Discurso no Senado Federal

SOLIDARIEDADE AO DISCURSO DO SENADOR CARLOS PATROCINIO SOBRE A SITUAÇÃO DA SAUDE NO BRASIL.

Autor
Emília Fernandes (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • SOLIDARIEDADE AO DISCURSO DO SENADOR CARLOS PATROCINIO SOBRE A SITUAÇÃO DA SAUDE NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 30/11/1996 - Página 19421
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • APOIO, DISCURSO, CARLOS PATROCINIO, SENADOR, PRECARIEDADE, SAUDE PUBLICA, BRASIL.
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, ORADOR, CONVOCAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), ESCLARECIMENTOS, SENADO, REPASSE, RECURSOS, ESPECIFICAÇÃO, LABORATORIO FARMACEUTICO.

A SRª EMILIA FERNANDES (PTB-RS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, abordamos hoje, neste plenário, um tema da mais alta relevância para a sociedade, para os interesses da Nação brasileira e para as futuras gerações. Trata-se da proposta que está sendo amplamente debatida neste País e, principalmente, no Congresso Nacional, em torno da privatização da Companhia Vale do Rio Doce, que, pelas últimas informações, há uma insistência até mesmo por parte do Governo em concretizar esse intento no início do próximo ano.

Construída ao longo de cinco décadas, durante diferentes Governos, a Companhia Vale do Rio Doce é atualmente uma das maiores mineradoras do mundo. Inscrita no rol das estatais estratégicas ao desenvolvimento nacional, a Companhia é um patrimônio inestimável do povo brasileiro.

Antes de mais nada, a proposta de privatização em curso está comprometida pela absoluta falta de informação da sociedade brasileira a respeito do que está ocorrendo. O tema está sendo motivo de preocupação, mas a discussão com dados concretos e reais não está chegando à sociedade brasileira, não apenas sobre o processo de privatização em si, envolto em mistério e até mesmo fechado para uma plena participação da sociedade como um todo, mas, principalmente, sobre o que verdadeiramente está sendo privatizado.

Pergunto: as pessoas, os cidadãos, os brasileiros sabem o que é a Companhia Vale do Rio Doce? Eles têm idéia da sua dimensão econômica, da sua importância estratégica ou do valor do seu patrimônio? Não, não sabem! E quem primeiro reconhece isso é, sem dúvida, a própria empresa, em seus documentos de divulgação, particularmente pela Internet.

Lá está escrito, na apresentação, em palavras que reproduzo aqui textualmente:

      Quando você ouve as pessoas falando sobre a Companhia Vale do Rio Doce, você somente pensa em minério de ferro, certo? Errado. Além de ser a maior produtora e exportadora de minério de ferro do mundo, a Vale também atua em outras áreas, tais como mineração de ouro, bauxita, manganês, cobre, caulim e potássio; na produção de alumina, alumínio, aço, ligas, celulose e papel; na operação de seus próprios portos, ferrovias e navios de longo curso. Todos esses negócios são operados conforme padrões de qualidade total.

Isso é o que diz a apresentação da Companhia Vale do Rio Doce na Internet, que sugiro a todos pesquisar para, pelo menos em parte, dimensionar a gravidade do debate que estamos travando - e que, como contribuição, solicitamos, inclusive, que sejam incluídas em parte como adendo a este pronunciamento - solicito a inclusão de dados importantíssimos anexo a este pronunciamento.

Nesse sentido, levantamos alguns questionamentos, considerando apenas alguns dados, em sua maioria, inexplicavelmente sonegados da opinião pública.

A sociedade tem conhecimento de qual é o volume de reservas minerais da Companhia Vale do Rio Doce? Muitos, incluindo técnicos especializados, falam em reservas no valor de US$1,7 trilhão. As avaliações oficiais apontam para um valor total de venda da empresa em torno de US$10 bilhões. O que o Governo ou as pessoas diretamente envolvidas no processo de privatização da empresa têm a dizer sobre isso? Quanto, de fato, vale a empresa? US$1,7 trilhão, US$ 10 bilhões ou outro valor qualquer, para mais ou para menos?

O que o Governo tem a dizer sobre a afirmação de que o valor de US$10 bilhões, pelo que se pretende vender a empresa, não paga nem as instalações portuárias e suas duas grandes ferrovias?

As pessoas, os cidadãos que serão diretamente prejudicados, por outro lado, têm a verdadeira dimensão estratégica da empresa no sistema produtivo nacional? São questionamentos que estamos levantando para que as pessoas tenham condições de nos responder?

