Discurso no Senado Federal

ANALISE DOS TRABALHOS DA DELEGAÇÃO BRASILEIRA QUE COMPARECEU A CONFERENCIA 'AMIGOS DO LIBANO', REALIZADA EM WASHINGTON. COMENTARIOS SOBRE O GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO NO ANO DE 1996.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA EXTERNA.:
  • ANALISE DOS TRABALHOS DA DELEGAÇÃO BRASILEIRA QUE COMPARECEU A CONFERENCIA 'AMIGOS DO LIBANO', REALIZADA EM WASHINGTON. COMENTARIOS SOBRE O GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO NO ANO DE 1996.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães.
Publicação
Publicação no DSF de 20/12/1996 - Página 21114
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, POSIÇÃO, ORADOR, REFERENCIA, CONFERENCIA INTERNACIONAL, AUXILIO, POPULAÇÃO, OBTENÇÃO, SOBERANIA, PAIS ESTRANGEIRO, LIBANO.
  • INFORMAÇÃO, ENCAMINHAMENTO, MANIFESTO, SOLIDARIEDADE, SOBERANIA, PAIS ESTRANGEIRO, LIBANO, AUTORIA, SENADOR, RONALDO SARDENBERG, PRESIDENTE, DELEGAÇÃO BRASILEIRA.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes do pronunciamento de despedida deste ano, quero transcrever, nos Anais da Casa, como já o fez ontem o Senador Romeu Tuma, a minha posição sobre a importante reunião, realizada em Washington, dos chamados Amigos do Líbano.

O Brasil foi o único país da América Latina convidado para esse encontro, junto com os países do Primeiro Mundo, para debater uma maneira de ajudar o Líbano a sair da tragédia que se vê envolvido há tanto tempo.

Convidado pelo chefe da nossa delegação, Ministro Ronaldo Sardenberg, compareci a uma reunião, em seu gabinete, onde se discutiu a pauta dos assuntos que seriam travados em Washington.

Nessa reunião, resolvemos que, além dos auxílios prestados ao Líbano, deveríamos aprovar uma moção de solidariedade contra as injustiças que aquele país vem sofrendo, objetivando que o Líbano possa, realmente, encontrar a autonomia e a independência do seu território.

Todas as pessoas que estavam presentes concordaram com as medidas tomadas. Saímos dali para uma reunião com o próprio Presidente da República que manifestou o mesmo entendimento.

Nossa proposta de moção de solidariedade foi levada por nós ao Senador Antonio Carlos Magalhães, Presidente da Comissão de Relações Exteriores, que foi favorável à mesma.

Assim, a moção foi encaminhada ao Presidente da Delegação, Ronaldo Sardenberg, para que, na reunião de Washington, manifestasse a posição dos Senadores do Brasil, representantes do povo brasileiro, no sentido de que se tenha um Líbano desocupado de todas as forças estrangeiras de qualquer origem, e que cessem todas as agressões à autodeterminação daquele povo, dando-se cumprimento às Resoluções da ONU, de modo especial a de número 426, conforme expressas e reiteradas manifestações do Excelentíssimo Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Com muito prazer, Senador Antonio Carlos Magalhães.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Senador Pedro Simon, quero dizer que, depois que V. Exª apresentou a sugestão da moção, entramos em contato com o Chefe dos Serviços Estratégicos, Embaixador Ronaldo Sardenberg e, de comum acordo com os membros da Comissão, foi sugerido o nome do Senador Romeu Tuma para encaminhá-la, que ontem prestou contas de sua viagem. Quero dizer ainda a V. Exª que o assunto é tão importante que o Embaixador do Brasil também teve uma participação muito grande e nos encaminhou - vou enviar cópia a V. Exª - um relatório pormenorizado da reunião. Há detalhes dos quais vale a pena tomarmos conhecimento, porque são extremamente favoráveis ao ponto de vista que V. Exª expressa da tribuna.

O SR. PEDRO SIMON - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Antonio Carlos Magalhães.

Realmente, o Senador Romeu Tuma representou o Senado e teve um desempenho absolutamente positivo e concreto. Participou de toda a reunião e ficou ao lado do Ministro, a quem levou a nossa solidariedade, o que é muito importante.

