Discurso no Senado Federal

DIMINUIÇÃO DO CRESCIMENTO ECONOMICO, O AUMENTO DO DESEMPREGO, E A PERSISTENCIA DA CONCENTRAÇÃO DE RENDA NO PAIS, MOSTRADO PELO INDICE GINI. CONSIDERAÇÕES SOBRE O NOVO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL-ITR.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA. TRIBUTOS.:
  • DIMINUIÇÃO DO CRESCIMENTO ECONOMICO, O AUMENTO DO DESEMPREGO, E A PERSISTENCIA DA CONCENTRAÇÃO DE RENDA NO PAIS, MOSTRADO PELO INDICE GINI. CONSIDERAÇÕES SOBRE O NOVO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL-ITR.
Publicação
Publicação no DSF de 21/12/1996 - Página 21187
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA. TRIBUTOS.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, ECONOMIA, PAIS, REDUÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, AUMENTO, DESEMPREGO, EFEITO, POLITICA, ESTABILIZAÇÃO, MOEDA, PREJUIZO, EFICACIA, POLITICA SOCIAL, FAVORECIMENTO, BANCOS, DEMORA, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA, RESULTADO, CONFLITO, ZONA RURAL.
  • ANALISE, PROPOSIÇÃO, OBJETIVO, GARANTIA, COMPROVAÇÃO, DIMENSÃO, TERRAS, SUJEIÇÃO, EFEITO, TRIBUTAÇÃO, IMPOSTO TERRITORIAL RURAL, MELHORIA, ARRECADAÇÃO.
  • DEFESA, IMPLANTAÇÃO, PAIS, PROGRAMA, GARANTIA, RENDA MINIMA, POPULAÇÃO CARENTE, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em 15 de dezembro de 1994, ao se despedir do Senado Federal, o Presidente Fernando Henrique Cardoso asseverou que o imperativo ético de incorporar ao processo de desenvolvimento, os milhões de excluídos pela miséria seria uma das principais tarefas de seu Governo. Passados dois anos, constatamos que o Governo avançou apenas modestamente nesta direção.

Conter a inflação que, em julho de 1994, atingia a taxa de 47% ao mês para menos de 0,4% em novembro de 1996, registrando uma taxa acumulada, nos últimos 12 meses, de 8,7%, segundo o Índice Geral de Preços da Fundação Getúlio Vargas; disponibilidade interna, a 10,5%, segundo o INPC ou mesmo segundo o Índice Geral de Preços - 10 da Fundação Getúlio Vargas, que fecha 1996 com 8,79%, taxa comparável às do fim dos anos 50, efeito marcante, com forte repercussão social, uma vez que a espiral de preços constitui um dos mecanismos que mais contribui para a concentração da renda e da riqueza.

A estabilização resultou em moderada melhoria da distribuição da renda, a qual foi detectada pelo IBGE, tendo o índice Gini, em 1995, atingido 59,2%, um pouco menor do que o de 1993, de 60,3%.

Mas, cuidado! Não pode o Governo estar soltando muitos foguetes com essa evolução. Basta lembrar que esse Índice Gini, de 59,2%, é mais alto do que o obtido no último ano do governo Collor de Mello, em 1992, quando atingiu 57,5%.

Em 1995, os 10% mais ricos detinham 48,2% da renda nacional, enquanto os 40% mais pobres recebiam apenas 8,9%. Atualmente, apenas a Guatemala, com índice de 59,6% em 1989, apresenta um índice Gini pior do que o do Brasil, dentre os países com maior desigualdade socioeconômica.

O resultado social foi insatisfatório porque os instrumentos para alcançar a estabilização dos preços - a combinação de política cambial rígida com altas taxas de juros - reduziram a taxa de crescimento do PIB para apenas 4,1% em 1995, e cerca de 3% em 1996, quando, acredito, seria possível ao Brasil estar crescendo a taxas pelo menos próximas da sua capacidade potencial, o que significaria taxas de crescimento de, pelo menos, 7% ao ano. Em conseqüência, as taxas de crescimento do emprego estiveram aquém do desejável ou do que poderia ter ocorrido. Cresceram lentamente, deixando milhões de pessoas - 1,24 milhões de pessoas na grande São Paulo, onde há dados do DIEESE -, sem poder contribuir para a geração de riquezas no País, como gostariam de fazer. Tal situação tem graves conseqüências no aumento da violência, da criminalidade, sobretudo nas áreas urbanas do País.

A forte desigualdade reflete, em grande parte, a disparidade na riqueza, sobre a qual temos poucas informações confiáveis. Infelizmente, o IBGE e a Secretaria da Receita Federal ainda não cuidaram de fazer um levantamento bem-feito da distribuição da riqueza.

Gostaríamos de ressaltar: uma coisa é a distribuição da renda, ou seja, o fluxo da receita de tudo aquilo que as pessoas no País recebem, na forma de receita proveniente do capital mais a receita proveniente do trabalho - a soma dos lucros, dos aluguéis, dos dividendos, dos juros, de um lado e a soma dos salários, da remuneração do trabalho. E outra coisa é a riqueza, aquilo que cada pessoa acumula, o patrimônio de cada pessoa.