A sociedade brasileira sabe que a Companhia Vale do Rio Doce tem reservas de ferro para 540 anos? De bauxita para 187 anos? De manganês para 185 anos? De ouro para 25 anos? De cobre para 24 anos? E de ferro para 350 anos?

É também do conhecimento de todos os brasileiros - questiono - que a Companhia Vale do Rio Doce é a maior produtora de ouro da América Latina? Que detém 95% das reservas de nióbio do mundo, utilizado para a fabricação de ligas das espaçonaves? Ou que é a única produtora de cloreto de potássio do Brasil? E que mantém centros de pesquisas florestais com bancos genéticos? Ou ainda, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que a Companhia Vale do Rio Doce é proprietária de 11 portos importantes em todo o País, de um sistema ferroviário eficiente para cargas pesadas em geral, destacando-se a estrada de ferro Carajás, sistematicamente premiada como a melhor operadora do ano entre todas as ferrovias do País, e de uma frota de navios capaz de realizar transportes transoceânicos de longo curso.

A verdade, Sr. Presidente e Srs. Senadores, é que a Companhia Vale do Rio Doce não é apenas uma empresa estatal com atuação no setor de minérios no País, que, se privatizada, provocará uma enorme perda material para o Brasil.

Através da operação em nove Estados diretamente, ou por intermédio de suas empresas controladas ou coligadas, e da participação em diversos empreendimentos, a Companhia Vale do Rio Doce tem o mapa da mineração do Brasil inteiro sob o seu controle.

Com sua presença em diversas áreas, a Nação brasileira tem assegurada a soberania sobre o subsolo, sobre os recursos minerais, sobre grande parte da floresta Amazônica, portos estratégicos e outros setores decisivos para o desenvolvimento do País.

Apenas para dar uma idéia da importância desta atuação, trago aqui as palavras do Almirante Roberto Gama e Silva, autor do livro "Entreguismo dos Minérios", entre outros, e um dos maiores especialistas brasileiros em recursos naturais. Diz ele: "A dependência norte-americana em relação às fontes de matérias-primas localizadas fora dos Estados Unidos é de 98% para o manganês, 97% para o cobalto, 91% para o alumínio, 91% para o cromo, 82% para o estanho, 70% para o níquel, 57% para o zinco, 52% para o tungstênio e 48% para o ferro.

Portanto, a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, diante de informações como essa, significa, em última instância, atender às necessidades daquele e de outros países em detrimento da exploração das nossas riquezas de acordo com os interesses nacionais.

O Sr. Carlos Patrocínio - Permite V. Exª um aparte?

A SRª EMILIA FERNANDES - Concedo o aparte ao nobre Senador Carlos Patrocínio, com muito prazer.

