Discurso no Senado Federal

OFICIO RECEBIDO DO CONSELHO MUNICIPAL DE SAUDE DE ALTAMIRA-PA, SOBRE O PROCEDIMENTO DO SECRETARIO DA SAUDE DO MUNICIPIO, QUE RETIROU O DINHEIRO DESTINADO AO PAGAMENTO DO PROGRAMA DO LEITE PARA AS CRIANÇAS E O DEPOSITOU NA CONTA DA SOGRA DO PREFEITO.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO MUNICIPAL.:
  • OFICIO RECEBIDO DO CONSELHO MUNICIPAL DE SAUDE DE ALTAMIRA-PA, SOBRE O PROCEDIMENTO DO SECRETARIO DA SAUDE DO MUNICIPIO, QUE RETIROU O DINHEIRO DESTINADO AO PAGAMENTO DO PROGRAMA DO LEITE PARA AS CRIANÇAS E O DEPOSITOU NA CONTA DA SOGRA DO PREFEITO.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/1997 - Página 6114
Assunto
Outros > ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO MUNICIPAL.
Indexação
  • LEITURA, OFICIO, CONSELHO MUNICIPAL, SAUDE, MUNICIPIO, ALTAMIRA (PA), ESTADO DO PARA (PA), DESVIO, VERBA, PREFEITO, EXERCICIO FINDO, AUXILIO, SECRETARIO MUNICIPAL.
  • INFORMAÇÃO, AUXILIO, JUIZ, ESTADO DO PARA (PA), CORRUPÇÃO, GOVERNO MUNICIPAL.
  • REGISTRO, ANAIS DO SENADO, OFICIO, ORADOR, PRESIDENTE, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), SECRETARIO EXECUTIVO, PROGRAMA COMUNIDADE SOLIDARIA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), AUTORIDADE ESTADUAL, JUDICIARIO, ESTADO DO PARA (PA).
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, EXPECTATIVA, PUNIÇÃO, RESPONSAVEL.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PPS-PA. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil encontra-se escandalizado com os fatos denunciados e vistos na CPI dos Precatórios. É interessante, Sr. Presidente, que os fatos que incriminam as maiores figuras sempre envolvem valores pequenos. Os milhões são considerados, de certa forma, fatos secundários. É o caso, por exemplo, do envolvimento do Prefeito Celso Pitta, com o pagamento do aluguel do carro de sua mulher, no valor de dois mil e poucos reais. Foi o caso da corrupção do ex-Presidente Fernando Collor, praticamente pego pelo recebimento de um Fiat. O mesmo ocorreu com Ibsen Pinheiro, na Comissão do Orçamento, que teve toda sua acusação baseada na compra de uma camionete, cujos recursos foram recebidos de alguém. Esses fatos escandalizam a Nação.

E estamos aqui, Sr. Presidente, para trazer mais um fato, que também escandaliza. Não é nosso interesse apenas denunciar. Quando fazemos a denúncia, buscamos fazer com que forças se unam para punir os culpados. Também lançamos uma mensagem ao povo, porque, apesar de tudo, apesar dos roubos, das falcatruas, da corrupção generalizada, o povo não pode perder a esperança. O povo tem que compreender e entender que política é a essência de tudo, que a política é uma necessidade, não apenas das grandes figuras, mas uma necessidade de cada cidadão brasileiro. Cada um deve participar, cada um deve buscar entender, porque é por intermédio da política que se corrigem os erros da sociedade.

Trago aqui, Sr. Presidente, um ofício que recebi do Conselho Municipal de Saúde de Altamira, no Estado do Pará, um Município que tem uma extensão territorial quase do tamanho da Inglaterra. Trata-se de um escândalo mais ostensivo, mais claro, mais evidente do que o escândalo que está acontecendo na CPI dos Precatórios, porque é um fato que demonstra a falta de medo das pessoas de cometerem crimes. É um fato que demonstra a impunidade que há no País, que precisa ser corrigida, e isso só acontecerá à medida que cada cidadão compreender e participar mais do processo político brasileiro.

Sr. Presidente, faço questão de ler esse documento. Parece coisa do Odorico Paraguassu, mas é algo absolutamente real e estarrecedor. Senão, vejamos. Diz o ofício a mim dirigido:

      "Nobre Senador,

      No dia 30 de dezembro de 1996, o Secretário de Saúde, Sebastião Vanderli Zortea, e seu tesoureiro, Ananias Francisco Carvalho de Paiva, sacaram da conta 106550 do Banco de Brasil de Altamira dois cheques, no valor total de R$139.221,46. Nessa conta são depositadas as verbas que o Ministério da Saúde manda para o programa "Leite é Saúde", destinado às crianças desnutridas e gestantes em risco nutricional.

