Discurso no Senado Federal

CONFLITO ENVOLVENDO SEM-TERRA NA OCUPAÇÃO DA FAZENDA SANTA CLARA, EM OURILANDIA DO NORTE-PA. COBRANDO DO GOVERNO FEDERAL O CUMPRIMENTO DA PROMESSA DE AMPLA REFORMA AGRARIA, FEITA DURANTE A CAMPANHA ELEITORAL DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • CONFLITO ENVOLVENDO SEM-TERRA NA OCUPAÇÃO DA FAZENDA SANTA CLARA, EM OURILANDIA DO NORTE-PA. COBRANDO DO GOVERNO FEDERAL O CUMPRIMENTO DA PROMESSA DE AMPLA REFORMA AGRARIA, FEITA DURANTE A CAMPANHA ELEITORAL DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Eduardo Suplicy, Leomar Quintanilha, Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 16/01/1997 - Página 2331
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • REGISTRO, ANAIS DO SENADO, OFICIO, ORADOR, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), CONFEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA (CONTAG), REPUDIO, MORTE, VIOLENCIA, SEM-TERRA, MUNICIPIO, OURILANDIA DO NORTE (PA), ESTADO DO PARA (PA), REIVINDICAÇÃO, APURAÇÃO, RESPONSABILIDADE.
  • BALANÇO, MORTE, TRABALHADOR, CAMPO, ESTADO DO PARA (PA).
  • CRITICA, OMISSÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFORMA AGRARIA, INFERIORIDADE, RECURSOS, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF).
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, MANUTENÇÃO, TERRAS, ESTADO DO PARA (PA), PECUARIA, MOTIVO, INVASÃO, SEM-TERRA, INICIATIVA, PROPRIETARIO, NEGOCIAÇÃO, GOVERNO.
  • CRITICA, GOVERNO, ATUAÇÃO, POSTERIORIDADE, CONFLITO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais uma vez, o Estado do Pará é palco de um conflito que gerou a morte de sem-terra. Mais uma vez, o Estado do Pará é manchete da primeira página dos jornais de todo o Brasil com títulos como este: "Sem-terra assassinados no Pará". Trago aqui uma nota da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, que quero deixar registrada nos Anais do Senado:

      "A direção do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Tucumã confirmou, hoje pela manhã, que chega a 13 o número de mortos no conflito ocorrido na última segunda-feira na fazenda Santa Clara, município de Ourilândia, sul do Pará. Há mais dez pessoas desaparecidas, o que eleva para 23 o número de vítimas. A ocupação da área estava sendo acompanhada pelo Sindicato de Trabalhadores Rurais de Ourilândia do Norte. Cerca de 100 trabalhadores ingressaram na fazenda em dezembro último.

      Hoje pela manhã, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) pediu audiência ao ministro da Justiça, Nelson Jobim, e encaminhou um documento ao governador do Pará, Almir Gabriel, exigindo a rápida apuração dos fatos e a prisão dos mandantes e pistoleiros da fazenda Santa Clara. O vice-presidente da Contag, Avelino Ganzer, embarcou hoje para a região, a fim de acompanhar a apuração de mais essa chacina no sul do Pará."

A fazenda pertence ao médico Edevair Vilela Queiroz.

A nota conclui com uma relação de nomes de pessoas mortas no ano de 1996.

A chacina mais grave ocorrida no nosso Estado foi a de Eldorado dos Carajás, quando 19 trabalhadores rurais sem-terra foram assassinados pela Polícia Militar do Governo do Pará. Posteriormente, na Fazenda São Francisco, também em Eldorado dos Carajás, em agosto de 1996, três trabalhadores foram assassinados. Na semana retrasada, vim a esta tribuna denunciar que mais dois trabalhadores foram assassinados na Fazenda São Francisco. Hoje, recebemos a triste notícia dessas mortes ocorridas em Ourilândia do Norte. Até agora, foram confirmadas três mortes. Os cadáveres de três trabalhadores rurais estão no necrotério de Ourilândia do Norte.

