Discurso no Senado Federal

COMENTANDO MATERIA PUBLICADA NO JORNAL O ESTADO DE S.PAULO DE ONTEM, DO JORNALISTA MOISES RABNOVICH, SOBRE A SITUAÇÃO DOS SERINGUEIROS NO ESTADO DO ACRE. AS CONSEQUENCIAS NEFASTAS DA FALTA DE UMA POLITICA NACIONAL PARA A BORRACHA. PROPOSTA DE S.EXA. PARA UMA POLITICA DE AÇÃO EXTRATIVISTA DA BORRACHA, A SER DEBATIDA COM O GOVERNO PELO MOVIMENTO DOS SERINGUEIROS E TAMBEM PELOS PRODUTORES DE BORRACHA DOS SERINGAIS DE CULTIVO.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • COMENTANDO MATERIA PUBLICADA NO JORNAL O ESTADO DE S.PAULO DE ONTEM, DO JORNALISTA MOISES RABNOVICH, SOBRE A SITUAÇÃO DOS SERINGUEIROS NO ESTADO DO ACRE. AS CONSEQUENCIAS NEFASTAS DA FALTA DE UMA POLITICA NACIONAL PARA A BORRACHA. PROPOSTA DE S.EXA. PARA UMA POLITICA DE AÇÃO EXTRATIVISTA DA BORRACHA, A SER DEBATIDA COM O GOVERNO PELO MOVIMENTO DOS SERINGUEIROS E TAMBEM PELOS PRODUTORES DE BORRACHA DOS SERINGAIS DE CULTIVO.
Aparteantes
Jefferson Peres, Nabor Júnior.
Publicação
Publicação no DSF de 01/03/1997 - Página 4794
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, MOISES RABNOVICH, JORNALISTA, DESCRIÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, SERINGUEIRO, MUNICIPIO, XAPURI (AC), ESTADO DO ACRE (AC).
  • CRITICA, INCAPACIDADE, GOVERNO FEDERAL, DEFINIÇÃO, POLITICA NACIONAL, BORRACHA, INCLUSÃO, PROPOSTA, BORRACHA NATURAL, GARANTIA, ESCOAMENTO, PRODUÇÃO, PREÇO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, SERINGUEIRO, REGIÃO AMAZONICA.
  • APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, AUTORIA, ORADOR, DEFESA, CRIAÇÃO, DIRETORIA, BORRACHA NATURAL, PARTICIPAÇÃO, ENTIDADE, SERINGUEIRO, INCENTIVO, ATIVIDADE EXTRATIVA, REGIÃO AMAZONICA.

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o jornal O Estado de S. Paulo, em matéria bastante extensa, publicada ontem, dia 27, de um enviado especial ao Município de Xapuri, o jornalista Moisés Rabnovich, começa com o seguinte texto:

      Gotas de leite pingam da seringueira ferida. Até estancar vão encher três colheres de sopa - a dose diária. Em um mês de sangradouro, darão 1 quilo e 800 gramas. Cada quilo está valendo R$ 0,60, embora cotado a R$ 1,30. Com uma "estrada de 150 pés", o seringueiro Manoel Barbosa de Brito faz R$ 13,50 por mês, na selva, no fim do Brasil, quase Bolívia.

Ele trabalha mais que o dia todo, porque geralmente um seringueiro começa a trabalhar às 4h30 da manhã e só encerra o seu trabalho às 18h ou 19h. É um trabalho cansativo. Quando se trata daqueles que têm que fazer o processo de defumação, ainda é mais doloroso, porque causa problemas pulmonares, problemas na vista, principalmente catarata.

Hoje eles já fazem o CPV, que chamamos de cernambi virgem prensado. Mas ainda existem os seringueiros que usam o método tradicional.

Da matéria que o jornalista Moisés Rabnovich fez consta um levantamento da situação, de como estão e de como vivem os seringueiros do Acre, mais particularmente do Município de Xarupi, que ele visitou. Diz ele ainda que "a herança do líder seringueiro Chico Mendes está se exaurindo..." Por que isso está acontecendo, Sr. Presidente, Srs. Senadores? Ontem o Senador Jonas Pinheiro, hoje o Senador Jefferson Péres, além de vários outros Srs. Senadores, demonstraram preocupação com o problema dos extrativistas da Amazônia.