O Sr. Carlos Patrocínio - Nobre Senadora Emilia Fernandes, é muito gratificante vê-la na tribuna nesta sexta-feira, principalmente porque V. Exª, em seu pronunciamento, defende o grande patrimônio que é a Vale do Rio Doce. A satisfação é maior sobretudo porque é V. Exª uma das legítimas representantes do segmento feminino neste Congresso Nacional. A cada momento figuras expressivas da sociedade brasileira juntam-se a esse movimento pela não-privatização da Companhia Vale do Rio Doce. É muito importante que vejamos, na tribuna do Senado Federal, essa grande Senadora, essa grande representante dos pampas proferir um discurso em defesa da Vale, principalmente porque, se não me engano, a Vale não atua no Rio Grande do Sul. V. Exª chama atenção para aspectos relevantes, principalmente para o aspecto estratégico, da atuação da Companhia Vale do Rio Doce. E o faz com toda propriedade. Na realidade não existe consenso, não existe boa vontade no âmbito do Congresso Nacional e no seio da sociedade brasileira no que tange à privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Até agora não entendo por que os tecnocratas, os homens da área econômica, o próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso insiste tanto na privatização da Companhia. V. Exª sabe que sou representante de um Partido que propugna pela privatização, pela saída do Governo de áreas não consideradas essenciais. Mas a Vale do Rio Doce é um caso à parte. Tratar-se de entregar o solo brasileiro aos interesses maiores internacionais. Ainda há pouco, o nobre Senador Ramez Tebet falava, com muita ênfase, sobre a ocupação racional da Amazônia, sobre o aproveitamento racional das suas riquezas. E a Vale do Rio Doce na grande Amazônia representa fator de integração, fator de ocupação, fator estratégico para a soberania nacional. Portanto, vejo, com muita alegria, com muita satisfação que o segmento feminino - V. Exª não só como grande Senadora, mas como mulher - posiciona-se em defesa da Companhia Vale do Rio Doce. Sobre o preço da Vale, a cada dia escutamos valores diferentes. V. Exª assegura que o Governo tem a intenção de vendê-la por cerca de R$9 ou R$10 bilhões. Segundo ouvi de técnicos expressivos, a Vale do Rio Doce não valeria menos que R$200 bilhões. E V. Exª fala em R$1 trilhão, o que é bem possível. O fato é que a Vale do Rio Doce é incomensurável, ninguém sabe qual seria efetivamente o seu valor. E, mais ainda, nobre Senadora: as mesmas companhias que estão sendo contratadas para avaliar o patrimônio da Vale do Rio Doce têm sido aquelas apontadas para fazer a sua comercialização, para intermediar a sua venda. Evidentemente que o fator número um, que faz com que o Governo pretenda alienar as ações da Vale do Rio Doce, seria a sua alta palatabilidade, digamos assim, porque muitos países por ela se interessam. Empresas da África do Sul, do Japão, da Austrália, empresas nacionais e muitas multinacionais, todas se interessam pela Companhia. A Vale, a terceira maior mineradora do mundo, é sobretudo um catalisador, ou seja, um regulador que impede que grandes monopólios nasçam em torno da exploração de minério, sobretudo do minério de ferro. Recebi esta semana um telefonema do eminente ex-Governador e ex-Senador, digno representante desta Casa, Senador Mauro Borges, que me pediu o número do telefone do ex-Vice-Presidente Aureliano Chaves e do ex-Presidente Itamar Franco. S. Exª, em entendimento com ambos, vai propor que entrem na luta, pelo menos no que tange à nossa região Centro-Oeste, em prol da permanência da Vale do Rio Doce com no mínimo 51% das ações que detém o Governo Federal. Trata-se, portanto, de um assunto de extrema importância. Acho que os projetos que tramitam nesta Casa e que têm sido alvejados deveriam ser submetidos à apreciação deste Plenário. Expresso o meu contentamento sobretudo pelo fato de o Senado Federal, mediante a atuação do nosso ilustre Presidente, Senador José Sarney, em conjunto com o ex-Presidente Itamar Franco e o ex-Vice-Presidente Aureliano Chaves, estar encabeçando a lista dos que estão contrários à privatização da Vale do Rio Doce. É motivo de muita alegria e satisfação para todos saber que esta Casa está bem representada nessa luta tão importante. Não sei se o nosso Presidente do Senado o faz como membro desta Casa, como Presidente do Congresso Nacional ou se somente como cidadão brasileiro. De qualquer maneira, esta Casa está representada na luta contra a privatização da Vale do Rio Doce, e é o que importa. Tenho certeza de que, na medida em que essa resistência à privatização ganha adesões tão importantes como a de V. Exª, o Governo irá refletir melhor, fazendo com que essa Companhia seja uma das últimas empresas nacionais a constar na lista das privatizações. Agradeço a oportunidade do aparte e congratulo-me entusiasticamente com V. Exª pelo pronunciamento.

A SRª EMILIA FERNANDES - Agradeço a V. Exª pelo aparte, que incorporo ao meu pronunciamento.

Exatamente pelas ponderações e considerações de V. Exª, estamos questionando a privatização da Vale. Queremos respostas para as indagações que aqui fizemos. Nesse momento entendo que temos que falar nos diversos tipos de privatizações. Em determinados setores, somos até solidários à iniciativa; seria uma maneira de o Estado assumir outros setores com mais compromisso. Mas, a Vale do Rio Doce, na minha avaliação, está dentro daquelas questões fundamentais ao desenvolvimento do País, e, portanto, exatamente o mais grave desse debate é que os argumentos apresentados pelo Governo, até o momento, com todo o respeito que temos, que tentam justificar a privatização da empresa, não têm conseguido nos convencer e a uma parcela significativa da sociedade brasileira.

O Sr. Elcio Alvares - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senadora Emilia Fernandes?

A SRª EMILIA FERNANDES - Com prazer, Senador Elcio Alvares.

