Discurso no Senado Federal

DENUNCIA PUBLICADA PELO JORNAL DIARIO DE CUIABA, DE QUE O GOVERNO FEDERAL REPASSOU RECURSOS AO GOVERNO DE MATO GROSSO PARA COMPRA DE TRATORES, NÃO SENDO ESTES ENTREGUES AOS RESPECTIVOS MUNICIPIOS ATE A PRESENTE DATA. DISTORÇÕES NO SISTEMA PENITENCIARIO BRASILEIRO. MOROSIDADE NA LIBERAÇÃO DE PRESOS.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DE MATO GROSSO (MT), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA PENITENCIARIA.:
  • DENUNCIA PUBLICADA PELO JORNAL DIARIO DE CUIABA, DE QUE O GOVERNO FEDERAL REPASSOU RECURSOS AO GOVERNO DE MATO GROSSO PARA COMPRA DE TRATORES, NÃO SENDO ESTES ENTREGUES AOS RESPECTIVOS MUNICIPIOS ATE A PRESENTE DATA. DISTORÇÕES NO SISTEMA PENITENCIARIO BRASILEIRO. MOROSIDADE NA LIBERAÇÃO DE PRESOS.
Publicação
Publicação no DSF de 21/03/1997 - Página 6204
Assunto
Outros > ESTADO DE MATO GROSSO (MT), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA PENITENCIARIA.
Indexação
  • DENUNCIA, JORNAL, DIARIO DE CUIABA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ADIAMENTO, ENTREGA, TRATOR, MUNICIPIOS, RESULTADO, AQUISIÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, VERBA, OBTENÇÃO, REPASSE, GOVERNO FEDERAL.
  • DEFESA, URGENCIA, ALTERAÇÃO, POLITICA PENITENCIARIA, PAIS, AUMENTO, INVESTIMENTO, AMPLIAÇÃO, CONSTRUÇÃO, PRESIDIO, REDUÇÃO, NIVEL, EXCESSO, LOTAÇÃO, PRESO, APLICAÇÃO, PENA, SUBSTITUIÇÃO, PRISÃO, PENALIDADE, MULTA, CONFISCO DE BENS.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, dois assuntos me fazem ocupar a tribuna do Senado na tarde de hoje. Primeiramente quero me referir à denúncia publicada no jornal Diário de Cuiabá, na página A-7 da edição de hoje, 20 de março de 1997:

      "DEMORA ELEITOREIRA

      Entrega de tratores da Prosol a prefeituras foi um ato "simbólico".

      Deputado denuncia que máquinas continuam nos pátios da empresa revendedora.

      Após duas semanas do megaevento em que 107 prefeituras de Mato Grosso receberam simbolicamente 140 tratores do governador Dante de Oliveira e do Ministro da Previdência e Assistência Social, Reinhold Stephanes, até agora apenas nos municípios da região de Sorriso as máquinas chegaram efetivamente.

      A demora na entrega fez com que o deputado estadual Quincas Santos (PFL) apresentasse na sessão de ontem pela manhã da Assembléia Legislativa um requerimento em que solicita à presidente da Prosol (Fundação de Promoção Social), a primeira-dama Thelma de Oliveira, informações sobre a realização de um cronograma de entrega das máquinas.

      Os equipamentos foram comprados por um convênio entre o governo estadual e o Ministério e o Governo de Mato Grosso, com recursos de R$3,87 milhões, com o objetivo de atender a cerca de 83 mil produtores e familiares do Estado. Além de um trator, cada kit entregue inclui grades aradoras, colheitadeiras e uma carreta com capacidade de três toneladas.

      O Deputado diz que recebeu reclamações dos prefeitos de Barra do Garças, Wanderlei Farias, e de Campinápolis, Orlando Brito, quanto à demora na entrega dos tratores. "Nas regiões em que há produção de hortifrutigranjeiros, a preparação do solo já deve começar a ser realizada e os tratores ainda não chegaram aos municípios."

      Quincas acredita que o governador Dante de Oliveira quer usar do mesmo fato político (a entrega dos tratores) em vários municípios para obter dividendos eleitorais. "O Governo quer fazer um carnaval em cada entrega", acusa o parlamentar. Segundo o parlamentar, as máquinas continuam no pátio da empresa revendedora.

Mais de cem tratores que deveriam ser entregues às prefeituras permanecem há mais de seis meses no pátio e estão se estragando.