Reparem que o dinheiro chegou no dia 30 de dezembro, faltando, portanto, um dia para terminar o mandato do prefeito, que deixaria o cargo ao seu sucessor, alguém que lhe fez oposição. A primeira questão que se levanta é como o governo manda um recurso para ser aplicado por um prefeito que tem apenas mais um dia de mandato. Esse erro foi cometido pelo Ministério da Saúde.

Vejamos o escândalo denunciado:

      "Esses cheques, porém, não foram usados para pagar o leite e o óleo do programa. Eles foram depositados, no mesmo dia, na conta 07291-89 da agência 0703 do Bamerindus, em Belém. Essa conta pertence a Dª Erundina Slompo, sogra do Prefeito Maurício Bastazini."

Veja bem, Sr. Presidente: o Ministro da Saúde deposita R$139.221,49 na conta da Prefeitura no Banco do Brasil. Na mesma hora, o Secretário de Saúde saca esse recurso, entrega os cheques ao Prefeito, e o Prefeito deposita os dois cheques na conta corrente da sua sogra!

Vejam o absurdo:

      "Cabe recordar que a Secretaria Municipal de Saúde, só no mês de dezembro de 1996, teve três Secretários de Saúde e Vanderli e Ananias foram nomeados para o cargo quando faltavam apenas dois dias para o término do mandato de Maurício Bastazini. Há quem diga que eles foram colocados só para botar a mão no dinheiro do leite."

Então, vejam a que absurdo chegamos! O Prefeito, sabendo que ia sair, dois dias antes nomeia um Secretário de Saúde, nomeia um tesoureiro para a Secretaria de Saúde, apenas para que eles recebam o dinheiro do leite e lhe entreguem, para que possa depositá-lo na conta da sua sogra.

Tem mais! Pior ainda!

      "Dito em palavra claras: O dinheiro do Programa do Leite foi roubado e depositado na conta da sogra do prefeito Maurício Bastazini. Sim, roubado mesmo. Como se rouba uma galinha no fundo do quintal, como se rouba uma bicicleta na frente da loja, como se rouba um relógio num assalto. "

      "O crime foi descoberto em tempo pelo Conselho Municipal de Saúde e pela Prefeitura de Altamira. No dia 3 de janeiro foi enviada à Promotora Pública Drª Elaine Nuayed de Souza uma representação pedindo bloqueio da conta de Erundina, por tratar-se de recursos públicos indevidamente nela depositados. O Juiz de Altamira, Dr. Maxiney do Rosário Cabral, concedeu a liminar, determinando o seqüestro judicial do dinheiro, deixando-o a disposição do juízo."

Agora, o mais grave, Sr. Presidente:

      "Os advogados de Dª Herundina Slompo procuraram a Drª Helena Farag, Juíza da 8ª Vara Cível da Capital, que, num despacho manuscrito de 8 linhas, sem qualquer fundamentação jurídica e sem apresentar motivos, concedeu uma liminar em favor de Dª Herundina, liberando o dinheiro.

      "E assim, graças à "generosidade" da Juíza, Drª Helena Farag, o dinheiro do leite das crianças desnutridas de Altamira sumiu no ralo imundo da apropriação indevida. A revolta da população contra essa escandalosa manobra é muito grande. Como entender que uma juíza de comarca diferente, mas da mesma instância contrarie e anule a decisão de outro juiz, sobretudo em se tratando de fato claramente criminoso, envolvendo o desvio de verba pública para o bolso de particulares?

É muito fácil, Sr. Presidente. Esta senhora, a Drª Helena Farag, é uma juíza conhecida no meu Estado pela sua má conduta, pela sua falta de ética e de honestidade no exercício do cargo de juíza. Essa juíza Helena Farag, agora envolvida na liberação desse recurso público, foi a mesma que, na eleição de 1990, estando atuando no Município de Itaituba, saiu oferecendo votos, juntamente com uns irmãos seus, que são pessoas de muito má conduta, a candidatos a deputado estadual e federal de outras regiões do Estado para serem votados no município de Itaituba, onde a Drª Helena Farag Presidia as eleições. Houve deputado que recebeu mil votos em Itaituba, outros receberam quinhentos e até mil e quinhentos, e sequer sabem onde fica a cidade.

Essa juíza vendeu votos para deputados estaduais e federais no Estado do Pará. Mas ela fez pior. Na eleição que presidiu em Itaituba, chegou ao ponto de haver setenta urnas de garimpo onde não houve eleições. As urnas foram preenchidas no foro. Havia boletins registrando 386 eleitores, e votaram todos os 386. Não faltou nenhum eleitor e todos os 386 votaram para o mesmo candidato a governador, para o mesmo candidato a senador, para o mesmo candidato a deputado federal e para o mesmo candidato a deputado estadual. Há urnas desse tipo feitas por essa senhora, que chegou a esse desplante.

Mais tarde, ela foi transferida para Bragança e, agora, é juíza na capital de meu Estado, privilegiada pelo Poder Judiciário, sendo ela uma pessoa de conhecida má conduta.

