Discurso no Senado Federal

DECISÃO DA GENERAL MOTORS DO BRASIL DE INSTALAR FABRICAS NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO SUL, SANTA CATARINA E SÃO PAULO.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDUSTRIAL.:
  • DECISÃO DA GENERAL MOTORS DO BRASIL DE INSTALAR FABRICAS NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO SUL, SANTA CATARINA E SÃO PAULO.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/1996 - Página 19488
Assunto
Outros > POLITICA INDUSTRIAL.
Indexação
  • REGISTRO, ANUNCIO, EMPRESA ESTRANGEIRA, IMPLANTAÇÃO, INDUSTRIA AUTOMOTIVA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), MOTIVO, ESTABILIDADE, ECONOMIA, BRASIL, EXPECTATIVA, COMERCIO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • ELOGIO, MODERNIZAÇÃO, INFRAESTRUTURA, PRIVATIZAÇÃO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), LUTA, AUTORIDADE ESTADUAL, ATRAÇÃO, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO, INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA.

O SR. JOSÉ FOGAÇA(PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, às 11 horas da manhã de hoje, estivemos no Palácio do Planalto com o Presidente da República, o Governador do Rio Grande do Sul, o Governador de Santa Catarina e o Governador de São Paulo, respectivamente, Antônio Britto, Paulo Afonso Vieira e Mário Covas. Da reunião e da solenidade de que participamos resultou o anúncio, Sr. Presidente, por parte da General Motors do Brasil, da instalação de uma fábrica de veículos no Rio Grande do Sul, fábrica esta que será implantada nas cercanias da capital, Porto Alegre, provavelmente no Município de Guaíba. Lá, também, os dirigentes da General Motors do Brasil anunciaram investimentos no Brasil da ordem de U$1 bilhão e 500 milhões nos próximos anos, sendo que desse investimento, U$600 milhões serão investidos para a implantação dessa fábrica de veículos automotores - carros, automóveis - no Rio Grande do Sul. Em Santa Catarina, a General Motors vai implantar uma fábrica de motores, que é uma espécie de subsidiária da planta instalada no Rio Grande do Sul, que vai fornecer os equipamentos, as peças para a assembleagem que se realizará na planta industrial gaúcha da GM.

Por outro lado, uma fábrica correspondente de estamparia de veículos, que é, na verdade, a lataria, o aspecto externo do veículo, que tem o nome técnico de estamparia no jargão do setor, será instalada em São Paulo, montando, portanto, esse conjunto, esse quadro de investimentos que serão aplicados no Brasil pela General Motors.

É importante ressaltar a relevância desse episódio, não apenas porque uma empresa privada estrangeira está colocando capital no Brasil, mas também porque, segundo o Dr. André Beer, Vice-Presidente da GM no Brasil, conforme ficou bem eloqüente e atestado com toda clareza e veemência, essa decisão foi tomada nos últimos dois anos, e a decisão somente foi tomada por uma razão: porque há uma macroestabilidade econômica no Brasil e há uma estabilidade macroeconômica. Não é a mesma coisa. De um lado, conseguiu-se a estabilidade econômica, o controle da inflação, mas, de outro lado, percebe-se que isso não é algo passageiro, conjuntural. Não é um jogo meramente vinculado a uma circunstância eleitoral ou a um momento político determinado. Trata-se de um projeto de País, trata-se de um projeto de Nação, trata-se de um projeto de economia nacional, trata-se de um projeto de Estado-Nação, que se vincula, notória e fortemente, ao futuro próximo, ao futuro imediato do Brasil.

Esse é um capital de risco. Não se trata de um empréstimo, não se trata de uma operação financeira realizada com os Bancos comerciais de Nova Iorque ou com a The City, de Londres. Trata-se de investimentos de capital fixo, com caráter de permanência, que vão construir, no Brasil, oportunidades múltiplas, expandindo frentes novas na nossa economia, aumentando a oferta de emprego e garantindo, seguramente, uma melhora considerável na nossa futura pauta de exportações. Segundo afirmou o Diretor e Presidente da GM, 20% da produção inicial da fábrica serão destinados à exportação e 80%, ao mercado interno.

