Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO SENADOR DARCY RIBEIRO.

Autor
Carlos Wilson (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO SENADOR DARCY RIBEIRO.
Aparteantes
José Agripino.
Publicação
Publicação no DSF de 20/02/1997 - Página 4107
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, DARCY RIBEIRO, SENADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).

O SR. CARLOS WILSON (PSDB-PE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, apesar do pouco tempo de vida parlamentar durante a qual tive a oportunidade de conviver com Darcy Ribeiro, uma característica assimilei de sua personalidade: o ambiente onde Darcy chegava não permanecia o mesmo.

Darcy Ribeiro possuía o dom de transformar as coisas. O pragmatismo, à sua presença, adquiria leveza; a sisudez cedia lugar à descontração; as dificuldades apresentavam horizontes de solução; o realismo abria-se para o sonho.

Essa, a imagem do homem Darcy Ribeiro, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que ficou gravada na minha memória.

Entendo agora a expressão do índio Chico Guarani quando pronunciou esta desolada afirmação: "Os povos da floresta estão sem pajé." Entendo também o alcance da palavra da escritora Nélida Piñon, ao preparar a Academia Brasileira de Letras para receber centenas de crianças que iriam prestar as últimas homenagens a Darcy Ribeiro: "Elas precisam sofrer o impacto da grandeza de um Brasil maior e não de um Brasil mesquinho."

Darcy foi brasileiro integral, brasileiro global, porque soube encarnar na sua vida, expressando nas idéias e vivendo no modo de ser e de agir o valor universal do homem brasileiro.

Darcy sorria sempre, até na doença. Ontem, ao vê-lo imóvel, sem vida, o Governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque, desabafou: "É a primeira vez que eu vejo o Darcy sem estar com o sorriso no rosto."

Darcy sabia ser diferente, sabia ser ilustre, sabia ser pequeno como um simples desconhecido enfurnado nas entranhas de nossa, ainda majestosa, floresta. Era querido, era questionador, era espontâneo, era delirante. Tinha o delírio do poeta que não se conforma com a mesquinhez nem com a renúncia a ser autenticamente homem do Brasil, nem com a submissão a desejos, planos, programas e ações alienígenas. Posicionava-se. Discutia. Provocava. Projetava. Sonhava. Cultivava a utopia como referencial, como ideal, como horizonte criador de sonhos e projetos. Sonhos e projetos de ser, de crescer como homem e como povo.

O Sr. José Agripino Maia - Senador Carlos Wilson, V. Exª permite-me um aparte?

O SR. CARLOS WILSON - Com muito prazer, concedo o aparte ao Senador José Agripino Maia.

O Sr. José Agripino Maia - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a minha cadeira é vizinha à que o Senador Darcy Ribeiro ocupou enquanto vivo. Com ele convivi dois anos. Foi uma convivência doce e afável. Sempre respeitei Darcy Ribeiro, que conheci quando governei meu Estado. Homem com a vida pública limpa, profícua; homem que experimentou sofrimentos e alegrias na vida; homem de grandes realizações pessoais; homem público a toda prova, de espírito público, que sentia a dor do dinheiro do povo; homem afável, que não demonstrava ser o homem importante que sempre foi. Ele permitia que as pessoas ficassem próximas dele. Não estabelecia distância para quem convivia com ele, o que prova a magnanimidade de sua personalidade. Foi um homem de cultura, um homem que dedicou sua vida à educação. Assisti aqui ao seu lado, no ano passado, à aprovação da LDB e pude ver sua alegria. Darcy criou a UnB e idealizou os CIEPs, a maior demonstração da história recente de apreço do homem público pela criança pobre, premiada com a melhor escola, com o melhor prédio físico. Mas era o homem das minorias. Esta é uma sessão de homenagem. Penso que todos nós devemos evoluir da palavra para a atitude na homenagem e há uma forma de fazê-lo. Estive presente, numa sexta-feira pela manhã, final de convocação, a um encontro por ele convocado para expor seu Projeto Caboclo. Mais ou menos 15 Senadores estavam presentes ao encontro. Darcy Ribeiro dizia, até em tom de gracejo, que aquelas presenças eram manifestação do prestígio do câncer. Rebati: não era prestígio do câncer; era prestígio do autor da idéia, do homem que tinha autoridade para convocar pessoas, porque elas iriam ouvir boas idéias de um homem sério e conseqüente. Ele expôs o Projeto Caboclo sob a forma de projeto elaborado. O projeto é de Darcy Ribeiro, mas por que não prestarmos uma última homenagem a ele, adotando o Senado da República, como seu, o Projeto Caboclo? Pela sua vida pública, que não o desonrou em nenhum momento, por que não merecer de seus Pares - após sua morte - apoio a esse projeto? Por que não ser o Projeto Caboclo mais que um projeto de Darcy Ribeiro para as minorias? Por que não ser ele um projeto do Senado Federal para o amazônida? Eu, que fui vizinho de Darcy durante dois anos, não poderia deixar de manifestar, neste modesto aparte, esta minha homenagem pessoal, este desabafo e esta proposta de fazermos do Projeto Caboclo algo maior que o sonhado por ele: um projeto de seus Pares, um projeto do Senado da República? Muito obrigado.

O SR. CARLOS WILSON - Sou eu que agradeço, Senador José Agripino. O testemunho de V. Exª é da maior importância.

Presidente Antonio Carlos Magalhães, lembro bem que, ao conversar conosco, V.Exª dizia-nos que o Senador Darcy Ribeiro pediu a V. Exª que ajudasse a implantar o Projeto Caboclo que, indiscutivelmente, era o que mais o entusiasmava naquele momento.

Darcy Ribeiro foi um homem de muitos ideais, de realizações e muitos futuros. O tempo não lhe era limite. E Carlos Drummond de Andrade sintetizou, esplendidamente, essa característica:

      "Darcy é um monstro de entusiasmo que nenhum golpe feroz arrefece. Sete Quedas acabou, mas Darcy é o cara mais Sete Quedas que eu conheço. Darcy, caudal da vida."

Ninguém podia sintetizar melhor Darcy Ribeiro do que Carlos Drummond de Andrade. Darcy colocava graça na vida. Era homem de esperança, esperança que ele soube colocar no lugar certo: no lugar onde ele estava, no nosso Brasil.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/02/1997 - Página 4107