Discurso no Senado Federal

RESULTADO DO SEMINARIO SOB O TEMA 'REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS PUBLICOS NO BRASIL: SETORES ELETRICO E DE TELECOMUNICAÇÕES', REALIZADO NA COMISSÃO DE INFRA-ESTRUTURA, A PROPOSITO DA DISCUSSÃO DA PRIVATIZAÇÃO DOS REFERIDOS SETORES.

Autor
José Agripino (PFL - Partido da Frente Liberal/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • RESULTADO DO SEMINARIO SOB O TEMA 'REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS PUBLICOS NO BRASIL: SETORES ELETRICO E DE TELECOMUNICAÇÕES', REALIZADO NA COMISSÃO DE INFRA-ESTRUTURA, A PROPOSITO DA DISCUSSÃO DA PRIVATIZAÇÃO DOS REFERIDOS SETORES.
Publicação
Publicação no DSF de 11/01/1997 - Página 204
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, SEMINARIO, DEBATE, PRIVATIZAÇÃO, SETOR, ENERGIA ELETRICA, TELECOMUNICAÇÃO, PROMOÇÃO, COMISSÃO PERMANENTE, INFRAESTRUTURA.
  • REGISTRO, ANAIS DO SENADO, DEBATE, SEMINARIO, SUBSIDIOS, APRECIAÇÃO, MATERIA, PRIVATIZAÇÃO.
  • NECESSIDADE, REESTRUTURAÇÃO, SETOR, ENERGIA ELETRICA, ANTERIORIDADE, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO.
  • ANALISE, PROBLEMA, EXPANSÃO, ENERGIA HIDROELETRICA, POSTERIORIDADE, DESESTATIZAÇÃO.
  • CRITICA, POLITICA, GOVERNO, SETOR, TELECOMUNICAÇÃO, NECESSIDADE, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO.

O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL-RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no final do ano passado, a Comissão de Infra-Estrutura, que presido, por delegação de V. Exªs, promoveu, em conjunto com a Federação Nacional dos Engenheiros, um seminário para discussão do tema "Regulação dos Serviços Públicos no Brasil: Setores Elétricos e Telecomunicações", convidando especialistas da Argentina, da França e dos Estados Unidos para trazer as experiências e advertências de quem já passou pelo processo de privatização nesses setores, cometeu equívocos e acertos e veio dar a sua contribuição para que os equívocos cometidos não fossem repetidos no Brasil. Repito, a convite da Comissão de Infra-Estrutura e da Federação Nacional dos Engenheiros.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, o seminário foi realizado com o objetivo de trazer à audiência do Senado a voz da sociedade civil brasileira no setor, a voz dos engenheiros do Brasil, que aqui acorreram para, durante dois dias, discutir e debater um assunto que consulta o interesse nacional, porque é assunto preeminente na economia brasileira e que responde pela retomada do crescimento econômico nos mais diversos setores e pela geração de milhares de empregos no País.

Ao seminário compareceram, além de autoridades federais convidadas, ministros de Estado, dirigentes de estatais dos setores elétricos e de telecomunicações, dos dirigentes da Federação Nacional dos Engenheiros, dos convidados especialistas estrangeiros da Argentina, da França e dos Estados Unidos, Parlamentares Federais, Deputados e Senadores, que não foram muitos, e essa é a razão pela qual ocupo a tribuna neste dia para aqui fazer um relato, que desejo fique registrado nos Anais do Senado, para que as opiniões e os debates realizados possam significar ponto de referência, de informação e de argumento para os debates que nesta Casa vão se processar sobre a privatização do setor elétrico e do setor de telecomunicações. Entendo eu que a voz da sociedade civil tem que ser considerada, para que um bom juízo de valores seja formulado por esta Casa.

Por essa razão é que tomo a liberdade de trazer ao conhecimento da Casa, para registro, repito, nos Anais do Senado, o relato das discussões e debates, ponto a ponto, durante os dois dias em que ocorreu o seminário.

O seminário sobre "Regulação dos Serviços Públicos no Brasil" teve como temas principais a reestruturação do setor elétrico brasileiro e o Projeto de Lei nº 50/96, que dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Energia Elétrica - Aneel.

O evento contou com a presença de Senadores e Deputados, especialistas estrangeiros dos Estados Unidos, da França e da Argentina, profissionais da área e interessados em geral, com a participação de aproximadamente 150 pessoas.

