Discurso no Senado Federal

REFORMA DO JUDICIARIO COMO FORMA DE MODERNIZAR E AGILIZAR A JUSTIÇA NO BRASIL. PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO, DE AUTORIA DO SENADOR RONALDO CUNHA LIMA, EM TRAMITAÇÃO NO SENADO, QUE INSTITUI O EFEITO VINCULANTE, PADRONIZANDO AS INTERPRETAÇÕES NOS DIVERSOS NIVEIS DA MAGISTRATURA.

Autor
Valmir Campelo (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/DF)
Nome completo: Antônio Valmir Campelo Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • REFORMA DO JUDICIARIO COMO FORMA DE MODERNIZAR E AGILIZAR A JUSTIÇA NO BRASIL. PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO, DE AUTORIA DO SENADOR RONALDO CUNHA LIMA, EM TRAMITAÇÃO NO SENADO, QUE INSTITUI O EFEITO VINCULANTE, PADRONIZANDO AS INTERPRETAÇÕES NOS DIVERSOS NIVEIS DA MAGISTRATURA.
Aparteantes
Nabor Júnior, Ronaldo Cunha Lima.
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/1997 - Página 5413
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • DEFESA, AGILIZAÇÃO, REFORMULAÇÃO, JUSTIÇA, BRASIL, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, RONALDO CUNHA LIMA, SENADOR, IMPLANTAÇÃO, EFEITO VINCULANTE, MAGISTRATURA.

O SR. VALMIR CAMPELO (PTB-DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil passa por um singular momento de sua história. Não há como ignorar que muita coisa mudou, desde o impeachment do Sr. Collor de Melo, a começar pela eliminação dos constantes sobressaltos da economia, que hoje ostenta uma estabilidade que sinaliza bons ventos para o futuro.

A "era Fernando Henrique Cardoso" é sobretudo a "era das mudanças", das reformas, das profundas transformações.

Estruturas arcaicas e impeditivas do nosso desenvolvimento passam por necessárias modificações e são adequadas às exigências de um mundo cada vez mais competitivo e globalizado.

Nesse contexto, Sr. Presidente, pouco se tem falado, no entanto, numa reforma crucial, absolutamente necessária para o País e há muito reclamada pela população como um todo.

Refiro-me, Srª e Srs. Senadores, à reforma da Justiça brasileira que ainda não aportou no Século XX, quando faltam pouco menos de 3 anos para adentrarmos o Século XXI.

Quero deixar claro, logo de início, que não pretendo esgotar neste meu pronunciamento tema tão complexo e de tamanha envergadura. Primeiro, porque me faltam o "engenho e a arte". Segundo, porque isso demandaria uma discussão envolvendo toda a sociedade brasileira, que é a principal interessada nessa reforma.

Como político, entretanto, tenho uma espécie de sensor, que é comum a todos nós que militamos nessa seara, indicando, permanentemente, uma insatisfação generalizada do povo em relação a nossa Justiça como um todo.

Matéria publicada no Correio Braziliense, em sua edição de ontem, mostra estatísticas impressionantes quanto ao funcionamento da Justiça brasileira, justificando, amplamente, esse clamor de insatisfação que emana de todas as classes sociais.

Segundo o texto, assinado pelo jornalista Antônio Vital, do conceituado matutino brasiliense, a cada ano nossos tribunais recebem cerca de 5 milhões de novos processos. Apenas em janeiro deste ano, o Superior Tribunal de Justiça recebeu 4 mil 300 novos processos, que se juntaram a outras 30 mil ações que aguardam por decisões naquela Alta Corte.

Pelas projeções do jornalista de Brasília, para zerar a pauta, cada Ministro do STJ teria de julgar 1.176 processos até o final do ano, promovendo o julgamento de pelo menos três processos por dia, incluindo sábados, domingos e feriados.

Essa mesma situação, Sr. Presidente, em alguns casos com números bem mais expressivos e preocupantes, repete-se nas demais instâncias judiciais Brasil afora, fazendo com que processos simples se arrastem por anos a fio, numa via crucis que penaliza especialmente os segmentos mais desfavorecidos da nossa população.

O Sr. Nabor Júnior - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Valmir Campelo?

O SR. VALMIR CAMPELO - Ouço, com muito prazer, V. Exª, nobre Senador Nabor Júnior.