Sr. Presidente, é difícil encontrar no mundo um país que tenha sofrido tantas injustiças como o Líbano. Tudo bem, tanto o povo palestino quanto o israelita têm direito a uma pátria, mas por que o Líbano deve pagar uma conta tão cara? Por que os palestinos sem terra, sem pátria, receberam abrigo no sul do Líbano? Ali viveram numa luta permanente com Israel, e o Líbano terminou pagando a conta. Com o povo sírio pelo norte, e os israelitas e os palestinos pelo sul, uma nação considerada a Suíça do Oriente Médio quase foi destruída. Agora, há um trabalho fantástico de reconstrução.

Por tudo isso, é muito importante a posição do Brasil, pois aqui há mais libaneses e descendentes de libaneses que no Líbano. Como aqui a colônia libanesa é muito grande, como a colônia israelita, a jordaniana e a egípcia são muito grandes e vivem pacifica e ordeiramente, temos autoridade para buscar esse entendimento.

Por isso, solicito a transcrição da carta que enviei ao Senador Antônio Carlos Magalhães e do seu despacho, bem como do relatório das manifestações que lá aconteceram.

Sr. Presidente, chegamos ao final de mais um ano. Creio que não podemos falar de maneira derrotista, porque não seria verdadeiro, e também não podemos falar ufanisticamente que amamos este País, porque também não seria verdadeiro. Devemos analisar com frieza o que aconteceu no mundo e o que se verificou no Brasil.

De saída, há um lado positivo: a inflação ficou contida. Não há dúvida de que o maior inimigo do trabalhador, do operário, da gente simples é a inflação. Os mais abastados, a classe média, têm condições de se livrar dela. Podem colocar dinheiro em poupança, aplicar na Bolsa de Valores, comprar dólares e bens; mas, para o trabalhador que ganha o salário e o gasta até o fim do mês, o maior inimigo é a inflação.

Há um segundo aspecto positivo, e que sou obrigado a reconhecê-lo. Como viajo muito pelo interior e converso muito com pessoas simples e humildes, pude perceber que os assalariados viveram um ano em que, de certa forma, o preço do pão não aumentou, o preço do leite não aumentou, o preço da passagem também não. Tem razão o Senhor Fernando Henrique quando diz que o preço do frango não aumentou. Os índices de venda do supermercado e os índices de consumo dizem que essa gente simples viveu até melhor do que em anos anteriores.

Do lado negativo, penso que não aconteceu aquilo que esperávamos e que estávamos rezando para que não acontecesse, mas com medo de que acontecesse. Falo da recessão e da explosão do desemprego. Houve desemprego, e muito. Lá no meu Rio Grande do Sul, só no setor calçadista, com o corte das exportações e a importação em massa da China, há milhares e milhares de desempregados. Mas, vamos dizer assim, não se chegou à recessão brutal que se imaginava com a quebradeira generalizada. Eu diria até que passou por lá, mas não ficou. Entendo até que, de certa forma, nos últimos meses, está recuando. As indústrias de calçado, por exemplo, estão podendo respirar novamente. No ramo de brinquedo, a Estrela, que estava praticamente falida, com o acordo que fizeram no sentido de sobretaxar os brinquedos oriundos do exterior, teve uma renovação de vida.

Este é um aspecto positivo: o Brasil vive em uma democracia. Os jornais, rádios, televisões, líderes sindicais, CUT, CGT tiveram liberdade.

Por falar em CGT, quero levar o meu abraço ao Joaquinzão. Como a vida é cruel! Eu não tinha conhecimento do que lhe aconteceu. Fiquei sabendo hoje quando ele estava saindo do asilo. Que vida ingrata! Pode-se ser a favor ou contra as idéias de Joaquinzão, mas ele foi um líder sindical de prestígio, de nome, de presença, de ação, de garra, e de repente foi atirado num asilo, longe de tudo. Agora, por caridade, ele é tirado de lá e recolhido a uma instituição.

Este foi um ano em que houve liberdade para debater, para discutir, para falar. Até penso que a grande imprensa namorou demais o Governo. Ela podia ter usado um pouco melhor a sua liberdade. Houve liberdade, quanto a isso não há dúvida nenhuma.

