Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A PROPOSTA DE REGULAMENTAÇÃO DO ARTIGO 192 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE DEVERA SER CONVERTIDA EM PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR E ENCAMINHADA AO PLENARIO, DE INICIATIVA DO SENADOR JOSE FOGAÇA.

Autor
Gilberto Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A PROPOSTA DE REGULAMENTAÇÃO DO ARTIGO 192 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE DEVERA SER CONVERTIDA EM PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR E ENCAMINHADA AO PLENARIO, DE INICIATIVA DO SENADOR JOSE FOGAÇA.
Publicação
Publicação no DSF de 05/12/1996 - Página 19722
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • ANALISE, PROPOSTA, REGULAMENTAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, AUTORIA, JOSE FOGAÇA, SENADOR, GARANTIA, ESTABILIDADE, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, REFORÇO, PODER, FISCALIZAÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), AUMENTO, CONTROLE, ADMINISTRAÇÃO, BANCOS.

O SR. GILBERTO MIRANDA (PMDB-AM) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no cumprimento de expressas atribuições constitucionais, este Senado e sua Comissão de Assuntos Econômicos--- que tenho a honra de presidir-- tornaram-se o estuário do grande debate nacional sobre a atual crise do sistema financeiro e também sobre as alternativas tendentes a reestruturá-las no interesse da estabilidade econômica e da retomada do desenvolvimento.

Recentemente, demos mais um passo decisivo nessa direção com a iniciativa de nosso nobre colega José Fogaça, que, na qualidade de coordenador de um Grupo de Trabalho Extraordinário sistematizou importante proposta de regulamentação do artigo 192 da Constituição Federal agora submetida à CAE. No momento, seus membros tomam conhecimento da proposta com a finalidade de convertê-la em projeto de Lei Complementar e encaminhá-la a Plenário como contribuição institucional da CAE. O Senador Fogaça concedeu recentemente, uma esclarecedora entrevista ao periódico Rumos do Desenvolvimento, órgão informativo da Associação Brasileira de Instituições Financeiras de Desenvolvimento (ABDE), e acredito que valha a pena destacar e comentar seus principais pontos.

De início, com a grandeza e o desprendimento que o distinguem, faz o Senador gaúcho questão de afirmar que esse não será um projeto dele ou de qualquer outro colega, mas da comissão, por ela patrocinado e respaldado na vontade política de dotar o sistema financeiro do país de uma nova e eficaz moldura regulatória, que garanta a credibilidade pública de instituições que, em última instância, têm nessa credibilidade seu maior patrimônio.

Sr. Presidente, como é do conhecimento geral, há quase sete anos, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados tenta regulamentar o art.192, o que, até agora, ensejou a apresentação de números projetos, tais como os de Francisco Dornelles, César Maia e José Fortunati, para citar apenas três. Lá, apenas dos esforços dos nobres deputados Benito Gama e Gonzaga Mota, este último o atual presidente da comissão, a questão permanece, não obstante, indefinida. Agora, a entrada do Senado Federal se dá justamente sob o já referido impacto da estabilização monetária sob a saúde dos bancos, que inspira sérios cuidados dos governantes e da sociedade desde o segundo semestre do ano passado, quando as crises do Econômico e depois do Nacional iniciaram uma verdadeira reação em cadeia de iliquidez, atingindo várias outras instituições. Nós, Senadores não temos qualquer intenção de ingerir nas prerrogativas da Câmara; apenas conforme disse há pouco, estamos decididos a dar a contribuição que o Brasil de nós espera ( e à que a Cata Magna nos obriga) no tocante à fiscalização e ao acompanhamento do sistema.

Desde o início da crise, converteu-se o Banco Central no alvo das atenções e, frequentemente também, das críticas de boa parte da opinião pública sobretudo a partir da instituição do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro (Proer). Pois é justamente o BC que constituí o fulcro das preocupações motivadoras da proposta ora em exame na CAE.

Por ela, o Banco central passa a se concentrar em sua atribuição primordial de guardião da moeda e do crédito, recebendo instrumental adequado para tanto. Caber-lhe-á estabelecer toda a programação monetária, ouvido, é claro, o Presidente da República, mas guardando capacidade de ação autônoma claramente definida.

Uma inovação relevante consiste no Conselho Deliberativo que substituirá o atual Conselho Monetário Nacional. No novo conselho terão assento o Ministro da Fazenda e mais 12 membros, todos nomeados pelo Presidente da República e aprovados pelo Senado, aí incluídos os cinco membros da diretoria executiva e o Presidente do BC. Todos os 12 membros aprovados do Conselho Deliberativo terão mandato fixo de seis anos, renovável apenas por mais seis.

O caráter inovador da proposição se manifesta plenamente no papel atribuído ao Ministro da Fazenda nesse conselho. Disporá ele de um poder de "semi-veto", ou seja, quando julgar que determinada decisão de política monetária afete a política econômica, poderá requerer votação de 315 dentro do Conselho Deliberativo. Portanto, uma resolução só será aprovada, se contar com ampla maioria, se não o consenso, dos membros do conselho.