O Senador José Roberto Arruda acabou de dizer que o Brasil viveu o período do caranguejo: de frente para o mar e de costas para o resto do País. Mas me parece que o processo de interiorização e a preocupação com as demais regiões do País ainda é muito pequena, porque, no caso da Amazônia, temos exemplos escabrosos: uma pessoa é obrigada a viver com uma renda mensal de R$13,50.

Será que o Governo brasileiro sabe quanto custa uma lata de leite em pó nos altos rios da Amazônia? Será que sabe quanto custa um quilo de sal? Será que sabe quanto custa uma bota sete-léguas, que evita que as cobras mordam as pernas e pés dos seringueiros? Uma bota sete-léguas chega a custar mais de três meses de trabalho de um seringueiro que ganha R$13,50 nos altos rios. É essa a realidade que estamos vivendo. Lamentavelmente, não tem havido preocupação de redirecioná-la.

O Governo Federal não definiu uma política nacional da borracha com uma proposta diferenciada para a borracha nativa, uma política que assegure o escoamento da produção e um preço que garanta um salário mínimo para os seringueiros da Amazônia; que o preço da borracha na Amazônia, ao final do mês, signifique uma renda de pelo menos um salário mínimo. É o mínimo que se exige para uma família sobreviver, até porque eles têm alguns adicionais, representados pela caça, pela pesca, pelo cultivo de algumas lavouras de subsistência, a criação de pequenos animais, como galinhas e porcos, e assim por diante.

Com um salário mínimo para comprar sal, açúcar, leite em pó para suas famílias, querosene para suas lamparinas, daria para dar uma vida minimamente digna para os seringueiros da Amazônia. Mas não é só isso que queremos. Queremos redimensionar o processo produtivo na Amazônia, com a implementação dos sistemas agroflorestais - essa idéia foi batizada pelo Senador Darcy Ribeiro de Projeto Caboclo. Queremos fazer o adensamento dos seringais, fazendo com que o plantio de seringueiras possa ser efetuado dentro da própria floresta. Queremos fazer o cultivo e o plantio de algumas madeiras nobres, como é o caso do mogno, por exemplo, que pode ser adensado também, além da castanheira e tantas outras.

A incapacidade do Governo Federal em definir uma política nacional para a borracha desestruturou o setor. As conseqüências estão sendo nefastas. A produção de seringa nativa, que chegou, em 1985, a trinta e quatro mil toneladas, chega, em 1996, a apenas cinco mil toneladas. Por que apenas cinco mil toneladas, se já foram, em 1985, trinta e quatro mil? Exatamente porque a borracha não tem preço, não há como escoar a produção, não há como as pessoas continuarem nessa atividade produtiva.

No entanto, o Governo estabeleceu que a borracha nativa da Amazônia tem que ser comprada, que a borracha do Brasil tem que ser comprada para, só depois, os consumidores de borracha natural poderem comprar a borracha que vem dos mercados estrangeiros.

O Sr. Jefferson Péres - Permite-me V. Exª um aparte, Senadora Marina Silva?

A SRª MARINA SILVA - Com o maior prazer, ouço o aparte do nobre Senador Jefferson Péres. 

O Sr. Jefferson Péres - Como disse V. Exª, nobre Senadora Marina Silva, ontem, o Senador Jonas Pinheiro, do Mato Grosso, e, hoje, eu, do Amazonas, nos pronunciamos sobre o grave problema da borracha. Mas ninguém, neste Senado, tem mais autoridade para fazê-lo do que V. Exª, nascida e criada no seringal, e que, portanto, viveu sofridamente o problema. Não é por coincidência que três Senadores se pronunciam sobre a matéria e que O Estado de S. Paulo se ocupou, ontem, da mesma questão. É que a situação dos seringais nativos da Amazônia já deixou de ser dramática para se tornar trágica, Senadora. Os seringais agonizam e o Governo Federal retrocedeu. Tínhamos, bem ou mal, uma política nacional da borracha até cinco ou seis anos atrás e, hoje, não temos mais, desde a extinção da Sudhevea. É hora de nós, da Região Norte, realmente unirmos esforços para sacudir a modorra do Governo Federal. A imprensa noticia que, segunda ou terça-feira, chegarão duzentos seringueiros para acampar em frente ao Palácio do Planalto. Creio que todos os Senadores da região deveriam se fazer presentes nesse momento, não por demagogia, mas para emprestar solidariedade àqueles nossos conterrâneos, a fim de dar repercussão política ao fato e, de alguma forma, tentar sensibilizar o Governo Federal. Meus parabéns pelo pronunciamento de V. Exª.