Eu diria - vejam como é estranha a minha análise - que as viagens do Presidente da República para o exterior foram positivas. Não há como negar isso. Podem dizer o que quiserem, mas que o Presidente da República tem "pinta", tem pompa, tem cultura, tem competência, tem conhecimento geral, tem presença, é poliglota, não há como deixar de reconhecer. As viagens do Presidente da República para o exterior somaram pontos para a Nação brasileira.

No entanto, há pontos negativos. Primeiro, o Senhor Fernando Henrique não entendeu que não basta ser honesto. Quem está no governo, além de ser, precisa parecer honesto. Isso é importante. Jamais o Senhor Fernando Henrique devia ter impedido o funcionamento da CPI dos corruptores. Jamais o Senhor Fernando Henrique podia ter extinto a CAI - Comissão de Investigação criada pelo Presidente Itamar Franco. Apesar dos apelos dramáticos, Sua Excelência não a reabriu. Jamais o Senhor Fernando Henrique podia ter extinto a CPI dos Bancos, já instalada, com Presidente e plano de trabalho. Aqui no Senado da República, votou-se uma moção extinguindo uma CPI que já estava instalada, um ato de força da maioria, na minha opinião, absolutamente ilegal.

Na minha opinião, houve um fracasso total na agricultura. O Senhor Fernando Henrique foi Ministro da Fazenda de um Governo de transição e que colheu uma safra recorde na agricultura. A maior safra da história da agricultura brasileira foi plantada e colhida no Governo do Sr. Itamar Franco. Tudo isso para agora recuar, cair e estarmos às vésperas de importar trigo, arroz feijão, milho? Para a agricultura este foi um ano cruel. Este foi um ano de madrasta para o agricultor brasileiro. Lá no meu Rio Grande do Sul, independentemente do ITR, as terras hoje praticamente não valem nada. Ao longo dos últimos 40 anos, nas regiões da área de fronteira do Rio Grande do Sul, o preço do hectare era de US$2,000; hoje, vendem-se aquelas terras por US$500 o hectare - se aparecer alguém querendo comprar - porque não têm mais nenhuma perspectiva.

Foi muito mal. É verdade que a agricultura nunca foi um problema importante para São Paulo. Quando era o café, o Governo girava em torno do café. Os problemas da agricultura de São Paulo são específicos, e café sempre teve solução específica no passado. Agora, o café está lá em Minas Gerais; sofra o café. Ainda ontem um companheiro discursava aqui dizendo que nós vamos terminar importando café, porque não é São Paulo que produz, é Minas Gerais. A agricultura vai mal. E o Governo não olhou para a agricultura.

Eu diria que, no social, o Governo não foi bem. Eu esperava muito do Programa Comunidade Solidária do Governo Fernando Henrique, porque aquela experiência do Betinho, feita no Governo Itamar, tinha sido o início. Aquilo não era um plano de Governo, era um programa do PT, que o Lula trouxe, e eu levei ao Presidente da República, que o encampou. O Betinho e o Bispo de Duque de Caxias fizeram milagre, mas era um plano improvisado. Já o Comunidade Solidária é um programa planejado, preparado, estruturado para caracterizar a social-democracia, para ser o diferencial no Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso. Mas não o foi, apesar da competência, da seriedade, da vontade e da garra de Dona Ruth. Nota dez para ela. Faltou empenho e ação do Governo para que aparecesse algum resultado, que, em termos de resposta, foi realmente muito pequeno.

Vejo agora em manchetes o Presidente da República indicar para Ministro o Dr. Albuquerque, um grande cidadão que fez um excepcional trabalho no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. O Presidente acertou em cheio na indicação do Dr. Albuquerque, pela sua competência, pela sua garra, pela sua disposição; o Ministro ocupava a diretoria da Faculdade de Medicina do Rio Grande do Sul. Nota dez para ele também. Mas quando vejo o Presidente da República dizer que o ano que vem será o ano da saúde, pergunto por que este ano e o ano passado não o foram. Afinal, a saúde era um dos cinco dedos do símbolo mão espalmada da campanha à Presidência. Todavia, nesses dois anos, não existiram nem o dedo da saúde nem o da agricultura. Assim, não deu para caracterizar o que é a social-democracia, mas o Governo ficou marcado como um Governo neo-liberal. E não há dúvida de que é um Governo neo-liberal.

