Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DA MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO NO CAMPO, CONCOMITANTEMENTE A IMPLANTAÇÃO DA REFORMA AGRARIA NO BRASIL. ENCONTRO DE TRABALHADORES RURAIS, REALIZADO PELO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS DE AGUA BOA/MT, DENOMINADO GRITO DA TERRA BRASIL, QUANDO FOI REDIGIDO UM DOCUMENTO PARA CHAMAR A ATENÇÃO RELATIVAMENTE AO DIFICIL ACESSO AO CREDITO DO PROGRAMA NACIONAL DE AGRICULTURA FAMILIAR - PRONAF.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • NECESSIDADE DA MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO NO CAMPO, CONCOMITANTEMENTE A IMPLANTAÇÃO DA REFORMA AGRARIA NO BRASIL. ENCONTRO DE TRABALHADORES RURAIS, REALIZADO PELO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS DE AGUA BOA/MT, DENOMINADO GRITO DA TERRA BRASIL, QUANDO FOI REDIGIDO UM DOCUMENTO PARA CHAMAR A ATENÇÃO RELATIVAMENTE AO DIFICIL ACESSO AO CREDITO DO PROGRAMA NACIONAL DE AGRICULTURA FAMILIAR - PRONAF.
Publicação
Publicação no DSF de 07/02/1997 - Página 3962
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ATENÇÃO, DOCUMENTO, AUTORIA, SINDICATO RURAL, MUNICIPIO, AGUA BOA (MT), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), NECESSIDADE, FACILITAÇÃO, ACESSO, TRABALHADOR RURAL, CREDITO RURAL, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), GARANTIA, ASSENTAMENTO RURAL, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA, PAIS.

                O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fazer reforma agrária é uma operação complexa. Não basta distribuir terra. É necessário conceder ao agricultor os meios para trabalhar a gleba, efetuar o plantio, garantir a colheita e entrar nos mecanismos de comercialização. Enfim, reforma agrária é o fim de uma política de redistribuição de renda no campo, combinada com a melhoria da produção agrícola. Se o projeto, ou a política, não considerar, cuidadosamente, cada uma dessas etapas, o conjunto pode ser ruinoso e deixar de atender aos objetivos maiores.

                O mundo ocidental está cheio de exemplos de políticas de reforma agrária que não foram bem sucedidas. Em Portugal, logo após a revolução dos cravos vermelhos, em 1974, iniciou-se um movimento de repartição da terra, basicamente no sul daquele país. As glebas foram entregues a agricultores que não dispunham de mecanismos de crédito para plantio, colheita e comercialização. Alguns anos depois, as terras retornaram a seus proprietários originais, porque a agricultura portuguesa sofreu uma violenta e repentina queda tanto na produtividade quanto na produção.

                Na América do Sul, o exemplo mais radical e conhecido ocorreu no Peru, ao tempo do governo Alvarado. Ocorreu a distribuição de terras, mas não aconteceu a criação dos mecanismos financeiros que entregariam aos agricultores os meios para plantar, colher e vender sua produção. De novo, em pouco tempo, as terras retornaram aos antigos proprietários. O país experimentou um momento de escassez de produtos agrícolas, enfrentou enormes dificuldades políticas no campo e restou a sensação de perda de tempo, desperdício de meios e inutilidade de uma política considerada a solução para diversos problemas nacionais.

                Nos países de economia planificada, como era a União Soviética, a reforma agrária manteve um padrão de baixa produtividade e reduzida produção. O gigante comunista, mesmo nos períodos de apogeu, foi um dos maiores importadores de produtos agrícolas do mundo. A maneira coletivizada de produzir não gerou a quantidade de produtos necessária para abastecer o mercado interno. Os demais países do Leste europeu que foram comunistas jamais realizaram uma reforma agrária no sentido estrito do termo. Ficaram a meio caminho entre a distribuição de terras e a coletivização. Não havia, é verdade, muita terra a ser distribuída aos camponeses da Europa Central.

