Discurso no Senado Federal

ARGUMENTOS QUE DEMONSTRAM A INOPORTUNIDADE DA PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. ESTUDOS ENCAMINHADOS A S.EXA. QUE RESSALTAM O PAPEL ESTRATEGICO DA VALE PARA O DESENVOLVIMENTO DO BRASIL.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • ARGUMENTOS QUE DEMONSTRAM A INOPORTUNIDADE DA PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. ESTUDOS ENCAMINHADOS A S.EXA. QUE RESSALTAM O PAPEL ESTRATEGICO DA VALE PARA O DESENVOLVIMENTO DO BRASIL.
Aparteantes
Benedita da Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/1997 - Página 6536
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • AUSENCIA, POSIÇÃO, DEFESA, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), CRITICA, GOVERNO, FALTA, PLEBISCITO.
  • COMENTARIO, ESTUDO, AVALIAÇÃO, FUNÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), IMPORTANCIA, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • REGISTRO, ADIAMENTO, LEILÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), MOTIVO, AÇÃO JUDICIAL, OPORTUNIDADE, PRORROGAÇÃO, DEBATE, ALTERAÇÃO, PROCESSO, VENDA.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, já muito aqui se falou e debateu sobre a Companhia Vale do Rio Doce. Nossos Anais estão inundados com os volumosos argumentos que demonstram a inoportunidade da privatização dessa empresa do modo como se programa fazê-lo.

E o curioso, Sr. Presidente, é que são ralas e raras, tímidas e desprovidas de objetividade, as eventuais falas que porventura defendam a iniciativa dessa privatização. Mesmo na imprensa, na divulgação de custosas campanhas pró ou contra a venda da Vale, as alegações oficiais têm sido inconsistentes, não obstante, as autoridades governamentais terem ouvidos moucos para os argumentos e apelos produzidos no Congresso em favor da Vale do Rio Doce. É impressionante a determinação dos setores que não abrem mão da privatização dessa companhia. É a determinação do dono, isto é, a vontade irrefreável de quem, sentindo-se legítimo e único proprietário de um bem, investe-se no direito de fazer dele o que lhe aprouver, sem dar satisfações a ninguém.

No meu entender, penso que o mínimo que os assessores oficiais deviam fazer, em face do repúdio de tantos à desmobilização da Vale do Rio Doce, como empresa estatal, seria consultar o povo sobre o assunto. Se não o fazem é porque, de antemão, já não lhes agrada a perspectiva do resultado de tal pesquisa plebiscitária.

Nestes últimos dias, Sr. Presidente, recebi de interessados, estudos em torno da Vale do Rio Doce com argumentos que, até agora, não tinham vindo a lume. Tal estudo procura demonstrar que a Companhia Vale do Rio Doce, ao contrário, por exemplo, do complexo siderúrgico estatal brasileiro, compõe um sistema integrado do maior interesse estratégico para o Brasil.

Uma siderúrgica, na verdade, é indústria de transformação: recebe a matéria-prima de um lado e, de outro, gera produtos siderúrgicos. Já a Vale do Rio Doce desenvolve um processo de completo modelo empresarial, pois detém a produção mineral, o transporte, o embarque marítimo, a navegação e o contato direto com o mercado.

E por ser um fator de desenvolvimento regional, a Vale do Rio Doce tornou-se um instrumento de conquista econômica de espaços vazios e potencialmente promissores.

Como diz o documento: "Ela pode ser considerada o maior instrumento criador de riquezas que possui o País, pois gera os seus próprios recursos, principalmente através das tecnologias do uso de seus bens minerais. Tem, portanto, papel de relevo na política de desenvolvimento do Governo e deve ser orientada para atuar exatamente e primordialmente nessa direção."

A Srª Benedita da Silva - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Edison Lobão?

O SR. EDISON LOBÃO - Pois não, Senadora Benedita da Silva, com muito prazer.

A Srª Benedita da Silva - Senador Edison Lobão, parece-me que hoje estamos tendo a grande oportunidade de falar a respeito da Vale do Rio Doce e a cada momento me convenço de que essa nossa defesa da não privatização dessa estatal é, sem dúvida, da vontade popular, da sociedade, do povo brasileiro que, lamentavelmente, ainda não foi consultado. Por quê? Hoje tivemos a oportunidade de ouvir da tribuna o Senador José Alves, que colocou com muita propriedade por que não se deve vender a Vale do Rio Doce. Tenho feito, junto com meus Pares da Bancada do Partido dos Trabalhadores, vários pronunciamentos desta tribuna, falando a respeito da não privatização da Vale do Rio Doce. V. Exª, neste momento, ocupa a tribuna para falar sobre esse assunto. Tal questão não é ideológica, envolve todos aqueles que querem preservar o patrimônio brasileiro em benefício da sociedade. A Vale do Rio Doce, Senador Edison Lobão, não pode e não deve ser vendida. Primeiro temos que garantir que haja espaços para manifestação da sociedade brasileira porque, na verdade, seja para privatizar ou não, quem tem uma pequena voz tem feito manifestações: o Congresso Nacional, as manifestações televisivas. Precisamos acalorar esse momento colocando o sentimento nacional nessa proposta, levando o Presidente da República a compreender que existem vários segmentos e correntes ideológicas contrárias à privatização desse patrimônio e que não se pode privatizá-lo de imediato, sem sequer sabermos da potencialidade da Vale do Rio Doce. Sabemos o que essa estatal tem produzido, e poderá produzir muito mais. A potencialidade da Vale do Rio Doce foge, neste momento, ao conhecimento técnico, inclusive, quando, por uma razão que ainda não me convenceu, se insiste em privatizá-la. Ora, Senador, V. Exª sabe, como também já falou o Senador José Alves hoje, que a Vale do Rio Doce é rentável, não onera os cofres públicos e que não precisa competir qualitativamente com nenhuma outra empresa. E diga-se, temos condições de dar a ela respaldo suficiente se a justificativa da privatização passar pela questão da fiscalização. Vamos fazer uma fiscalização maior se esse é o caso, mas não é. Ela tem demonstrado o seu potencial e estamos aqui incansáveis na sua defesa. V. Exª está de parabéns, nesta tarde, enfocando um assunto da maior relevância. Esse assunto assusta-me na medida em que não apenas as vozes ou a voz rouca da rua, mas também aqui neste Senado temos nos manifestado por várias vezes e ainda não sentimos nenhuma sensibilidade por parte do Poder Executivo para, de uma vez por todas, dar fim a esse desejo da privatização da Vale do Rio Doce. Acredito no esforço que estamos fazendo e se tivermos a oportunidade de envolver a população brasileira, fazendo, como disse no aparte ao Senador José Alves, uma consulta à população, tenho certeza de que não aprovaremos de forma nenhuma essa privatização. V. Exª sabe que poderá contar, nesse seu clamor, com tantos outros Srs. Senadores, entre eles eu mesma, e digo que não seremos uma voz clamando no deserto. Tenho esperança de que a Vale não seja privatizada.