Esse fato já foi comunicado ao Ministro da Previdência e Assistência Social, Reinhold Stephanes, e à Secretária Nacional de Assistência Social, Lúcia Vânia Abraão, que, lamentavelmente, não tomaram providência alguma. Já está se formando um clima de revolta na Assembléia de Mato Grosso contra mais esse descaso do Governo, que recebe recursos federais no valor de R$3.870 milhões, adquire os tratores e os deixa seis meses parados no pátio, sem entregá-los aos municípios, sobretudo àqueles cujos prefeitos pertencem a nossa coligação, que é oposição em Mato Grosso - prefeitos do PFL, PTB e PPB. Os tratores - repito - estão apodrecendo no pátio da empresa revendedora.

Sr. Presidente, alguma providência tem que ser tomada para pôr termo a essa situação. Não é justo que o Governo Federal repasse dinheiro ao Governo Estadual, este adquira as máquinas e não as entregue para serem utilizadas pela nossa população. É lamentável que no atual Governo nenhuma denúncia seja apurada. Há mais de 10 dias afirmamos isso ao Ministério da Previdência e nenhuma providência foi tomada para fazer com que essas entregas sejam efetivadas.

Por isso o meu protesto pelo descaso com que o Governo do Estado vem tendo com os recursos públicos, deixando praticamente estragar no campo, no depósito da firma fornecedora, equipamentos adquiridos com o dinheiro da Secretaria Nacional de Assistência Social.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, outro assunto me traz a esta tribuna. Dedicando-se à difícil tarefa de solucionar os diferentes e graves problemas que afligem a sociedade, o Presidente Fernando Henrique Cardoso decretou, no ano passado, indulto especial e condicional a cerca de 12 mil condenados de bom comportamento, que cumprem reclusão de até seis anos nos estabelecimentos penitenciários de todo o País.

Apropriadamente, não foram contemplados pelo benefício presidencial os presos condenados por crime de latrocínio, de extorsão seguida de morte, de extorsão acompanhada de seqüestro, de estupro, de atentado violento ao pudor, de envenenamento de água, alimentos e remédios, de morte praticada por grupos de extermínio, de tentativa ou consumação de homicídio qualificado e de genocídio, entre outros.

A medida deveria diminuir a superlotação dos presídios, causa freqüente dos motins deflagrados pela população carcerária, vítima das precárias condições de sobrevivência e da prática de todas as espécies de violência, atos comuns nas dependências ditas de recuperação de presos.

Com efeito, esses estabelecimentos ainda registram a altíssima média de três rebeliões a cada mês, em conseqüência da superpopulação e do estado físico marcadamente caótico em que se encontram as instalações e os equipamentos, numa clara demonstração da incapacidade de o Estado gerenciar a contento o cumprimento das penalidades por ele mesmo impostas.

A propósito, Aloysio Biondi relatou para a Folha de S.Paulo o que considera "uma das histórias mais comoventes dos últimos anos" acerca das distorções existentes no sistema penitenciário brasileiro. Na detenção superlotada de uma cidade do interior paulista, "os presos formaram um consórcio sui generis, em obediência ao qual pagavam uma quantia mínima por mês para comprar algo sonhado por todos: pura e simplesmente a liberdade".

"Um preso mais instruído havia descoberto que muitos colegas de cela estavam ali havia meses, sem necessidade: haviam cometido crimes leves, não tinham antecedentes, poderiam esperar a decisão do juiz em liberdade. Mas não tinham dinheiro para pagar a fiança que lhes garantiria a soltura."

Surgiu, daí, a idéia de se fazer um mutirão ou "um consórcio, realizando-se um sorteio mensal para decidir qual preso teria sua fiança paga com o dinheiro de todos. Preço da fiança do primeiro libertado: R$70,00". Conclui que, "por esse valor, os governantes brasileiros mantêm homens e mulheres no horror das prisões, privados não apenas de liberdade, mas, conseqüentemente, da própria vida. Semi-enterrados. Dormindo em pé em celas apinhadas", conforme mostra a CNBB na Campanha da Fraternidade deste ano.

Não se considerando sentimentos de solidariedade humana, mas tão-somente argumentos econômicos, "cada preso custa ao Estado, em média, R$500,00 por mês. Com ínfimos R$70,00, ou R$100,00 ou R$200,00, pode-se libertar um preso detido por crime afiançável. Uma economia de R$5.900,00 ou R$5.800,00 por ano, por preso".