Se me perguntarem qual a grande restrição que faço a esse Governo no final do ano, direi: a Vale do Rio Doce. Custa a crer que, vivendo como vivemos, debatendo como debatemos a história do povo brasileiro, o Governo seja tão insensível, tão frio, tão enigmático, tão autoritário com relação à Vale do Rio Doce. Para ele, para seus tecnocratas, não tem Senado, não tem nada. Foi cruel o desempenho do Governo. O Governo deveria meditar com um pouco mais de profundidade.

Se V. Exªs lerem o jornal de hoje, verão uma cena cruel: o ex-Ministro da Argentina, Domingo Cavallo, chorando, numa exposição às mulheres, pedindo perdão à Argentina pelo tempo que trabalhou no Governo de Carlos Menem, porque é um governo corrupto e imoral. Domingo Cavallo foi o grande sustentáculo do primeiro Governo Menem e o grande cabo eleitoral de sua reeleição. O ex-Ministro funcionou para a reeleição de Carlos Menem como Itamar Franco funcionou para a eleição de Fernando Henrique Cardoso. Ou seja, o Presidente Itamar Franco, responsável pelo Plano Real, afiançava a eleição do Sr. Fernando Henrique Cardoso para presidente; o Sr. Domingo Cavallo, Ministro da Fazenda, afiançava a reeleição do Sr. Carlos Menem. Pois esse homem está nos jornais, chorando, pedindo desculpas à nação argentina por ter servido a um Governo corrupto. Observem com a vida dá voltas.

Quero dizer ao meu amigo Fernando Henrique Cardoso que a vida sobe e desce. Sua Excelência já conheceu os momentos de descida quando esteve no Chile; conheceu os momentos de descida quando não lhe era permitido lecionar; conheceu os momentos de descida quando a única tribuna que tinha era a do MDB do Rio Grande do Sul, porque fora aquela não tinha nenhuma. Agora ele está no apogeu, no auge, no endeusamento. Mas haverá um momento de análise do que estamos vivendo.

Atualmente estamos discutindo figuras como Jango e Getúlio Vargas. Estamos verificando que nos anos de 1954 e 1964 ocorreram dois golpes que nada tinham a ver com a moral, com a dignidade, com a honra e com a decência, porque não havia corrupção.

O Sr. Fernando Henrique tem que entender que esse patrimônio, bem ou mal, certo ou errado, ele e o pai dele foram os que mais ajudaram a construir. Mas isso que está aí, Petrobrás, Vale do Rio Doce, açominas, energia, telefonia e tudo o mais, isso tudo foi feito ao longo de mais de 60 anos e, bem ou mal, isso é economia do povo brasileiro, isso é patrimônio do povo brasileiro.

Privatizar, terminar, tudo bem, mas tem que ser discutido. Um dia isso vai ser discutido, vai ser analisado sob dois ângulos: primeiro, o de privatizar, porque muita coisa tem que ser privatizada; segundo, o de como privatizar. Uma coisa é privatizar; outra coisa é doar. E, em se tratando da Vale, nem privatizar, porque privatizar a Vale num todo é abrir mão de parte da soberania brasileira, porque é o nosso subsolo que passa a ter outro dono. E se privatizasse a Vale e desse certo, uma empresa japonesa comprasse, pegasse US$100 bilhões ou US$150 bilhões e fosse aplicar em tudo o que existe de possibilidade de exploração, do subsolo - o que o Governo brasileiro não faz, porque não tem dinheiro - os japoneses criariam uma nação dentro de uma Nação. Aconteceria uma guerra civil, uma convulsão, porque haveria muita gente, muito navio, uma mobilização fantástica de uma empresa estrangeira dentro do Brasil.