O setor elétrico foi abordado em três painéis. O primeiro painel foi "A Experiência Internacional na Área de Regulação de Serviços Públicos"; o segundo painel, "A Regulação dos Serviços de Eletricidade no Brasil, a Lei Aneel"; e o terceiro painel, "Diretrizes para o Novo Modelo do Setor Elétrico Brasileiro".

Dentre as principais questões abordadas, uma das grandes preocupações do seminário foi a necessidade de compatibilizar o projeto de lei com a política global para o setor. Nesse sentido, foi destacado o projeto que está sendo conduzido pelo Ministério de Minas e Energia para a definição de um novo modelo institucional para a energia elétrica. A conclusão desses trabalhos no Ministério determinará, em conseqüência, o envio ao Congresso de um projeto de lei global para o setor.

Essa ação determinará a necessidade de revogar a Lei da Aneel, se aprovada como está neste momento, ou de submetê-la a mudanças profundas.

A postura mais prudente hoje, no entender da maioria dos participantes, seria aprofundar o debate e desenvolver um esforço para aprovar um novo marco regulatório, mais completo e abrangente. Dificuldades específicas relacionadas com o atual órgão regulador, o DNAEE, poderiam ser contempladas em lei específica.

Existem hoje vários pontos em debate no âmbito da reestruturação do setor elétrico no Ministério de Minas e Energia, que colidem com disposições contidas no projeto de lei da Aneel. Foram citadas, dentre outras questões, a responsabilidade pelas licitações de novos aproveitamentos, a responsabilidade pelo atendimento do mercado, a forma e a extensão da descentralização da regulação e da fiscalização, as questões comerciais, econômicas e financeiras. Entre estas últimas está o financiamento de novas hidrelétricas e a política tarifária a ser adotada.

Foi destacada ainda a necessidade de aprimorar outras disposições já contidas no atual projeto, como a definição completa para o cálculo da taxa de fiscalização, a conveniência do uso de contratos de gestão para fiscalizar a gestão da administração da Aneel e os mecanismos de transição, em particular a disposição de remeter para fora do órgão as decisões relacionadas com tarifas por um período de três anos.

O Secretário de Energia do Ministério manifestou sua concordância em relação às disfunções apontadas, mas manifestou-se favorável à aprovação do projeto de lei sem alterações. A isso acrescentou que reconhecia a necessidade de outras leis para implantar um novo modelo, assim como a necessidade de modificar ou ajustar as disposições nesta lei, se assim aprovada.

A Federação Nacional dos Engenheiros entende que um posicionamento desse tipo só contribuiu para aumentar as desconfianças dos novos investidores, em face da instabilidade institucional assim configurada. Essa situação conduz ao aumento da taxa de risco, o que repercute sob a forma de maiores tarifas.

Segundo palavras do Secretário de Energia, um dos grandes objetivos a curto e médio prazos é justamente reduzir essas taxas de risco embutidas nas taxas de retorno desejadas pelos investidores. O Secretário afirmou ainda que o aumento de 1% na taxa de risco representa 6% na tarifa final.

A exposição da Federação Nacional dos Engenheiros, corroborada por outras intervenções de palestrantes e participantes, mostrou que a discussão de temas dessa complexidade exige um tempo considerável para apreciação e implementação de novas leis. Como exemplo, foram mencionadas as sucessivas reformas implementadas nos Estados Unidos para reestruturar o setor elétrico desse País, iniciadas em 1978 e ainda hoje em evolução. Foi citada, como exemplo, a implementação recente de novas regras para viabilizar a competitividade do sistema elétrico no Estado da Califórnia, uma região em que 75% dos negócios já são da iniciativa privada.

Essa nova lei dispondo tão-somente sobre questões estruturais, não abordando, portanto, a questão da propriedade, foi discutida e debatida por quase quatro anos antes de sua aprovação final.

A cautela dos Estados Unidos também ficou expressa na declaração do palestrante americano, quando afirmou que seu país também acompanha com atenção a reestruturação argentina para avaliar os resultados que estão sendo obtidos.

Ficou claro também que a etapa de privatizar, se for o caso, é a última fase de um processo que se inicia no estabelecimento de um arcabouço legal, a instituição do novo modelo institucional, passando por uma fase de regulamentação, o disciplinamento das leis normativas, e a implantação da nova estrutura.

Foi enfatizado que a preocupação primeira deve ser a de garantir novos capitais para a expansão do sistema. Essa preocupação está sendo abandonada pela postura mais pragmática e imediatista de vender ativos já em serviço e já depreciados, para obter alguns recursos para diminuir as dívidas públicas. Essa ação acaba desviando recursos que poderiam ser canalizados para as novas obras. Essa foi uma opinião apresentada pela Federação Nacional dos Engenheiros, apresentada, debatida, defendida.

