Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM A COBRANÇA DA CPMF NO PROXIMO ANO, RESULTANDO NUM IMPACTO NOS PREÇOS FINAIS DOS BENS INDUSTRIALIZADOS E, TAMBEM, NUMA IMINENTE FUGA DE CAPITAIS PARA O EXTERIOR. PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO A SER APRESENTADA POR S.EXA. EXTINGUINDO O REFERIDO TRIBUTO.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • PREOCUPAÇÃO COM A COBRANÇA DA CPMF NO PROXIMO ANO, RESULTANDO NUM IMPACTO NOS PREÇOS FINAIS DOS BENS INDUSTRIALIZADOS E, TAMBEM, NUMA IMINENTE FUGA DE CAPITAIS PARA O EXTERIOR. PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO A SER APRESENTADA POR S.EXA. EXTINGUINDO O REFERIDO TRIBUTO.
Publicação
Publicação no DSF de 11/12/1996 - Página 20078
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • CRITICA, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, EMENDA CONSTITUCIONAL, CRIAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), OBJETIVO, PERMANENCIA, ADIB JATENE, EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), RECONHECIMENTO, ORADOR, ERRO, VOTO.
  • CRITICA, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), SITUAÇÃO, ESTABILIDADE, MOEDA, ESTIMATIVA, AUMENTO, PREÇO, PRODUTO INDUSTRIALIZADO, PREJUIZO, CONCORRENCIA, EXPORTAÇÃO, BRASIL, APREENSÃO, AMPLIAÇÃO, INFLAÇÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, AUTORIA, ORADOR, EMENDA CONSTITUCIONAL, REVOGAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), OBJETIVO, PREVENÇÃO, INFLAÇÃO, EVASÃO DE DIVISAS, CAPITAL ESPECULATIVO, PREJUIZO, BOLSA DE VALORES.
  • LEITURA, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, DEBATE, PREJUIZO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), ECONOMIA.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, SENADOR, REVOGAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma preocupação extensiva a toda a sociedade brasileira me traz a esta tribuna, na tarde de hoje: a iminente cobrança da CPMF a partir do início do próximo ano.

Gostaria de lembrar o contexto personalíssimo em que se deu a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição que instituiu a Contribuição Provisória Sobre Movimentação Financeira e o papel preponderante do ex-Ministro Adib Jatene, que colocava a aprovação da CPMF como condição sine qua non para a sua permanência à frente do Ministério da Saúde.

Igualmente, gostaria de lembrar o peso dessa premissa no processo decisório do Congresso Nacional: os méritos e a competência do Ministro conduziram a um embate maniqueísta que nada de bom acrescentou à consistência da defesa da proposta.

Por outro lado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vale lembrar o choque macroeconômico provocado pelo Plano Real e as novas condições econômicas dele decorrentes, as quais permitiram vislumbrar, num horizonte de curto e médio prazos, a troca do círculo vicioso da inflação pela perspectiva de um círculo virtuoso (menos inflação, mais produção, melhor distribuição, mais estabilidade).

Daí o equívoco que será a manutenção desse tributo de controvertida gestação, dificílimo parto e, certamente, malfadada implementação, num quadro de inflação baixa.

Não se pode ignorar que o impacto de uma alíquota de 0,25% numa inflação de 40% mensais, como à época da concepção original da CPMF, é perfeitamente tolerável para o conjunto da economia, de vez que os seus reflexos não se fazem sentir de maneira tão significativa na produção, o que, sem dúvida, não é verdadeiro para índices inflacionários abaixo de 0,5% ao mês.

Nesse contexto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, completamente diverso daquele que norteou a concepção original do tributo, a penalização da economia extrapola em muito o setor financeiro, atingindo linearmente cada etapa da cadeia produtiva, a distribuição de serviços e mercadorias, o preço dos alimentos básicos e, até, as pequenas poupanças populares, garantidoras, em última análise, de uma promessa de futuro para os menos favorecidos.

Estima-se que a alíquota de 0,2% poderá ter um impacto de até 3% nos preços finais de bens industrializados, o que, entre outras coisas, sinaliza, no mínimo, incoerência do Projeto de Governo na área econômica, por frustrar, uma vez mais, a competitividade dos bens e serviços produzidos no Brasil, no momento em que as nossas exportações estão em baixa. E aí, Sr. Presidente e Srs. Senadores, alerto que a inflação nos Estados Unidos e na maioria dos países europeus foi até abaixo de 3%, e o CPMF vai gerar uma inflação, segundo os bons economistas, de mais ou menos 3%. Isso, no mercado internacional, pesa.

Segundo manchete da Folha de S. Paulo de hoje, o Brasil foi o país que menos aumentou as exportações e o segundo em crescimento de importações em 1995 (as exportações cresceram 7% e as importações 49%, de acordo com o relatório da Organização Mundial do Comércio, divulgado no encontro que se realiza em Cingapura).

Importa ressaltar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, neste momento, 127 países se reúnem em Cingapura, buscando encontrar formas eficazes para aumentar o livre fluxo de mercadorias e serviços a partir da competitividade internacional dos países membros da OMC.