Sr. Presidente, quero lamentar o fato de essas mortes continuarem a ocorrer e de o Governo não tomar providências para evitar esse tipo de acontecimento. O sul do Pará é a área mais conflagrada do Brasil. Esses conflitos haverão de continuar se providências não forem tomadas pelo Governo Federal.

Lamentavelmente, o Presidente Fernando Henrique Cardoso não enxerga o óbvio, não enxerga a realidade do País. Ele está cego, está envolvido com a sua vontade de ser Presidente da República mais uma vez, está apegado ao poder, está, de maneira até mesmo fora do normal, desejoso de continuar no poder e só se preocupa com reeleição.

Quero lamentar pelo Ministro Raul Jungmann, que tem demonstrado, ao longo de sua vida, que tem vontade de fazer a reforma agrária, mas que está-se deixando contaminar por esse grupo que está no poder.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso não tem vontade política de fazer reforma agrária, porque, se tivesse, não destinaria tão poucos recursos ao Ministério Extraordinário da Reforma Agrária.

O Brasil vem passando por fatos graves no governo da social-democracia. Em primeiro lugar, foi a chacina de Corumbiara, depois, a chacina de Eldorado dos Carajás. O Presidente Fernando Henrique Cardoso decidiu, então, criar o Ministério Extraordinário da Reforma Agrária. Só que esse Ministério não dispõe de recursos. Foram destinados R$2,6 bilhões de reais ao Ministério da Reforma Agrária, enquanto para as Forças Armadas foram destinados R$15,8 bilhões e, para o pagamento de juros da dívida interna e externa brasileira, R$33 bilhões de recursos do Tesouro. Não é possível fazer reforma agrária desse jeito.

Sr. Presidente, o que quero ressaltar, acima de tudo, é que os grandes latifundiários, inclusive do sul do Pará, sentem que não é mais possível economicamente manter as suas propriedades, porque exigem um forte aparato de segurança para não serem ocupadas. Esse custo não compensa, principalmente no que se refere à pecuária, que é a base econômica do sul do Pará. Os grandes proprietários, por esta razão, estão procurando o Governo para negociar. Eles é que estão procurando o Governo. Eu, como Senador de oposição, como lutador pela reforma agrária, tenho recebido em meu gabinete pessoas que jamais imaginei poderiam me procurar. Essas pessoas vêm colocar a sua situação, a sua dificuldade em manter a posse da terra. São áreas que ainda não foram invadidas. E, antes que sejam invadidas, os proprietários estão tentando negociar com o Governo.

O Sr. Leomar Quintanilha - Senador Ademir Andrade, V. Exª me permite um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Com satisfação, Senador Leomar Quintanilha.

O Sr. Leomar Quintanilha - Nobre Senador Ademir Andrade, o tema que V. Exª traz à discussão da Casa nesta tarde já tem sido objeto da manifestação de diversos Srs. Senadores em razão das questões que estão sendo levantadas na discussão da reforma agrária. A posição do Governo foi a de buscar a via da alteração da tributação do imóvel, com vistas a facilitar a disponibilidade de diversas áreas para fins de assentamento rural. No entanto, a questão que V. Exª traz agora, referente às mortes ocorridas no Pará, bem como as ocorridas em outras regiões do Brasil, evidencia que a intranqüilidade no campo está tomando proporções tais que, certamente, se medidas urgentes e firmes não forem adotadas, essa intranqüilidade chegará à cidade. Já se verifica um intercâmbio de pessoas que se movimentam de um lado para outro - do campo para a cidade e, agora, no sentido inverso, da cidade para o campo -, engrossando esse movimento dos chamados sem-terra, na esperança de conseguir uma guarida em um desses projetos de assentamento do Governo. É preciso, nobre Senador, que o INCRA e, principalmente, o Ministério da Reforma Agrária, que, acredito, tenha sido criado com o objetivo precípuo de agilizar os procedimentos administrativos nesse sentido, adotem essas medidas com urgência, sob pena de não superar a sua própria burocracia ou de as mortes continuarem acontecendo, assim como a intranqüilidade, a desobediência civil e à própria Constituição. Portanto, entendo ser do maior relevo a discussão e o tema que V. Exª traz à Casa nesta tarde.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Agradeço a V. Exª, Senador Leomar Quintanilha. Espero que possamos nos somar para resolver esse problema.

