Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOVA FORMULAÇÃO DO ITR, QUE, A SEU VER, NÃO DEVE TER NO ESPIRITO SANTO O MESMO CARATER PUNITIVO DO RESTO DO PAIS, POIS E O ESTADO QUE OFERECE A MELHOR DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS NO PAIS.

Autor
José Ignácio Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: José Ignácio Ferreira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS. REFORMA AGRARIA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOVA FORMULAÇÃO DO ITR, QUE, A SEU VER, NÃO DEVE TER NO ESPIRITO SANTO O MESMO CARATER PUNITIVO DO RESTO DO PAIS, POIS E O ESTADO QUE OFERECE A MELHOR DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 29/11/1996 - Página 19325
Assunto
Outros > TRIBUTOS. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ANALISE, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA, BRASIL, CRITICA, CONCENTRAÇÃO, TERRAS, EFEITO, FALTA, JUSTIÇA SOCIAL, ATRASO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.
  • ANALISE, DIFERENÇA, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), INFERIORIDADE, LATIFUNDIO.
  • SITUAÇÃO, PEQUENA PROPRIEDADE, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), INFERIORIDADE, PRODUTIVIDADE, PROBLEMA, APLICAÇÃO, IMPOSTO TERRITORIAL RURAL, PENALIDADE, PEQUENO PRODUTOR RURAL, FALTA, INFRAESTRUTURA, CREDITO AGRICOLA, INCENTIVO, PRODUÇÃO.

O SR. JOSÉ IGNÁCIO FERREIRA (PSDB-ES) - Sr. Presidente Srªs e Srs. Senadores, o Atlas Fundiário Brasileiro, editado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, em agosto último, mostra o quadro perverso da concentração da terra no Brasil. Vejamos alguns dados reveladores. Existem cerca 430 mil imóveis rurais com extensão entre 100 a 100 mil hectares, que ocupam uma área de 270 milhões de hectares. Já os imóveis com menos de 100 hectares são 2 milhões e 600 mil, ocupando uma área total de apenas 61 milhões de hectares.

Comparando os dois grupos em termos percentuais, os dados do INCRA mostram que 14% das propriedades rurais detêm 82% das terras; enquanto 86% do total dos imóveis rurais ocupam apenas 18%. Estes dados colocam o Brasil entre os países de maior concentração fundiária do mundo. E explicam muitos dos nossos problemas econômicos e sociais, tais como: o êxodo rural, a inchação e favelização das periferias das cidades, a violência urbana e rural, a escandalosa concentração de renda e o baixo poder de compra do mercado interno.

As conseqüências desse fato sobre as perspectivas de desenvolvimento econômico e social do país são evidentes. A proliferação da miséria no meio de grandes massas tem custos econômicos, políticos e sociais muito altos, que acabam se abatendo sobre toda a sociedade. O país está há décadas pagando um preço muito alto pelo descaso de suas elites que, até hoje, não souberam dar ao povo brasileiros mais do que as migalhas que caem de suas mesas. 

Enquanto isso, outros povos, que há algumas décadas eram considerados culturalmente mais atrasados do que nós, fizeram reforma agrária, investiram na educação popular e distribuíram renda. Estão, por isso, tomando a nossa dianteira e o nosso lugar no processo de globalização da economia.

Srs. Senadores, se a situação fundiária do país, segundo o mapa do INCRA, não é nada animadora, no Estado do Espírito Santo é bem diferente. Ali, as 76 mil e 600 propriedades com menos de 100 hectares ocupam 50% das terras. É uma situação fundiária que dá ao Estado certa tranqüilidade no campo, em comparação com o que acontece no resto do país.