Trata-se, Sr. Presidente, de uma medida que, em primeiro lugar, procurou atender a uma realidade - ou seja, em um País estável, localizado em um mercado tão amplo, tão sólido, como hoje se apresenta ser o Mercosul, cuja criação de comércio é da ordem de 400% relativamente àquilo que havia anteriormente -, e mostra claramente que o Rio Grande do Sul está no caminho certo.

O Estado está fazendo uma verdadeira reforma pública, está reorganizando as suas estruturas: o Porto de Rio Grande está sendo modernizado, passando por um processo de privatização; as estradas também estão sendo licitadas para serem mantidas por operação privada, mediante pedágio, o que vai-lhes dar uma melhora notável. E seguramente, com os investimentos em infra-estrutura que serão feitos a partir do momento que o Estado reorganizar suas finanças e seu endividamento e consolidar essa dívida num prazo de 30 anos, por meio de um acordo amplo com o Governo Federal, se estabelecerão as condições de credibilidade para uma empresa desse porte se implantar no Rio Grande do Sul.

Portanto, é da maior importância registrar isto: os investimentos estão sendo feitos, primeiro, porque houve, no Rio Grande do Sul quem lutasse, quem colocasse a sua posição política em jogo e apostasse na importância de expandir e incrementar o Mercosul. Enquanto alguns condenavam a integração, e a fizeram retroceder em alguns momentos, como no governo anterior, os Governos Pedro Simon e Antônio Britto trataram de incrementá-la e criar as oportunidades não só de defesa dos interesses do Estado, cuja similaridade com a Argentina, todos reconhecem, é muito grande, mas procurando reconverter a economia gaúcha e prepará-la para essa competição. Em segundo lugar, um Governo que reorganiza o Estado com profundas reformas que, embora às vezes incompreendidas, geram frutos extraordinários para o benefício da população no futuro. Em terceiro lugar, a estabilidade monetária atingida, alcançada pela política econômica do Governo Fernando Henrique Cardoso.

Registro isso, Sr. Presidente, com grande satisfação, porque se verifica que o Brasil não é mais o país dos anos 70; o país que tomava empréstimos irresponsáveis a juros escorchantes; o País que vivia à véspera permanente da desordem inflacionária e financeira. Não. Aquele país está jogado no lixo do tempo e da história. O país que nós queremos é um país transparente, com estabilidade monetária, com estabilidade política, com ordem democrática, com a mais absoluta e plena liberdade de organização popular e um país que é capaz de oferecer garantias aos investidores externos. Que garantias são essas? As garantias de que aqui as regras são estáveis, que aqui as leis funcionam, que aqui a Constituição vale. Basta isso para que o País ganhe a confiança internacional que vem ganhando e atraindo os investimentos que vem atraindo.