A Srª Marina Silva - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Ouço V. Exª, Senadora Marina Silva.

A Srª Marina Silva - Primeiro, mais uma vez, desejo lamentar esses trágicos acontecimentos que envolvem o assassinato de trabalhadores em conflito de terra e dizer que a sociedade brasileira já não suporta mais que, a cada chacina, tome-se, a conta-gotas, alguma medida. Depois da chacina de Corumbiara e de Eldorado dos Carajás, reeditou-se o Ministério da Reforma Agrária. A partir disso, houve toda uma luta para que fossem aprovados pelo Congresso Nacional alguns instrumentos legais que possibilitassem ao Governo agir na implementação e realização da reforma agrária. Lamentavelmente, em que pese também reconhecer o compromisso e o interesse do Ministro Raul Jungmann, a reforma agrária, no Brasil, tem-se constituído num processo altamente moroso, porque depende de uma ação administrativa do Executivo. É preciso que haja uma determinação para a alocação dos recursos necessários; a questão deve ser enfrentada do ponto de vista prático, operacional, porque todas as alegações que fazíamos em benefício da reforma agrária já são de conhecimento e, acredito, do entendimento do Governo. Por outro lado, as alegações do impedimento da reforma agrária, por falta de instrumento legal, do meu ponto de vista, já está sanado à medida que os instrumentos foram aprovados nesta Casa. O que está faltando para que a reforma agrária aconteça é determinação política, é uma ação do Poder Executivo, para que tenham fim esses episódios lamentáveis que ceifam a vida de pessoas inocentes. Não sabemos sequer o número de mortos neste novo conflito. A continuar desta maneira, quase que a cada mês V. Exª terá que subir à tribuna para denunciar esses episódios no Estado do Pará. Muitas pessoas dizem que a oposição gosta de ter um cadáver para chorar a fim de fazer política. Isso não é verdade. É uma injustiça, uma injúria! É com tristeza, com muito constrangimento que, como pessoa humana, aqui comparecemos para, repetidas vezes, anunciar que pessoas morreram, muitas vezes até de forma anunciada, porque os latifundiários organizam-se e arregimentam pessoas para tal. Os meios de comunicação mostram pessoas armadas, de prontidão, para atacar e matar pessoas inocentes que estão lutando em legítima defesa da vida, do direito de ter um pedaço de terra para morar. Neste nosso País - como gosta muito de falar o nosso Presidente - que tenta inserir-se na globalização, sabemos que milhões de brasileiros não terão acesso a esses processos, e a única maneira de conseguirem viver com dignidade é mediante a reforma agrária. Reconheço o trabalho e a luta de V. Exª em favor da reforma agrária, mas, do ponto de vista da verbalização como seres desejantes da reforma agrária, já chegamos à exaustão. Precisamos nos tornar seres que realizem a reforma agrária e, nesse sentido, todo mundo tem de se dispor a ajudar o Governo, principalmente a oposição. Nessa questão, o Governo não tem oposição, a não ser de seus próprios aliados.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Senadora Marina Silva, agradeço o aparte de V. Exª e digo que, mais uma vez, a contragosto, somos obrigados a fazer um deslocamento à área. Vou constrangido, triste, revoltado. Vou porque é minha obrigação. O Senador Eduardo Suplicy, a Senadora Benedita da Silva fizeram um requerimento e nós quatro - V. Exª e também o Senador Sebastião Rocha - iremos dar uma força àquela gente, mostrar que há alguém lutando por eles. Mas vou triste, vou constrangido, não agüento mais esse tipo de incidente.