A Nação reconhece que o Presidente da República é muito inteligente, e seus amigos reconhecem que ele é vaidoso. Aqueles que acreditam que ele pode se perder pela vaidade estão enganados. O Presidente Fernando Henrique é muito mais inteligente que vaidoso. Eu o acho muito inteligente e muito vaidoso. Se formos analisar o Governo de Fernando Henrique hoje, não o veremos como um social-democrata, mas sim como o Governo liberal das privatizações - nesse aspecto, a continuação do Governo Collor, até com mais impulso, com mais disposição. Na época de Collor, não ouvi falar em privatização da Petrobrás nem da Vale do Rio Doce.

O Presidente da República cometeu um equívoco, e eu disse isso pessoalmente a Sua Excelência. Só após os três primeiros anos de governo, ele deveria discutir o assunto da reeleição, para não se curvar, como terá de se curvar, aos interesses mais variados, no momento de defender essa tese. Sua Excelência deveria ter deixado esta questão para daqui a onze meses, para outubro do ano que vem, quando já tivesse feito as suas grandes obras.

Ao invés disso, faz seis meses que só se fala em reeleição. Fala-se em eleição para presidente da Câmara, para presidente do Senado, mas fala-se também na reeleição. Fala-se na rolagem da dívida dos Estados, mas fala-se também na reeleição. Qualquer assunto discutido tem em vista a reeleição, e isso diminuiu a capacidade de avanço e de recuo do Presidente da República. Mas o equívoco já foi cometido, e não há como retroceder.

O Presidente da República tinha que medir muito a questão da reeleição. O País já fez uma grande injustiça com o Presidente José Sarney. A imprensa passou para o povo que o Presidente Sarney, com o é dando que se recebe, com concessões de televisões, rádios e não sei mais o quê, ganhou mais um ano. Seu mandato era para ser de quatro anos, e ele ganhou um ano, comprou um ano. É uma mentira, uma cruel mentira. Porque, na realidade, o Presidente Sarney tinha seis anos e abriu mão de um ano. Na Constituinte, Mário Covas e companhia queriam que ele abrisse mão de dois anos, ficando com quatro. Nunca o Presidente Sarney brigou por mais um ano. Brigou, isso sim, para não abrir mão de dois anos, no que ele estava certo. Nunca me entenderam na época, quando eu era Governador do Rio Grande do Sul, pois, para mim, ele deveria lutar para ficar os seis anos. Que sejam seis anos e se implante o parlamentarismo, eu dizia. Naquela época, eu já defendia um mandato de seis anos, com direito à reeleição, mas com parlamentarismo. O Presidente Sarney aceitou cinco anos com parlamentarismo, mas Mário Covas não. O Dr. Ulysses serviu de intermediário entre o Presidente Sarney e a Constituinte: cinco anos com parlamentarismo. Entretanto, os heróis da Constituinte disseram não; quiseram um mandato de quatro anos sem parlamentarismo.

Na eleição seguinte para presidente da República, devido ao desgaste que sofreu, José Sarney não pôde dizer para quem votou no primeiro turno nem no segundo turno, porque ninguém queria o seu apoio. O desgaste foi tamanho que ele nunca disse se votou no Collor ou se votou no Lula no segundo turno, nunca disse se votou no Covas, no Dr. Ulysses ou no Aureliano Chaves, tal era o seu desgaste. Essa foi a injustiça que fizeram com o Sarney.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso não pode incorrer no mesmo desgaste do Presidente Sarney. Ele pode até conseguir a reeleição, o que não quer dizer que venha a ser reeleito. Sua Excelência tem que sair desse processo com a dignidade que o caracteriza. Fernando Henrique é um homem de bem, é um homem sério, é um homem digno. Atesto, porque conheço sua vida. Posso ter divergido de Sua Excelência em alguns momentos, como no caso do Proer, que reputo um erro brutal. Mas o Presidente da República não agiu de má-fé em relação ao Proer; ele foi levado a isso pela área econômica. Se Sua Excelência tivesse aplicado o dinheiro do Proer na agricultura, seria um herói hoje. Foi a incompetência do pessoal que o auxilia, que vive em roda dele, mas não um erro de Sua Excelência.

O Governo do Fernando Henrique é um governo sem oposição - isso podemos verificar. Lula, Brizola, Ciro Gomes - companheiro de Partido, mas adversário nas idéias -, PT, CUT, não lhe fazem oposição.