Conseqüentemente, "a libertação de milhares de presos traria uma economia de centenas de milhões de reais para os Governos Estaduais. Assim, compensaria largamente a contratação de funcionários em caráter temporário para acelerar o processo de libertação desses presos".

"Nada seria feito por humanitarismo, mas para economizar. De quebra, a sociedade ficaria livre do festival de hipocrisia representado pelas declarações e entrevistas na televisão e nos jornais, de Governadores, Secretários e especialistas do setor penitenciário, ou defensores dos direitos humanos, que só dão o ar de sua graça quando há rebeliões ou massacre nos presídios."

A discussão de uma nova política criminal, portanto, seria encaminhada no sentido de enfrentar esse tipo de problema, concedendo velocidade adequada ao uso de práticas efetivas de não reter, inutilmente, o preso no cárcere. Discutiria, também, métodos de contenção da violência urbana, ao lado de providências destinadas a evitar que as prisões, sejam cadeias públicas, detenções ou penitenciárias, sigam existindo como verdadeiras universidades do crime.

Revela-nos o Ministério da Justiça que não se cumprem quase 300 mil mandados de prisão, por falta de vagas para acolher os novos presos. De acordo com o censo da população carcerária, realizado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, em 1995, o sistema conta com 59 mil vagas para uma demanda de 140 mil prisioneiros, apontando para um excedente de 81 mil vagas.

Então, mesmo em delegacias e distritos policiais, acumulam-se presos já condenados e os ainda aguardando julgamento; junta-se o criminoso primário ao reincidente, numa promiscuidade que a todos infelicita. Todavia, a Constituição Federal garante que o cumprimento das sentenças do juiz criminal deve ocorrer em estabelecimentos distintos, em função da espécie de delito, da idade e do sexo do condenado, devendo-se, em todos os casos, ser respeitada a integridade física e moral do preso.

Ora, Sr. Presidente, Srs. Senadores, clara está a impossibilidade de se cumprir o mandamento constitucional em cubículos superlotados, gerando revoltas, depredações e fugas, que muitas vezes deixam um saldo de vítimas inocentes e sempre elevados prejuízos financeiros para o Poder Público.

Julga o Ministério que para solucionar o problema dos condenados sem vaga nos presídios seria necessária a construção de mais cem novos estabelecimentos penitenciários. De outro lado, a recuperação do sistema penitenciário, que há mais de um exercício não recebe qualquer investimento, exigiria recursos da ordem de R$1 bilhão.

No entanto, segundo a avaliação da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, além dos claros na lotação, abertos pelo indulto, milhares de outros poderiam também ser liberados, caso se cumprissem, em favor do preso, os benefícios que a lei defere.

Já foram constatados numerosos episódios de cumprimento integral da pena, sem que a Justiça tenha determinado a liberdade do preso, e de reclusos cuja situação penal autorizaria a concessão do benefício do regime semi-aberto.

Também, a ausência de serviços advocatícios próprios e permanentes impossibilitam que o recluso tenha acesso a outra série de benefícios, como a unificação ou remissão das penas, pelo abatimento dos dias trabalhados e por bom comportamento.

A esse respeito, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária indica duas contribuições à melhoria do sistema carcerário, representadas por investimentos na ampliação e construção de presídios e pela aplicação intensiva das penas alternativas, em lugar das condenações privativas de liberdade.

Com isso, o confinamento seria substituído por penalidades como multa e confisco de bens, conforme o caso, e pela aplicação, ao criminoso que não representa risco para a sociedade, de penas retributivas, compensatórias e equivalentes ao prejuízo causado pelo ato delituoso.

Ainda de acordo com a análise do Conselho, mais de 20 mil sentenciados permanecem recolhidos em delegacias e distritos policiais, por falta de vaga nas penitenciárias. Essa distorção da política criminal em vigor, entre outros prejuízos, impede que o preso seja beneficiado com a redução da pena por dias trabalhados, conforme há pouco assinalamos.

A Campanha da Fraternidade da CNBB para 1997, dirigida exatamente para a melhoria das condições nos presídios, tem conscientizado a sociedade sobre as barbaridades que ocorrem nesses verdadeiros "campos de concentração".

Vamos concluir, Sr. Presidente, estas breves apreciações, consignando que, decerto, esse quadro preocupante precisa ser repensado e que nossas autoridades urgentemente promovam a discussão da reforma dos ultrapassados métodos e costumes do sistema prisional, no contexto mais amplo da instituição de uma política criminal para o País.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/03/1997 - Página 6204