Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O TRABALHO DOS PARLAMENTARES NA ELABORAÇÃO ORÇAMENTARIA. CORTES NO ORÇAMENTO DE 1997, NOTICIADOS PELO JORNAL DA TARDE.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O TRABALHO DOS PARLAMENTARES NA ELABORAÇÃO ORÇAMENTARIA. CORTES NO ORÇAMENTO DE 1997, NOTICIADOS PELO JORNAL DA TARDE.
Publicação
Publicação no DSF de 22/02/1997 - Página 4294
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • DEFESA, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, CONGRESSISTA, APERFEIÇOAMENTO, PROJETO DE LEI ORÇAMENTARIA, APRESENTAÇÃO, EMENDA, ATENDIMENTO, INTERESSE, ESTADOS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DA TARDE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVULGAÇÃO, PRETENSÃO, GOVERNO FEDERAL, REDUÇÃO, ORÇAMENTO, EXERCICIO FINANCEIRO.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, REDUÇÃO, ORÇAMENTO, DESRESPEITO, TRABALHO, CONGRESSISTA.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a principal missão do Congresso Nacional é a elaboração das bases financeiras da administração do País, através do Orçamento anual. É uma tarefa sobre a qual se debruçam, preliminarmente, os técnicos dos Três Poderes, para que, na data estabelecida pela Constituição, o Presidente da República envie o texto ao Legislativo, a fim de ali receber a análise e as modificações ditadas pelo próprio interesse da sociedade.

Quando encaminha ao Congresso Nacional a Mensagem contendo o Projeto de Lei Orçamentária, portanto, o Executivo deve estar consciente das implicações e dos ritos do processo democrático, posto que Senadores e Deputados Federais também não podem deixar de cumprir sua missão de estudar e, quando cabível e desejável, alterar o texto original.

É um trabalho exaustivo, que V. Exªs conhecem e têm vivido no exercício dos seus mandatos: durante praticamente todo o segundo semestre de cada ano, dedicamo-nos ao processo de elaboração orçamentária, tarefa que exige redobrado esforço daqueles que fazem parte da Comissão Mista. Todos nós estamos sujeitos às freqüentes visitas de Governadores, Deputados Estaduais, Prefeitos, Vereadores e representantes das comunidades que nos elegeram - e que trazem, justamente, as aspirações legítimas dos nossos concidadãos.

Na raiz de tudo, vamos encontrar uma questão conceitual que nem sempre é entendida como deveria ser: os técnicos devem redigir as propostas, dentro de suas óticas teóricas ou burocráticas; os Representante do povo, por seu turno, devem adequá-las aos anseios gerais da nacionalidade, porque a Nação se compõe de seres humanos, não de algarismos!

No afã de obter resultados econômicos retumbantes, muitas vezes os tecnocratas se ligam apenas aos fatores já consolidados da produção nacional, dos grandes centros desenvolvidos e densamente povoados; obedecem, talvez inconscientemente, às barreiras criadas pelo Tratado de Tordesilhas, onde o Brasil pouco ultrapassa a faixa litorânea - e, assim, conseguem agravar ainda mais as imensas dificuldades sofridas por quem vive a luta diuturna para efetivamente integrar ao Brasil mais de metade de seu território.

Nós, membros do Congresso Nacional, vemo-nos atingidos por maldosas, constantes e infundadas acusações, quando, no exercício de nossas obrigações constitucionais, modificamos pontos da proposta enviada pelo Executivo. Mas, se não o fizéssemos, estaríamos fugindo ao cumprimento do dever, estaríamos negando ao povo justamente o que ele nos determinou: adequar os números à realidade das aspirações sociais do País.

Sempre existe, entretanto, quem aponte o dedo para esta Casa e clame contra pretensos "desfiguramentos" do Projeto; pessoas que - à falta de argumentos institucionais legítimos - acusam os Congressistas de "paroquialismo" e "fisiologismo" no encaminhamento da chamada Lei de Meios. Sempre existem os burocratas e técnicos, dos mais diversos escalões, que tratam o Orçamento como obra própria pessoal e irretocável, acima de qualquer crítica ou modificação.

Acabamos de concluir, na recente Convocação Extraordinária, a apreciação do Orçamento da União para o exercício iniciado em 1º de janeiro último. Desde setembro, a matéria envolveu as atenções prioritárias de todos nós, não apenas dos que compõem a Comissão de Orçamento, mas de todos nós, repita-se, pois é coletiva a missão de, ouvindo os reclamos dos concidadãos, buscar bases humanas e positivas na definição dos programas orçamentários.