O Sr. Elcio Alvares - Senadora Emilia Fernandes, lamento discordar de V. Exª, dentro desta sustentação, e muito mais ainda do meu querido colega de Partido, Senador Carlos Patrocínio. A questão da Companhia Vale do Rio Doce, como colocada, é inteiramente irrealista, porque o Governo não tem negado, em nenhum momento, o debate amplo sobre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, e os eminentes colegas sabem que já está praticamente agendada a vinda do Presidente do BNDES, Luiz Carlos Mendonça de Barros, a esta Casa. O próprio Senador José Agripino, que é o Presidente da Comissão de Infra-Estrutura, já começa um trabalho para que tomemos conhecimento daquilo que será o edital de privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Vejam V. Exªs: V. Exª, que está na tribuna, é do Rio Grande do Sul, mas o Senador Carlos Patrocínio tem uma ligação maior, porque é do corredor centro-leste e, evidentemente, a Companhia Vale do Rio Doce tem uma participação pelo porto de Tubarão. Sou Senador pelo Espírito Santo, onde a Companhia tem uma grande presença, mas digo a V. Exª - e aí externo o pensamento dos capixabas, dos mineiros e dos paulistas, conhecido em razão de pesquisa de opinião pública - que a maioria do povo mineiro, a maioria do povo paulista, assim como do Espírito Santo, está favorável à privatização, mas dependendo das circunstâncias. Não vamos entregar a Companhia Vale do Rio Doce de porteira fechada. Há algumas questões que precisam ser examinadas e é aí que reside a beleza do debate. Ficar contra a privatização da Vale do Rio Doce, pura e simplesmente, parece-me que não tem cabimento. Tem-se que ficar contra por algum motivo muito importante. Com relação ao caso, por exemplo, de Tubarão, que é uma das maiores manifestações da Companhia Vale do Rio Doce no meu Estado, eu pergunto: se for privatizada a Companhia Vale do Rio Doce, vamos pegar o Porto de Tubarão e levar para outro local? Ela vai continuar trabalhando no Espírito Santo da mesma maneira, e com um detalhe - aí eu estou com o projeto da Senadora Regina Assumpção -, ou seja, esse dinheiro da venda da Companhia Vale do Rio Doce não será usado para reduzir o estoque da dívida pública. Esse dinheiro tem que ser usado para estimular o desenvolvimento regional. Esse é um dos pontos que constam do parecer do Senador Vilson Kleinübing, que deve ser lido por todos os colegas, porque baliza uma questão que é da mais alta importância para esta Casa. E fecha, em seu parecer, o Senador Vilson Kleinübing: antes de se colocado à publicidade, o edital da Companhia Vale do Rio Doce tem de ser submetido à apreciação dos Senadores da República. Com relação a essa questão da Companhia Vale do Rio Doce, vota-se um projeto na Comissão de Assuntos Econômicos e ele já vem para o plenário. Tudo isso parece-me - perdoe-me o signatário do manifesto, porque eu o respeito profundamente - ser uma questão que já está inteiramente ultrapassada em termos de Brasil. Nosso País tem uma posição muito clara a respeito da privatização. Hoje, por exemplo, vi, na coluna de economia do Jornal do Brasil, uma pergunta muito interessante sobre a razão de agora se estar falando nas reservas de ouro que a Companhia Vale do Rio Doce não explorou, quando o Sr. Eike Batista detém uma fortuna de US$500 milhões. O Sr. Eike Batista é filho do Sr. Eliezer Batista, o grande defensor da não-privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Isso está no Jornal do Brasil, com todos os efes e erres. Por que até então a Companhia Vale do Rio Doce não implementou a questão das minas de ouro, deixando que uma empresa privada pudesse ter exatamente esse veio aurífero tão importante para o Brasil? Gostaria de ponderar - e esta é a posição do Governo Federal, que o Presidente Fernando Henrique Cardoso tem falado a todos nós - que não há um perfil ainda definido do edital da Companhia Vale do Rio Doce e vamos debatê-lo ainda aqui, no Senado. Não devemos tomar, adredemente, uma posição contrária, porque o debate seria mais saudável e é a isso que o Governo vai-se propor. Tenho esperanças, a exemplo do que aconteceu na votação do projeto do Senador José Eduardo Dutra, na Comissão de Assuntos Econômicos, que nenhuma dúvida cercará o assunto no plenário, quando a questão será abordada como merece. O Maranhão, por exemplo, representado aqui pelo Senador Francisco Escórcio - e que também é o Estado do Presidente José Sarney, sendo governado por sua filha -, vai ter, em contrapartida, dentro da visão que temos a respeito da privatização daquela empresa, algo muito importante. Se o Espírito Santo recebesse R$400 milhões - e o Governo, lá, é do PT, o que me deixa muito a cavaleiro para falar, pois pertenço a outro Partido -, teria um impulso muito grande, permitindo-lhe criar um projeto de desenvolvimento regional. Portanto, com o maior respeito não só à eminente oradora, mas também ao meu querido amigo Carlos Patrocínio, que, quando cheguei, a aparteava, coloco esta posição, não porque o Governo a adotou, mas porque é a posição de um Senador do Estado do Espírito Santo, onde a Companhia Vale do Rio Doce tem uma grande participação. E vou adiantar mais um elemento: a Companhia Vale do Rio Doce realizou, recentemente, uma pesquisa entre seus funcionários, para saber como ficaria o caso da venda da companhia. O resultado mostrou que 92% dos funcionários comprariam as ações da Companhia Vale do Rio Doce, no sistema de privatização. É fundamental essa participação. Estou lutando, Senadora Emilia Fernandes, para elevar o percentual destinado aos funcionários da Companhia Vale do Rio Doce. E estou lutando por quê? Porque fui procurado pela Associação dos Empregados da Companhia Vale do Rio Doce, que gere os interesses dos seus funcionários, e achei a causa justa. Então, penso que a Companhia Vale do Rio Doce vai ficar no mesmo lugar e não podemos permitir que, amanhã, ela seja transformada em um cartel, em prejuízo de seus operários e funcionários. E, feito isso, adotando o mecanismo defensivo da Gold Share, Sr. Presidente, eminente Senadora, não teremos dúvida nenhuma ao dizer que a privatização da Companhia Vale do Rio Doce é emblemática, importante, fundamental para o País, e muito mais para o Espírito Santo. Não tenho dúvida de que tanto o Senador Gerson Camata, quanto o Senador José Ignácio, que são de um Estado no qual a Vale do Rio Doce tem uma atuação muito grande, também vão votar favoravelmente.

