Discurso no Senado Federal

JUSTIFICANDO O PROJETO DE LEI DO SENADO 44, DE 1997, APRESENTADO POR S.EXA. NA PRESENTE SESSÃO, QUE ACRESCENTA PARAGRAFO UNICO AO ARTIGO 31 DA LEI 8.071, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990, QUE DISPÕE SOBRE A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA POPULAR.:
  • JUSTIFICANDO O PROJETO DE LEI DO SENADO 44, DE 1997, APRESENTADO POR S.EXA. NA PRESENTE SESSÃO, QUE ACRESCENTA PARAGRAFO UNICO AO ARTIGO 31 DA LEI 8.071, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990, QUE DISPÕE SOBRE A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/1997 - Página 6242
Assunto
Outros > ECONOMIA POPULAR.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, SENADO, APRESENTAÇÃO, ORADOR, INCLUSÃO, ARTIGO, LEGISLAÇÃO, DEFESA DO CONSUMIDOR, OBRIGATORIEDADE, FIXAÇÃO, PREÇO, MERCADORIA, COBRANÇA, TAXAS, JUROS, EVENTUALIDADE, PARCELAMENTO.

A SRª MARINA SILVA (BLOCO/PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero apenas me reportar à iniciativa de um projeto de lei que estou apresentando que acrescenta parágrafo único ao artigo 31 da Lei nº 8.071, de 11 de setembro de 1990, que dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências.

A iniciativa tem, por fundamentação, a idéia de que o consumidor, na relação com o comerciante ou o fornecedor, é o elo mais fraco. Atenho-me exatamente ao fato de que, quando se trata da venda de produtos ou de serviço de forma parcelados, muitas vezes, a divisão em parcelas acaba por escamotear uma elevação de juros muito alta que não é percebida pelo consumidor, principalmente em se tratando de pessoas simples. Há um destaque maior para o parcelamento que, muitas vezes, chega a 10, 15 vezes, e a pessoa atém-se apenas àquela "pequena" quantidade que ele irá pagar a cada mês para poder usufruir de um objeto dos seus sonhos, do seu desejo, para satisfazer às suas necessidades, sejam elas do ponto de vista econômico ou mesmo uma necessidade do ponto de vista emocional, de um conforto pessoal.

Tenho em mãos um panfleto de propaganda que dá conta do parcelamento de uma cama em 15 vezes, com uma parcela mensal de R$9,85. É claro que uma pessoa, ao observar este preço, vai sentir que é muito fácil, que está, como se diz na linguagem corrente, por uma bagatela. O preço à vista sairia por apenas R$79,90, enquanto o preço final, com parcelamento, chega a R$147,75, ou seja, há aí um percentual de juros por mês, numa média de 4%, que é incompatível com a inflação apresentada pelo Governo.

Há, na verdade, uma má-fé em relação ao consumidor que, em não estando alerta, acaba por achar que está fazendo um grande negócio, quando, na verdade, está sofrendo uma espécie de usurpação dos seus recursos por uma prática da elevação de juros indevidos, que está sendo praticada no mercado.

A proposta que faço acrescenta ao art. 31 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, o seguinte parágrafo único:

      "Quando a oferta ou a apresentação se referirem a fornecimento com pagamento parcelado, também serão informados as taxas de juro, se for o caso, e o preço à vista com igual ou maior destaque do que preço a prazo."

O objetivo é que fique bem claro quanto o consumidor pagará a mais pelo sistema a prazo e qual a vantagem se pagar à vista, porque o preço ficaria bem destacado.

Ainda há pouco, observando um livro muito interessante de um escritor, cientista e físico, intitulado "Mundo Assombrado pelos Demônios", há uma parte que diz exatamente que precisamos nos proteger de nós mesmos. E quando fazemos essas leis é para tentar nos proteger de nós mesmos, de nossas ganâncias, dos nossos anseios pelo lucro imediato em detrimento do interesse público ou do interesse de outra pessoa.

Há um outro escritor, um filósofo cristão, ao qual já devo ter feito algumas referências neste plenário chamado Hans Kung, que escreveu um livro muito interessante que trata de um projeto de ética global. Em determinado momento no livro, ele faz uma indagação: "Para que as leis sem os costumes?" Lamentavelmente, quando não temos os costumes, as leis são fundamentais porque, se não temos os costumes nem as leis, então, o cidadão fica à deriva do interesse de quem quer que seja para praticar aquilo que o seu livre arbítrio lhe confere como sendo certo ou incerto.

É preciso que sejam pactuadas formas de proteção coletiva, de proteção social. O próprio Hans Kung, mais adiante, coloca que a ética não mais pode ser individual na sociedade pós-moderna, como muito bem acabou de colocar V. Exª, Sr. Presidente, no pronunciamento que fez, a ética também precisa ser coletiva. E, nesse sentido, precisamos criar mecanismos coletivos de controle aos abusos praticados contra os indivíduos, contra os direitos humanos, contra a democracia.

Esse projeto, muito embora aparentemente simples, recai sobre essa tentativa de, enquanto não temos os costumes de respeito às pessoas, enquanto não temos uma ética coletiva que nos obrigue a fazer aquilo que é correto do ponto de vista social, cultural, econômico, nós precisamos das leis. E, quem sabe, nessa criação de leis, vamos também aprendendo a ter novas práticas e novos costumes.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/1997 - Página 6242