Oposição fez Carlos Lacerda a Jango e ao Dr. Getúlio. Oposição fez a UDN a Juscelino Kubitscheck, que, apesar do governo espetacular que fez, não teve nem candidato, foi obrigado a aceitar o Lott, que teve meia dúzia de votos.

É bem verdade que o Congresso Nacional hoje não tem grande significado. Depois da revolução, foi caindo, foi esvaziando, e agora é o Presidente, são as medidas provisórias. Somos mais uma ficção do que um Poder. Vale mais uma capa da Veja, vale mais uma notícia do Jornal Nacional, do que ficarmos aqui debatendo uma semana inteira - aliás, o que menos sai na imprensa é o que acontece aqui.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, é muito importante preservar a figura do Presidente da República. Sua Excelência cometeu um erro ao trazer a debate a reeleição e assumir o seu comando. Não precisava.

Dizem os jornais - eu não acredito - que Sua Excelência terá candidato à Presidência da Câmara e do Senado. Se fosse um candidato do PFL, do PT, do PMDB, do PDT, tudo bem, pois o Presidente tem que apoiar um candidato de sua base. Entretanto, se há um debate interno, não me parece que o Presidente da República tenha alguma coisa a ver com isso.

Em primeiro lugar, os Parlamentares têm de fazer um esforço enorme para dizer que o Presidente está fora disso. Se não fizerem assim, o Presidente da República tem a obrigação de dizer que estão criando um problema para ele, que não pode governar sem o apoio dos Senadores do PFL, do PMDB, do PSDB ou do PPB. Essa é a questão.

No entanto, a imprensa vem publicando, no que não acredito, que o Presidente estaria tomando posição em torno de uma eleição. Sua Excelência faria muito mal, porque a eleição é aqui nas duas Casas e, portanto, é um problema desta e da outra Casa.

Eu, por exemplo, não vou votar contra ou a favor do Governo, seja quem for que ganhe a Presidência do Senado. Eu não perdoaria se o Presidente da República mandasse votar no candidato do PMDB, porque acho errado; mas também não aceitaria que me mandasse votar em outro candidato, porque também acho errado. Essa não é missão de Sua Excelência.

São essas as questões que temos de analisar neste final de sessão legislativa. Creio que, com toda sinceridade, fizemos nossa parte.

Não posso me classificar como otimista. Sou um homem de fé, de crença, pois luto pelo que acredito. Assim, creio que cada um deve fazer a sua parte. Parece-me que estamos muito longe de fazer o que poderíamos. O povo brasileiro é muito melhor do que sua elite. A elite política, intelectual, religiosa e empresarial está muito aquém do povo, que tem condição, sentimento e disposição para vencer, só lhe falta a chance necessária. Se depender da sua elite, demorará muito.

O SR. PEDRO SIMON - Na época do milagre brasileiro, a tese era de que o Brasil crescia mais do que o Japão. O problema era fazer o bolo da riqueza. Depois disso, iríamos distribuir entre os párias, para que eles viessem participar da sociedade brasileira. Mas nós vimos onde foi parar o bolo, Sr. Presidente. A crise e a miséria aumentaram a níveis de impressionar.

De certa forma, no Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso estamos vivendo isso. A meta é privatizar, subir para padrões de Primeiro Mundo, crescer e, depois, olhar para o social. Olhar para o social era olhar para a saúde, para a agricultura, para um plano de alimentação popular, para um plano de construção popular.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Pedro Simon?

O SR. PRESIDENTE (Henrique Loyola) - Eu gostaria de dizer ao nobre Senador Pedro Simon que já estamos concedendo a V. Exª o dobro do tempo - 20 minutos excedentes - e há outros oradores inscritos.

O SR. PEDRO SIMON - Peço desculpas ao Senador Eduardo Suplicy, mas o amigo terá a oportunidade de se inscrever.

Encerro, Sr. Presidente, dizendo, de modo especial a V. Exª, que foi uma honra e uma alegria muito grande conviver com V. Exª, pela sua dignidade, seu caráter, sua seriedade.

Que a todos nós - e de modo especial a V. Exª - o destino reserve um Natal de paz e um Ano Novo de reconstrução.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/12/1996 - Página 21114