A SRª EMILIA FERNANDES - Senador Elcio Alvares, agradeço o aparte de V. Exª.

O SR. PRESIDENTE (Ramez Tebet) - Senadora Emilia Fernandes, a Presidência prorroga o prazo para o seu pronunciamento, pela importância do tema e pelo seu espírito generoso, acolhendo no seu pronunciamento dois apartes que foram verdadeiros discursos.

O Sr Elcio Alvares - Perdôe-me, então, Excelência.

A SRª EMILIA FERNANDES - Agradeço o aparte do Senador Elcio Alvares. Ao longo do meu pronunciamento, vou ter oportunidade de esclarecer suas ponderações.

Eu acrescentaria uma questão: é importante a posição do Governo, confirmada pelas palavras de V. Exª, de que considera importante o debate, o esclarecimento, mas que só está ocorrendo, Srs. Senadores, pelo movimento de reação que houve neste País. Se não houvesse este movimento de reação daqueles que querem esclarecimento, daqueles que querem saber o valor real dos bens, do patrimônio da empresa, talvez a companhia já tivesse sido privatizada. Então, é isto que estamos clamando e pedindo: o debate, o esclarecimento e a resposta do Governo.

Hoje, fala-se que vamos privatizar tudo porque o Governo precisa investir em áreas estratégicas, como saúde e educação. Já há algum tempo ouvimos isso e tanto a educação como a saúde continuam um caos. Por outro lado, temos depoimentos escritos do próprio Governo de que o compromisso maior - e é o que se tem notado - é com o pagamento da dívida e não com a aplicação nos setores sociais.

Consideramos esse questionamento altamente salutar, porque através dele vamos construir a melhor alternativa para o País.

O Sr. Geraldo Melo - Permite-me V.Exª um aparte, nobre Senadora Emilia Fernandes?

A SRª EMILIA FERNANDES - Concederei o aparte, mas considero importante avançar um pouquinho no meu pronunciamento, até porque alguns aspectos vão-se elucidando em relação ao que penso neste momento e estaremos abertos ao diálogo.

Não devemos olhar nosso País como um investimento, com retorno para o Estado onde a companhia tenha algo, como um porto ou as próprias minas. Temos que olhar este País como um todo, pois queremos o desenvolvimento igualitário, a soberania, e a projeção do País diante do mundo, diante da globalização que está posta.

Entendo que, em primeiro lugar, nesse processo, precisamos ter isso muito claro, porque a empresa é enxuta, lucrativa, com elevada rentabilidade, não ficando nada a dever a qualquer outra empresa do setor privado mundial.

Apesar de produzir, principalmente, minério de ferro, cujo preço - de cerca de US$17 por tonelada - não aumenta há 50 anos, a empresa não deixou de ampliar a sua produção e os seus lucros.

É o próprio Governo, por intermédio do BNDES, que reconhece ser a Companhia Vale do Rio Doce "uma usina integrada, líder no mercado brasileiro, competitiva no mercado internacional, que não dá prejuízo, tem um excelente nível de atividade". E, além disso - ainda segundo as autoridades federais - "é moderna e atualizada tecnologicamente".

