Discurso no Senado Federal

DIVULGAÇÃO DE IMPORTANTE ESTUDO DO IPEA, SOB O TITULO:'A DISTRIBUIÇÃO DE RENDA ESTA PIOR QUE EM 92, DESIGUALDADE EDUCACIONAL E A RAIZ DO PROBLEMA'. RELATORIO DO PNUD, DIVULGADO NO SEGUNDO SEMESTRE DO ANO PASSADO, SOBRE A SITUAÇÃO BRASILEIRA. EXCLUSÃO DOS ESTADOS DO NORDESTE DAS PRIORIDADES DO GOVERNO FEDERAL, RESSALTANDO COMO EXEMPLO, A POLITICA AUTOMOTIVA QUE BENEFICIA O SUL E SUDESTE DO PAIS. SUGESTÃO AO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO PARA A CRIAÇÃO DE UM PROJETO-PILOTO, NA PARAIBA, DESTINADO A REDUZIR DISPARIDADES DE RENDA ENTRE AS REGIÕES DO BRASIL.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • DIVULGAÇÃO DE IMPORTANTE ESTUDO DO IPEA, SOB O TITULO:'A DISTRIBUIÇÃO DE RENDA ESTA PIOR QUE EM 92, DESIGUALDADE EDUCACIONAL E A RAIZ DO PROBLEMA'. RELATORIO DO PNUD, DIVULGADO NO SEGUNDO SEMESTRE DO ANO PASSADO, SOBRE A SITUAÇÃO BRASILEIRA. EXCLUSÃO DOS ESTADOS DO NORDESTE DAS PRIORIDADES DO GOVERNO FEDERAL, RESSALTANDO COMO EXEMPLO, A POLITICA AUTOMOTIVA QUE BENEFICIA O SUL E SUDESTE DO PAIS. SUGESTÃO AO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO PARA A CRIAÇÃO DE UM PROJETO-PILOTO, NA PARAIBA, DESTINADO A REDUZIR DISPARIDADES DE RENDA ENTRE AS REGIÕES DO BRASIL.
Aparteantes
Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/1997 - Página 5425
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, BRASIL, CONCLUSÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, MOTIVO, PRECARIEDADE, EDUCAÇÃO.
  • COMENTARIO, RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), ESTUDO, DESENVOLVIMENTO, HOMEM, INFERIORIDADE, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB).
  • CRITICA, GOVERNO, OMISSÃO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, INCENTIVO, INDUSTRIA AUTOMOTIVA, REGIÃO NORDESTE.
  • SUGESTÃO, CRIAÇÃO, PROJETO, GOVERNO FEDERAL, ESTADO DA PARAIBA (PB), OBJETIVO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na edição da Gazeta Mercantil, de segunda-feira, 24 de fevereiro, foi divulgado importante estudo do IPEA sobre distribuição e desigualdade de renda no Brasil, sob o título: "A distribuição de renda está pior que em 92, desigualdade educacional é a raiz do problema".

O estudo, extremamente detalhado, é de responsabilidade do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, um banco de cérebros do Ministério do Planejamento, conforme a matéria e o incontestável reconhecimento nos meios acadêmicos e junto à opinião pública do País.

Segundo as conclusões do referido estudo, a educação seria a fonte básica da desigualdade, devendo essa persistir enquanto não se priorizar o indispensável choque educacional de que o Brasil necessita.

Voltaremos ao assunto nos próximos dias, analisando-o em maior profundidade. Todavia, gostaríamos de, no dia de hoje, desta tribuna, relacioná-lo a um outro estudo, objeto de pronunciamentos meus e de alguns de meus nobres pares pela semelhança das conclusões alcançadas por um e por outro.

Trata-se do relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento-PNUD, divulgado no segundo semestre do ano passado sobre a situação brasileira. O estudo partia de um conceito novo, o de que a verdadeira riqueza de uma nação deve ser compreendida como um movimento para ampliar as possibilidades dos indivíduos e dos níveis de bem-estar já conquistados. Para tanto, trabalhava um conceito denominado índice de desenvolvimento humano.

O desenvolvimento humano é um processo mediante o qual as pessoas desfrutam de mais e melhores chances, entre elas, as mais importantes são uma vida prolongada e saudável, educação e acesso a recursos necessários para se ter uma vida decente. Outras oportunidades incluem a liberdade política, a garantia dos direitos humanos e o respeito a si mesmo.

A definição de desenvolvimento humano, Sr. Presidente, Srs. Senadores, assim imaginada, resulta naturalmente em grande dificuldade operacional para sua exata mensuração.