Acontece uma barbaridade contra garimpeiros e para lá nos deslocamos para ajudá-los; acontece uma barbaridade em Eldorado dos Carajás e para lá nos deslocamos para ajudá-los; acontece em Corumbiara e para lá nos deslocamos. E o Governo continua absolutamente insensível a essa realidade e a esse genocídio que vem ocorrendo com o nosso povo, nossa gente, o que é lamentável.

Sr. Presidente, esses fatos acontecem não por falta de alerta. Tenho aqui levantamento de mais de 150 ofícios dirigidos aos Ministros, dirigentes do INCRA, agora Ministério da Reforma Agrária, solicitando providências. Também tenho cerca de seis ofícios de pessoas interessadas em negociar com o Governo porque não suportam mais, economicamente, inclusive, manter suas terras; estão dispostas a negociar as terras em condições favoráveis ao Estado.

Posso citar o caso do Sr. Altino Ferreira Barbosa, dono da Mineração Taboca. Lá existe toda uma estrutura, Senador Eduardo Suplicy, com casas, supermercados, escola e uma área de terra que eles pretendem negociar. Junto a essa área, há uma outra de 47 mil hectares em que o Governo poderá fazer uma negociação barata para o propósito da reforma agrária.

Existe também um caso ainda mais sério e ocorre na Fazenda Tayná Recan, antiga fazenda do Bradesco. Seu proprietário tem 63 mil hectares de terra e está tendo um custo elevado para manter a segurança na área. Ele próprio disse a mim e ao Ministro Raul Jungmann que em sua terra ninguém entra. Mas ele tem vontade de negociar com o Governo.

Essas propostas foram feitas. Pedimos que o ministério faça vistoria e estude o assunto. Não é somente o caso dessa fazenda. Há outros proprietários interessados em se desfazer de suas propriedades, porque não conseguem mantê-las. Ficou provado que governos anteriores atuaram erradamente, dando grande extensão de terras a pessoas isoladas. Não há atualmente a menor vontade e ação para resolver o problema. Desafiei - e volto a repetir nesta Tribuna - o Ministro da Reforma Agrária, Raul Jungmanm, quando S. Exª esteve aqui neste plenário, a que citasse um único caso em que o Governo tivesse tomado a iniciativa de arrumar uma área e, nesta área, pacificamente, assentar trabalhadores rurais. Há vinte anos que luto pela reforma agrária neste nosso País e especialmente no meu Estado do Pará. Nesse tempo todo só vi o Governo resolver conflitos que já existiam, só vi o Governo agir depois que a invasão já havia ocorrido e muitas vezes agir depois que as mortes haviam ocorrido, como foi o caso da Fazenda São Francisco, onde morreram três em agosto do ano passado e morreram dois há dez dias. Somente depois dessas mortes enviaram funcionários do Ministério para desapropriar a fazenda. Quer dizer, o Governo é o próprio estimulador das invasões quando ele não age de maneira antecipada para preparar um projeto para assentar os trabalhadores rurais, que precisam ser assentados neste nosso País.