Mas outras questões importantes, Sr. Presidente e Srs. Senadores, foram também abordadas, como a desverticalização do sistema. O sucesso de um modelo competitivo, da forma que se quer implantar no Brasil, depende da desverticalização das empresas, isto é, que as empresas se dividam em empresas de geração, transmissão e distribuição e que haja competição entre as geradoras.

Na Argentina, a lei obrigou que as centrais elétricas fossem vendidas a diferentes compradores, o mesmo ocorrendo com as concessões de distribuição. Além disso, foi proibido que o proprietário de uma usina detenha também uma concessão de distribuição ou transmissão.

O palestrante francês informou que uma diretiva da União Européia, recentemente aprovada, implanta uma sistemática de desverticalização semelhante à da Argentina, a qual, se aceita pelo governo francês, levaria à desverticalização da EBF e de todas as empresas da União Européia, tornando a região um grande mercado competitivo.

O palestrante manifestou-se contrário a tal posição, uma vez que a França fez pesados investimentos não só na oferta de energia, mas também em pesquisa e desenvolvimento tecnológicos para a solução do seu problema energético.

Segundo o seu entendimento, a adoção da mencionada diretiva poderia acabar interferindo nos benefícios decorrentes desses esforços para outros países, além de enfraquecer a posição competitiva da empresa no mercado europeu.

No Brasil, o consórcio de construtoras, contratadas pelo NML, lideradas pela Coorpers and Laybrem, recomenda a mesma sistemática.

O impasse aqui surgido é a oposição dos Estados do Paraná e de Minas Gerais em desverticalizar as suas empresas. Esses dois Estados, ao longo de sua história, investiram pesadamente em geração hidrelétrica, são auto-suficientes em energia barata. Para eles é difícil admitir que, após todos esses investimentos, não possam abastecer, prioritariamente, os seus Estados com essa energia.

A maioria de outros Estados que possuem geração, bem como o Governo Federal, já anunciaram a política de privatização das usinas. Os novos proprietários poderão colocar energia em qualquer mercado, em qualquer Estado. Se Paraná e Minas Gerais continuarem com as suas empresas verticalizadas e sem mudanças de propriedades, poderão oferecer aos seus próprios Estados energia bem mais barata, e as suas usinas já estão pagas e só têm custo de manutenção e operação.

As usinas vendidas para proprietários privados poderão praticar tarifas de mercado resultantes de valores maiores do que as do Paraná e Minas Gerais. Esse fato, aliado ao poder econômico das empresas verticalizadas - Copel, do Paraná, e Cemig, de Minas Gerais -, faz com que haja uma visível pressão para as suas desverticalizações e uma resistência dessas empresas e desses Estados.

A Federação Nacional dos Engenheiros não tem por que se opor à permanência de empresas nacionais fortes que possam competir tanto no mercado interno como no mercado externo. A pulverização sugerida enfraquecerá empresas fortes que não manifestaram problemas que exigissem a venda de seus ativos, deixando o mercado nacional somente à mercê de investidores externos.

O Chile privatizou internamente seu setor e compete no mercado externo de forma vigorosa. Por que impedir isso às empresas nacionais - questiona a Federação Nacional dos Engenheiros? É necessário encontrar uma forma de conciliar esses interesses - é a opinião da FNE.

Abordando agora a questão da expansão do sistema. No cenário de privatização, muda radicalmente a forma de expansão da geração. O setor privado busca tipos de usina que exijam menores investimentos, menor tempo de construção e, conseqüentemente, um retorno mais rápido aos seus investimentos.

O palestrante francês observou que essa foi uma das constatações de recente seminário mundial de energia, realizado no Japão.

O conferencista argentino relatou que a expansão em seu país, após a privatização, só se deu através de usinas a gás e que a forma para incentivar a expansão hidrelétrica ainda não foi encontrada.

No Brasil, há uma tendência de uma expansão acelerada com termelétricas a gás, segundo foi admitido pelo representante da Eletrobrás. O que preocupa é que essas fontes se esgotam a curto prazo.