A SRª MARINA SILVA - Incorporo o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento, pois sei que V. Exª é aliado dessa causa.

O Sr. Nabor Júnior - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª MARINA SILVA - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Nabor Júnior - O problema que V. Exª hoje traz ao Senado já foi também por mim abordado várias vezes, nesta tribuna: a política nacional da borracha. Verificamos, com pesar, a desatenção do Governo Federal para a cruel situação vivida pelos brasileiros que exploram, na nossa região, essa atividade, que já foi penosa porém razoavelmente rentável - mas que hoje é somente penosa. V. Exª, no seu pronunciamento, lembra que, em 1985, a produção nacional de borracha vegetal no Brasil era de cerca de 35 mil toneladas. Hoje, todavia, não passamos das 5 mil toneladas, o que, sem qualquer dúvida, confirma nossas antigas previsões de crescente desinteresse pelo setor, o qual não propicia remuneração mínima aos extratores, tanto os seringueiros quanto os empresários que ainda procuram manter viva a atividade. Não há preço, não há garantia de comercialização; não há perspectiva de assistência médico-hospitalar para as famílias daqueles trabalhadores, nem escola para os filhos; não há meios de escoamento da produção. Não existem, em síntese, maiores possibilidades de recuperação da heveicultura, posto que toda a estrutura montada anteriormente pelo Governo Federal para proteger a produção e a comercialização da borracha foi destruída, como disse há poucos instantes, em aparte, o Senador Jefferson Péres. O Banco da Amazônia se viu aos poucos perdendo os vínculos com sua destinação inicial, quando foi criado para financiar a produção da borracha na Amazônia, com o nome de Banco de Crédito da Borracha, na época da guerra; depois, mudou para Banco de Crédito da Amazônia; agora, é simplesmente Banco da Amazônia S.A., com poucas agências efetivamente voltadas para o financiamento do produtor de borracha. O Governo Federal extingüiu a própria Sudhevea, que originariamente se chamava Comissão de Defesa da Borracha, e, ao mesmo tempo, derrubou a taxa Torb, um tributo aplicado à diferença de preços entre a borracha produzida no Brasil e a importada, que evidentemente é mais barata, não apenas porque é mais bem elaborada, mas sobretudo porque tem incentivos fiscais dos seus governos, na Malásia e nos outros países que a produzem. O produto da taxação correspondente à diferença de preços entre a nossa borracha e a trazida do Exterior era aplicada nos seringais da Amazônia; e até isso desapareceu. Como se vê, os governos dos últimos 10 anos estão dando reiteradas demonstrações de total desprezo por essa atividade, que, mesmo assim, sobrevive e ainda se constitui num dos sustentáculos da nossa região. Não se respeita o fato de, por exemplo, ter sido o Acre colonizado, explorado e desenvolvido, consolidando as fronteiras nacionais, através da formação de várias cidades, sempre em função dos seringais, os mesmos seringais hoje totalmente abandonados. E o que ocorreu, com o estrangulamento da economia da goma? O êxodo rural para as cidades! Os seringais se esvaziaram, reduzindo-se hoje a cerca de 10% da população que neles viviam e trabalhavam há 10, 20 anos. Todos sabemos que o contingente populacional que não conseguiu sobreviver em torno da seringueira migrou para as cidades, onde está assentado em favelas e em áreas de invasão, como ocorre em Rio Branco. V. Exª, legítima acreana, pode atestar que, só nos últimos 10 anos, foram criados 60 novos bairros, habitados por pessoas oriundas dos seringais. Esse quadro o Governo Federal teria condições de resolver, como disse V. Exª, se desse preço justo ao produtor, garantindo-lhe crédito na época adequada e oferecendo condições de comercialização. Mas o que vemos é o desestímulo, são situações como a criada pela indústria nacional de pneumáticos, onde as multinacionais se recusam a adquirir a produção de borracha nacional e preferem importá-la da Malásia e de outros países, não apenas devido ao preço mais barato - mas sobretudo porque essas plantações também lhes pertencem. Afirmo, por todos esses fatores, que o movimento dos seringueiros, marcado para os primeiros dias de março, merece o apoio de todos nós. Já manifestei ao Governo Federal, por meio de documento encaminhado à Casa Civil da Presidência da República, o meu total e incondicional endosso às principais reivindicações daqueles trabalhadores e, na atual conjuntura, vou acompanhá-los nas tratativas com as autoridades, para que alcancem o seu objetivo, que é também um dos principais objetivos de toda a minha vida: propiciar melhor condição de vida para os seringueiros e seus familiares.Muito obrigado a V. Exª pelo aparte que me concedeu. Foi mais uma preciosa oportunidade para retornar àquela que, sem qualquer dúvida, é para mim uma das principais preocupações: a defesa dos empresários e dos trabalhadores que persistem, contra tudo e contra todos, na luta pela sobrevivência da heveicultura brasileira.