Na contramão da história, a CPMF irá reduzir a competitividade da nossa economia vis a vis os demais países capitalistas.

Convictos da imperiosa necessidade de se abortar a aplicabilidade da recém-aprovada Emenda Constitucional nº 12, de 1996, que "outorga competência à União para instituir contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira", estamos apresentando Proposta de Emenda Constitucional revogando o art. 74 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

O referido tributo, na verdade um imposto travestido de contribuição, pretende exigir do contribuinte, durante dois anos, o pagamento de 0,25% do valor de toda operação de natureza financeira que ele venha a realizar, estando passível de cobrança, portanto, desde uma simples transferência bancária de valores até um modesto saque de dinheiro da caderneta de poupança, o que certamente afeta a economia de milhões de brasileiros, inclusive a dos mais pobres.

A criação do referido tributo deveu-se, conforme afirmamos inicialmente, à luta obstinada do então Ministro da Saúde Adib Jatene, vendendo à opinião pública a idéia de que somente com a sua cobrança seriam atacados os graves problemas que afligem o setor da saúde, mormente os relativos à má prestação estatal dos serviços de saúde à população.

A despeito de todas as críticas dos opositores da instituição da CPMF, fundadas principalmente na iniquidade do tributo, que atinge igualmente ricos e pobres, sendo, assim, mais duramente, por estes últimos, e nos seus impactos macroeconômicos negativos, dada a sua cumulatividade, foi ele aprovado pelo Congresso Nacional.

Diante de uma economia que atualmente registra níveis ínfimos de taxa inflacionária, o iminente início da cobrança da CPMF em janeiro próximo preocupa os investidores, em especial os do mercado de capitais, em que os efeitos da globalização da economia são mais fortes, devido à previsível queda do rendimento líquido das aplicações financeiras e da negociação de ações, podendo provocar, por conseguinte, a fuga de capitais para países onde as regras de mercado sejam mais favoráveis.

Sr. Presidente, queria fazer uma colocação a esse respeito. Acabamos de chegar dos Estados Unidos, onde fomos verificar como funciona o sistema financeiro, a área financeira daquele país. Já tínhamos feito isso na Alemanha. Fomos ao Banco Central americano, à Bolsa de Valores de Nova Iorque, à Bolsa de Futuros de Nova Iorque, a "n" instituições. Para nossa surpresa, o próprio Presidente da Bolsa de Valores de Nova Iorque disse-nos, num rasgo de sinceridade, que nós tínhamos ajudado muito a Bolsa de Nova Iorque, porque, ao aprovarmos aqui a CPMF, estávamos fazendo com que para lá se transferissem ações. Hoje, lá ocupam uma posição de destaque as ações da Eletrobrás. Há também as da Aracruz, e agora vão entrar outras ações. Ele nos dizia que, com toda a certeza, eles teriam todas as blue chips lá, em Nova Iorque, graças à nossa ajuda, com a criação da CPMF. Ou seja, as nossas Bolsas de Valores estão perdendo a concorrência.

Por essa razão, estamos preocupados.

Ademais, os especialistas prevêem também impacto inflacionário, ainda não estimado - muitos acreditam que da ordem de 3% -, provocado pelo inevitável repasse dos custos financeiros que serão incorporados aos produtos e aos serviços, colocando em risco a inédita meta brasileira pós-industrialização de se conseguir, ao final do ano de 1997, uma inflação anual de apenas 5% ou 6%, o que significaria a consolidação do êxito do combate ao flagelo da inflação empreendido pelo atual Governo.

Esperamos que a racionalidade prevaleça sobre o emocionalismo e a demagogia, para evitar prejuízos à população carente, resultantes de medidas fiscais esdrúxulas e de eficácia efêmera, que podem ameaçar a estabilidade da moeda e, conseqüentemente, piorar as condições de vida dos mais necessitados, aos que se destinam, em tese, os recursos a serem arrecadados pela CPMF.

Faço um outro parêntese. Quando votei a CPMF, aqui, tinha certeza de que era algo sem grandes problemas, partindo de dados que recebemos de fontes seguras do Governo. Para nossa surpresa, começamos a ver o debate no bojo dos próprios economistas do Governo. Até mais: observamos, por exemplo, o Dr. Gustavo Franco, do Banco Central, dizer que isso era um erro. Verificamos também os editoriais de todos os grandes jornais deste País, na semana passada, como o de O Globo, que disse:

      "Revisão da CPMF - Tributo Infectado.

      Ao se aproximar a data de entrada em vigor da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, setores do próprio Governo começam a se dar conta do estrago que esse tipo de tributo poderá provocar no País. Como a CPMF foi instituída por emenda constitucional, exigindo um grande esforço político no Congresso, o Governo dificilmente dará o braço a torcer, mesmo que o pai da idéia, Adib Jatene, já tenha deixado o Ministério.

