Discurso no Senado Federal

INTERPELAÇÃO AO MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, SR. NELSON JOBIM.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA MINERAL.:
  • INTERPELAÇÃO AO MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, SR. NELSON JOBIM.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/1996 - Página 20303
Assunto
Outros > POLITICA MINERAL.
Indexação
  • INTERPELAÇÃO, NELSON JOBIM, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), LEGALIDADE, ATUAÇÃO, FORÇAS ARMADAS, RETIRADA, GARIMPEIRO, DESOBSTRUÇÃO, AREA, GARIMPAGEM, MUNICIPIO, CURIONOPOLIS (PA), ESTADO DO PARA (PA).

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, meu caro Ministro Nelson Jobim, em primeiro lugar, gostaríamos de desmistificar um pouco essa questão.

O Ministro das Minas e Energia, ao enviar uma mensagem para o Congresso Nacional, explicando as questões de Serra Pelada, qualificou políticos que defendem os garimpeiros de politiqueiros e oportunistas. Isto está no documento enviado a esta Casa.

Quero esclarecer, em primeiro lugar, Ministro Nelson Jobim, que a questão do garimpo é muito mais de justiça do que de votos.

Eu, por exemplo, sou um Senador da República eleito com mais de meio milhão de votos no meu Estado, fui o cidadão mais votado, entre todos os candidatos, na minha capital e, evidentemente, não vivo atrás de voto de garimpeiro, até porque a maioria dos garimpeiros de Serra Pelada pertence ao Estado do nosso querido Presidente José Sarney. Eles não são, portanto, eleitores do Estado do Pará.

Ministro Nelson Jobim, tenho uma admiração enorme por V. Exª, fui seu colega durante os trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte, sei da sua capacidade. O que se coloca aqui - e lamento isso - é que V. Exª, pelas circunstâncias, está num lugar que o obrigou a fazer o que fez.

Recebi os documentos, creio eu juntados pela Companhia Vale do Rio Doce, e queria mostrar algumas coisas a V. Exª. O primeiro item do documento enviado se refere ao Decreto nº 74.509, que concedeu à AMSA Mineração, em 1974, o direito de fazer pesquisa sobre minério de ferro.

A primeira pergunta que faço a V. Exª é se, em algum momento, em algum instante, o Governo procurou estudar a fundo o assunto para ver de quem era a razão? Em algum momento o Governo teve a sensibilidade de procurar verificar com quem estava a razão na questão da posse de Serra Pelada?

E aí afirmo a V. Exª: no mesmo dia, Ministro Nelson Jobim, que o Decreto nº 74.509 outorgou à AMSA Mineração a concessão para lavra, saíram três outros decretos. Estão no documento que V. Exª enviou a esta Casa: os Decretos nºs 74.507, 74.508 e 74.510, todos eles absolutamente irregulares, porque com áreas acima de 10 mil hectares e o Código de Mineração é taxativo nessa questão, estabelece que não pode haver decreto de pesquisa em área superior a 10 mil hectares. Mas aqui tudo é possível!

Logo abaixo está dito:

      "Comunicação, em 13 de maio de 1980, da AMSA Mineração S/A ao DNPM sobre a ocorrência de ouro."

Dia 13 de maio de 1980. V. Exª sabe muito bem que o ouro de Serra Pelada foi descoberto em meados de 1979. E aí pergunto a V. Exª: em algum momento o Governo Federal se preocupou em saber se, durante os sete anos em que a AMSA Mineração teve esse decreto de pesquisa nas mãos, ela fez alguma pesquisa?

Ministro Nelson Jobim, ela não fez nenhuma pesquisa! Portanto, o seu Decreto de Lavra, pelo próprio Código de Mineração, já deveria ter caducado.

Em terceiro lugar, Ministro Nelson Jobim, vem a questão da pesquisa. Está no documento enviado pelo Governo:

      "Os trabalhos de pesquisa de ouro, na área do Decreto de Lavra nº 74.509, de 5 de setembro de 1974, foram executados em duas etapas e chegaram aos seguintes resultados."