Sem dúvida, não escapou ao Senador Fogaça, defensor consciente, consistente e coerente da independência da autoridade monetária, nos moldes do Federal Reserve (Fed) americano e do Bundesbank alemão, que face ao complexo jogo de pressões políticas, empresariais e corporativas, característico de nossa cultura econômico-financeira, tal liberdade de ação não poderá deixar de acarretar redobradas responsabilidades paras os dirigentes das instituições. Um cuidado particularmente louvável tomado pela proposta consiste no estabelecimento de uma "quarentena" de 12 meses durante os quais integrante do Conselho Deliberativo ficará impedido de trabalhar em instituições do mercado financeiro após a saída de seu cargo no BC.

Em outra inovação moralizadora, a proposta define a natureza e as limitações das instituições financeiras públicas e privadas, fortalecendo consideravelmente poder de fiscalização do Banco Central, em especial no que se refere à obtenção de informações, comunicação de irregularidades ao Ministério Público, aplicação de sanções na esfera de abrangência do Banco Central, além de rígidas exigências quanto à posição de controladores e administradores, bem como de seus familiares.

Paralelamente, são regulamentados o sigilo bancário, e as atividades de empresas que prestam serviço de auditoria às instituições financeiras. Esses auditores passarão a ter responsabilidade solidária em qualquer processo-crime movido contra os bancos e seus clientes, o que os obrigará a não conivir ou não fechar os olhos a quaisquer irregularidades.

Se, como corretamente enfatiza o Senador Fogaça, a proposta amplia bastante o poder de fiscalização do BC sobre as instituições financeiras públicas e privadas, também é verdade que o Senado fica , por ele, consideravelmente fortalecido em sua capacidade de supervisionar a autoridade monetária. O Presidente do Banco Central passará a enviar, trimestralmente, relatório detalhado das atividades do órgão. Além disso, deverá comparecer, no final do primeiro e do terceiro trimestres de cada ano, perante a Comissão de Assuntos Econômicos, para prestar contas de suas decisões.

O Senador encerra sua entrevista lembrando que o anteprojeto prevê a possibilidade de destituição do Presidente do Banco Central por parte do Senado, caso este concorde com iniciativa do Presidente da República nesse sentido. E essa iniciativa presidencial poderá, por sua vez, estar embasada em requerimento, devidamente circunstanciado, dos Srs. Senadores, no qual estes solicitem a troca, substituição, ou destituição do Presidente do BC.

Aproximando-me do fim deste pronunciamento, Sr. Presidente, destaco a sábia orientação que prevaleceu no âmbito do grupo de trabalho senatorial no sentido de não sobrecarregar o projeto com disposições referentes a áreas sem dúvida, importantes, mas de interesse secundário em vista do objetivo maior de salvaguardar o valor de compra da moeda e a credibilidade fundamental do sistema bancário, tais como resseguros, seguros, previdência privada, capitalização e instituições do mercado de capitais.

Gostaria de concluir minhas palavras desta tarde conclamando os nobres colegas membros da Comissão de Assuntos Econômicos e os estimados pares em geral a que, todos juntos, encaremos com disposição e minudência a tarefa de estudar esse projeto de lei complementar, tendo em vista, inclusive, a possibilidade de aperfeiçoá-lo e aprimorá-lo. Nosso sucesso nesta missão será um marco decisivo na consolidação da estabilidade e na recuperação da capacidade do Brasil para voltar a poupar, crescer, gerar emprego e distribuir riqueza. Constituirá, também, magnífica afirmação de nossa competência legislativa à consecução desse magno desiderato.

Longe de qualquer um de nós, Sr. Presidente, nutrir a ilusão de que isso esgotará a problemática da estabilização, com definitiva eliminação de todas as fontes estruturais de reaquecimento inflacionário. Afinal, a gravíssima situação da dívida pública e das finanças estaduais está aí, a clamar também por uma solução definitiva. A extensão de mecanismo do Proer aos estados cujos governos mostram se decididos a estancar a sangria de recursos públicos resultante de velhos vícios políticos, que inviabilizaram financeira e, eu diria mesmo, moralmente a esmagadora maioria dos bancos estaduais, é uma decisão governamental de indubitável impacto, mas que não chega a equacionar inteiramente a questão. Por isso mesmo, as atenções e as angústias dos governadores e das populações desses estados voltam-se cada vez mais para esta Câmara Alta, que, afinal, é a Casa da Federação. Também neste aspecto, desejo proclamar minha confiança em nossa capacidade democrática de ouvir todas as partes que entram nessa intricada equação, de colocar esses argumentos e reivindicações na justa perspectiva do debate nacional sobre as reformas fiscais (administrativa, tributária e previdenciária) ora em exame em ambas as Casas do Congresso, chegando a uma solução equilibrada que contemple um compromisso histórico entre a necessária austeridade e o inadiável imperativo do crescimento com justiça social.

Muito obrigado, Sr. Presidente!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/12/1996 - Página 19722