O Sr. Nabor Júnior - V. Exª está abordando um tema de interesse de toda a Nação brasileira, que é o emperramento da justiça do nosso País. A meu ver, uma das medidas que podem ser adotadas para reduzir o acúmulo de feitos judiciais no Brasil é a aprovação do projeto de emenda constitucional do Senador Ronaldo Cunha Lima, que institui o efeito vinculante, que são as decisões tomadas pelos tribunais superiores que atingem as instâncias de primeiro grau, padronizando as interpretações nos diversos níveis da Magistratura. O que está acontecendo é que, muitas vezes, os Tribunais Superiores julgam determinadas ações, mas, nas Cortes inferiores e nos Juizados de primeiro grau, continuam sendo apreciadas ações semelhantes às que já foram julgadas anteriormente.

Então, o efeito vinculante proposto pela Emenda do Senador Ronaldo Cunha Lima vai aliviar consideravelmente o número de ações que terão ingresso na Justiça brasileira. Isso é indispensável!

Os Tribunais Superiores não podem ficar cronicamente abarrotados de ações provenientes de todos os Estados. Um jornal informa hoje que quando o Ministro da Justiça, Nelson Jobim, chegar ao Supremo Tribunal Federal - e o Presidente da República já encaminhou mensagem a esta Casa fazendo essa indicação - ele vai herdar, de plano, dois mil processos, oriundos da gestão do seu antecessor, o ex-Ministro Francisco Resek. Quer dizer, não foi possível ao Ministro Francisco Resek, com o talento, a operosidade e a competência que todos festejamos, julgar todas essas ações. Só o efeito vinculante é que vai resolver essa questão, paralelamente a instituições como o Juizado de Pequenas Causas e outras inovações voltadas para a universalização e a eficácia da Justiça. Todos, aliás, devemos investir mais na criação dessas Cortes de rito sumário e grande eficácia, que muitos Estados já têm, como o Acre, nas quais são julgadas causas especiais e que não exigiriam o empenho da grande soma de recursos e estruturas da Justiça comum. Devemos estimular a sua criação em outros Estados, para julgar causas realmente pequenas, que não compensam acionar Tribunais de segunda ou terceira instância, mas não podem ser subtraídas à Justiça, mas por intermédio de juízes especiais.

O SR. VALMIR CAMPELO - Muito obrigado, nobre Senador Nabor Júnior. Acolho, com muita satisfação, as observações transparentes e oportunas de V. Exª. Eu me permitiria dizer a V. Exª que realmente o Juizado de Pequenas Causas já deveria ter sido implantado em todos os Estados, em todas as cidades do nosso País. Isso, sem dúvida nenhuma, iria desafogar as ações e a Justiça, que muitas vezes é morosa exatamente pela sobrecarga de processos a que estão submetidos os juízes, os desembargadores, os ministros e os magistrados de maneira geral.

Com relação à súmula vinculante do projeto de autoria do nobre Senador Ronaldo Cunha Lima, por quem tenho admiração e apreço muito grandes, é realmente oportuno que todos nós venhamos a discutir esse projeto. Em princípio comungo da mesma tese, mas, por outro lado, também existem opiniões formadas de que a súmula vinculante poderia cercear a liberdade dos julgadores, dos juízes. No entanto, tenho certeza de que a súmula vinculante talvez possa ser uma das saídas para desafogar a tramitação dos processos que hoje circulam na Justiça, principalmente nos Tribunais Superiores. Desse modo, considero oportuna a discussão desse tema aqui nesta Casa.

O Sr. Ronaldo Cunha Lima - V. Exª me permitiria um aparte?

O SR. VALMIR CAMPELO - Ouço, com muito prazer, o nobre Senador Ronaldo Cunha Lima.