A SRª MARINA SILVA - Agradeço o aparte de V. Exª, que é oriundo de Tarauacá, Município que tem uma relação muito forte com os extrativistas.

V. Exª é um profundo conhecedor dos problemas que a nossa região vem enfrentando após a desativação das empresas extrativistas - que já foram responsáveis, não me canso de dizer, por 40% das exportações do Brasil em outras épocas.

Só para se ter uma idéia do que tem significado a falta de uma política para a borracha, 60 mil seringueiros podem ser obrigados a deixar a atividade - temos ainda, em toda a Amazônia, 60 mil famílias vivendo desse trabalho. Isso pode obrigar as famílias a procurar as periferias das cidades, como é o caso de Cruzeiro do Sul, Manuel Urbano e Rio Branco. No próprio Estado da Amazônia, já temos um enorme problema de população urbana, sem condições de infra-estrutura, como nos Municípios de Lábrea, Sena Madureira, Guajará-Mirim e tantos outros que podem ficar completamente ingovernáveis, com uma massa de população que não terá qualificação para conseguir um emprego no mercado de trabalho e nem infra-estrutura necessária para viver com mínima dignidade.

No levantamento que fizemos, se levarmos em conta o tamanho de cada uma das 60 mil famílias - e todos sabem que as famílias dos seringueiros, das pessoas que moram na roça, são muito numerosas - teríamos cerca de 330 mil pessoas sem nenhuma condição de sobrevivência, porque passariam à condição daqueles que, na cidade, são chamados de mão-de-obra desqualificada. Repito: um seringueiro, um lavrador é mão-de-obra desqualificada na cidade; no campo, ele é mão-de-obra altamente qualificada.

Meu pai é um excelente agricultor; foi um excelente seringueiro e, hoje, é um pequeno comerciário. Graça a Deus, ele cursou até o 4º ano primário; sabe as quatro operações de matemática e consegue escrever muito bem, melhor do que muitos que terminam o Ginásio e o Segundo Grau. Mas isso foi uma contingência do destino, porque, quando ele saiu do Ceará, como soldado da borracha, já havia conseguido fazer o 4º ano primário. Porém, considero-o mais qualificado na roça do que como pequeno comerciário, onde ganha dois salários mínimos como vendedor. Muitas pessoas não têm a mesma sorte: ou vão empurrar um carrinho de picolé, ou as meninas partem para a prostituição, enfim, a família se degenera completamente. Portanto, teríamos 330 mil pessoas correndo o risco de levar esse tipo de vida.

A indústria de pneus está preferindo importar a borracha dos países asiáticos, que subsidiam a sua produção e ainda investem recursos significativos no desenvolvimento tecnológico da extração da borracha - coisa que o Brasil não fez à época que podia ter feito, para que, inclusive, não tivéssemos perdido a competitividade.