Ousamos dizer que a Companhia Vale do Rio Doce é o exemplo mais bem acabado do que os próprios defensores da modernidade não cansam de apontar como ideal de empresa moderna e competitiva.

Ainda no caso da Companhia Vale do Rio Doce, a tese da necessidade de privatizá-la, de abri-la à participação estrangeira para tornar o setor mais competitivo é inteiramente descabida.

Atualmente, a Companhia já conta com 49% de capitais privados, com cerca de uma centena de sócios e investidores, presentes sob as mais diversas formas de parceria em diversas áreas de atuação da empresa.

A Companhia Vale do Rio Doce é uma empresa de capital aberto, consagrada no mercado por sua transparência, firmada ao longo dos anos pela participação de investidores privados brasileiros, japoneses, italianos, espanhóis, franceses, argentinos e sul-africanos. Portanto, é uma empresa que está aí, aberta ao novo estilo de capital e de desenvolvimento.

Fala-se apenas que é o Estado que mantém, que é o Estado que gasta muito, que é o Estado que sustenta. Não! Trata-se de uma empresa de capital aberto. Já existe a participação.

É um fato que, apesar de ocultado da opinião pública, faz do processo de privatização em curso, não uma abertura à participação do capital externo, mas apenas uma transferência pura e simples do controle acionário da empresa para os interesses externos. É isso o que queremos ver esclarecido e explicado.

Além do mais, mesmo que a privatização viesse a resultar em ganhos de produtividade, como se afirma, é preciso responder quem seria beneficiado com isso: a sociedade brasileira ou os grandes grupos econômicos estrangeiros?

O Sr. Geraldo Melo - V. Exª me permite um aparte, Senadora Emilia Fernandes.

A SRª EMILIA FERNANDES - Ouço com muito prazer o aparte de V. Exª.

O Sr. Geraldo Melo - Senadora Emilia Fernandes, penso que V. Exª está trazendo uma contribuição importante para o País. Concordo que este assunto precisa ser discutido. Na realidade, eu, pessoalmente, sou favorável à privatização da Companhia Vale do Rio Doce, sou favorável ao Programa de Privatizações, ao programa de diminuição do Estado. Com relação à Companhia Vale do Rio Doce, na minha opinião, a questão é essencialmente de preço. À medida em que o País conta com a Companhia Vale do Rio Doce, que está dando lucro, vai continuar esperando que ela dê lucro. Os donos das ações que representam parte do capital é que mudarão, mas isso não diminui o número de empregos, não diminui a produção da Vale do Rio Doce e nem a contribuição que ela dá ao País e aos Estados onde se localiza. Portanto, isso não muda nada. Para mim, o importante é saber se um ativo valiosíssimo, como a Vale do Rio Doce, será vendido por um preço que compense que a sociedade brasileira deixe de ser - toda ela - sua proprietária e passe a pertencer ao grupo "a" ou "b". Mas, que haja prejuízo pelo simples fato de se privatizar, que haja prejuízo para a sociedade, penso que não possa ser mantida e nem sustentada essa tese. A minha dúvida, em primeiro lugar, é com relação ao preço, porque os valores que estão sendo referidos parecem-me extremamente baixos em relação ao valor aparente de um ativo como o da Vale do Rio Doce. A segunda questão que eu colocaria é: por que a pressa em relação à Vale do Rio Doce? Uma das preocupações é retirar de cima do Estado cargas onerosas. E, contabilmente, a Vale do Rio Doce representa ativos, já que não onera porque é uma empresa eficiente e lucrativa, embora, em comparação com empresas semelhantes que existem por aí afora, ela seja muito menos eficiente. Mas a Vale do Rio Doce não está sendo onerosa ao Estado brasileiro, e talvez fosse mais importante acelerar a privatização de algumas geringonças que estão aí dando prejuízos e aumentando, portanto, os problemas e encargos da União. O terceiro ponto - e pela primeira vez divirjo do Senador Elcio Alvares - é em relação aos benefícios que essa privatização trará aos Estados como Espírito Santo, Minas Gerais, Pará, Maranhão. Como representante do Rio Grande do Norte, que não tem Vale do Rio Doce e nunca terá, digo que o meu Estado também quer o seu pedaço. Para mim, é incompreensível - e gostaria de ter um esclarecimento - o argumento de que um Estado desses tem o direito de receber uma compensação. Compensação de quê? Qual é o prejuízo? Se não há prejuízo para o Brasil, como um todo, em se privatizar a Vale, em que se baseia a tese de que haverá prejuízo, por exemplo, para Minas Gerais? A Vale do Rio Doce vai continuar em Minas. Vamos supor que a Vale do Rio Doce fosse uma empresa privada e que o Governo de Minas Gerais estivesse querendo atrair investimentos. Se alguém montasse a Vale do Rio Doce privada naquele Estado, seria uma tremenda vitória para Minas Gerais. Muito bem. Mas não foi uma empresa privada, foi o Estado brasileiro que um dia fez com que brotasse a estrutura monumental de investimentos que existe nos vários Estados, onde atua a Vale do Rio Doce. Essa estrutura vai continuar a existir, vão continuar a existir os empregos, vai continuar a existir a atividade produtiva. A Vale do Rio Doce não vai mudar de lugar; as ações é que estão sendo vendidas. E elas pertencem a quem? Por acaso está se tomando a ação do Espírito Santo, de Minas Gerais, do Maranhão? Não está. O que está sendo feito? Estão sendo vendidas as ações do Estado brasileiro, que é uma entidade da estrutura social do País, que pertence a todos os brasileiros. Se, na hora em que o Brasil vende ações de algumas das suas empresas, tem que repartir preferencialmente com algum Estado, então, seria preciso ver por que não repartiu quando vendeu outros ativos, já que estão sendo negociadas ações do Governo em outros empreendimentos, em outras empresas, em outros Estados. Na realidade, acredito que isso é uma simples esperteza, e os Estados que não participam dela não têm por que assistir de braços cruzados. Até aplaudo os governantes pela competência com que estão procurando recursos para os seus Estados, já que é o papel deles. Mas a competência deles não pode ter como contrapartida a incompetência dos outros. Eles são competentes para levar recursos para os seus Estados, mas que não o façam às custas dos demais. Não há o menor fundamento, seja de natureza técnica, econômica, social ou moral, que justifique que parte dos recursos oriundos da venda desse ativo devam ser concentrados em algum desses Estados. Essa é a minha opinião.

