Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AO NOVO REPRESENTANTE DA COMUNIDADE AFRO-BRASILEIRA NO SENADO FEDERAL, SENADOR ABDIAS NASCIMENTO, QUE SUBSTITUI O SENADOR DARCY RIBEIRO NA BANCADA DO RIO DE JANEIRO.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM AO NOVO REPRESENTANTE DA COMUNIDADE AFRO-BRASILEIRA NO SENADO FEDERAL, SENADOR ABDIAS NASCIMENTO, QUE SUBSTITUI O SENADOR DARCY RIBEIRO NA BANCADA DO RIO DE JANEIRO.
Aparteantes
Ademir Andrade, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 05/03/1997 - Página 4938
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, POSSE, ABDIAS NASCIMENTO, SENADOR, SOCIOLOGO, ECONOMISTA, HISTORIADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), SENADO.
  • ELOGIO, TRABALHO, ABDIAS NASCIMENTO, SENADOR, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo esta tribuna para registrar o retorno do Senador pelo Estado do Rio de Janeiro, sociólogo, economista, historiador, Abdias Nascimento, esta Casa.

Abdias Nascimento, conhecido por nós como o Guerreiro Negro, é o nosso Zumbi. Assume o mandato com o afastamento do titular, em 1991 e, a partir de então, começamos a ter uma representação da comunidade afro-brasileira neste Senado Federal.

Mais tarde, sua produção, tudo que aqui fez serviu-me de orientação. Temos um carinho e um respeito muito grande por ele. Defensor de várias causas, mas numa é radical e não abre mão, o que é importante para nos dar a força necessária para não calarmos, mas falarmos enquanto tivermos fôlego.

Tenho em mãos o discurso que Abdias fez quando da sua posse, em 1991, do qual vou ler alguns trechos:

      ".. a esta tribuna não ascende apenas um Senador do Partido Democrático Trabalhista, representante do Estado do Rio de Janeiro, nem tampouco o economista ou o teatrólogo, antes entregador de doces que sua mãe fazia, ou o faxineiro que estudava à noite, nem o professor universitário e artista plástico, autor de obras sociológicas e políticas, que lecionou e trabalhou nos Estados Unidos e na África, ainda que exilado e perseguido. Ocupa esta tribuna um afro-brasileiro, um homem comum, consciente de sua origem africana e que jamais abdicou aos seus direitos de cidadão brasileiro... Um filho desse povo heróico, construtor de civilizações milenares, que veio acorrentado para as terras "recém-descobertas" das Américas. E é esse povo que quero invocar em primeiro lugar, pois é em nome dele que estou aqui neste momento. Evoco aqueles que me antecederam nesta luta que me traz hoje a esta tribuna: na pessoa de Zumbi de Palmares, rendo minhas homenagens a todos os africanos e afro-brasileiros que batalham e batalharam por amor a seu povo e ao Brasil, seguindo a longa tradição africana que remonta à linha das rainhas-mães e guerreiras Kentake, da antiga Núbia, Yaa Asaantewa, de Ghana, Nzingha, da Angola, chegando ao Brasil nas pessoas de Dandára, Aqualtune e Luiza Mahin".

Essas foram palavras do Senador Abdias do Nascimento, em 1991, da tribuna do Senado Federal.

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª me permite um aparte?

A SRA. BENEDITA DA SILVA - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Ademir Andrade.