É isso que estamos a assistir, lamentavelmente. Somos obrigados a vir à tribuna apresentar o nosso pensamento, a nossa idéia para que o povo brasileiro se some a nós, para que possamos conseguir transformar alguma coisa, porque está muito difícil concretizar a reforma agrária.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Senador Antonio Carlos Valadares, antes de lhe conceder o aparte, ouvirei o Senador Eduardo Suplicy, porque ele já o havia solicitado, mas em seguida ouvirei V. Exª.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Ademir Andrade, considero da maior importância que V. Exª aqui esteja chamando a atenção do Presidente Fernando Henrique, do Ministro da Justiça, do Ministro Raul Jungmann, porque falta maior energia ao Governo para levar avante a reforma agrária. Os episódios de Corumbiara, de Eldorado de Carajás e agora no sul do Pará, em Ourilândia do Norte - que eu próprio vou conhecer amanhã junto com V. Exª - provam isso. Episódios como os que ocorreram no Pontal do Paranapanema mostram que o Governo não está agindo com a celeridade devida. Observo o Ministro Raul Jungmann um tanto cheio de preocupações, de barreiras, como se não compreendesse na devida profundidade as razões pelas quais o Movimento dos Sem-Terra, trabalhadores rurais em todo o Brasil estejam a chamar a atenção para o problema através de ocupações simbólicas e nunca com ações armadas por parte deles próprios. Eles querem mostrar que, havendo áreas não produtivas, elas podem ser ocupadas. Ao fazerem isso, eles estão sinalizando para o Governo como deveriam agir - com muito maior rapidez. O Ministro Raul Jungmann agora está dizendo que não conversa com trabalhador sem terra que invade terras. Ora, por que razão um trabalhador destituído de direitos, de propriedade, de possibilidade de estar sobrevivendo vai estar ocupando uma área improdutiva, uma área que ele vê que não está sendo utilizada devidamente senão para mostrar que deve-se realizar justiça, que deve ser feita a reforma agrária? São muitos hoje aqueles que consideram, inclusive eu próprio, o movimento dos sem terra como um dos mais importantes na história social deste País. Daí por que será importante e oportuno que façamos o diagnóstico no sul do Pará, para que possamos trazer aqui a realidade dos fatos e para que depois possamos transmitir não apenas ao Congresso, mas aos membros do Executivo as razões pelas quais continua ocorrendo essa violência seguida de impunidade. Infelizmente, com respeito aos episódios de Corumbiara e de Eldorado dos Carajás, em que pese as declarações, sejam das autoridades estaduais, do Governador Almir Gabriel, do Presidente Fernando Henrique Cardoso ou do Ministro Nelson Jobim. O fato concreto é que até agora, passados mais de 12 meses com respeito a Corumbiara e desde 17 de abril de 1996, quando ocorreu o incidente de Eldorado dos Carajás, não sabemos quais foram os responsáveis e quais as medidas tomadas para puni-los. Isso é algo que não condiz com aquilo que as próprias autoridades estão dizendo.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Agradeço a V. Exª, Senador Eduardo Suplicy. Há mais um fato, o de Ourilândia do Norte, na Fazenda Campos Altos, do Sr. Dimas Luiz da Silva. Essa fazenda foi invadida há cerca de um ano. Os posseiros invadiram uma área de mata que fica exatamente no meio da fazenda, e o proprietário possui gado de um lado e do outro. Os gerentes, ao tentarem atravessar, o conflito é permanente, a tensão é constante. Fizemos em outubro do ano passado uma reunião com os trabalhadores rurais e houve pedidos dos padres ao Governo, da Comissão Pastoral da Terra, do sindicato, das autoridades, do prefeito, da Câmara dos Vereadores, de todo o mundo da região, pedindo ao Governo que desapropriasse a área. Para surpresa nossa, o proprietário apareceu na reunião, e disse que não queria conflito com ninguém, que queria o seu direito de mexer no seu gado; enquanto o Governo não tomasse uma providência, que os posseiros respeitassem seu direito. Além disso, falou que tinha uma liminar pelo juiz para expulsar os posseiros da região, mas que ele preferia a negociação. Isso já faz mais de cinco meses, Senador Eduardo Suplicy.