Apesar de nos últimos anos a Receita Federal ter solicitado às pessoas que atualizem o valor dos seus bens, até hoje não se tem um registro do valor desses. Há dados apenas sobre um dos aspectos do patrimônio. Refiro-me à propriedade da terra.

O Atlas Fundiário do Brasil de 1996, organizado pelo INCRA, revela que, em 1992, os 2,6% maiores proprietários detinham 56,7% da área rural no País. A demora em modificar esse quadro fez o Governo tomar dois grandes sustos: os massacres de Corumbiara e de Eldorado dos Carajás. Nesses dois anos, o Governo Fernando Henrique Cardoso se caracterizou pela agilidade com que, por meio de medidas provisórias, criou o Proer para prover recursos creditícios a taxas de juros relativamente baixas e criar renúncias fiscais, com o objetivo de resgatar instituições financeiras do naufrágio, e pela lentidão com que se moveu para enfrentar o poder dos latifúndios.

Nesta última semana, os ruralistas conseguiram assegurar que fosse apenas módico o Imposto Territorial Rural a ser cobrado sobre o valor de suas terra. O Governo sequer cuidou, no meu entender, de assegurar que os proprietários declarassem com correção aquele valor.

O Governo diz, no art. 21 da medida provisória e do projeto de lei de conversão, que tem como relator o Senador Jader Barbalho, que há ali providências no sentido de a Receita Federal, com a colaboração dos Governos Estaduais, das Secretarias de Agricultura e dos Municípios, assegurar uma certa medida do valor das áreas, comparando com o que for declarado pelos proprietários de terra.Antes, havia um valor mínimo calculado pelo Governo.

Sr. Presidente, haveria uma forma bastante criativa e interessante de assegurar-se que os proprietários, efetivamente, indicassem o valor adequado. Esta proposição, inclusive, externei ao Ministro Raul Jungmann e ao relator Jader Barbalho - sim, é verdade que o fiz no início desta semana, quando já se havia passado o tempo de propor emendas e o Senador Jader Barbalho não teve tempo de se debruçar devidamente sobre a matéria. Mas vou destacar aqui que ainda será possível, proximamente, tendo em vista a evolução da experiência e, sobretudo, se se averiguar que os valores declarados pelos proprietários rurais não estão sendo adequadamente registrados, de acordo com os seus valores reais, ao Congresso Nacional examinar essa questão.

Qual é a proposição? Ela se baseia em reflexão do economista Henry George, que tratou da taxação da terra, em proposição do primeiro Presidente da República da China, Sun Yatsen, e também foi elaborada pelo laureado Prêmio Nobel de Economia, Maurice Allais, economista francês e trazida ao debate pelo economista brasileiro Paulo Nogueira Batista Júnior. Todo proprietário de terra declararia uma vez ao ano o valor da sua propriedade. Isto seria publicado, anonimamente, num registro, num cadastro de terras em cada Município. Tornar-se-ia público e o poder público, de um lado, poderia oferecer 140% daquele valor, e qualquer pessoa física ou jurídica, de outro, poderia oferecer 150% do valor declarado. Para evitar as ofertas frívolas, deveria a pessoa física ou jurídica depositar pelo menos 50% em caução. E uma vez feita a oferta, caberia ao proprietário vender, sem desvantagem, porque estaria vendendo por pelo menos 140, 150% do valor, ou, então, ajustar o valor para aquele limite de 140 ou 150% do valor, mas aí pagaria uma multa de 5% sobre o valor novo declarado. Assim teríamos um mecanismo de estímulo aos proprietários para que declarassem corretamente o valor da terra.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta última semana os ruralistas conseguiram assegurar que fosse módico, portanto, o ITR a ser cobrado sobre o valor de suas terras. Esperamos que, mediante a experiência, possamos melhorar o ITR. O Governo Fernando Henrique Cardoso vem deixando passar a oportunidade de implantar, com maior vigor, um instrumento que, ao lado da aceleração da reforma agrária, possa realmente contribuir para compatibilizar o crescimento, a estabilização e a erradicação da miséria, assim como fez com a distribuição de cestas de alimentos e outras iniciativas - algumas delas meritórias - que, por exemplo, o Conselho do Comunidade Solidária fez em algumas regiões do País.

A implementação em todo o País de um programa de garantia de renda mínima, que mostra resultados palpáveis nas cidades que já o instituíram, seria uma forma de combinar a realização da justiça social com o investimento em capital humano.

Sr. Presidente, gostaria, nesta conclusão, de agradecer a todos os que colaboraram conosco neste ano, a todos os servidores do Senado Federal, a todos os meus colegas do Congresso Nacional. A todos os Senadores e Senadoras os votos de muito bom Natal. A todo o povo brasileiro a certeza de que esperamos poder assegurar, com o empenho de todos os que aqui têm trabalhado, com tanta seriedade, com tanta dedicação no propósito de bem representar o povo brasileiro, no próximo ano, uma qualidade de vida maior, mais justiça e muito maior respeito aos direitos da cidadania, desejando que também caminhemos para aperfeiçoar as instituições democráticas de nosso País.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/12/1996 - Página 21187