O Sr. Ademir Andrade - Senadora Benedita da Silva, desejo associar-me a V. Exª nesta homenagem ao nosso colega Abdias do Nascimento. Fico feliz de vê-los aqui. Fui colega do Senador Abdias do Nascimento na Câmara dos Deputados. Conheço a sua dedicação, o seu trabalho, o seu envolvimento na causa dos negros, no combate ao racismo. Conheço a sua história e o seu trabalho. Portanto, acho justíssima a homenagem que V. Exª faz a ele neste momento, considerando inclusive o fato de ser o Senador Abdias do Nascimento do PDT e integrar o nosso Bloco, o Bloco da Oposição no Senado da República. Creio que sua presença e sua participação vão ampliar a força desse Bloco. Concluo o meu aparte, Senadora Benedita da Silva, dizendo que temos que caminhar para melhorar cada vez mais. Nós, neste Parlamento, no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, temos que ter uma representação do povo na proporção do próprio povo. Somos hoje 81 Senadores da República e temos V. Exªs, os dois Senadores negros desta Casa, que estão aqui cumprindo o seu papel e que merecem e têm merecido de todos nós, em todo momento, o respeito. V. Exª mesma já passou aqui algumas dificuldades e recebeu a solidariedade dos seus companheiros e desta Casa pelo valor que tem o seu trabalho. Entendo que devemos caminhar para que um dia a representação de negros no Senado seja tão grande quanto é a sua população. Da mesma forma, a representação das mulheres. De 81 Senadores, apenas cinco são mulheres, num País que tem a maioria de mulheres. Digo sempre, com muita franqueza e sinceridade, que o Congresso brasileiro será muito melhor, muito mais eficiente, muito mais competente no dia que tiver na sua formação uma proporção de mulheres condizente com a quantidade de mulheres do nosso Brasil. Porque as mulheres são, realmente, mais sensíveis, mais corajosas, mais conhecedoras dos problemas, mais responsáveis, porque acumulam dupla responsabilidade, na maioria das vezes. Fico feliz em ter V. Exªs aqui conosco e espero que ampliemos a participação não só dos negros como também das mulheres nesta Casa. Creio que nesse dia, quando alcançarmos isso, estaremos caminhando para o aperfeiçoamento político e para a verdadeira conquista da justiça social pela qual tanto lutamos. Muito obrigado.

A SRª BENEDITA DA SILVA- Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Ademir Andrade, e sei que o Senador Abdias do Nascimento é uma pessoa querida de todos nós.

Eu gostaria também de dizer que esse homem, mais do que o Senador, comprometido com a causa social, comprometido com a defesa intransigente do negro brasileiro, do negro no mundo, mereceu uma homenagem simples na Câmara de Vereadores, quando fui eleita vereadora na cidade do Rio de Janeiro. Eu não tinha visto outra pessoa senão Abdias do Nascimento para prestar uma homenagem a todos os negros, que tiveram a coragem, que ajudaram e que me fizeram representante da cidade do Rio de Janeiro. Lembro-me bem da homenagem feita, do fundo da alma, do coração, do meu sentimento, do meu respeito, da minha solidariedade, porque esse homem faz escola no País.

O rico currículo de Abdias do Nascimento revela um pouco de sua trajetória política. Filho de José Ferreira do Nascimento e de Georgina Ferreira do Nascimento, nasceu em 14 de março de 1914, em Franca, São Paulo. Neto de escravos, seu pai sapateiro e sua mãe doceira.

Esse homem deu a volta por cima e chega com um currículo invejável. Não é o fato de chegar ao Senado, Senado foi conseqüência de todo o acúmulo dessa luta que ele travou ainda no seio familiar, dadas suas condições sociais.

Abdias do Nascimento participou das revoluções de 1930 e 1932, nesta última como "cabo de esquadra".

Por suas atividades políticas durante a carreira estudantil, em 1937 foi condenado pelo Tribunal de Segurança Nacional por lutar contra o Estado Novo, em defesa do patrimônio nacional.

Também na década de 30 participou das lutas do Movimento Negro, integrando a Frente Negra Brasileira. Foi ele que, em 1944 - quando eu estava ainda no meu caixote, no meu berço que era um caixote - fundou o Teatro Experimental do Negro, criando espaço no teatro para o negro, até então excluído do meio teatral. Em 1968, fundou o Museu de Arte Negra.

Temos orgulho de Abdias do Nascimento. Em decorrência do golpe militar de 1964, foi obrigado a deixar o País, permanecendo nos Estados Unidos como professor catedrático da Universidade de Nova Iorque, onde fundou a cadeira de culturas africanas, e na Nigéria, como professor visitante do Departamento de Línguas e Literatura Africana da Universidade de Ife.

Com a abertura política no Brasil, Abdias do Nascimento fundou, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, o Instituto de Pesquisa e Estudos Afro-Brasileiros, o Ipeafro.

Participou da Fundação do PDT e, em 1983, foi eleito Deputado Federal.

Esse homem merece todas as homenagens.