As emendas propostas por Senadores e Deputados e acatadas pelo Plenário são uma gota d´água no universo de R$431 bilhões, dos quais mais da metade - R$223 bilhões - serão queimados na fogueira da dívida pública mobiliária federal.

E o que são emendas parlamentares?

As emendas que apresentei, que cada um de V. Exªs apresentou, voltam-se para aqueles pontos esquecidos pelo pragmatismo e pelos delírios tecnocráticos dos autores da proposta original; são aperfeiçoamentos, posto que se destinam a melhorar as condições de vida dos cidadãos e preencher importantes lacunas deixadas pelos macroelaboradores. Uma balsa para a municipalidade de Marechal Thaumaturgo pode parecer um reles detalhe paroquial para os gênios dos gabinetes refrigerados, mas é vital para a sobrevivência dos brasileiros que constroem e garantem as fronteiras distantes da Pátria.

A estação de tratamento de água, em Rio Branco, sofre o anátema da corrupção de governos passados e é tratada como erva daninha pelos tecnocratas federais - mas, sem ela, a vida do povo da Capital acreana continua sendo um inferno de doenças, carências e precariedades.

Estou certo de que cada um de V. Exªs poderá dar um depoimento semelhante, à luz das necessidades específicas dos respectivos Estados. E estou certo, também, de que o sentimento de revolta e impotência é praticamente unânime, quando vemos ameaçado o trabalho estafante de meses a fio, em que buscamos aperfeiçoar a proposta orçamentária.

Sim, porque o Governo já está reencenando a ópera anual dos cortes.

O Jornal da Tarde estampou, no último dia 18, matéria que antecipa a passagem da tesoura sobre o Orçamento: "GOVERNO VAI CORTAR R$10 BILHÕES." E, obedecendo ao vocabulário dos tecnocratas, fala em contingenciamento, metas fiscais superávits de primários, etc - um discurso que já conhecemos e sofremos nos últimos anos.

Vamos detalhar o que diz a informação do sempre respeitado JT:

      "O Governo Federal pretende cortar, por decreto, pelo menos R$10 bilhões do Orçamento para 1997 - deverá usar R$7 bilhões, hoje destinados a outras despesas, para pagar juros de sua dívida. A previsão orçamentária terá de ser reduzida em R$3 bilhões, devido à expectativa e queda na arrecadação deste ano."

Nem esse corte arbitrário, todavia, conseguirá resolver o problema do acerto de contas do Governo, como acrescenta o Jornal da Tarde: "com os cortes, a equipe econômica prevê que metade dos juros previstos para vencer este ano será efetivamente paga, enquanto o restante se transformará em aumento da dívida."

Os técnicos do Governo, segundo o JT, mais uma vez jogam a responsabilidade sobre o Congresso. "A lei orçamentária aprovada pelo Congresso, alegam os técnicos do Governo, não permite pagamento de juros com receita de impostos. Toda essa conta, sustentam os técnicos, teria de ser paga com endividamento, se não forem cortadas despesas".

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, louve-se, na matéria estampada terça-feira pelo Jornal da Tarde, a preocupação de ouvir a Comissão de Orçamento do Congresso. É uma atitude que, longe de ser rotineira, acontece poucas vezes, porque é sempre mais fácil e mais cômodo insultar os políticos.

De início, ficou patente a atitude política do Governo, que, por seus técnicos, aumentou em 79,32% a rubrica "amortização da dívida interna e externa", resultando no fabuloso montante de R$223 bilhões, como citei, baseado nessa reportagem, no início do presente pronunciamento.

Em contrapartida, "houve uma queda de 7% dos recursos para investimentos", informa o jornal, acentuando que "o total reservado pelo Governo para obras e projetos não passa de R$10 bilhões, menos de 3% do Orçamento".

Nenhum desses números é gratuito. Para chegar ao quadro final da receita e da despesa, em 29 de janeiro, o Congresso gastou dias e noites a fio; discutiu cada item e cada dotação das verbas públicas, em busca de caminhos que melhor atendam aos interesses da nacionalidade, tanto nos grandes projetos federais quanto no atendimento à dura realidade dos rincões mais distantes e esquecidos.

Cumprimos o nosso dever. Fizemos, dentro das limitações de recursos e de tempo, o melhor Orçamento possível, o mais justo e mais racional. Trabalhamos dentro das regras democráticas previstas na Constituição, que pôs termo ao tempo em que o Congresso se limitava a carimbar a proposta, nos estritos termos elaborados pelo Executivo.

Ou será que esse tempo ainda não acabou, Sr. Presidente? É uma suspeita cabível, porque as perspectivas indicam um novo corte em todas as propostas surgidas no Legislativo - corte por meio de vetos, de contingenciamentos ou do simples desprezo pelas dotações fulminadas pelos tecnocratas.