O SR. EDISON LOBÃO - Senadora Benedita da Silva, já usamos desta tribuna todos os argumentos técnicos contra a privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Tenho daqui ouvido as manifestações de V. Exª, dos companheiros do seu Partido e do Senador José Alves - no meu gabinete, ainda há pouco ouvia o discurso de S. Exª também -, e os argumentos que aqui levantamos não foram até hoje respondidos por nenhuma autoridade do Governo.

Por que, então, não consultar a opinião pública, como diz V. Exª? Por que não fazer uma pesquisa para saber se o povo brasileiro autoriza ou desautoriza a privatização da Companhia Vale do Rio Doce?

O Governo não deseja se submeter a esse teste. Prefere, nesse caso, tomar uma decisão de império, decidir sozinho, assumir sozinho a responsabilidade. Nesse passo, realmente, o Governo estará assumindo sozinho a sua responsabilidade.

Seguidamente tenho dito desta tribuna que apóio - e o faço até com ardor, com fidelidade, com lealdade - o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Nesse particular, lamento não poder apoiar a iniciativa de seu Governo.

Não encontro razão de natureza nenhuma para a privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Esse argumento que usamos de ser ela rentável é até o mais fraco de todos. O fato é que não se conhece em profundidade o patrimônio da Companhia; quem o declara são as próprias autoridades do Governo.

O Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social, Senador Francelino Pereira, freqüentemente adia a privatização da Vale sob o peso do argumento no sentido de que o preço cobrado pelas ações está aquém do que de fato ela vale. Se o vendedor, que é o mais ardoroso defensor dessa transferência de patrimônio, procede assim, imagine nós.

Hoje, ouvi pelo rádio que uma vez mais o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social pretende adiar o leilão de venda das ações, já agora por um outro motivo, em razão de ações na Justiça, de liminares que estão sendo anunciadas em função da venda precipitada da Companhia Vale do Rio Doce.

O fato é que deveríamos meditar um pouco mais. Por que não adiar pelo menos por mais seis meses, enquanto se estuda profundamente a questão? Quem sabe se encontraria, com a imaginação criadora do povo brasileiro, uma alternativa melhor até mesmo para a venda mas em melhores condições para o País, em condições claras, nítidas, transparentes, que todos pudéssemos entender e não pelas condições que somente os técnicos entendem.

São estes os apelos que estamos aqui fazendo todos os dias, parece que clamando no deserto. Meu Deus, onde estás que não me escutas? Será possível que chegaremos ao ponto de uma venda precipitada, desnecessária, quando tudo indica uma providência inversa a que está sendo colocada em prática?

Agradeço, Senadora Benedita da Silva, a contribuição valiosa de V. Exª. Quem sabe ainda poderemos ser ouvidos.

Sr. Presidente, o meu Estado talvez seja o que mais de perto tem testemunhado o trabalho pioneiro e desenvolvimentista da Vale do Rio Doce. Não só a província mineral de Carajás, mas a estrada de ferro, a melhor do Brasil, cortando terras antes inexploradas para atingir o porto de águas profundas no Itaqui, no qual se transfere, muitas vezes, para navios da própria Companhia Vale do Rio Doce, o minério exportado, fator de riqueza nacional.

Sr. Presidente, seria ilusório imaginar-se que a iniciativa privada, após assumir esta Companhia, iria ter ânimo e fôlego para dar continuidade ao papel de agente do desenvolvimento que tem caracterizado a empresa. Nem é este o dever de uma empresa privada que precisa estar atenta ao lucro para assegurar sua própria sobrevivência. Se a Vale mantém empreendimentos que fujam às suas principais metas no campo mineral, então, que se privatizem tais setores. Nunca, porém, oferecer-se o "quem dá mais" um patrimônio nacional que, depois, de desfeito, não será jamais recuperado.

Sei que este meu apelo às autoridades econômicas que comandam o processo de privatização da Companhia Vale do Rio Doce, mais uma vez, cairá no vazio. Contudo, que se registre junto com todos os outros lançados no Congresso Nacional para que a futura análise dos nossos historiadores não se faça de maneira distorcida.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/1997 - Página 6536