A SRª EMILIA FERNANDES - Muito obrigado, Senador.

O SR. PRESIDENTE (Ramez Tebet) - Senadora Emilia Fernandes, a importância do debate fez com que esta Presidência, em homenagem ao seu pronunciamento, permitisse a prorrogação do tempo que lhe é destinado na tribuna. Peço a V. Exª que encerre o seu pronunciamento, porque estamos com o tempo de sua permanência na tribuna ultrapassado em 17 minutos.

A SRª EMILIA FERNANDES - Vamos pedir a V. Exª um pouco mais de paciência, Sr. Presidente, até porque os apartes foram longos mas foram altamente enriquecedores para o nosso pronunciamento. Não vamos nos deter em respondê-los.

Queremos apenas dizer que o aparte do Senador Geraldo Melo vem exatamente acrescentar questionamentos.

Vamos avançar um pouco mais no pronunciamento e, logo em seguida, se for possível, daremos mais apartes.

Perguntávamos, então, por que a pressa na privatização. Por que prometer ou negociar benefícios para alguns Estados e não pensar o Brasil todo? Eu apenas discordaria do Senador Geraldo Melo quando diz que a primeira questão, para ele, essencialmente, é a do preço.

Pois eu vou mais além. Considero que a privatização da Vale do Rio Doce vai além da questão do preço, ela inclui a discussão da soberania, da independência e até da própria democracia neste País.

Ainda, rapidamente, lembraríamos a participação, na empresa, de grupos internacionais.

Estão certos, por outro lado, aqueles que questionam se a empresa, sob o controle externo, continuará mantendo-se como a importante agência de desenvolvimento econômico, social e cultural nas regiões onde atua.

Uma grande corporação, com matriz no exterior, movida apenas pelo interesse do lucro global, reempregará parte dos seus ganhos no incentivo da saúde, da educação, da cultura, da preservação do meio-ambiente ou de outras atividades produtivas no País, como é feito hoje pela empresa?

Não seria mais correto, mais coerente para com os interesses nacionais, que se fizessem as correções que porventura fossem necessárias na empresa, os enxugamentos, enfim, para que ela produzisse ainda mais benefícios para o conjunto do povo brasileiro?

Nesse sentido, este debate, bem como as suas conseqüências, não é apenas de interesse das regiões onde a empresa tem atuação, mas é um tema de repercussão nacional, na medida em que a desnacionalização da Companhia Vale do Rio Doce traz prejuízos para toda a sociedade brasileira.

Ainda é uma inverdade afirmar que, entregando nossos minérios, ou qualquer outro patrimônio público, estaremos abrindo as portas para a entrada de novos investimentos ou para a transferência de tecnologias de ponta para o País.