A distribuição fundiária do Espírito Santo, mais eqüitativa que a brasileira, tem uma explicação histórica. Durante o período colonial, sobretudo nos séculos 17 e 18, as autoridades coloniais fizeram da região montanhosa, coberta pela densa Mata Atlântica, uma barreira natural em defesa das minas de ouro recém-descobertas, contra as incursões de possíveis conquistadores, sobretudo de holandeses e franceses. Dessa forma, a colonização do interior do Estado foi tardia, já no século 19, pela imigração de açorianos, suíços, alemães e italianos. A topografia e a mentalidade dos imigrantes, que se apossavam de glebas do tamanho da capacidade de exploração de suas famílias, deram ao Estado do Espírito Santo uma organização fundiária mais equilibrada que no resto do país.

Dessa maneira, os problemas rurais mais graves e freqüentes do Estado são típicos das regiões de minifúndios com baixa produtividade. O fato provoca a pauperização dos colonos e um crescente êxodo rural, talvez tão grave quanto o provocado pelos latifúndios no resto do país.

Diante desse fato, Srs. Senadores, a reforma agrária mais urgente no Estado do Espírito Santo não é redistribuir terras, mas dar aos colonos e pequenos produtores as condições necessárias e suficientes para que eles, como o seu trabalho, consigam reproduzir e melhorar o modo de vida de suas famílias. Isto significa dar ao pequeno proprietário rural incentivos como: crédito barato, a juros subsidiados e com menos burocracia; assistência técnica que lhes proporcione o acesso a tecnologias baratas e eficientes; financiamento de safras, que permita à sua pequena produção competir no mercado em pé de igualdade com a grande produção capitalizada; infra-estrutura, como estradas vicinais, eletrificação e telefonia rurais; escolas, postos médicos e odontológicos, e obras de saneamento.

Pelo que vimos, Srs. Senadores, a nova formulação do Imposto Territorial Rural, em boa hora introduzida por uma medida provisória do Presidente Fernando Henrique Cardoso, não deve ter, no Estado do Espírito Santo, o mesmo caráter punitivo dos latifúndios improdutivos com o objetivo de forçar a redistribuição da terra. Deve ter, sim, o caráter de incentivo, como mostramos acima.

É neste sentido que apoiamos a nota da Federação da Agricultura do Estado do Espírito Santo, assinada pelo seu presidente Nyder Barbosa de Menezes, publicada nos jornais na semana passada. Diz a nota: "A situação do Espírito Santo face às novas normas revela-se particularmente delicada, porque a conceituação de produtividade ali definida contrasta com a realidade rural vivida pelo Estado."

E apresenta três exemplos deste contraste entre a nova norma e a realidade das três principais produções agropecuárias do Estado. O primeiro diz respeito à cultura do café. Pelas novas normas do INCRA, o produtor capixaba deveria produzir 25 sacas beneficiadas por hectares, quando ele, nas suas condições atuais, só consegue produzir de 8 a 10. 

O segundo exemplo é o da pecuária. Neste caso, a ocupação exigida passa a ser de 1,8 unidades/animal por hectare, quando a ocupação atual não passa de 0,8 unidades/animal por hectare.

Por fim, a produção exigida da cultura do cacau é de 750 gramas/pé, contra uma produção atual de 450 gramas/pé.

Pelo que vimos, se, no Estado do Espírito Santo, a conceituação de produtividade do INCRA não for adaptada às suas condições de produtividade, os pequenos proprietários, que são a maioria, serão mais penalizados pelo novo imposto que os latifundiários, que são poucos.

Concordamos também com o Presidente da FAES, Nyder Barbosa de Menezes, quando, em sua nota, pede para os produtores do Espírito Santo, aos invés de pressões e punições, "créditos e demais estímulos que possam lhes propiciar condições para realizarem a melhoria de produtividade."

Dadas as condições fundiárias peculiares do Estado do Espírito Santo, as novas normas para o Imposto Territorial Rural devem ter ali um caráter não punitivo, mais de incentivo à produção e de melhoria de renda e de condições de vida para os pequenos produtores rurais. Esta é a reforma agrária mais urgente que o Espírito Santo espera das autoridades municipais, estadual e federal.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/11/1996 - Página 19325