O problema, no caso, não é lidar com muitos indicadores que poderiam até por excesso prejudicar o resultado final. A questão está em escolher os índices confiáveis que irão revelar a qualidade de vida de uma comunidade.

Por essa razão, o PNUD restringiu a medição do desenvolvimento a três elementos essenciais da vida comuns a todos os povos do mundo, independentemente de diferenças culturais, econômicas, sociais ou políticas, isto é, longevidade, conhecimento e níveis decentes de vida. O cruzamento dessas três variáveis resultou no Índice de Desenvolvimento Humano, o IDH, que varia de zero a um e quanto mais perto da unidade maior nível de desenvolvimento.

É claro que o sistema não é perfeito. Uma das críticas mais comuns está em que os resultados apresentam médias que podem omitir variações existentes dentro das comunidades. Entretanto, seria muito mais difícil introduzir elementos como liberdade política, que teria resultados diferentes, segundo a cultura de cada povo.

Por essas razões, os técnicos do PNUD decidiram levar em consideração apenas aqueles três quesitos básicos. E sobre eles foi montado o Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil, sobre dados do censo de 1991 e com o auxílio do próprio IPEA.

Quando o estudo foi divulgado, revelou-se que os piores índices de desenvolvimento humano foram encontrados nos nove Estados do Nordeste. Os resultados, evidentemente, desagradaram aos formadores de opinião, aos líderes e aos políticos nordestinos.

A Paraíba, Estado que represento neste Senado, teve a pior colocação. A primeira reação originária dos Estados nordestinos foi a de levantar suspeitas sobre o estudo e encontrar discrepâncias estatísticas naquele trabalho.

Os emocionalismos que se abateram sobre o estudo do PNUD não lhe retiram, contudo, o mérito. Às vezes, as pessoas cogitam camuflar a realidade e, agindo assim, pensam que ela desaparece. As misérias do Nordeste, em verdade, não se tornaram melhores ou piores por causa daquele estudo. Ficaram apenas visíveis.

Estamos dissertando sobre o óbvio, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. Existe uma elevada probabilidade de que Estados e regiões com menor progresso econômico e social sejam aquelas que se colocam nos últimos lugares do ranking.

O IDH mede esperança de vida ao nascer, escolaridade e renda per capita. Quando se mede uma região em que os três índices estão razoavelmente servidos, aquela com menor desenvolvimento fica prejudicada.

A conclusão não pode ser outra, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. O índice está certo. Errados estão os Estados do Nordeste. Errado também está o Governo Federal que não cria incentivos específicos para a região, mesmo depois de tomar conhecimento de uma situação tão desfavorável quanto essa.

Não há como escapar à lógica: em qualquer lugar do mundo, em determinado momento, regiões deprimidas apresentam indicadores sociais e econômicos desfavoráveis em relação às mais desenvolvidas.

Mas há um dado interessante. Se na composição do IDH for substituída a variável PIB per capita pela renda domiciliar per capita, os Estados da região continuam a ser os de menores valores absolutos em face dos resultados nacionais.

No entanto, no longo prazo, entre 1970 e 1988, foram aqueles que tiveram o melhor desempenho relativo em termos de desenvolvimento humano no Brasil. Está ruim, mas já esteve pior.

Na verdade, embora tenham corrido em busca do melhor nível de vida, os Estados nordestinos estão sendo obrigados a percorrer uma enorme distância antes de encontrar os níveis verificados no Centro-Sul.

O Brasil desmontou o seu mecanismo de planejamento estratégico. Nos últimos 15 anos, não houve nenhuma iniciativa nesse sentido. E também não se teve notícias de políticas regionais efetivas.

Aproveito para fazer um parênteses, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para relatar que têm chegado muitos prefeitos a Brasília. Na semana passada acompanhei prefeitos da região do Cariri, da Paraíba. Um deles contou que não chove na região há doze anos. Ele tem um neto de nove anos, que nunca viu chuva. Os empregos agrícolas acabaram. É óbvio que uma região como essa, se não receber apoio, se não tiver um projeto, se não tiver a transposição das águas do São Francisco, não tem do que sobreviver.

Toda aquela região, Sr. Presidente, está vivendo às custas dos velhos que foram aposentados pelo Funrural. É uma lástima!

Além disso, o Brasil viveu a década perdida nos anos 80, embrulhado na questão da dívida externa, sob pesados índices de inflação e com um crescimento econômico negativo.