Até o momento, esse artifício, além de aumentar as taxas de juros, e quebrar a indústria nacional, tem somente promovido uma intensa desnacionalização do parque industrial brasileiro.

Aquilo a que estamos assistindo, e os jornais estão a divulgar isso seguidamente, são empresas brasileiras, como a Metal Leve, para citar um exemplo, sendo adquiridas pelo capital estrangeiro, sem que isso resulte em novas plantas industriais ou mais empregos.

Quanto à transferência de tecnologia, no caso da Companhia Vale do Rio Doce, tal argumento demonstra total falta de conhecimento, ou uma profunda má-fé para com a empresa, exemplo de eficiência e desenvolvimento tecnológico para todo o mundo.

A venda da Companhia Vale do Rio Doce para "fazer caixa", reduzir o volume do principal da dívida externa, e pagar menos juros e serviços, vem a ser o mais injustificável argumento da privatização da empresa.

Apenas para dimensionar a insensatez dessa tese, segundo dados oficiais, nos primeiros 10 meses deste ano, o Governo já enviou para o exterior um total de US$8,2 bilhões, a título de pagamento de juros e de serviços da dívida externa - ou seja, quase uma Companhia Vale do Rio Doce, de acordo com a avaliação oficial.

Diante disso, é incompreensível que alguém de bom senso, em dificuldades financeiras, pretenda se desfazer exatamente daquele patrimônio que, além de não lhe trazer prejuízo, ainda lhe proporciona ganhos imediatos, e, a médio e longo prazo, pode ser fator de discussão, no nível que estamos inclusive propondo.

Sr. Presidente, não quero abusar da boa vontade de V. Exª, portanto vou dar como lido o meu pronunciamento.

Poderemos até voltar numa outra oportunidade para detalhar e explicitar algumas questões, mas gostaríamos de concluir dizendo que, em momentos bem mais difíceis da vida nacional, os governantes do nosso País tiveram capacidade para avaliar e tirar proveito da situação trazendo conquistas para o Brasil, como pudemos ver em momentos em que foram discutidos outros temas nacionais.

Nenhum país do mundo, em momento algum, por mais graves que fossem as suas dificuldades, abriu mão dos seus principais instrumentos de desenvolvimento econômico e de conquista de melhores condições de vida para o seu povo.

Antes de concluir, quero ainda me congratular com o Líder da nossa Bancada, Senador Valmir Campelo, que, na Comissão de Assuntos Econômicos, quando foi apresentado projeto do Senador José Eduardo Dutra pedindo que o Senado Federal fosse ouvido e valorizado na definição dessa questão, deu o voto favorável do PTB à proposta. Queremos, por isso, cumprimentá-lo neste momento.

E concluo reafirmando o meu apoio a esse grande movimento em defesa da Companhia Vale do Rio Doce. A reação contrária, hoje, à venda dessa empresa, talvez condenada pelo Governo, já tem um ponto altamente significativo, que é a reação que está surgindo neste País.

O Governo precisa vir explicar melhor inclusive o que o Senador Geraldo Melo disse: por que a pressa, por que não se desfazer do que não está dando lucro e do que não há necessidade que seja do Governo? E, principalmente, por que vender a Vale, se até mesmo o próprio Governo não sabe a capacidade total dessa empresa? Por que ela está sendo utilizada como forma de negociar recursos para os Estados, se o Brasil merece uma atenção maior, com todas as dificuldades que tem nas diferentes regiões?

O Sr. Francisco Escórcio - V. Exª me permite um aparte?

A SRª EMILIA FERNANDES - Dou um aparte de um minuto, Sr. Presidente, e encerro o meu pronunciamento.

O Sr. Francisco Escórcio - Senadora Emilia Fernandes, parabenizo-a neste momento pela riqueza de detalhes que o trabalho de V. Exª nos trouxe. Eu, como representante do Estado do Maranhão, não poderia deixar de aqui dar a minha opinião: eu sou contra a privatização da Vale do Rio Doce. A discussão é boa, democrática e válida, mas tenho uma preocupação: é quanto ao edital. Muito obrigado. 

A SRª EMILIA FERNANDES - Agradecemos o aparte de V. Exª. Este é um tema que não se esgota. A sociedade brasileira está exigindo esclarecimentos e informações e esperamos que o Governo tenha a sensibilidade de mostrar ao povo brasileiro do que estamos falando: da imensidão do seu patrimônio.

Certamente voltaremos a esta tribuna para debater este tema, que é de alta responsabilidade desta Casa.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/11/1996 - Página 19421