porque não via nas acusações que me faziam nem crime em tese. E disse mais: "Se o Tribunal Regional Eleitoral achar que algumas dessas acusações são crimes eleitorais em tese, deve possibilitar a instrução do processo, porque não existe nenhuma prova do alegado".
O parecer do Procurador da República, Dr. Alcides Munhoz da Cunha, foi ignorado, e eu fui fuzilado, espingardeado, arcabuzado, como conseqüência de momentos do meu governo em que me neguei, por exemplo, a pagar salários de juízes aumentados por resolução, sem lei, sem o ato jurídico complexo, que é lei de iniciativa do Judiciário, passando pelo Legislativo e com a sanção do Governador.
Foi um período muito duro e de muitos confrontos. Lembro-me de que ainda na Prefeitura de Curitiba recebi, inaudita altera pars, sem a ouvida da parte contrária, sem a ouvida do Município, uma determinação judicial para aumentar as tarifas do transporte coletivo por meio de uma medida judicial que alterava os valores da planilha. Indignado, recorri ao Presidente do Tribunal de Justiça, que me aconselhou a agravar com um mandado de segurança para dar efeito suspensivo. Foi o que fiz. A medida foi sustada ao fim e ao cabo sem que a Prefeitura de Curitiba fosse ouvida. Julgaram o agravo e mantiveram a sentença do Juiz.
Na época, declarei publicamente: se a sentença afirma que um ônibus de Curitiba não mais roda, como tem ocorrido nos últimos 15 anos - acompanhamentos eram feitos pelo órgão de gerenciamento -, 2,7 quilômetros com um litro de combustível, eu, em vez de obedecer a sentença que dobra o consumo do combustível, vou colocar um litro de óleo diesel em cima da bomba injetora do ônibus, vou convocar a imprensa nacional e internacional e fazer o ônibus rodar 2,7 quilômetros. Se o ônibus rodar 2,7 quilômetros, com um litro de óleo diesel, não cumprirei a determinação judicial. E, se o Judiciário quiser fazê-la cumprida, que casse o meu mandato, ponha um juiz na Prefeitura, porque a sentença dada pelo juiz singular da Vara da Fazenda Pública, apesar da sua vontade, do seu desejo, não alterou o consumo do combustível.
Senador Antonio Carlos Valadares, enquanto fui Prefeito, esse acórdão não foi publicado. Não fui forçado a desafiar o Judiciário com um litro de vidro transparente de óleo combustível para provar que sentença não aumenta consumo de combustível nem em Curitiba nem em lugar algum do mundo.
Quando saí, o novo prefeito fez um acordo com os empresários e concedeu mais ainda do que o Judiciário havia concedido. Mas a pinimba, o conflito, começou aí, atravessou o meu período de Governador do Estado.
No primeiro ano em que fui Governador, no aniversário do Judiciário, o Dr. Pedroso, Presidente do Tribunal de Justiça, faz um discurso falando na lua-de-mel com o novo Governo, porque tinha tido conflitos com o meu antecessor, Álvaro Dias.
A lua-de-mel terminou no dia que me quiseram impor salários. No dia que quiseram me mandar a conta dos seus aumentos - e não era apenas o aumento dos juízes, era o aumento dos juízes vinculado a todos os funcionários do Judiciário -, o que impossibilitaria o Estado do Paraná de funcionar e iniciaria a deterioração das finanças do Estado, que acabaria se assemelhando a uma Alagoas ou mergulhando na crise que vive o Rio Grande do Sul, eu resisti. Aí começaram as retaliações. Pedidos de intervenção vieram às dúzias. Intervenção porque o Estado não cumpria despejos judicialmente estabelecidos. Pediam-me para despejar, numa zona urbana, 35 mil pessoas que ali residiam há 35, 40 anos. Todos esses pedidos de intervenção cessaram no dia que deixei o governo.
O novo governo nunca mais ouviu falar nesse rigor absoluto pelo cumprimento das decisões judiciais, mas a folha de pagamento do Estado do Paraná bate hoje em 97,2% da receita líquida disponível. E, no fim do ano, ultrapassará 100% da receita líquida disponível. O nosso Governador, que pede licença ao Senado para fazer empréstimos, a exemplo de tantos outros, vendeu ações da Companhia Paranaense de Energia Elétrica para pagar a folha e o 13º. Empresas públicas estão sendo vendidas, não para investimento, mas para pagar a folha e dar contrapartida a empréstimos absurdos que o Governo do Estado deseja contrair. Se não conseguimos pagar a folha, como pagaremos, no futuro, os empréstimos?
O crescimento vegetativo da folha chega às vezes a 1% ao mês. Os planos de cargos e salários, os avanços horizontais, os avanços diagonais, todos esses artifícios colocados na estrutura de organização do funcionalismo, fazem com que a folha inche.
O governo hoje vive em lua-de-mel com o Tribunal Regional Eleitoral e com o Judiciário como um todo. O Governador disse que não discute sentença judicial. Negou-se a fazer o que eu faria no lugar dele: defender um mandato popular limpamente conquistado. Assim foi conquistado o meu, assim foi conquistado o dele. Mas todos se calam num pacto de silêncio, restando a mim apenas uma certeza, a certeza de que existe Justiça no Brasil. Existem juízes em Brasília, e o Tribunal Superior Eleitoral acolherá as razões, não minhas, mas do fiscal da lei, do Procurador da República que funcionou no processo e que pediu o seu arquivamento ou produção livre de provas, o estabelecimento do contraditório, o direito legítimo à defesa.
É a terceira vez que tentam cassar o meu mandato. Já estou pensando no que farei na quarta vez, pois tenho a certeza interior de que o Tribunal Superior Eleitoral não falhará, não comigo, mas com os eleitores do Paraná que estão sendo cassados; não apenas com os eleitores do Paraná, mas com o processo democrático de livre escolha, pelo povo, dos seus governantes e dos seus representantes.
Vou enfrentar este processo com altivez, sempre que tiver oportunidade. Sempre que provocado, contarei a história das minhas relações com o Poder Judiciário do Paraná. Não aceito os conselhos de conciliação e de silêncio, porque a conciliação e o silêncio significam, claramente, a admissão de uma culpa, que eu não tenho.
Sr. Presidente, espero que os meus projetos tenham guarida no Plenário do Senado, bem como o interessantíssimo projeto democratizante do Senador Eduardo Suplicy estabelecendo o contraditório toda vez que o Presidente da República se expressar em rede ou assim o fizer um dos seus ministros.
Muito obrigado, Sr. Presidente.