O segmento extrativista reconhece a necessidade de maior eficiência e inovações tecnológicas, tanto na produção como no beneficiamento da borracha, mas, neste momento, isso só será possível com o apoio governamental. Os seringueiros se propõem a melhorar a qualidade da borracha para atender às necessidades do mercado nacional, desde que o Governo os capacite e ofereça tecnologia para tal.

Nesse sentido, não me canso de enfatizar o fato de que há uma abertura por parte do Conselho Nacional de Seringueiros e das comunidades extrativistas em ter investimentos técnicos para que possam melhorar sua produção.

No mês de abril, estarei acompanhando o Presidente da Pirelli do Brasil, o Dr. Tomazini, para uma visita ao Município de Xapuri, onde assinarão um convênio de melhoramento técnico da borracha dos extrativistas do Estado do Acre. A Pirelli colocará alguns técnicos para que consigamos um melhor produto.

Isso é resultado da visita que fiz ao Presidente da Pirelli, na Itália. Na oportunidade, pude falar que o mundo desenvolvido cobra-nos a preservação da Amazônia, mas não nos dá alternativa de sobrevivência se a mantivermos preservada. Tanto é verdade que preferem comprar a borracha da Malásia a comprar da Amazônia. Assim nossas populações são obrigadas a ir para o garimpo predatório, para a extração irregular de madeira ou para a degradação social, que é viver nas periferias das cidades.

Conseguimos sensibilizar, de alguma forma, os executivos da Pirelli, que se propuseram a nos ajudar mediante cooperação técnica, para que a nossa borracha deixe de ser considerada como produto de segunda categoria.

Um outro aspecto importante a ser considerado são as ações quem podem ser desenvolvidas pelo Ibama. Inclusive, já houve iniciativas, na época do Dr. Raul Jungmann, por parte do CNPT-Ibama, que podem ajudar no melhoramento técnico. Já existem algumas ações nesse sentido, como a implementação das usinas de beneficiamento de borracha nos Municípios de Xapuri, Sena Madureira, Feijó, Cruzeiro do Sul, e mais outras seis usinas em toda a Amazônia. Essa usinas de beneficiamento gerarão emprego, agregação de valores e alguma circulação de dinheiro durante o processo.

Não bastam, portanto, afirmações econométricas superficiais de que a borracha importada é mais barata ou melhor do que a nacional. Já conhecemos essa questão, sabemos até por que acontece dessa maneira. O Governo tem que entender que o extrativismo na Amazônia não é um problema apenas social e econômico, mas também um problema ambiental. Se quisermos preservar a Amazônia, se quisermos desenvolvê-la, se quisermos dar uma resposta de natureza econômica para as populações que manejaram seus recursos, que aprenderam a lidar com a floresta e que até hoje ali sobrevivem sem causar grandes danos, precisaremos de uma política para esse setor.

A nossa proposta de política para extrativismo também envolve a possibilidade de se manter na floresta seus verdadeiros sentinelas, os seringueiros, dando-lhes condições de sobrevivência.

Aos economistas, perguntamos: se o Governo brasileiro fosse pagar guardas florestais para proteger a Amazônia, quantos bilhões e bilhões seriam necessários? Os seringueiros fazem isso desde que tenham o mínimo necessário nas áreas de saúde e de educação e ainda uma política de preço que lhes dê pelo menos um salário mínimo como renda mensal. Além disso, precisam de condições de escoamento do produto e a garantia de que ele será comprado.

Queremos uma política, para a borracha, que leve em conta os aspectos sociais, culturais, econômicos e ambientais; uma política que garanta a melhoria nos níveis de renda e condições de vida da população. Nesse sentido, apresentamos uma proposta.

Estamos vivendo um problema grave, que é a venda da castanha brasileira para os bolivianos. Não contamos com uma política de preço para a castanha; não está havendo condições para que as cooperativas, os consumidores, os compradores nacionais, que ainda adentram ao seringais comprando castanha, possam comercializar esse produto. O que está acontecendo é que a Bolívia está comprando a nossa castanha em todo o entorno da área de fronteira e criando um sério problema, inclusive para a cooperativa de Xapuri.