Abdias do Nascimento foi responsável - e a minha alegria é que eu também estava junto - pela criação da Fundação Cultural Palmares e pelo tombamento da Serra da Barriga. É Presidente do Memorial Zumbi, órgão da sociedade civil.

Com o retorno de Abdias do Nascimento, o Estado do Rio de Janeiro passa a ser o único Estado brasileiro, e o primeiro da História, a possuir duas representações nesta Casa. É altamente significativo para nós.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senador Abdias do Nascimento tem afirmado que sua atuação parlamentar dará prosseguimento a sua vida pública, dedicada à defesa e à promoção dos direitos humanos e civis da população afro-brasileira.

Tenho certeza de que, desta tribuna, ouviremos ecoar mais um grito de Zumbi dos Palmares através da voz desse grande cidadão brasileiro.

Em discurso que fará dia 21 de março próximo, tenho certeza de que esta Casa receberá dele uma brilhante aula do conhecimento da vida do povo afro-brasileiro e também do conhecimento formal da história do negro no mundo.

O Sr. Pedro Simon - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª. BENEDITA DA SILVA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Pedro Simon - Nobre Senadora, em primeiro lugar, reconheço que o Rio de Janeiro é o primeiro Estado a ter dois representantes negros no Senado e é também o primeiro Estado a ter maioria na sua representação no Senado, porque o outro é minoria e deve se colocar no seu lugar, respeitando a maioria, que é representada por V. Exª e pelo ilustre Senador Abdias do Nascimento. Fico emocionado com o seu pronunciamento. V. Exª sabe de todo o carinho, todo o respeito e toda a admiração que tenho pelo seu trabalho, pela sua luta e pelo esforço que vem fazendo, na tribuna do Senado Federal, no debate das questões sociais, da gente sofrida, do nosso povo. E, dentro do social, não há como deixar de reconhecer, lamentavelmente, o percentual dramático e cruel dos negros, que são os mais injustiçados e os mais esquecidos na história deste País. Mas V. Exª hoje faz um discurso diferente, trazendo sua saudação à presença do extraordinário companheiro Abdias do Nascimento. É claro - e S. Exª sabe disso - que todos nós já festejamos. Já tive a oportunidade de fazer um pronunciamento saudando-o quando, em 1991, S. Exª chegava a esta Casa. É claro que todos nós gostaríamos de fazer esta saudação em outras circunstâncias. Todos sentimos a queda e a morte daquele que era um homem internacional e que, embora branco, defendia os interesses dos negros de todas as injustiças, um homem acima do bem e do mal, o Senador Darcy Ribeiro. Não tenho dúvida de que o Senador Abdias do Nascimento vem para ficar. S. Exª vem com uma mensagem, com uma bandeira, com uma história e com uma biografia. V. Exª tem toda razão. Neto de escravo, seu pai um homem humilde, sua mãe uma doceira, começando lá de baixo, subiu esse degrau e chegou a uma condição que o torna o grande líder, o grande nome e o grande chefe, exatamente como V. Exª, da causa do negro no Brasil. Dessa causa que não deve ser apenas o debate da poesia, ou apenas o debate da demonstração de que as coisas são assim. Deve ser a constatação da crueldade da realidade, onde os negros são o maior número na favela, na prisão, em condenações, o maior número de injustiçados sociais. Esse debate tem que vir. A responsabilidade de V. Exª, e agora de um modo especial do Senador Abdias do Nascimento, é cobrar do Senado, do Congresso Nacional e das elites brasileiras a irresponsabilidade do seu silêncio, a sua hipocrisia no sentido de ver o problema e não participar da sua solução. Não tenho dúvida de que V. Exª, com muita