      Mas a equipe econômica pode amenizar o impacto da CPMF usando os atos relativos à sua regulamentação. Por exemplo, estabelecendo alíquota zero ou algo perto disso em algumas operações. O imposto ou contribuição de 0,2% passaria quase despercebido no período em que a inflação era de 40% mensais; mas com índice abaixo de 0,5% ao mês, um tributo de 0,2% que incide sobre qualquer saque, pagamento ou transação efetuado através do sistema financeiro, tem impacto terrível nos custos de produção, além de inviabilizar várias operações.

      Nas Bolsas de Valores, a CPMF de 0,2% não permitirá mais que os especialistas comprem e vendam ações diariamente com margens muito pequenas. Sem essas negociações rotineiras, as ações simplesmente deixam de ter liqüidez, o que, para os investidores, é mortal.

      Mas o estrago não ficará restrito ao mercado financeiro. Como se trata de um tributo em cascata, que incide, linearmente, sobre cada etapa da produção, a alíquota de 0,2% pode ter impacto de até 3% nos preços finais de bens industrializados. Nos combustíveis, calcula-se que o aumento médio para compensar a CPMF será de 0,5%.

      Tudo somado, essa infeliz contribuição pode produzir 2 ou 3 pontos percentuais de inflação no ano que vem. A saúde pública talvez não tenha maior aliado no Brasil do que a queda da inflação. É ilógico que se estime um tributo que produz inflação, supostamente, para reforçar o Orçamento do Ministério da Saúde, em especial, quando não há a menor certeza de que foram criados mecanismos eficientes de controles de gastos."

Por outro lado, O Estado de S. Paulo, de sábado, 7 de dezembro, publicou afirmação feita no dia anterior pelo Diretor da Área Externa do Banco Central, Gustavo Franco, dizendo que, se a regulamentação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira não for muito cuidadosa em relação aos investimentos no mercado de capitais, esse tributo vai esvaziar as Bolsas de Valores brasileiras e matar a galinha dos ovos de ouro. Segundo ele, pode haver um desastre, sim; de acordo com Franco, se não for mudada a alíquota de 0,20%, será mudada a base sobre a qual o tributo incide. A pergunta que devemos responder é simples: queremos ou não ter um mercado de capitais? - indagou em entrevista.

Textos semelhantes foram publicados pela Folha de S. Paulo e por O Estado de S. Paulo, que repercutiram matérias como esta: "A CPMF põe em risco também a capitalização." (O Estado de S. Paulo, de 10/12/96).

Ou seja, os dados que nos foram entregues não eram precisos. Verificou-se que, pelo endividamento, por um lado, as Bolsas e, por outro lado, a produção, vão ter um reflexo muito negativo.

Talvez melhor fosse se pudéssemos disciplinar os gastos do Ministério da Saúde. Devemos ter a humildade, como estou tendo neste momento, de dizer que votei e me considero enganado; foi um erro praticado por mim.

Por isso, tenho a coragem de hoje correr aos meus Pares pedindo apoio para uma PEC, onde solicito a revogação desse imposto que não vai trazer vantagens, mas vai trazer, com toda a certeza, muitos problemas, principalmente para a produção e para as nossas Bolsas de Valores.

Continuando, Sr. Presidente, não devemos correr o risco de colocar em xeque o vitorioso Plano de Estabilização Econômica em troca de um paliativo para os problemas da saúde, que devem ser enfrentados com medidas gerenciais e fiscais, consistentes e definitivas.

Conclamamos, portanto, todos os Parlamentares a lutarem pela extinção desse tributo que, além de pouco contribuir para resolver os graves problemas da saúde nacional, pode ensejar o surgimento de outros mais abrangentes e mais difíceis de serem resolvidos, como os que ocorreram nos longos anos de altas taxas inflacionárias que desorganizaram a economia nacional e sua competitividade internacional.

Portanto, Sr. Presidente, essa é a posição que trago nesta tarde. Vou pedir aos meus Pares para que me apóiem nessa PEC, a fim de que possamos corrigir esse erro, a meu ver, calamitoso. Pessoas como eu e outros Pares votaram na certeza de que estavam lutando pelo bem público, e não tiveram, em nenhum momento, a informação do outro lado, do risco; olhamos os prós, mas não tínhamos noção dos contras.

Mais uma vez, critico os que deixaram de nos dar as informações. Não temos a visão macroeconômica do Estado. Se tivéssemos, com toda a certeza, não teríamos votado dessa maneira. Não temos os números precisos.

Observamos manifestações contrárias da parte de Gustavo Franco, um economista respeitado, de homens das Bolsas de Valores de São Paulo, do Rio de Janeiro, da Bolsa de Futuros, todos apavorados com o esvaziamento que iremos sofrer; de líderes empresariais - recebi muitos pedidos de associações comerciais, de associações industriais, no sentido de que se corrija o erro.

Tive a humildade de vir ao plenário confessar o meu engano. Mais ainda, vou pedir aos meus Pares para que me apóiem, a fim de que possamos corrigir o que, a meu ver, é um engano calamitoso.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/12/1996 - Página 20078