E aí está escrito: Etapa 1980/1982.

Quer dizer, depois do Decreto, de 1974 a 1979, quando se descobriu o ouro, a AMSA Mineração não fez nenhuma pesquisa na área. Absolutamente nenhuma.

E o que se questiona, Ministro Nelson Jobim, é a demarcação. Veja V. Exª que, coincidentemente, dos quatro decretos que a AMSA Mineração recebeu, no mesmo dia, a Vale do Rio Doce pegou justamente aquele Decreto de Lavra, o único que poderia ser legal, porque estava dentro do limite de 10 mil hectares, e o plotou sobre Serra Pelada.

Fomos questionar a demarcação dessa área de 10 mil hectares, porque queríamos ter certeza de que Serra Pelada estaria incluída dentro da área de 10 mil hectares. Sempre quisemos saber sobre isso.

Tenho aqui o documento enviado por V. Exª - é o Documento nº 11 -, que fala sobre a implantação do Decreto nº 74.509. No item II, ele confirma o que os garimpeiros sempre disseram: constatou-se que o marco SL1 estava destruído.

E a história que se tem, que se sabe, é que a Vale do Rio Doce deslocou esse marco justamente para fazer com que o Decreto de Lavra nº 74.509 incluísse Serra Pelada nele. Esse documento que fez a pesquisa, a verificação etc., chegou à conclusão de que estava dentro. E este documento é assinado - veja bem - pelo coordenador de Serra Pelada, pela Companhia Vale do Rio Doce, pelo representante da Docegeo, pelo representante do DNPM e pela empreiteira contratada para fazer isso.

Sr. Presidente, lamento profundamente que tenha tão pouco tempo para questionar o Ministro. Vou, então, só fazer as perguntas.

Ministro Nelson Jobim, o Senado e a Câmara criaram cada qual uma comissão para discutir o problema, e chegamos a uma conclusão a respeito do mesmo.

Estivemos com o Presidente José Sarney e solicitamos a S. Exª que conseguisse com o Presidente Fernando Henrique Cardoso uma audiência para que as duas Comissões, da Câmara e do Senado, fossem a Sua Excelência, Presidente da República, entregar uma proposta.

O Presidente não nos recebeu. Mandou que o seu Secretário, Sr. Eduardo Jorge, o fizesse. O resumo da nossa proposta pedia que as Forças Armadas brasileiras fossem colocadas como mediadoras dessa questão. Pedia que as Forças Armadas brasileiras usassem o seu Departamento de Cartografia para fazer a constatação de que a área de Serra Pelada estaria dentro da área do Decreto de Lavra nº 74.509.

Ministro Nelson Jobim, não houve resposta. Esse documento foi entregue em julho de 1996 ao Sr. Eduardo Jorge, quando levamos mais de três horas conversando a respeito. Não houve resposta à comissão de Senadores nem à comissão de Deputados Federais. O Exército, que queríamos fosse fazer a demarcação para comprovar a posse da área, ao invés disso, foi ao Pará para garantir a violência da Companhia Vale do Rio Doce.

Finalmente, pergunto a V. Exª, que é um jurista, é um homem que entende de leis mais do que qualquer um de nós - talvez, melhor do que V. Exª, nesta Casa, somente o Senador Josaphat Marinho - e quero que V. Exª me responda de maneira clara, cristalina: a operação foi legal, Ministro? Podem as Forças Armadas brasileiras atuar numa questão como essa, dentro do Estado do Pará, respeitando a Constituição, sem que a intervenção tenha sido solicitada, seja pelo Poder Judiciário, seja por outro Poder competente, para fazer isso? Foi legal a operação?

Infelizmente, vou encerrar essa primeira fase aqui, porque não quero abusar da paciência do Presidente José Sarney.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/1996 - Página 20303