                Os Estados Unidos do século 19 realizaram, talvez, a única reforma agrária que ofereceu resultados consistentes ao longo do tempo. Ela aconteceu em paralelo à conquista do Oeste, que, em verdade, consistiu na abertura de uma nova e imensa fronteira agrícola. O homem branco percebeu que havia espaço e oportunidade para conquistar novos territórios e se lançou na aventura. Levou o gado, a família e foi estabelecendo fazendas, sítios e criando comunidades. Foi a época, também, de uma fortíssima migração de europeus para o novo país da América do Norte.

                O sistema financeiro se incumbiu de financiar o desenvolvimento dessas pequenas comunidades, que se consolidaram como cidades, rodeadas de unidades produtivas. Pode-se dizer, ainda, que a geografia ajudou. As imensas planícies permitiram que, na ausência de acidentes naturais pronunciados, o homem trabalhasse a terra e nela buscasse, primeiro o seu sustento, depois a comercialização dos produtos por ela oferecidos. A conquista do Oeste norte-americano solucionou os problemas de superpovoamento das principais cidades européias e abriu uma nova perspectiva na produção agrícola mundial.

                O Brasil tem oscilado, historicamente, entre os vários modelos de reforma agrária. Já experimentou mais decepções que sucessos nos diversos modelos que empregou. E tem convivido, de maneira extremamente incômoda, com os massacres de posseiros nas áreas de crise. A falta de uma política consistente e presente, nesse importante segmento da vida brasileira, tem proporcionado esse espetáculo, quase diário, de confronto entre proprietários e camponeses.

                O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Água Boa, Mato Grosso, realizou o encontro de trabalhadores rurais denominado Grito da Terra Brasil. Neste Congresso, por deliberação da maioria dos presentes, foi redigido um documento que visa a chamar a atenção das autoridades municipais, estaduais e federais relativamente ao acesso ao crédito do Programa Nacional de Agricultura Familiar -- PRONAF. Segundo o modelo atual, o acesso ao crédito é concedido somente aos proprietários de terras, deixando à margem grande número de famílias. De acordo com os dados do INCRA, 964 (novecentos e sessenta e quatro) famílias, embora assentadas dentro de projetos daquele Instituto, não estão em condições de se habilitarem para receber o benefício.

                Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, comecei afirmando que reforma agrária é operação complexa. Sem crédito, a política se frustra. Os agricultores de Água Boa afirmam, em seu documento, que, se não houver a desburocratização para acesso ao crédito, o festejado Programa de Agricultura Familiar não atingirá seus objetivos e existirá somente nas dispendiosas campanhas publicitárias do Governo Federal, sem efeito prático algum.

                As medidas de simplificação das operações deverão ser repassadas urgentemente para os agentes financiadores, caso contrário a liberação dos recursos somente ocorrerá no tempo inoportuno. Sem acesso ao crédito, não se efetiva, verdadeiramente, a ocupação das áreas de assentamento e não se realiza a reforma agrária, que pretende dar condições econômicas, sociais, de infra-estrutura para que os assentados possam permanecer na terra produzindo e vivendo em níveis mínimos de dignidade.

                Eis aí, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um exemplo pronto e acabado dos impasses e das armadilhas que a política de reforma agrária provoca. É necessário que o crédito chegue aos assentados, caso contrário todo o esforço anterior no sentido de distribuir terras será invalidado. Peço ao Ministro da Reforma Agrária, ao Ministro da Agricultura e às autoridades do sistema financeiro nacional que sejam sensíveis aos reclamos dos agricultores de Água Boa. Eles querem apenas trabalhar e começar, com seu exemplo, dedicação e altivez, um projeto de reforma agrária que vai gerar os benefícios previstos. É fundamental que eles tenham acesso aos créditos do sistema financeiro.

                Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/02/1997 - Página 3962