alegria, traz essa saudação a Abdias do Nascimento. Conheço S. Exª de longa data. Jovem, aprendi a apreciar o seu trabalho, o seu esforço e, principalmente, o seu arrojo. Falou-se em teatro negro, quando no Brasil já são inúmeros os artistas negros que se impõem ao respeito do povo brasileiro - mas S. Exª começou lá atrás, como muito bem diz V. Exª -, quando subir num teatro alguém de cor era considerado um absurdo. Mas S. Exª teve coragem de iniciar o teatro experimental, de fazer o Museu do Negro, de lutar pelas causas verdadeiras, e, no entanto, sofreu a violência na ditadura do arbítrio do Estado Novo e veio sofrer de novo em 1964, porque não se entregou. Geralmente, alguém que leva uma paulada muda depois, adapta-se. S. Exª sofreu na luta contra a tirania no Estado Novo e mostrou que é vencedor. Venceu lá em Nova York, voltou, elegeu-se Deputado, e hoje está aqui. E V. Exª o homenageia com uma rara felicidade. E que beleza ver a sua grandeza de espírito! V. Exª poderia dizer que era a rainha, estava só e que agora são dois. Mas V. Exª tem essa grandeza de entender que, multiplicado por dois, são maioria, como neste momento, neste final de sessão, em que V. Exªs já são maioria neste Plenário. Não tenho qualquer dúvida de que, logo adiante, o pensamento de V. Exªs será maioria dominante neste plenário. Meus cumprimentos também ao Senador Abdias do Nascimento, meu carinho, meu respeito, minha admiração e minha convicção pelas idéias que defende, pelas lutas do PDT, do trabalhismo, que tem uma história tão longa a favor do social neste País. V. Exª, por sua história, vem fortalecer substancialmente o Congresso Nacional, vem nos ajudar no sentido de que este Senado saia da posição de acomodação, de só discutir o supérfluo, debatendo as questões que estão lá em cima. Infelizmente, faz tempo que não vemos aqui neste Congresso, caro Senador, o cheiro do povo, o cheiro do debate das questões sociais, do voto e da preocupação com as questões do povo brasileiro. S. Exª vem com a grande responsabilidade de ajudar sua Colega e mais alguns que estão tentando sacudir a poeira, para mostrar que o Senado não é uma espécie de academia ou, como diziam alguns, o céu sem que se precise morrer para chegar lá. O Senado é onde debatemos as grandes e profundas teses, mas onde o cheiro do problema das questões sociais não aparece. S. Exª traz essa responsabilidade, diz bem V. Exª, nobre Senadora, não apenas no discurso do dia 21, dia da defesa da raça negra, mas ao longo do tempo. Eu que já me quedo e fico até o final da sessão para ouvir pronunciamentos como o de V. Exª, minha querida Senadora, terei que ficar mais algum tempo, porque tenho absoluta convicção de que teremos alguém falando em nome do povo, da gente mais simples e mais sofredora, um nome que nos emocionará pelo seu pensamento na pessoa do grande Senador Abdias do Nascimento.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço o aparte e sei que V. Exª tem sido um dos grandes colaboradores dessa causa, não só porque tem conhecimento, mas tem compromisso, porque não basta ter conhecimento, tem que ter compromisso. V. Exª tem se manifestado e sabemos que podemos contar com seu apoio e com esta Casa, porque tenho certeza de que o pronunciamento do Senador Abdias do Nascimento haverá de se somar a tantos outros que desta tribuna já foram feitos em defesa da comunidade negra, afro-brasileira. Sei que S. Exª defenderá políticas de ações compensatórias e a definição de cotas no mercado de trabalho; sei que pretende e quer a criação de cursos de apoio e que também defenderá com muita garra a demarcação das terras das comunidades remanescentes dos quilombos.

