Discurso no Senado Federal

EXPEDIENTE, RECEBIDO POR S.EXA., DA ASSOCIAÇÃO DAS COMUNIDADES DOS INDIOS TAPEBA, CAUCAIA, NO ESTADO DO CEARA, DENUNCIANDO VIOLENCIA QUE VEEM SOFRENDO.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • EXPEDIENTE, RECEBIDO POR S.EXA., DA ASSOCIAÇÃO DAS COMUNIDADES DOS INDIOS TAPEBA, CAUCAIA, NO ESTADO DO CEARA, DENUNCIANDO VIOLENCIA QUE VEEM SOFRENDO.
Publicação
Publicação no DSF de 21/02/1997 - Página 4209
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • LEITURA, EXPEDIENTE, AUTORIA, PRESIDENTE, SOCIEDADE, COMUNIDADE INDIGENA, INDIO, ESTADO DO CEARA (CE), REFERENCIA, DENUNCIA, VIOLENCIA, RESERVA INDIGENA, REGIÃO.
  • INFORMAÇÃO, PRETENSÃO, ORADOR, ENCAMINHAMENTO, EXPEDIENTE, NELSON JOBIM, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), ADOÇÃO, PROVIDENCIA, REDUÇÃO, VIOLENCIA, OPOSIÇÃO, INDIO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DO CEARA (CE).

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, foi-me enviado da parte da Associação das Comunidades dos Índios Tapeba, de Caucaia, no Estado do Ceará, um expediente relatando um grave episódio de violência que vem ocorrendo contra essa comunidade no Município de Caucaia.

O expediente diz o seguinte:

      "Nós, Tapeba, do Município de Caucaia, no Ceará, Brasil, estamos revoltados e muito preocupados com a onda de violência que ultimamente vem ocorrendo em nossa área indígena.

1. DOIS ASSASSINATOS NA LAGOA DOS TAPEBA

      Dia 15 de dezembro deste, às 19h30min, mais ou menos, na Comunidade da Lagoa dos Tapeba, na nossa área indígena, foram barbaramente assassinados, no terreiro de suas casas, dois Tapeba, mãe e filho, Maria do Carmo de Alencar e Alencar de Alencar Gomes, conhecido por "Caucaia". Eles estavam em suas casas, que ficam muito isoladas, no Meio do Mato, quando foram atacados. Uma voz perto que chamou por um dos filhos. Como era noite escura, não deu para reconhecer quem era. O outro filho Alencar se aproximou e, de surpresa, foi logo sendo baleado com arma de fogo (vários tiros) e também foiçadas na cabeça e nas costas.

      Na mesma hora, a Carminha, mãe deles, saiu no terreiro e foi também baleada (vários tiros) e degolada com foice e caiu logo em cima do corpo do filho já morto.

      Um outro filho dela, Amadeu, saiu de casa para socorrer a mãe e o irmão, quando também foram disparados vários tiros, mas ele conseguiu escapar. As marcas das balas estão no pé de cajueiro que fica perto das casas neste local.

      Ele tentou correr atrás dos assassinos, que eram quatro, mas eles escaparam, desapareceram.

2. OUTRO ASSASSINATO HÁ 47 DIAS.

      Outro filho da Carminha, conhecido por Coca, Carlos Alencar, foi assassinado brutalmente com cinco tiros e treze facadas. E ainda deixaram a arma do crime enfiada no corpo do morto (A Polícia de Caucaia esteve no local e retirou a faca.)

      O medo foi tão grande com essa violência e depois com o boato de que se a família denunciasse, eles (os assassinos) acabariam com toda a família. Não iam respeitar nem as crianças. Até as Comunidades silenciaram com medo e não tomaram atitude. Depois disso ficaram sem poder sair de casa para o trabalho e estavam passando até fome, a mãe e os filhos".

Ele faz um relato dramático da situação em que se encontra a Comunidade dos Tapebas e pede o meu auxílio enviando esta denúncia ao Ministro Nelson Jobim.

Pelo que notei, pela linguagem, pela forma com que se coloca, o ofício foi redigido pelos próprios índios. Estão sofrendo muito. Lembrei-me de que sempre que ocorre este tipo de denúncia, as entidades dizem que o documento não é da lavra das vítimas, mas que alguém fez para elas e nem se preocupam com o crime.

Neste caso, eles fizeram questão de escrever, inclusive utilizando linguagem própria, como podemos verificar:

      "Todos os parentes estão se sentindo ameaçados por serem próximos à vítima. Não existe segurança nas Comunidades, todas as famílias apavoradas sem poderem "sai" de casa. Os três últimos filhos sobreviventes da família da Carminha abandonaram suas casas onde moravam há mais de quarenta anos. Estão perambulando, sem saber para onde ir, amedrontados, com crianças pequenas e sem nada para garantir a sobrevivência".

Estou enviando um expediente ao Ministro Nelson Jobim para que providências sejam tomadas.

Sr. Presidente, desejo, desta tribuna, registrar a minha solidariedade para com a Comunidade dos Tapebas. Eles fazem um relato do enorme preconceito que sofrem na cidade de Caucaia. Inclusive, alguns rapazes indígenas foram detidos apenas porque estavam olhando vitrines. Outro fato lamentável foi o espancamento de uma senhora, por um cidadão que, ao passar pela rua, passou a agredi-la por não ter gostado de suas feições.

É um processo de violência muito grande. Esse preconceito fortíssimo parte de nós, os brancos. Lamentavelmente, no Estado de Mato Grosso, esse tipo de atitude tem feito que vários adolescentes indígenas cometam suicídio por não suportarem o preconceito.

Envio este expediente ao Ministro Nelson Jobim para as devidas providências e os assassinos sejam punidos. Segundo eles, as autoridades locais não estão empenhadas na investigação dos fatos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/02/1997 - Página 4209