O resultado é este: por maior que tenha sido o crescimento dos Estados nordestinos, seus índices de vida, renda e escolaridade continuam muito abaixo da média nacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não adianta varrer as cinzas para debaixo do tapete. O Governo Federal continua a não incluir os Estados do Nordeste entre as suas prioridades. Temos um exemplo recente: a chamada política automotiva está provocando uma corrida de fábricas de automóveis para o Brasil.

A Renault já iniciou a construção de sua fábrica no Paraná, a Mercedes-Benz em juiz de Fora, Minas, a Honda e a Toyota em São Paulo...

O Sr. Roberto Requião - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Com grande satisfação, Senador Roberto Requião.

O Sr. Roberto Requião - Apenas uma observação para ilustrar seu pronunciamento e dar a verdadeira dimensão da política automotiva e da globalização. A Renault está abrindo uma fábrica no Paraná financiada pelo Governo do Estado, que participa com R$300 milhões no capital e, segundo o Jornal O Estado de S.Paulo, investe R$220 milhões em infra-estrutura. Ao mesmo tempo, ela fecha uma fábrica na Bélgica e demite 3.100 trabalhadores.

O SR. NEY SUASSUNA - É verdade, Sr. Senador Requião, e, algumas vezes, esses investimentos nem compensam. Agora mesmo, nos Estados Unidos, uma fábrica da Mercedes foi implantada num dos estados do centro-oeste americano e, contas feitas, teve um prejuízo grande para o estado, terminou nem valendo a pena.

Tem-se dúvidas até dos investimentos aqui, mas de qualquer jeito é no Sul e Sudeste que estão ocorrendo esses investimentos. Apesar das dificuldades, gostaríamos de receber esses investimentos, com o apoio do Governo Federal.

A Volkswagen está concluindo as obras de sua moderníssima linha de montagem de caminhões em Resende, Rio de Janeiro.

Inicialmente, nenhuma das novas montadoras foi para o Nordeste. Os Estados do centro-sul, que já possuem problemas urbanos de toda a ordem, congestionamentos de indústrias pesadas e leves, ainda assim conseguiram oferecer maiores atrativos e receber os novos investimentos estrangeiros.

Depois de muita luta da Bancada nordestina, o Governo Federal decidiu favorecer a implantação da indústria automotiva no Nordeste, através de uma política diferenciada de incentivos fiscais. Os Estados Unidos e outros países do Primeiro Mundo agora transformaram a questão em contencioso no âmbito da Organização Mundial do Comércio.

Ainda na semana passada, o Ministro José Alfredo Graça Lima, Diretor-Geral do Departamento Econômico do Itamarati, admitia a possibilidade de uma revisão da Medida Provisória do regime automotivo como forma de se evitar um painel na Organização Mundial do Comércio.

As mudanças poderiam ocorrer logo após a conclusão da reunião preparatória da ALCA, em Recife.

Se perdermos a briga, o Nordeste, provavelmente, continuará à margem do processo de desenvolvimento nacional.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, nós, os representantes do Nordeste, não podemos e nem devemos brigar com os fatos e as evidências. O estudo é bom. Ruim é a situação dos Estados nordestinos. É chegada a hora de reverter esse cenário de marginalização crescente dos nordestinos frente ao resto do Brasil.

O Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso precisa dar ao Nordeste a prioridade adequada. É fundamental criar incentivos para atrair novos capitais para aquela região. É importante reduzir os desequilíbrios, até por uma razão lógica. Com esse desequilíbrio, temos a migração interna e essa migração cria um desequilíbrio social. São famílias do Nordeste que ficam sem os seus chefes e são essas pessoas que vêm a São Paulo, Rio de Janeiro, Sul-Sudeste, para formar um cinturão de miséria em torno das grandes cidades. É uma migração que desequilibra socialmente toda a família brasileira. É importante reduzir os desequilíbrios.

É necessário restabelecer os mecanismos de planejamento estratégico para que se produzam políticas públicas diferenciadas.

O todo não pode ser forte, se uma parte é fraca. Nunca o todo será forte se uma parte for fraca. A fortaleza do todo será sempre igual à fraqueza da parte mais fraca.

E fica aqui uma sugestão, que poderia indicar a boa vontade do Governo Federal para com a região: a criação, na Paraíba, Estado que aparece em último lugar no ranking do índice de desenvolvimento humano, de um projeto-piloto destinado a reduzir disparidades de renda entre as regiões do Brasil.

Fica essa sugestão. Vou mandar cópia deste discurso ao Senhor Presidente da República, ao Sr. Ministro do Planejamento e às demais autoridades competentes, para que pensem na criação desse projeto-piloto, que começaria, mais uma vez, a tentar reverter essa desigualdade tão extrema.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/1997 - Página 5425