Nesta oportunidade, Senador Abdias do Nascimento, pelo respeito e pela consideração que tenho por V. Exª, humildemente, gostaria de prestar-lhe contas do que pude, até então, fazer nesta Casa. Eu, uma mulher cristã, tinha certeza e convicção de que Deus nos mandaria um reforço.

Neste momento, presto-lhe contas, porque V. Exª sabe que, quando partiu o nosso querido e estimado Senador Darcy Ribeiro, sequer pude concluir meu discurso nesta tribuna, pela dor da sua ausência não apenas no Senado, mas também no meu coração, como amiga que era dele.

Tenho certeza de que ele tinha um compromisso com essa causa e que não ficou - previa as coisas - devendo absolutamente nada quanto aos seus compromissos. Tenho certeza, também, de que não se entristeceu por saber que V. Exª estaria aqui. Pela vontade dele, V. Exª já estaria aqui há muito tempo - estas são palavras dele -, porque sabia da importância dessa representação.

Por isso, muitas vezes em que eu queria que aprovasse algo, eu invocava V. Exª e dizia: Vou conversar com Abdias, Senador Darcy Ribeiro. V. Exª tem que garantir, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, emendas que possam dar à comunidade afro-brasileira instrumentos na educação. Darcy, com aquele jeito, com seu sorriso, então, dizia: "Está bem. Não é o Abdias quem está aqui, mas posso fazer". Esse carinho do Senador Darcy Ribeiro para com V. Exª é digno de registro de minha parte.

Senador Abdias do Nascimento, tive algumas iniciativas e sei que contarei com V. Exª no reforço para fazer soar, com muito mais solidez, essas nossas propostas. Fiz aqui um projeto de lei inspirado e baseado nas reivindicações das comunidades afro-brasileiras, mas os estudos que realizo são nos livros de sua autoria.

Fiz um projeto lei ampliando o alcance da lei que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor; fiz o projeto que regulamenta a intitulação das áreas remanescentes dos quilombos. Projeto este que, vindo da Assembléia Nacional Constituinte, contou com um grande aliado à época, o Deputado, hoje Senador Bernardo Cabral, que se debruçou para dar uma redação concensual às forças políticas daquele momento, o que nos garantia - nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias - a possibilidade de regulamentar as titulações das áreas dos remanescentes quilombos.

Um projeto, ainda nesta Casa, estabelece a quota de participação de estudantes carentes e setores etnorraciais em instituições de ensino superior; outro que dispõe sobre a inclusão da presença dos negros nas produções das emissoras de TV e em peças publicitárias. Há um projeto, ainda de minha autoria, que torna obrigatória a menção do quesito "cor" em documentos; e um projeto de lei que inclui a disciplina História e Cultura da África nos currículos escolares.

Senador Abdias do Nascimento, sei que foi muito pouco, mas foi o que pude fazer. Alguns desses projetos ainda se encontram nas comissões, com pareceres favoráveis e contrários. Queremos que o Senado Federal tenha a sensibilidade de, em cada um desses projetos, não os ver como um projeto da Senadora Benedita da Silva, do PT fluminense, mas que os veja como o clamor de um povo que tem sustentado este País, dos filhos que não fugiram à luta e que querem instrumentos de igualdade. Sei que V. Exª será fundamental no convencimento deste Plenário, a sensibilizar-se por essas propostas, porque só nós sabemos como elas terão um efeito multiplicador e positivo em nossas vidas. Nós que, em meio à situação social que nos levou a pobreza, recebemos uma riqueza, segundo o meu conceito, divina, da inteligência, porque o saber não ocupa lugar. Podem-nos tirar a casa; podem-nos tirar o trabalho; podemos não ter onde reclinar a cabeça, mas a inteligência é coisa que foi herdada, dada divinamente, que ninguém jamais poderá nos tirar e que V. Exª, com muita competência, continua exercendo a serviço desta causa justa.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em nome do povo do Estado do Rio de Janeiro e da sociedade civil brasileira, que muito se orgulha do ilustre Senador, saudamos o mais novo Membro desta Casa. Temos a convicção de que a presença de Abdias do Nascimento entre nós significará mais um defensor das causas populares, com um papel de destaque na defesa da cidadania para o povo afro-brasileiro, um povo com o qual a nossa sociedade tem uma dívida concreta, não só moral".

Muito bem lembrado! Em várias ocasiões em que teve a oportunidade de me apartear em assuntos desta natureza, o Senador Pedro Simon não fez por menos e mencionou a dívida concreta que se tem para com a população afro-brasileira.

Antes de concluir, Sr. Presidente, quero, ainda, homenagear esse ilustre brasileiro que é Abdias do Nascimento registrando, Abdias, uma mensagem de sua autoria:

      "Enquanto o Brasil não assumir a rica beleza de sua identidade africana, a maioria de sua população ficará alijada do conjunto nacional. Para recuperar sua própria identidade nacional e resgatar a dívida que tem para com seus cidadãos de origem africana, urge à Nação brasileira mergulhar nas dimensões mais profundas dessa herança civilizatória africana. Essas verdades têm que ser ensinadas nas nossas escolas, para restituir ao contingente majoritário da nossa gente o seu auto-respeito, a sua auto-estima e a sua dignidade, fontes do protagonismo e da realização humana".

Obrigada, Abdias, por você existir. Obrigada por você estar aqui.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/03/1997 - Página 4938