De que valeu nosso esforço?

De que valeu a luta dos Prefeitos, Vereadores, Deputados Estaduais, Governadores, lideranças comunitárias, representantes informais da sociedade? Para que tanto esforço, se o resultado final é idêntico ao que vigorava no período militar? Terá a ditadura dos tecnocratas mudado apenas de estratégia? Antigamente, proibiam-se mudanças no projeto de Orçamento; hoje, os tecnocratas vetam ou engavetam as mudanças. O resultado, como se vê, é o mesmo: o Congresso castrado em sua principal prerrogativa, na sua missão mais elementar, a de fazer o Orçamento do União.

Como sempre, falo com base em fatos e informações acima de contestações. Jamais permito ou permitirei que uma palavra leviana me possa ser atribuída a qualquer pretexto. E, no que diz respeito ao Orçamento, os números são impressionantes e definitivos.

Apenas onze das dotações destinadas a rubricas acreanas no Orçamento de 1996 foram efetivamente empenhadas e liquidadas; 15 ficaram na casa dos 90%; 5, na dos 80%; 3, na dos 70% - e todas as demais, 30 ao todo, foram liquidadas em percentuais que se reduziam progressivamente de 57,6% a 1,03%.

Mas existem outros dados piores, ainda mais comprobatórios do desrespeito com que o trabalho legislativo orçamentário é tratado: três rubricas chegaram a ser empenhadas, mas não foram liquidadas; 37, embora autorizadas, nem mereceram empenho financeiro.

Mas o pior não fica aí: tivemos outras 31 rubricas que sequer foram autorizadas no mais frontal desrespeito ao trabalho dos Congressistas. Desrespeito ainda maior para com os cidadãos que nos elegeram para representá-los e, por nosso intermédio, dentro dos parâmetros da democracia, buscaram alento capaz de aliviar a precariedade das condições de vida que os angustiam.

Menos de 10% das dotações para o Estado do Acre, como se vê, foram efetivamente cumpridas; metade delas sequer chegou a ser parcialmente paga - foi sugada por interesse dos gênios que formulam e manipulam as finanças nacionais.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, deixo com V. Exªs a íntegra dos relatórios e dos resultados que citei para inserção nos Anais da Casa e exemplo às futuras gerações de Parlamentares. E o faço na esperança de que esse clima de descaso e de desrespeito não venha a continuar.

Digo, ainda, com a sinceridade de sempre: não fosse minha trajetória de democrata incondicional, não fosse minha luta de décadas contra ditadores e autoritários de todos os matizes - não fosse isso, eu diria que nos tempos do arbítrio era até melhor, porque o quadro institucional se mostrava mais nítido e mais honesto: era proibido mudar as diretrizes enviadas pelo Governo e ponto final!

Hoje, a sociedade conquistou, com a Carta de 1988, o direito de adequar os números dos técnicos à realidade de suas legítimas aspirações. Mas isso de nada valem, porque os técnicos simplesmente cortam, vetam, esquecem, engavetam e pisoteiam o fruto dos interesses canalizados pelo povo por intermédio de seus autênticos representantes: os Senadores e os Deputados Federais.

O novo ano está apenas começando. Não gostaria de ser tomado como pessimista ou alarmista, ao chamar a atenção da Casa e do País para o risco de novas agressões ao trabalho elaborado na Comissão de Orçamento e no Plenário do Congresso Nacional, responsáveis pelo Orçamento prestes a ser sancionado pelo Presidente da República.

Será para mim uma verdadeira satisfação, se puder, no final do ano, dizer que as palavras deste discurso estavam erradas; desejo, sinceramente, que o Orçamento aprovado pelo Congresso seja lealmente cumprido, que as 11 mil emendas elaboradas e propostas pelos Congressistas contribuam para tornar humano e factível o manuseio das riquezas nacionais; que o cumprimento rigoroso do Orçamento de 1997 abra novos tempos para a magna causa da defesa dos interesses dos brasileiros, pessoalmente e do conjunto de seus objetivos.

Até lá, devemos todos ficar atentos à sanção e à posterior execução das normas que estabelecemos.

Cada Estado tem suas dotações, de cada Representante se exige prestar contas a seus representados de como se desempenhou no exercício do mandato por eles conferido nas urnas soberanas.

Há tempo para tudo. Agora, temos de lamentar as omissões arbitrárias e os erros verificados no exercício de 1996 - mas vamos, acima de tudo, lutar para que esse desrespeito à representatividade popular não se repita em 1997.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/02/1997 - Página 4294