O Sr. Ronaldo Cunha Lima - Primeiro desejo registrar, de forma escolhida, o meu agradecimento pelas referências generosas que V. Exª fez e faz a meu respeito. Segundo, tecer algumas considerações a respeito da emenda da reforma constitucional que estabelece o efeito vinculante para as decisões de mérito do Supremo Tribunal. A emenda, ao longo da sua tramitação, tem recebido sugestões que puderam enriquecê-la e foi submetida ao crivo da análise mais percuciente por parte de entidades ligadas ao Direito, notadamente a Ordem dos Advogados, a Associação do Ministério Público e advogados. O escopo principal da emenda é, primeiro, desafogar o Supremo Tribunal, com cerca de 35 mil processos, dos quais muitos análogos, assemelhados ou rigorosamente iguais; segundo, para dar uniformidade às decisões das instâncias inferiores; terceiro, para não permitir que recursos processuais somente fossem possíveis a quem tivesse recursos materiais. Com esses três ângulos, essas três pedras fundamentais, estaríamos estabelecendo e conferindo ao Supremo Tribunal Federal a competência para ele próprio, mediante seu Regimento Interno, estabelecer as hipóteses em que se configuraria o efeito vinculante, porque entendemos também que ele não pode ser estendido em todas as hipóteses do julgamento submetido à Suprema Corte. Se hoje existe dentro da Constituição ação direta de inconstitucionalidade, e se o § 2º do art. 102 da Constituição estabelece a possibilidade da declaração de constitucionalidade, não vemos por que não estender aos julgamentos de mérito, às causas definitivas de mérito do Supremo Tribunal, e, quando julgadas ou decididas por 2/3 da Corte, esse efeito se estabelecer de forma a vincular-se às às hierarquias inferiores dentro dos demais tribunais. Ao argumento que se opõe de que poderia haver uma imitação na independência dos julgados de primeira instância, tivemos oportunidade de dizer que o próprio Supremo Tribunal Federal com a competência que lhe é deferida vem estabelecendo como estabelecerá no seu Regimento Interno os casos, as hipóteses do efeito vinculante e não vai permitir ou estabelecer que essas decisões sejam ad perpetuam rei memoriam, que sejam eternas. Elas podem ser modificadas desde que provocadas e fundamentadas pelo próprio juiz da instância inicial para merecer mais tarde, se for possível, a reapreciação pelo próprio Supremo Tribunal Federal para que essas decisões não sejam imutáveis. Efeito vinculante não quer dizer imutabilidade da decisão, mesmo porque no nosso Direto Processual temos a ação rescisória para modificar a coisa julgada. Ao Supremo Tribunal Federal daremos competência para estabelecer, no seu Regimento Interno, as hipóteses para revogação ou revisão da Súmula e quais as pessoas que terão legitimidade para fazê-lo. Agradeço essa oportunidade a V. Exª.

O SR. VALMIR CAMPELO - Eu é que fico muito agradecido a V. Exª pelo aparte e pelos esclarecimentos como autor desse projeto que, sem dúvida nenhuma, trará benefícios à justiça do nosso País, principalmente no que diz respeito à tramitação dos processos hoje na nossa justiça que se acumulam a cada momento.

Parabéns a V. Exª pelo brilhante projeto apresentando.

Continuando meu pronunciamento, Sr. Presidente:

"As razões dessa lentidão da justiça são variadas e vão desde as impropriedades da legislação, que permitem a um bom advogado protelar indefinidamente o andamento de processo, até a já conhecida falta de juízes nos nossos tribunais.

Segundo a avaliação de advogados experientes, a lentidão se acentua quando se trata de ações patrocinadas ou sofridas pelo Poder Público, cujos processos na Justiça se avolumam a cada dia, notadamente no que se refere às reclamações trabalhistas do funcionalismo em geral.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não restam dúvidas de que a Justiça brasileira precisa mudar, adequar-se às exigências de uma sociedade em profundo e contínuo processo de mutação.

Precisamos encontrar meios de dar à Justiça brasileira as condições necessárias para, efetivamente, fazer-se justiça neste País.

No meu modo de ver, a Justiça tem que servir ao homem, facilitar a vida das pessoas e não ser motivo de desânimo, de esperas intermináveis por decisões que, quando exaradas, tornam-se inócuas e com efeitos muitas vezes paradoxais.

Dessa forma, quero deixar aqui um apelo aos nossos juízes, desembargadores, ministros, advogados e professores, no sentido de repensarmos a Justiça brasileira, buscando adequá-la aos desafios do terceiro milênio, tornando-a, efetivamente, um instrumento de justiça, de paz social e de desenvolvimento. Vamos humanizar, democratizar e modernizar a Justiça brasileira!

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/03/1997 - Página 5413