O Sr. Lauro Campos - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Com muita honra, Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos - Quero, de início, parabenizá-lo pelo cumprimento do seu dever como ilustre e eminente Senador pelo Rio Grande do Sul, no sentido de defender os investimentos que o Estado de V. Exª agora conseguiu no setor da produção automobilística. Também o Paraná, o Rio de Janeiro e Juiz de fora serão sedes de indústrias automobilísticas estrangeiras. Elas vêm como sempre vieram: ganhando terreno, ganhando 15 anos de isenção tributária, o acesso ao trabalhador de mão-de-obra barata e ainda, algumas delas, empréstimos do BNDES, como aconteceu em Juiz de Fora. São 50 milhões de carros produzidos por ano no mundo. A União Européia, esta semana, já cria dificuldades crescentes para a importação de peças e componentes de carros. Depois de atingir, há pouco tempo, uma euforia nesse setor - setor que os neoliberais consideravam como emblemático da vitória de suas idéias -, o México faliu. Na época, ficou evidente que 87% dos componentes dos carros montados naquele país eram importados e, portanto, não davam emprego para os mexicanos, nem renda satisfatória e impostos para os cofres públicos; constituem apenas, ou principalmente, um elemento que ocasiona concentração de renda. Como aconteceu nos anos 70, em que a taxa de inflação estava entre 12% e 23% ao ano, e houve uma discussão sobre qual delas seria a correta, uma briga entre Delfim Netto e Mário Henrique Simonsen. A dívida externa estava em US$3 bilhões apenas, e a taxa de juros no exterior era tão baixa, que Roberto Campos e Simonsen escreveram um livro para estimular os empréstimos, o endividamento externo, aproveitando o dinheiro barato lá fora. Depois, a taxa de juros, no início dos anos 80, passou a 21,5%. A concentração de renda que houve naquela ocasião fez com que a indústria brasileira pudesse ressurgir, reafirmar-se, estabilizar-se. Eu gostaria de aplaudir com mais intensidade essa industrialização dos pontos a que me referi, inclusive do Rio Grande do Sul, se naquele Estado tivessem sido abertas indústrias de sapatos, de roupas, de tecidos e de artigos a que pudessem ter acesso a massa de trabalhadores da sociedade brasileira, excluída da possibilidade de ter o seu carro novo, ou mesmo usado, e de ter acesso aos artigos de luxo, que dinamizaram contraditoriamente a economia nacional nos últimos 40 anos. Muito obrigado.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Agradeço ao nobre Senador. O aparte de V. Exª é, evidentemente, crítico ao processo de industrialização no Brasil. Creio que esse debate é muito interessante. Neste momento, não estou com tempo e possibilidade para aprofundar uma discussão nesse sentido. Realmente, analisar o perfil da industrialização brasileira é para nós, brasileiros, inclusive, um dever. Nós já temos um modelo de País e sequer raciocinamos, refletimos ou nos indagamos a respeito do modelo de industrialização que instalamos e cujo carro-chefe - sem fazer um trocadilho - é a indústria automobilística.

Em 1978, quando estive no ABC, acompanhando o Senador Teotônio Vilela, numa greve que ocorreu e no centro da qual estava um operário chamado Luiz Inácio Lula da Silva, quando pelo menos alguns de nós falaram em expulsar as multinacionais do Brasil, tanto o Lula quanto os operários que ali se encontravam consideraram esse um discurso completamente impróprio, ou seja, expulsar a GM, a Volkswagen, a Ford e outras indústrias automobilísticas do ABC seria simplesmente varrer o ABC e varrer todo o sindicalismo que ali nascia. Se hoje a GM, a Volkswagen e outras empresas automobilísticas importantes forem expulsas do Brasil, evidentemente a geração Vicentinho também será fulminada e desaparecerá no mesmo segundo.

Temos hoje no Brasil um modelo de industrialização que pode ser discutido, mas sei que a CUT defende com armas e dentes a manutenção dessas empresas no Brasil, para aqui continuar gerando e garantindo empregos.

A única coisa com que nós gaúchos, de certa forma, nos regozijamos é que, após 20 anos de reivindicações, finalmente o Rio Grande do Sul é contemplado com uma indústria dessa natureza. Essa é uma indústria tão importante que somente para a sua instalação, como núcleo-base operacional, serão necessárias 29 fábricas. Instalar-se-ão em torno da GM, do núcleo de assembleagem produtiva da GM, a chamada montadora, 29 novas fábricas, gerando um fator extraordinário de multiplicação de ofertas infinitas de emprego e ocupação de mão-de-obra. Isso sem contar com os novos cursos universitários e técnicos de nível secundário que serão implantados e que já estão sendo estruturados, tanto em nível de educação pública quanto em nível de educação privada. Deve também contar com inúmeras novas atividades paralelas que irão se implantar. Isso nada tem a ver com automóveis, mas já existe um conjunto de novas empresas de investimento em turismo e hotelaria que estarão tratando de implantar esses hotéis em torno dessa região produtiva, com a finalidade de atender à demanda que ali, por certo, surgirá.