      Os atos e a rapidez da ação da Drª Helena Farag levantam fortes suspeitas de abuso de poder e prática criminosa, o que, aliás, já é comentado em toda a cidade de Altamira e região, envolvendo, além dela, outros personagens do Poder Legislativo, do Judiciário e do Ministério Público estadual.

      Nossas repetidas queixas contra o Poder Executivo municipal e a Fundação Nacional de Saúde, que nunca respeitaram o Conselho Municipal de Saúde, não foram ouvidas, e por isso, só durante o ano de 1996, da "Saúde Pública" de Altamira foram desviados, roubados mesmo, mais de R$500 mil. E isso se refere apenas a casos dos quais o Conselho tomou conhecimento e encaminhou a denúncia.

Com tantos desvios de recursos, como esperar que o SUS funcione?

      Este Conselho Municipal de Saúde, indignado por tanta corrupção e decepcionado pela atitude inaceitável do Poder Judiciário e dos Poderes Públicos em geral, pede que S. Exª empreste sua voz a esta luta, exigindo, a bem do bom nome das Instituições, que as instâncias superiores do Ministério Público e do Judiciário tomem posição pública e oficialmente, a fim de dar a devida satisfação à comunidade altamirense gravemente ferida em seus direitos. Os criminosos - todos eles - devem ser presos e punidos; o dinheiro deve ser devolvido, já. O Poder Judiciário, que teimosamente rejeita qualquer controle externo, deve mostrar concretamente que sabe governar-se sozinho.

      Respeitosamente

      Gracinda Lima Magalhães

      Presidente em exercício do Conselho de Saúde do Município de Altamira.

É este Poder Judiciário, que tanto quer sua independência, que aceita que membros da sua classe sejam corruptos, cometam arbitrariedades, e o espírito de corpo não lhes permite punir determinados juízes. Isso não aceitamos, Sr. Presidente. Vamos lutar até o fim para que essas pessoas paguem por seus atos, para que juízes corruptos percam o seu cargo. Essas denúncias nós vamos continuar fazendo.

Quero deixar registrado nos Anais do Senado os ofícios que encaminhei, em função da denúncia grave que recebi, dirigidos, em primeiro lugar, ao Ministro Marcos Vinícius Rodrigues Villaça, Presidente do Tribunal de Contas da União, que tem a obrigação de vigiar o dinheiro do Governo Federal que vai para as Prefeituras Municipais. Quero que o Ministro tome providências para saber como sumiram esses R$139 mil.

Envio outro ofício à Srª Ana Maria Peliano, Secretária Executiva da Comunidade Solidária; ao Sr. Carlos César Albuquerque, Ministro de Estado de Saúde, porque foi de lá que saiu o dinheiro para ser roubado por essas pessoas, protegidas pela Juíza Helena Farag; ao Ministro Pedro Sampaio Malan, Ministro do Planejamento, para que tome providências sobre esses R$139 mil, tomados do povo que necessita do leite e do amparo do Governo; ao Desembargador Romão Amoedo Neto, Presidente do Tribunal de Justiça do meu Estado, pedindo-lhe que tome providência contra a decisão arbitrária, corrupta e inescrupulosa da Juíza Helena Farag; ao Desembargador Humberto de Castro, Corregedor da Justiça do Estado do Pará, para que tome providências no sentido de apurar as razões pelas quais a Juíza Helena Farag liberou os recursos da conta da sogra do ex-Prefeito daquele Município.

É com denúncias de escândalo como esse que vamos colocar os culpados no seu devido lugar. Sabemos que a impunidade é grande no Brasil, mas não podemos desistir de acusar, não podemos desistir de denunciar. Não queremos levar a desesperança por essa corrupção generalizada; queremos, em contrário, dizer ao povo que essas coisas, para serem corrigidas, precisam ser ditas e que o povo deve compreender que cada vez mais tem que participar do processo político, militar em um partido político, procurar saber seu programa de trabalho, conhecer as pessoas que se apresentam como candidatos. É dessa forma que vamos combater os ladrões e fazer com que o dinheiro do povo venha a servir ao próprio povo.

Registro ainda minha crítica contundente ao Ministério da Saúde e ao Presidente da República, por deixarem que coisas absurdas como essa aconteçam. Faltando um dia para se terminar o mandato de um prefeito, coloca-se na conta da prefeitura R$139 mil para que se efetue despesas com leite e atendimento às mães que estão perto de dar à luz. Lamentavelmente, tais coisas acontecem em nosso País.

Sr. Presidente, esperamos que, com as denúncias, providências sejam tomadas: que as pessoas devolvam o dinheiro que foi roubado do povo de Altamira e que a juíza em questão seja punida com a perda do cargo, porque não merece ocupá-lo no Estado do Pará.

Era a manifestação que eu gostaria de fazer neste momento. Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/1997 - Página 6114