Essa fazenda fica à beira de Ourilândia do Norte; oito mil hectares de terra, encostados em Ourilândia do Norte. E até o momento não tivemos nenhuma resposta do Governo, apesar dos nossos ofícios encaminhando e solicitando solução para o problema, inclusive anexando os documentos da CPT - Comissão Pastoral da Terra -, FETAGRI, do Padre Ricardo Rezende, de tantas outras pessoas envolvidas com os problemas sociais naquela Região.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Ouço o Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Senador Ademir Andrade, é triste o Senado Federal receber mais uma vez notícias tão constrangedoras, que alarmam o mundo inteiro, colocando o Brasil no lugar de um país injusto, com seu povo, com sua gente, com seus trabalhadores. Um país com 8,5 milhões de km², onde quase que 1% dos proprietários detém 50% das propriedades rurais. Isso poderia ser corrigido, e logicamente que um Governo só não irá corrigir tal injustiça. Os outros governos que passaram, a começar desde a instalação do Império até hoje, passando pela República, a reforma agrária sempre foi bandeira de alguns políticos e não há nenhuma solução definitiva, concreta para a resolução de um problema tão grave quanto este, e é lamentável que mais mortes tenham acontecido no Estado do Pará em conflitos de terra. Isso é uma prova evidente de que o discurso do Governo durante a campanha não se casa com a prática. É um discurso todo cheio de boas intenções, mas quando chega a hora de realizar aquilo que prometeu nada acontece. Daí as mortes, os conflitos, as invasões, o inconformismo dos trabalhadores e também a revolta de proprietários que muitas vezes vêem suas propriedades invadidas e sem uma solução pronta e enérgica do Governo para evitar esses conflitos. Entendo que o Imposto Territorial Rural não vai resolver nada. Já tive ocasião de dizer nesta Casa que o Brasil é o País da anistia, do perdão. Alguns proprietários vão ficar devendo o Imposto Territorial Rural e, de repente, aparece no Senado Federal e na Câmara dos Deputados um projeto concedendo anistia ampla e irrestrita aos devedores do Imposto Territorial Rural. E o uso da propriedade continuará, de forma injusta, a causar prejuízos enormes ao nosso País. Queria solidarizar-me com o pronunciamento de V. Exª e lamentar que fatos tão tristes voltem a acontecer em seu Estado. V. Exª é um defensor da correção das injustiças que ainda se cometem contra o trabalhador e procede com muito equilíbrio em seu discurso. Sua manifestação é no sentido de que o Governo acelere o processo da reforma agrária. Assim como há injustiças contra os trabalhadores, há também a preocupação dos proprietários, bons e que promovem o desenvolvimento de nosso País e que não sabem aonde esse conflito vai chegar. V. Exª tem toda razão: o Governo Federal deve sair das intenções - e sabemos que são boas as intenções do Ministro da Reforma Agrária - e partir para a prática. É necessário um projeto viável, que transforme o Brasil num País realmente habitável para seus trabalhadores e proprietários de terra.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Muito obrigado, Senador.

Para finalizar, cito ainda o caso da Fazenda Guarantã, onde também houve um acordo entre o Prefeito, a Câmara, centenas de trabalhadores rurais, sindicatos e proprietários. Todos chegaram a um acordo para que o Governo resolvesse o problema dos trabalhadores. Essa proposta foi feita há mais de um ano e meio e até agora não houve solução. É dessa forma que a coisa infelizmente está funcionando no nosso Estado.

Peço, Sr. Presidente, que seja transcrita nos Anais do Senado a nota da Contag lançada a nível nacional hoje, bem como os ofícios que dirigi ao Ministro Raul Jungmann e a seus antecessores, no sentido de acelerarem o processo de desapropriação de áreas que poderiam resolver inúmeros problemas do nosso Estado.

Encerro dizendo ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que acorde, que esqueça o problema de reeleição, pois não é de reeleição que o Brasil está precisando. Que Sua Excelência cuide de governar, que Sua Excelência cuide de administrar, porque em seu Governo estão morrendo mais trabalhadores rurais do que em governos militares que o antecederam. E isso é uma vergonha para o País, é uma mancha para todos nós. É preciso que esse homem entenda o que está acontecendo, acorde para o que está acontecendo e passe a trabalhar efetivamente pelo País e concretize a reforma agrária que prometeu fazer no Brasil.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/01/1997 - Página 2331