Apresento aqui a proposta que estará sendo debatida com o Governo pelo Movimento dos Seringueiros e também pelos produtores de borracha dos seringais de cultivo, que se juntaram aos seringueiros porque acham que nesse momento é fundamental a ação conjunta, porque ambos estão sendo prejudicados.

Ontem, reunimos em meu gabinete o Senador Jonas Pinheiro, o representante do Conselho Nacional dos Seringueiros e os representantes do seringais de cultivo, quando examinamos minha proposta. É a seguinte:

      1 - "Em relação à falta de estrutura técnica e administrativa do Ibama para responder às nossas necessidades, propomos que seja readequado o setor e que seja criada uma Diretoria de Borracha Nativa que atenda aos interesses econômicos do conjunto do setor, no qual existe uma participação institucional das entidades dos seringueiros, como o Conselho Nacional de Seringueiros:

      2 - que seja mantido o contingenciamento, as importações da borracha natural, favorecendo o consumo da borracha natural existente no País, com especial atenção para a borracha nativa;

      3 - definir uma política de preço para a borracha nativa, a fim de remunerar satisfatoriamente os seringueiros de tal maneira que possa haver uma renda mensal de um salário mínimo;

      4 - implementar o Prodex, que é uma linha de crédito criada com o esforço da Bancada da Amazônia.

Estive à frente de todo o processo de negociação junto ao Governador do Estado do Amapá e ao Secretário de Planejamento de Rondônia. Graças a Deus, conseguimos sensibilizar a Drª Flora Valadares para implementação da primeira linha de crédito para os extrativistas. Que essa linha de crédito seja implementada com regras operacionais que garantam o acesso aos tomadores - extrativistas - em condições justas, adequadas, socialmente possíveis, para que possam habilitar-se junto ao banco.

      5 - Estabelecer portaria Ministerial onde 50% da Tormb - os recursos que o Senador Nabor Júnior acabou de mencionar - sejam destinados a investimentos nos seringais nativos, através do CNPT-Ibama - trata-se de órgão do Ministério do Meio Ambiente só para ações junto aos extrativistas - para financiamentos de projetos de apoio à produção e comercialização da borracha apresentados por Cooperativas, Sindicatos e Associações de Seringueiros.

      6 - Desenvolver junto aos seringueiros um Programa de Assistência Técnica e de capacitação para melhorar a produção e a qualidade da borracha, especialmente da Placa Bruta Defumada, nova técnica que garante melhor qualidade.

Após a aplicação dessa técnica, o produto ficaria com mais pureza e não estaria, digamos assim, perdendo a competitividade para a borracha que estamos importando;

      7 - dar prioridade às áreas de seringal nativo, na alocação de recursos federais para a questão da saúde, da educação.

Acima de tudo, deve ser criada infra-estrutura comum dentro das reservas extrativistas, para que os seringueiros possam ter o mínimo de vida social. Inclusive temos um projeto a respeito desse tópico. Seria algo muito semelhante ao que apresentou o ex-Senador Darcy Ribeiro.

Eu falaria ainda sobre a portaria que foi assinada pelo Ministro do Meio Ambiente, mediante a qual se cria um grupo de trabalho para o desenvolvimento da Amazônia. Essa portaria reporta-se apenas ao setor empresarial, deixando de fora as entidades, os movimentos sociais e aquelas pessoas que têm condições de dar algum tipo de colaboração. Mas isso é assunto para uma outra oportunidade, até porque, estamos próximos da avaliação da Rio+5, quando me pronunciarei sobre o caso.

O problema do desenvolvimento da Amazônia não se resolve com ação do Governo ou dos empresários, ignorando o conjunto da sociedade, principalmente dos setores produtivos. Não se pode praticar a velha política segundo a qual "para a Amazônia o desenvolvimento são os grandes projetos pensados de fora para dentro e não de dentro para fora".

Peço Sr. Presidente que o meu pronunciamento, por inteiro, conste nos Anais da Casa.

Vamos fazer uma articulação: o Senador Nabor Júnior, Senador Jefferson Péres, Senador Jonas Pinheiro, Senador Carlos Bezerra, eu e tantos outros Senadores que estão demonstrando sensibilidade com o problema dos extrativistas da Amazônia.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/03/1997 - Página 4794