Há todo um processo multiplicador na economia que vai se espraiar, o que demonstra que é muito correto o discurso de estimular, de manter, de preservar, de defender e até de privilegiar as pequenas e médias empresas porque são o pulmão, são o respiradouro, são a disseminação socialmente justa da capacidade produtiva e do capital. Também é verdade que um modelo com uma visão extremamente microfísica da economia e que se atenha limitada e obtusamente somente ao pequenismo, não gera crescimento, não gera expansão, não abre novas frentes de crescimento econômico.

Está provado que é possível que o modelo industrial que está no Brasil pode ser revertido aos anos 60, à era pré-JK. Basta tomar o poder e suprimir boa parte da indústria nacional. Mas o modelo que se instalou desde a era JK até hoje é um modelo em que se prova que a macroplanta industrial, a grande fábrica, o grande investimento, que exige uma grande concentração de capital, é extremamente pulverizador e microdisseminador do crescimento econômico através das veias, das aortas e das múltiplas formas de distribuição de renda, de riqueza e de formação de comércio que se estabelecem a partir dessas raízes.

Portanto, atrair grandes empresas significa garantir a multiplicação, a sobrevivência, a segurança e a prosperidade de milhares e milhares de pequenas e de microempresas. Esse, parece-me, é o grande ato vitorioso do Governo Antônio Britto, que durante dois anos, silenciosamente, articulou esse projeto sem dar nada em troca, sem fazer favores que muitas vezes comprometem os próprios recursos públicos.

Sem nenhum desrespeito ao Paraná, sem nenhuma desconsideração com o Governador Jaime Lerner, quando a Renault queria se instalar no Rio Grande do Sul, o Governador antecipou-se e disse à empresa que ele investiria U$350 milhões por meio dos investimentos gerados pelo Banco de investimentos do Estado.

No caso do Rio Grande do Sul, isso não existe. O que existe é uma disposição espontânea da empresa em razão de um mercado que se instala no Mercosul, um mercado que existe entre Buenos Aires e o Rio de Janeiro, com a possibilidade de alcançar o Nordeste no futuro. Como me disse o Dr. André Beer, isso acontecerá num futuro muito imediato, porque eles querem implantar seus parques industriais nessas áreas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fico bastante orgulhoso de fazer o registro dessa grande vitória política, dessa grande afirmação econômica do Rio Grande do Sul ao implantar uma fábrica de veículos automotores no nosso Estado.

Isso se deve, como disse, a três fatores: primeiro, ao Mercosul. E o Mercosul tem uma história. O Mercosul foi muitas vezes contrariado, rejeitado, questionado; mas há homens de visão que precisamos citar e respeitar. Entre esses homens de visão, que enxergaram o futuro e tomaram a decisão política do Mercosul, está o nosso Presidente do Senado, José Sarney, então Presidente da República.

Por alguns, isso era visto como a destruição da economia brasileira. Por alguns, isso era visto como a varredura final da economia gaúcha. Nem por isso a produção agrícola caiu; a produção industrial só aumentou, a criação de comércio ampliou-se e, evidentemente, hoje o Mercosul se coroa definitivamente, de modo a registrarmos que é uma vitória. E o seu primeiro mentor, o pai do Mercosul no Brasil - pode-se dizer -, é sem dúvida o Presidente José Sarney.

Segundo, deve-se estabilidade e confiança à política econômica do atual Governo. Terceiro, tem-se a coragem do Governo Antônio Britto em assumir a reforma do Estado gaúcho, fazendo com que também ele ganhe a credibilidade que precisava para assegurar esses investimentos.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/1996 - Página 19488