O Brasil ainda conta com o fabuloso potencial hidrelétrico que exige maiores investimentos, maior tempo de construção e maior prazo para o retorno dos investimentos. Isso não tem atraído o capital privado, a não ser em algumas exceções, onde grandes indústrias, em parceria com empresas estatais, estão construindo algumas usinas. Nesse caso, porém, visando a atender somente o seu próprio consumo e a maioria dos outros Estados que possuem geração, bem como o Governo Federal.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, faço agora algumas apreciações sobre o setor de telecomunicações. É de consenso geral que o órgão regulador terá que estabelecer e executar a política de telecomunicações, outorgar concessões, normatizar e supervisionar as atividades do setor, estabelecer padrões e administrar o espectro eletromagnético, tendo como principais características a autoridade, a imparcialidade e a independência.

O Ministério das Comunicações, Minicom, reconhece que o assunto é complexo e informa que uma série de pendências estão atrasando o envio da Lei Geral de Telecomunicações ao Congresso Nacional. Porém, deixa bem claro que já tem alguns pontos definidos, quais sejam: a criação do órgão regulador, sob a forma de autarquia subordinada ao Minicom; a prestação de contas diretamente ao Poder Executivo; a auditoria feita pelo TCU; e, finalmente, o órgão será centralizado em Brasília, não havendo representação nos Estados.

A Lei nº 9.295, de 19 de julho de 1996, prevê que o Minicom agirá temporariamente como órgão regulador do setor até que uma Lei Geral de Telecomunicações seja aprovada pelo Congresso Nacional, sendo responsável pela administração dos recursos arrecadados sem repassá-los ao Tesouro Nacional. E ainda autoriza a Telebrás a criar subsidiárias para assumir a exploração do serviço celular, já em operação, no prazo de dois anos, quando o sistema poderá ser privatizado.

Nos debates, pudemos concluir que o Poder Executivo, através da promulgação da Lei nº 9.295, está tomando decisões importantes e estratégicas para o País, fragmentando os serviços públicos de telecomunicações sem definir uma política global para o desenvolvimento do setor.

Essa é a opinião, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, da Federação Nacional dos Engenheiros.

Enquanto no mundo as empresas estão se agrupando, fortalecendo-se e internacionalizando os seus serviços para enfrentar a concorrência, que é cada vez maior, o Brasil está fracionando o seu sistema público de telecomunicações.

Outra preocupação é a criação do órgão regulador sob a forma de autarquia, que, já sabemos, não funciona - pensa assim a FNE. Vide outras autarquias existentes no Brasil, além da grande ingerência política que sofrerá, contrariando o espírito de um órgão regulador livre e independente.

Note-se, ainda, que a autarquia que será criada é centralizadora, a legião dos Estados da Federação na possibilidade de implementação de uma política específica e com características regionais, fato esse prejudicial ao espírito de um órgão regulador democrático.

À vista dos fatos, temos assistido a um atropelo daquilo que foi aprovado na reforma constitucional. A aprovação de uma lei mínima, abrindo os serviços mais lucrativos, como a telefonia celular, a comunicação de dados, bem como a permissão dada à iniciativa privada para o lançamento de satélites, passando amplos poderes para o Minicom, sem que haja implantação de um órgão regulador independente, como determina a Constituição, cria uma situação predefinida que, se comprovada prejudicial aos interesses nacionais, será irreversível, pois as concessões já terão sido formalizadas.

É imprescindível haver regras claras para implantar um novo modelo para o setor de telecomunicações, para que possamos planejar a expansão do sistema, definindo como o mercado será atendido, dando condições para o Brasil inserir-se na globalização cada vez mais presente. Portanto, concluímos que se faz mister a aprovação da Lei Geral de Telecomunicações antes da formalização das concessões, para resguardar os princípios constitucionais contidos no art. 21 da Lei Maior.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, faço esse relato, porque entendo que a voz da sociedade civil que aqui se manifestou muitas vezes contrária à opinião de autoridades do Poder Executivo é importante ser ouvida, refletida pelos seus Parlamentares, Deputados e principalmente Senadores que votarão e aprovarão a privatização de setores importantes como o setor elétrico e de telecomunicações.

Foi esse o relato do seminário organizado pela Comissão de Infra-Estrutura e pela Federação Nacional dos Engenheiros. Cumpriu-se uma etapa importante na discussão de temas ligados a setores fundamentais à economia do País: setor elétrico, setor das telecomunicações. Discutiu-se à exaustão, ouvindo-se quem precisava ser ouvido: os engenheiros, autoridades federais, executivos do Poder Executivo e Parlamentares - Deputados e Senadores.

Registro o esforço realizado pela Federação Nacional dos Engenheiros, que durante dois meses preparou, juntamente com a Comissão de Infra-Estrutura, a agenda que produziu o seminário cujo registro faço nesta manhã.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/01/1997 - Página 204